PEIXES - COMO ENFRENTAM AS DIFERENÇAS DE PRESSÃO? - CAP I

Vamos nesta série de artigos ver de que forma os corpos dos nossos peixes são directamente afectados pela pressão hiperbárica do mar que os rodeia, e como lidam com ela.
E já agora, também como a pesca à linha os pode afectar em termos fisiológicos, e até matar, mesmo que nos …escapem.
Necessariamente teremos de saber previamente algo sobre o assunto, ter algumas bases, entender o que é isso de pressão atmosférica e pressão hiperbárica.
Saber como se distribui verticalmente, e de que forma a alteração súbita da profundidade muda os valores de pressão a que os corpos dos peixes estão sujeitos. E estabilizados.
Por mais que vos pareça maçador, penso que vale a pena ler um pouco sobre conceitos tão gerais como atmosfera, gravidade, temperatura, e partir daí para algo bem mais profundo e interessante: a forma como os nossos peixes se relacionam com a profundidade. Acreditem que vai valer a pena!
Vamos a isso, a um artigo que hoje tem menos pesca, quase só dados físicos, mas que nos irá ajudar nos textos seguintes a compreender alguns fenómenos de peixes e pesca que estão debaixo dos nossos olhos mas que …não entendemos.

Ouvimos falar em “frente fria”, “centro de altas pressões”, mas nem todas as pessoas sabem exactamente o que isso quer dizer. Apenas sabem que afecta o comportamento dos peixes e por conseguinte…a pesca. Afinal o que é isso?!
É sabido que ao caminharmos numa rua, a pescar de costa ou a navegar no nosso barco, temos sempre sobre nós um entorno de ar, algo a que convencionámos chamar de uma “atmosfera”.
Estamos cercados de ar. Não o vemos, mas percebemo-lo, sabemos que existe. De resto respiramos esse ar.
Quando ele se desloca a grande velocidade, e embora não o possamos ver, sentimo-lo na pele sob a forma de vento.
É o vento que provoca as ondas, as quais promovem a necessária mistura de gases, nomeadamente o oxigénio na água do mar, um dos factores que possibilita a existência de peixes.
Esse ar, todo o conjunto de gases comuns e raros que o formam, embora invisível aos nossos olhos, tem uma determinada massa, um determinado peso, e inevitavelmente, como toda a matéria, todos os corpos, sofre sobre si a força do efeito de gravidade, ou seja, também é atraído para o centro gravitacional da Terra.
No caso do ar, o peso dessa massa gasosa faz-se sentir na superfície terrestre sob a forma de pressão atmosférica.


Vento, ondas, marés, temperatura, pressão atmosférica, etc, …tudo muda o comportamento dos nossos peixes. 


Poderíamos definir essa pressão como uma força que é exercida pela massa de gases no sentido descendente, de cima para baixo, sobre tudo o que existe na superfície terrestre.
Está em todo o lado e é aplicada a tudo e todos. A nós humanos…também.
No entanto, porque nascemos neste ambiente e desde sempre nos habituámos a sentir esse efeito de pressão, não estranhamos.
Da mesma forma que não vemos a gravidade, não pensamos nela, apenas sabemos que existe porque nos limita a cada passo.
Lançamos objectos para cima e eles caem. Sabemos que irão cair antes mesmo de os lançarmos.
Para nós isso é tão natural que nem questionamos alguns factos que, mesmo a nós pescadores, acabam por exigir adaptações, truques, formas de contrariar a regra.
Na verdade, tudo o que fazemos, desde a compra criteriosa de materiais às nossas próprias técnicas de pesca, tudo isso é influenciado por este estranho fenómeno da gravidade.
Dou-vos um exemplo para que entendam melhor: se pescamos a spinning, ao lançarmos uma amostra queremos que voe o mais longe possível, queremos atingir zonas de pesca menos pescadas, onde os peixes estão mais descansados, mais receptivos a morder.
Ou que a amostra chegue bem atrás da rebentação, onde sabemos que andam os nossos robalos a caçar.
Mas, por melhor que seja a cana, por mais força que façamos, por melhor que seja a nossa técnica de lançamento, ela vai acabar por cair e provavelmente não muito longe de nós. Podemos nem conseguir atingir a zona onde os peixes estão.
Porquê?! Que acontece para sermos impedidos de chegar onde queremos?
Pois sim, as amostras vão ter de vencer diversas forças, as quais, não sendo visíveis, ainda assim existem e limitam a sua acção.
E que forças são essas?




