PORQUE MIGRAM OS PEIXES DE LOCAL AO LONGO DO ANO? - CAPÍTULO III

Peixes que estão habilitados a caçar de noite, com boa acuidade visual em zonas de penumbra, a conseguir caçar mesmo durante a noite mais escura, preferem não se expor demasiado à luz do dia, sobretudo quando o sol está a pino.
Todos sabemos que o calor, o sol directo e por vezes os dias sem vento e águas paradas abrandam a actividade dos robalos. A meio do Verão e parte do Outono, sentimos muito maiores dificuldades em conseguir picadas a meio do dia que nas primeiras e últimas horas.
Vimos antes que as águas demasiado quentes podem refrear as “boas intenções” dos nossos peixes. Limitam-nos por rarefação de oxigénio.

Assim, as pescas do início da manhã e do final da noite resultam melhor, especialmente se coincidirem com os tempos certos de maré. Isto vale ainda mais para zonas em que a profundidade é menor, e é necessário esperar pela famosa “conta de água”.

Pescar ao raiar do dia em zona de robalos é uma maravilha. Podemos inclusive apontar para estar no local ainda de noite. Sabemos que os robalos estarão ativos por lá e o calor das noites de verão convida a este tipo de “sacrifícios”.
Nunca me perdoarei de não vos chamar a atenção para os perigos dos pesqueiros de rocha, escarpados, onde colocar um pé em falso pode ser o fim de uma vida. Todo o cuidado é pouco, e por isso devemos privilegiar zonas de areia, em praia, próximas de afloramentos rochosos.
Temos tempo com o dia já claro, para pescar “empoleirados” nas arribas, em zonas onde ver bem é essencial.
Nas praias, a partir do mês de Setembro, já aparecem peixes disponíveis. Os turistas, a partir de Agosto já praticamente abandonaram as costas, as noites ficam ligeiramente mais frias e por isso mesmo as condições tornam-se ideais para a pesca.
Estes frios nocturnos são o primeiro sinal que é dado aos robalos para que iniciem o seu processo de engorda. As primeiras ondas de frio geralmente desencadeiam todo um processo de aumento de atividade.
Este é o momento em que eu consigo os meus melhores peixes, aqueles robalos de cortar a respiração. Estão ainda em mar aberto, em cotas baixas, alimentando-se de cavalas, carapaus, sardinha e caranguejos.
Esta é a época perfeita para pescar peixes grandes. Comem de tudo! Pequenos chocos, lulas, e tudo o que sejam peixes miúdos, tudo é alimento para os nossos queridos robalos. Adoro pescá-los em Setembro, Outubro!


Robalo de 3 kgs que caiu num jig de 30 gramas.


Nesta fase, a pesca com vinis é tremendamente eficaz. Melhor que jigs! A razão prende-se com o facto de os peixes estarem num patamar acima. Os jigs trabalham bem melhor junto ao fundo, a peixes emboscados. Quando os pesqueiros são mais baixos, o vinil dá-nos vantagens.
Podemos subir ligeiramente o tamanho, um comprimento de 12 a 15 cm não é excessivo nesta época do ano.
Preparar a pesca com antecedência, sabendo o que vamos fazer, evita-nos dissabores. Na nossa mochila de pesca devemos ter um pouco de tudo, de amostras de superfície a jigs.
De manhã bem cedo, eu utilizo nesta fase as amostras sem pala, stickbaits, cujo trabalho na primeira capa de água é excelente. Ficam loucos a perseguir aquele estranho peixe que larga salpicos e bolhas, que muda de direcção, que pára, arranca de novo e tenta fugir-lhes.
Não raro, vejo um robalo abocar a amostra e mais uns quantos a querer morder a parte que sobra fora da mandíbula!

Como escolher estas zonas? Se é verdade que não podemos em rigor excluir qualquer tipo de habitat, porque o robalo visita tudo, literalmente tudo aquilo que pode ser visitado, mesmo os locais mais inesperados, ainda assim é mais natural que sejam encontrados em zonas “querençudas”, onde sabemos que inevitavelmente estarão. As possibilidades são muitas, e aqui estão algumas pistas que permitem que tenhamos mais sucesso.

Vimos que em determinadas condições de mar, os peixes não podem lá estar! Certamente leram os artigos dos últimos dois dias, antes de chegarem a este.
Não há locais sagrados que abriguem sempre peixes, durante todo o ano, independentemente das condições de mar. Isso não existe. Poderão dizer: “mas Vitor, a Pedra da Galé na Carrapateira tem de ter sempre robalos”...
Nem sempre. Aqueles que espalham linhas e boias à volta da pedra, e aqueles que mergulham e caçam lá, sabem que não há sempre robalos. Podemos sim dizer que quando não há ali, com aquelas condições, é difícil que existam em muitos outros lados. Estarão porventura ao largo, a perseguir cardumes de comedia, ou muito mais fundos, para escapar a condições difíceis. Mas há locais onde o mais natural é que estejam.
Peões isolados, com espuma, com muito marisco incrustado, com distância à costa, se possível algum sossego, …não têm muito por onde falhar. Zonas de saídas de água doce, muito menos.


Nesta altura do ano comem quase tudo aquilo que encontram. Um cavaquinho também...


