Comecei a caçá-los há muitos anos, mais de 30, em fundos de 14 a 16 metros, entre a areia e a rocha. Na verdade nem são particularmente difíceis, por alguma curiosidade que apresentam. Fazemos a descida, eles afastam-se, desaparecem da nossa vista, mas passados 40 a 60 segundos já começam a aparecer, a chegar aos poucos. Vêm e vão, e se tivermos boa capacidade física, acabam por entrar no nosso raio de acção. Quando estão no meio de outros peixes são muito mais confiantes, entram mais depressa.
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Estes dois pargos de riscas, cacei-os no Senegal, numa pedra a 21 metros de fundo. |
Em homenagem ao meu grande amigo Chiquinho, e porque se tratava de uma pedra sem nome, ficou o “ Caillou de Chico”, em tradução livre, “Calhau do Chico”.
Não deixa de ser curioso que os locais, por nossa influência, continuam a chamar-lhe isso ainda hoje.
Estava forrada de pargos destes, e de meros. Vamos voltar a ela, e a relatos do que lá fizemos, daqui a dias.
Tenho alguns casos na zona de Setúbal, que não resisto a contar-vos:
Caçada 1- Estava a fazer uns sargos numa fresta comprida, a 14 metros de fundo. O dia prometia, porque já tinha conseguido uma caixa cheia, em apenas 12 ou 13 sargos. Havia peixes grandes, a rondar os 2 kgs, e a fresta estava bem preenchida. Como de costume, fazia a abordagem do lado de fora, para o largo, a saída natural dos sargos, para os obrigar a vir para o lado de terra, onde se aguentavam mais tempo dentro do buraco. A dada altura, começaram a espirrar sargos por todo o lado, e a fresta ficou vazia, desapareceram todos. Quando cheguei ao fim da fenda ( falamos de algo que tem cerca de 10 metros de longo, por um metro de largura, embutido na rocha), percebi a razão do comportamento anormal dos sargos. Aquilo que acontecia normalmente era que iam encostando ao fim da fresta, deixando o máximo possível de espaço para mim, mas tentando sempre meter-se nas zonas mais escuras. Naquele dia saíram todos, e a razão era que havia um safio enorme à ponta, no escuro. Para não ficar sem sargos durante meses naquele sitio, resolvi arpoar o safio. Em princípio, daí a dias estaria tudo cheio de sargos novamente. E assim fiz, mas correu mal, o bicho conseguiu entalar-se de forma a que não o consegui retirar à primeira. Subi, e deixei a arma pendurada, na vertical. A profundidade não era muita e por isso conseguia ver o cabo da arma, branco, a partir da superfície. Preparei a descida e ao chegar a meia água, reparei que havia algo ao lado da arma. Desci mais um pouco e dei com um enorme pargo riscado, dos seus 8 kgs, parado, a ver o que se passava abaixo, onde o safio se revolvia dentro do buraco, fazendo saltar o poalho do fundo. Eu estava sem arma, porque o arpão estava cravado na cabeça do safio. O pargo viu-me chegar e saiu, devagarinho, para me fazer sofrer ainda mais…
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Neste dia, terei feito dois, a julgar pelas duas caudas. A memória não chega para tudo. A verdade é que aparecem, embora não seja um pargo que entre todos os dias na nossa caixa. |
Caçada 2- Estava com o meu colega de mergulho Luis Lemos, a procurar os sargos no fundo, atento a algum robalo a meia água, num espectacular dia de sol, com água limpa. Eu andava muito mal do pescoço, com contracturas que mal me deixavam rodar a cabeça. Ainda assim, o vicio do mergulho é muito pior que o tabaco, e mesmo naquelas miseráveis condições, equipei-me. A dada altura, havia muitos sargos no fundo. Desci, e aterrei numa pedra a 13 metros minha conhecida, de muitas aventuras anteriores, e deixei-me ficar parado, a observar. Tinha à minha esquerda um cardume de sargos pequenos, a não merecerem o tiro, encostados à pedra. À minha frente, um cardume de salmonetes de bom tamanho continuou a sua faina de desenterrar minhocas da areia sem se incomodar comigo. Porque não aparecia mais nada, comecei a pensar que um salmonete grelhado seria sempre melhor que um pontapé nas costas. Apontei um deles. Os salmonetes são muito frágeis, e por isso há que ter muito cuidado com o tiro, que deve ser feito à cabeça, para não estragar o grelhado. De repente, de um estado de acalmia, passaram a estar nervosos e num instante desapareceram. Percebi que não era por minha causa, não fazia sentido. Olhei em volta e não vi nada de estranho. O pescoço limitava-me a capacidade perceber se havia algo mais. As tintureiras não são frequentes naquela zona, tão baixo. Resolvi subir, e como de costume, procurei rodar o tronco de forma a entender a posição das pedras, e ver onde iria descer a seguir. Foi então que o vi: um pargo riscado dos seus 7 kgs estava colado a mim, nas minhas costas, a não mais de um metro. Afastou-se, sem me dar a menor possibilidade.
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Pequeno exemplar, juvenil, que um dia, se tiver sorte, chegará aos 12 kgs. |
Há momentos em que as pedras ficam pejadas deste tipo de pargo. Espalham-se por pedras ilhadas, cercadas de areia, e cada uma tem o seu. A razão de não serem muito sociáveis quando maiores é um mistério, já que não existe falta de comida, não têm de a disputar.
Recordo-me de dias em que os encontrei da seguinte forma: mergulhava sobre a pedra, ficava estático a olhar para fora desta. E eles apareciam, vindos da areia, 2 metros acima do fundo, sempre sozinhos.
Invariavelmente a fazer o movimento clássico: entrada a direito, com velocidade constante e a dada altura, quando conseguiam ver bem o que estava à sua frente, paravam. A seguir, rodavam de lado, preparando a saída, caso necessária. Era esse o momento do tiro, e a maior parte deles ficava.
De quando em quando, um destes pargos aparece, para alegrar o dia. Esta terá sido mais uma das minhas saídas em que o objectivo era um petisco para fazer em casa, para alguns amigos. Duas santolas para cozer, um linguado para a filha, uns pampos para filetes, safios e polvos para a mãe, e …um pargo, para o forno. Nunca foi um peixe estranho às minhas caçadas, porque eu fazia, quando tinha uma boa condição física, muitas esperas. De quando em quando havia um que aparecia.
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Pargo riscado de 7 kgs. São pescados em Marrocos e Mauritânia até aos doze kgs. |
Caso tenham fotos de pescarias peixes destes e queiram enviar-nos, façam o favor.
O blog é de todos e só faz sentido se for partilhado.
Vítor Ganchinho
Com as ganas que estou só me apetece fumar 20-20-20 ou seja 3 pargos que somem 20 Kg.
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