Desde logo a resistência do ar, que trava a sua progressão, que lhes oferece …resistência à sua deslocação. É um facto!
Maior ou menor resistência, dependendo da velocidade de deslocação do vento, e de estarmos a lançar a favor ou contra o sentido em que se desloca.
Experimentem lançar contra o vento e entenderão que é muito mais difícil que lançar a favor do vento.
O que fazemos a seguir são estratégias para vencer essa resistência, mas o princípio é claro: há sempre uma resistência porque estamos sempre rodeados de ar.
Por isso preferimos linhas finas que lhe oferecem menos atrito, são menos pesadas e assim sendo a amostra arrasta-as consigo mais facilmente. E por isso, …lançamos mais longe.
Também sabemos que, por força do efeito de gravidade, a amostra estará sempre impedida de subir indefinidamente ou mesmo manter uma trajectória infinita paralela à superfície do mar. Irá sempre acabar por cair.
Sim, podemos conseguir lançar mais longe se escolhermos uma amostra com um peso mais significativo, caso a acção da nossa cana o permita.
Isso significa que estamos a tentar contrariar o efeito de gravidade lançando um peso superior, uma amostra mais pesada, dando-lhe o maior impulso inicial possível, e recorrendo a uma outra força chamada de energia cinética.
Imprimimos um forte movimento na direcção onde queremos que vá cair e temos a esperança de conseguir alcançar uma maior distância. Mas a dado momento, a amostra cai.
Podemos escolher uma forma mais longilínea, mais aerodinâmica, (lançar uma bola será mais difícil que lançar um cilindro estreito e comprido, por efeito do atrito do ar, mesmo que o peso seja o mesmo).
E já agora, podemos ainda definir uma trajectória óptima que permita um voo mais longo, mas no fim vai sempre cair.
Sabemos que vai cair, antecipamos isso. Sabemos bem que o movimento da amostra não será perpétuo, porque algo irá actuar sobre ela e vai forçá-la a baixar ao nível zero.
A amostra cai, mais perto ou mais longe, por força destes efeitos invisíveis. Se pensarmos bem, tudo o que fazemos tem a ver com a necessidade de contrariar diversas forças físicas.




Relativamente à pressão atmosférica, estamos sempre a actuar sobre o seu efeito, mas fazemo-lo de forma inconsciente. Está sempre lá mas não se vê.
Serão essas forças iguais em todo o lado? Não, nem tanto.
Em terra, a pressão atmosférica diminui à medida que a altitude aumenta, ou seja, depende de um local para outro, da sua altitude relativamente ao nível médio do mar.
À medida que subimos o nosso corpo em altitude, a pressão atmosférica que incide sobre nós diminui, pois diminui directamente o peso da coluna de ar que temos em cima.
Como o ar é algo compressível, ao subirmos diminui a densidade desse ar. E se a densidade do ar é menor, se há menos moléculas por metro quadrado, fica claro que o peso desse ar sobre nós é inferior.
Logo, a pressão atmosférica é menor.




