TIRAR CARTA DE PESCADOR - 4

No último número de "Tirar carta de pescador" falámos um pouco sobre a questão das amostras, e da sua perfeição técnica.
Ficou algo por dizer.
Devemos ter em atenção as nossas tentativas de as “melhorar”... porque na maior parte das vezes estamos a desvalorizar o trabalho prévio feito por especialistas na matéria.
Quanto mais leves maior a dificuldade em aceitarem as nossas alterações, sem que isso mude por completo a sua performance. Por vezes, o aumento de um número no tamanho do triplo é suficiente para que a amostra deixe de trabalhar como seria expectável. Os equilíbrios são muito ténues, uma diferença de um grama pode fazer com que a nossa peça deixe de funcionar.
Na maior parte dos casos, estragamos amostras quando lhes mudamos uma ou as duas fateixas triplas. Ao colocarmos algo maior, por exemplo, estamos a adicionar peso extra.
E pode dar-se o caso de essas amostras não terem esse grau de tolerância. Podemos alterar a nosso gosto, mas tendo em atenção esse detalhe: o peso de armamento deve ser o mesmo, ou muito próximo disso.
Eu faço-o correntemente, mas tenho o cuidado de levar sempre muitas outras, de forma a que, em caso de incompatibilidade de acessórios, não fique privado de pescar nesse dia.




Nas versões mais leves, digamos de 6 a 10 gramas, devemos ter em atenção que lançar longe implica termos os meios para o fazer.
Não se trata apenas de uma cana adequada para aquilo que é o spinning tradicional, entre os 2,70 a 3,10 mts de comprimento. Com uma cana longa, mas preparada para amostras mais pesadas, as possibilidades que temos de conseguir trabalhar amostras leves, são diminutas.
O peso extra ligeiro destas amostras implica uma cana de construção pensada para o efeito, são normalmente canas um pouco mais finas, mais ligeiras, de baixa acção, 2-12, 5 -15, por aí.
Também a linha deve ser fina, para permitir que o peso mosca da amostra possa ainda assim ser o suficiente para a catapultar bem longe. Linha gorda e amostra leve é um casamento com divórcio à vista.
Por isso mesmo, a linha multifilamento adequada não deve exceder o PE 1 e já estamos a operar na zona alta, já lhe podemos chamar linha “ grossa”.
Podem pescar-se robalos com muito menos. Para robalos de tamanho standard, o PE1 é mais que suficiente, trata-se de um peixe sem muita força, cuja defesa se resume a meia dúzia de arranques desordenados.
Deixamos o PE 1,5 para os casos em que assumidamente vamos para a pesca de grandes exemplares, em mares batidos, revoltos, ou zonas com algas, encalhes, etc. Aí sim, uma linha mais resistente faz falta, porque os robalos mais velhos correm muito nos primeiros dois ou três arranques.
O princípio é este: linha mais fina, maior distância de lançamento, mais possibilidades de conseguirmos chegar onde queremos.
E sobretudo, a possibilidade de trabalharmos com amostras mais leves, mais pequenas, muito mais eficazes para peixe desconfiado. Quantas vezes as razões dessa desconfiança são os nossos próprios erros.
Assim sendo, lançar longe é minimizar as asneiras que fazemos a pescar de terra, e consequentemente aumentar as probabilidades de sermos capazes de convencer o peixe a morder. O resto nós fazemos...


Modelo Shimano em stock na loja. Amostra para lançar longe em zonas de águas um pouco mais profundas, 5 a 10 metros, limpas ou perto disso, com peixe a subir a partir das pedras.


A lançar uma amostra de superfície em zonas baixas, de preferência sem pala frontal, vamos ter surpresas em zonas baixas, recantos onde um qualquer obstáculo pode servir de esconderijo para o nosso peixe.
Procurem zonas com turbulência de água, uma pedra a assomar à superfície, algo que possa de alguma forma dar alguma vantagem momentânea a um predador face à sua presa.
Isso e a presença no local certo à hora certa, fazem milagres. Quem sabe onde, quando e como são os nossos pescadores mais veteranos. Os anos deram-lhes a sabedoria necessária para obterem resultados.
Muitos dos nossos pescadores mais velhos sabem de pesca e das suas manhas, dos seus truque, aquilo que os nossos jovens sabem de telemóveis. Gente nova sabe de tecnologia, mas gente velha sabe da vida. E da pesca.
Os nossos velhotes são livros carregados de saber. Eles sabem que as correntes não são iguais todos os dias e a todas as horas. E por isso sabem quando e aonde ir pescar o seu peixinho do almoço.
O mar muda, as marés avançam uma hora por dia, e por isso a pesca, e as horas da pesca também têm de mudar.
O valor da experiência é algo de inestimável, e, sobretudo num meio tão abrangente de variantes quanto o mar, o tempo ajuda. Os anos dão-nos conhecimento.
Quem sabe de pesca é quem passou milhares de horas a pescá-lo, a olhar para ele.