Todos nós temos os nossos locais sagrados, onde vamos com alguma confiança, sabendo que dificilmente não estarão lá. Eu utilizei um desses sítios quando fui confrontado com a necessidade de ter mesmo de conseguir um robalo em directo para a RTP, num programa de pesca em que participei.
Quando dei ordem para começar a filmar, eu sabia que os robalos estavam debaixo do barco e que iria conseguir uma picada. E aconteceu. O filme pode ser visualizado no Youtube da GO Fishing.
Para se ter essa certeza, temos de ter em consideração factores como: temperatura das águas e possibilidades de os peixes estarem, ou não, nos locais em que queremos pescar. A pressão de pesca que esses peixes terão sofrido nos últimos dias. O estado do mar, a hora da maré, e a consequente corrente, que é um dos factores que mais influencia a decisão dos robalos começarem a caçar. A hora do dia, que na circunstância, de Verão, era importante que fosse mais para o cedo. A direcção e força do vento, factor que nos permite desligar o motor uma meia centena de metros antes de chegar à pedra. O ruído não nos ajuda em nada a conseguir resultados. O coeficiente de maré, que provoca desníveis e consequentes correntes, sempre aproveitadas pelos predadores.

Tudo nos informa, tudo pode ser um sinal de que o peixe está por aqui, ou não. Os golfinhos mostram-nos onde está o seu alimento. Que por sinal é também o de muitos outros peixes. A identificação de bolas de forragem pode fazer-se a partir do barco, se tivermos bons olhos e soubermos ver.
Devemos saber ler o que se passa quando pequenos peixes denotam nervosismo, quando saltam à superfície, quando espirram cada um para seu lado.
A nossa sonda pode dar-nos pistas preciosas. A deslocação de cardumes de comedia junto ao fundo, as sombras que surgem a poucos metros, ao lado, por baixo, ...o voo das aves, tudo conta. As gaivotas, os gansos patolas, todos procuram aproveitar as fragilidades que um cardume de peixe miúdo revela quando apoquentado por um predador. Ou muitos predadores...

Há mesmo zonas que estão impregnadas de robalos, normalmente em cardumes com algumas dezenas de indivíduos, a que somam outros cardumes e outros. Nestes casos, o mais certo é que se concentrem diversos barcos no local. Atenção: não devemos fazer aos outros aquilo que não gostaríamos que nos fosse feito. Respeitar os espaços de cada um é um imperativo.
Eu não pesco onde estão outros barcos. Nem gosto que me encostem barcos ao meu... nesses casos, acabo inevitavelmente por sair. Sou eu que tomo a iniciativa de sair, e tenho sempre outros locais onde posso reproduzir a pesca que estava a fazer ali. O peixe estará certamente espalhado pela zona.
Assisto por vezes a situações realmente confrangedoras, de pessoas que se aproximam, que pedem lume para o cigarro, a mim que não fumo, que vêm perguntar se a corveta da Marinha passou por ali, que horas são, etc. Invariavelmente vejo-os a marcar no GPS o local e a espreitar a sonda pelo canto do olho.
Mais triste que isto, só chorando aos gritos em pranto. Há regras de cortesia que não devem ser ultrapassadas. Manter 100 metros de distância dos outros barcos é o mínimo que podemos fazer nestes casos.
Para mim, não serve de forma nenhuma, eu não pesco junto a outros barcos e ponto final. Gosto de controlar aquilo que se passa, de ter tempo para observar, espreitar se há caranguejo pilado, se há cardumes na sonda, e isso implica tempo e descanso.
Quando estou a sós, posso passar algum tempo a observar se há pistas de “passareiras” ao largo, se as aves estão mais agitadas, se os cardumes de peixe miúdo estão apertados por alguma coisa abaixo deles. Estas coisas fazem-se quando não temos barcos a cruzar as nossas águas.

Os bons resultados conseguem-se quando somos capazes de entender onde estão os peixes, o que estão a fazer, o que há para eles comerem, e aí sim, adaptamos as nossas amostras ao que existe, e pescamos. E as caixas ficam compostas.
O processo é de tal forma simples que por vezes bastam duas horas de boa pesca para conseguir resultados de bom nível.
Se as sardinhas estão a ser empurradas à superfície, uma amostra de 10 cm em tons azul prata, por exemplo uma Shimano Silent Assassin, pode ser tudo o que é necessário para encher a caixa.


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Se o peixe está a morder franco e temos algum vento, a amostra de pala com 9,9 cm pode funcionar bem. Se estão mais difíceis, a versão mais pequena, em 7 cm, sem pala, resulta melhor. Dá-nos mais picadas.
E a seguir, vamos tentar reproduzir aquilo que funcionou bem numa zona, vamos dar uma volta por pedras próximas, porque poderão também elas estar carregadas de peixe.
Há que tentar, há que trabalhar para obter bons resultados. E quando não resulta, voltamos a casa e meditamos sobre a razão pela qual não fomos bem sucedidos.
Quem se interroga com frequência acaba por encontrar respostas, é uma questão de tempo. As outras pessoas, as que encolhem os ombros e continuam a acreditar em sorte e azar, não precisam de se maçar com isso.
Cada saída é uma lição, um momento de possível aprendizagem. Ao fim de muitas saídas, começamos a ter um padrão, uma figura daquilo que pode acontecer quando as condições são aquelas. Sabemos o que podemos esperar.

Tente.
Tente tudo aquilo que vier à cabeça que ache que eventualmente poderia resultar.
Thomas Edison, o inventor da lâmpada eléctrica, da máquina de filmar, e de muitas outras coisas que fazem parte da nossa vida hoje, disse um dia: “Eu não falhei. O que eu encontrei foram milhares de formas de fazer que não resultaram”...



Vítor Ganchinho



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