Por isso os aviões se deslocam mais depressa a maiores altitudes, a pressão atmosférica é menor, o avanço é mais rápido.
Sem querer detalhar muito, apenas en passant, é algo como isto: quando os aviões sobem a altitudes muito significativas, afastam-se da superfície da terra, o que quer dizer a densidade do ar diminui. Há menos moléculas de ar presentes.
Embora tenham de manter uma razão estequiométrica de uma determinada quantidade de ar para uma quantidade de combustível, (há uma proporção directa entre eles para que os motores funcionem bem) eles beneficiam do facto de, ao reduzirem as moléculas de combustível, reduzirem o consumo.
Um outro factor é o atrito, ou “arrasto” do avião, que passa a voar mais rápido por ter de vencer menos resistência do ar à sua penetração.
Se o ar é menos denso, o motor precisa fazer menos força para propulsionar o avião, logo queima menos combustível. Certo?
No mar, não é diferente. O princípio é o mesmo, quanto mais fundo maior a pressão. Para que fiquem sem dúvidas de que a pressão hidrostática aumenta à medida que a profundidade aumenta, há um exercício muito simples que pode ser feito em casa, e que prova que é assim. Pegamos numa garrafa de água cheia, fazemos 3 furos e vamos ver que a pressão de saída da água obriga o liquido a sair com mais força quanto mais abaixo se situa.
Porque a pressão é maior em baixo, o jacto de saída é mais forte.




Relacionado com este fenómeno, e porque isso nos interessa para efeitos de pesca, poderíamos ainda referir outros dados:
Quanto mais alta a temperatura do ar menor é a pressão atmosférica. E obviamente o contrário também vale: quanto maior a pressão atmosférica mais baixa a temperatura do ar.
Nunca esqueçam isto: a temperaturas mais elevadas corresponde uma menor pressão atmosférica.
Isto acontece porque, sob baixas temperaturas, o ar fica mais compactado, mais pesado, as moléculas de ar aproximam-se mais umas das outras. E um peso superior faz ainda mais pressão sobre o ar que já se encontra por baixo.
Chama-se a isso pressão atmosférica mais alta, ou, aquilo que todos vós costumam ouvir nos boletins meteorológicos, “altas pressões”.
Os nossos robalos são afectados por elas.




Mas o valor da pressão atmosférica não é constante, e por isso mesmo, quando nos deslocamos a algum lugar mais alto, a pressão é diferente. À medida que subimos notamos que existe algo de estranho, de diferente.
Convencionámos definir como 1 atmosfera a força de pressão à altura da superfície do mar. A partir desse padrão, se subimos a uma montanha, a pressão baixa. Os nossos ouvidos” estalam”, compensam a diferença de pressão interna.
Mas se baixamos desse nível zero da superfície do mar para baixo, se mergulharmos em profundidade, a pressão sobe.
À medida que descemos vamos ter uma pressão de duas, três, quatro, cinco atmosferas, etc, de acordo com a profundidade a que descemos.
A cada 10 metros aumenta um nível de pressão, ou seja, a 10 metros de fundo temos a pressão de duas atmosferas. A 30 metros teremos 4 atmosferas e por aí fora. Quem mergulha com garrafas sabe que esse é um factor que deve ter sempre sob controlo.
Isso quer dizer que a água acusa o peso que tem sobre si, e que aumenta a pressão a cada metro que se desce.
Para efeitos de cálculo, temos que à superfície o valor de 1 atmosfera é de 1 bar de pressão. E um bar é igual a 1 kg por cm2.
De uma ou outra forma, já todos nós tivemos a oportunidade de sentir o que é pressão hidrostática. Ao mergulharmos, a pressão na nossa cabeça, nos seios perinasais e em todas as cavidades com ar, aumenta.
A ponto de sentirmos uma dor profunda, caso não consigamos compensar esse aumento de pressão.
E os nossos peixes? Eles também sofrem os efeitos dessa pressão?
Claro que sim! Se em terra falamos de pressão atmosférica, no mar falamos de pressão hidrostática, mas são fenómenos paralelos. O princípio técnico é o mesmo.
No próximo número vamos aplicar estes princípios e descobrir porque rebentam os olhos aos nossos peixes quando os puxamos depressa demais...
Vamos falar sobre pressão hiperbárica e de como ficam os nossos peixes quando recolhemos linha no carreto muito depressa.



Vítor Ganchinho



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