A Shimano Silent Assassin, um clássico na pesca ao robalo. Estas amostras são responsáveis por toneladas de capturas em todo o mundo.


Os nossos pescadores mais velhos sabem que o peixe não fica em permanência nas correntes mais fortes. Eles não ganham muito em ficar de “peito aberto” a nadar contra uma força que os pode ajudar, mas não dessa maneira. Escolhem zonas de turbulência sim, mas ainda assim sítios onde não necessitam de gastar energia de forma inútil. Porque a intenção nunca é “trabalhar no ginásio”, eles não precisam de emagrecer, de manter a linha. Querem, pelo contrário, ficar gordos, pesados e maiores, porque é isso que os pode guindar a um patamar de maiores possibilidades de obtenção de alimento. O tamanho do predador está directamente ligado ao potencial de capturas que pode fazer. Se acham que isso não é importante, pensem nisto: um robalo pequeno tem de encontrar comida que possa ser mordida. Por maior que seja o exagero daquilo que pode interessar-lhe, está limitado pelo volume que passa pela sua goela. Uma cavala pode ser interessante, mas se esta tiver o seu tamanho, está fora de questão.
Um robalo grande pode engolir essa cavala e mais algumas que estejam ao lado... pode avançar por uma tainha de 1 kg, ou um polvo de 0.5 kg, sem qualquer dificuldade.
Tamanho é poder!
Por vezes ficamos espantados com o tamanho das presas que são engolidas vivas por robalos que nem sequer são grandes. O nosso colega Luis Vanolli mostrou-me há dias um caso de um robalo que tinha engolido …uma baila! Um outro, também deste colega de pesca, tinha dentro do estômago algo como …dois peixes agulha! Infelizmente as fotos não ficaram com a resolução mínima devida, e vamos ter de esperar por outra oportunidade, mas fica o registo, e passo uma das fotos, ainda assim:


Aquilo que seria uma verdadeira impossibilidade, é afinal algo que pode acontecer. Este robalo engoliu dois agulhas quase do seu tamanho...


Depois do feriado continuamos a nossa saga do peixe do momento: o robalo.



Vítor Ganchinho



13 Comentários

  1. Luís vanolli08 dezembro, 2022

    Mais um excelente relato!
    Só para "corrigir" o peixe foi apanhado pelo meu parceiro de pesca, o slava, um grande pescador !

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    1. Olá Luis!

      Robalos que engolem agulhas inteiros são bichos maus que podem fazer de tudo.
      Pelo sim pelo não, convém levar um chicote igualzinho ao que os domadores de feras utilizam para os leões.
      Agora a sério: não deixa de ser espantoso que um robalo consiga fazer isto!

      Continue a mandar esta informação, ela é útil para todos os que pescam.

      Abraço
      Vitor

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  2. Boa tarde Vitor

    Hoje aprendi imenso. Até fora de água se aprende muito.
    Muito obrigado
    Abraço

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    1. Pessoas com entusiasmo acabam sempre, mais dia menos dia, por conseguir fazer grandes coisas. Porque essa é a base de tudo!
      Se alguém não sente formigueiros na barriga quando leva uma pancada forte de um robalo na espuma, ou de um pargo matulão quando ataca um jig, não precisa sequer de perder tempo a comprara equipamentos de pesca. Ou se gosta ou não se gosta!
      O António Lopes tem tudo para vir a ser um bom pescador. Porque vibra com o mar e os peixes.

      Abraço
      Vitor

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    2. António Lopes09 dezembro, 2022

      Boa tarde Vítor

      Agradeço as suas palavras mas basta-me apenas ser um pescador, com muito gosto pela descoberta da pesca e pela aprendizagem, com tudo o que isto envolve. E claro, se possível trazer peixe para casa hehehe, o peixe tem outro sabor!!!

      Eu na vida considero-me um aprendiz, todos os dias aprendo, também pela minha profissão tenho que me manter atualizado e estudo constantemente, tenho imenso gosto por isso. Agora com esta idade descobri o mar, a pesca e como isso me dá prazer, poder relaxar da vida, a qual vivemos a mil e em que profissionalmente não podemos falhar em nada.

      Foi um privilégio descobrir este blogue acidentalmente e o Vítor com os seus saberes e as suas partilhas, o seu gosto pelo mar e por tudo o que o rodeia. Conheço pouca gente que vibre com isso ( e com o que faz, grande parte das pessoas faz apenas por fazer), que os olhos brilhem a falar e a partilhar algo, tamanha é a satisfação.

      Tenho lido imenso aqui no blogue e absorvo tudo como nunca pensei. Ao ler revejo-me em algumas coisas nos exemplos que dá, alguns com muito humor. Não sei quando vou conseguir ler todos os artigos, mas ando a Ler.

      Existe alguma forma de começar a ler os artigos desde o primeiro? Tenho lido ao pesquisar por temas e a carregar na seta para os anteriores da publicação/pagina atual.

      Muito obrigado
      Abraço
      António

      Eliminar
    3. Boa tarde António Lopes

      É dever de quem pesca há mais anos passar conhecimento a quem se iniciou à pouco tempo.
      Quando ensinamos estamos também a aprender. É da troca de opiniões que se faz luz, e nestas coisas da pesca tudo está em constante evolução. Os peixes cada vez mais difíceis, os equipamentos cada vez melhores, e no meio de tudo isso, nós, que temos dias bons e dias maus.
      Não vale a pena pensar que ninguém tem dias maus, porque não é verdade. O que acontece é que alguns têm dias mais maus que outros. A forma de olhar para o mar não é igual para todos, e por isso, por vezes, acontece que há pessoas que conseguem ultrapassar as dificuldades colocadas pelos peixes nesse dia. Mas um mau dia acontece a toda a gente.

      Vamos lutar aqui no blog para que a quantidade de dias maus seja reduzida a uma insignificância, para que todos se possam divertir a fazer aquilo que gostam.

      Sobre a leitura de nºs atrasados, talvez o editor do blog, o Hugo Pimenta possa ajudar. Ele vai ver se há forma de ir por temas.
      Mas se clicar na seta vermelha irá retornado para trás, semana a semana.

      Abraço
      Vitor

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  3. Boa tarde Vitor

    Muito obrigado

    Abraço

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    Respostas
    1. Há imensos artigos sobre cada tema. Na verdade, quando se escreve sobre pesca, é quase impossível que não se escreva várias vezes sobre robalos, ou sobre pargos, ou sobre canas, ...carretos, etc. Porque isso é a base de tudo o resto.
      è ir retrocedendo e de certeza vai encontrar um ou outro detalhe mais....



      Abraço
      Vitor

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  4. Boa tarde Vitor

    Muito obrigado, não tem problema. Procuro e tenho lido muito, era por curiosidade saber se conseguíamos ler desde a primeira publicação.

    Abraço

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    1. Bom Dia Caro António, Obrigado pelo seu feedback. Estão disponíveis três formas de encontrar as publicações anteriores: 1 - Utilizar a caixa de pesquisa por tema ("Pesquisar neste blogue"), que se encontra no canto superior direito do ecrã; 2- Clicar na opção "PUBLICAÇÕES ANTERIORES (CLIQUE AQUI🔻)", disponível no rodapé do ecrã; 3 - Na barra laranja que se encontra do lado direito, antes do formulário de contacto, selecionar a opção "Arquivar", a qual permite consultar todas as publicações agrupadas por mês/ano . Se surgir alguma dificuldade, disponha. Cumprimentos, Hugo

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  5. António Lopes12 dezembro, 2022

    Boa noite Hugo

    Muito obrigado.
    A que procurava era "selecionar a opção "Arquivar", a qual permite consultar todas as publicações agrupadas por mês/ano" , para ler desde inicio. :)

    Cumprimentos

    António

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    Respostas
    1. Estive a espreitar a funcionalidade do sistema e de facto deu para ver que os artigos hoje são menos maus que os primeiros.

      António, ainda assim tem quilómetros de linhas para ler....

      Abraço
      Vitor

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    2. É a evolução 😁
      Vou ler todos os kms de linhas.

      Abraço

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