A RAZÃO DE SER DA ESCOLHA DAS CORES NOS JIGS - CAP II

A acção de pesca desenvolve-se num meio que não é o nosso, mas que achamos conhecer bem: o mar.
Temo-lo como “mar azul”, mas a verdade é que raramente ele é tão azul conforme gostamos de o imaginar. Os cambiantes de cor são inúmeros, quase todos mais para o verde, o castanho, e nem todos nos servem para pescar a 100%.
Se em condições normais teremos nas nossas águas costeiras um mar vagamente azul, quando há tempestades essas condições alteram e passamos a ter a mesma água mas …adicionada com algo mais.
Infelizmente não se trata de açúcar diluído, esse é transparente, mas sim lama, aluvião, (transportado pela chuva para os ribeiros e rios e daí até ao mar), um aporte de sedimentos minerais.
Junto à costa e a jusante dos rios, quando a água fica cor de barro torna-se francamente difícil pescar.
A queda de chuva e consequente escorrência de terras é pois um factor de turbidez, mas esse é um factor natural, ao qual não podemos obviar.
Pode até acontecer que as águas estejam carregadas de sedimentos e isso se deva a mão humana: a eventual necessidade de, por razões de segurança, proceder à abertura de barragens pode tapar as águas onde pescamos.
No fim de tudo, a verdade é que raramente temos águas “demasiado limpas”…


Já vimos aqui no blog que a tonalidade da cor da água depende de inúmeros factores, e também que são sempre os excessos de movimentação atmosférica, os mínimos e os máximos, aqueles que mais podem prejudicar os nossos esforços de apresentar uma amostra em boas condições.
Os sedimentos diluídos, os lodos, a areia, as algas, até as descargas industriais, perturbam a visibilidade e isso pode chegar a limites que impedem a pesca à vista, o jigging ou spinning conforme o entendemos.
Somos prejudicados pelas tempestades violentas, mas também as grandes calmarias podem, naqueles dias de sol intenso, quente, levar ao aumento da temperatura da água e com isso provocar a reprodução exponencial de algas.
Não nos ajuda pescar numa “sopa de caldo-verde”….mas se tivermos de o fazer, não são as cores naturais que nos salvam, mas sim aquelas que fazem um contraste acentuado e por isso se tornam visíveis.
Nesses dias, o jigging, por ser feito na vertical e necessitar por isso de profundidade, é mais difícil.
O spinning, porque feito mais próximo da superfície, logo na presença de luz solar, sofre menos os efeitos da falta de visibilidade.
Em qualquer dos casos, a redução da velocidade de recuperação das amostras/ jigs impõe-se. Devemos dar um pouco mais de tempo ao peixe para que consiga fixar o posicionamento do artificial.
Não esqueçam que em casos limite teremos menos de 1 metro de visibilidade horizontal o que quer dizer que o nosso predador estará a socorrer-se muito mais dos seus sentidos alternativos que propriamente da sua visão.
Falamos de olfacto, audição e linha lateral.

Opção 4- Utilizo frequentemente esta cor quando começo a pescar. Porque me levanto cedo chego ao local de pesca ao raiar do dia e a essa hora, a luz ainda não chegou ao fundo, o sol está a aparecer no horizonte e assim sendo, o brilho, o “glow” ou luminosidade ventral deste jig Little Jack dá um ponto de referência e visibilidade constante ao predador. 

Quando lançamos um jig, ele não percorre apenas uma distância que vai da superfície ao fundo. Não é apenas o cima e o baixo.
Um ser que vive suspenso no meio líquido, tem de ter em conta que pode ser atacado de qualquer quadrante.
Gostava que tivessem em consideração que um peixe juvenil, objecto de predação por outros maiores, (e por isso um alvo permanente e com necessidade de se conseguir esconder ou ser suficientemente rápido para escapar às investidas de outros mais crescidos), vive num mundo tridimensional, em que existe cima, baixo e lados.

O conceito é este: discreto mas eficaz porque reproduz fielmente o alimento do dia a dia.

O perigo pode chegar de baixo, mesmo que ele esteja muito próximo do fundo. Os peixes que se colam ou enterram no fundo como os rascassos, os peixes-aranha, e até os chocos, são uma ameaça permanente.
Mas também pode chegar uma espécie pelágica por cima, a descer num voo picado ao cardume de pequenos peixinhos, as lulas fazem-no bem.
Ou algo que se mantém imobilizado a meia água e resolve investir bruscamente, por exemplo um robalo ou um pargo, reagindo à proximidade dos mais incautos.
Na verdade, os momentos de descanso não serão muitos e quando acontecem são o resultado de um fim de maré em que a maior parte dos predadores já se alimentou, e por isso não necessita de continuar a comer.
Ser pequeno neste caso não ajuda nada e daí a sofreguidão pelo crescimento, a necessidade de ganhar tamanho e com isso escapar a um destino de morte prematura.

Reduzir o tamanho das amostras pode dar-nos resultados surpreendentes…

Devemos pois considerar que a camuflagem para ser perfeita teria de ser eficaz sob qualquer ângulo, a 360º, e na maior parte dos casos não o é.
A verdade é que os peixes predadores se alimentam todos os dias….nem que seja à conta dos mais naïfs, dos pequenos inocentes que ainda acreditam que não há maldade no mundo.
Se pensarem bem, um peixe visto de cima para baixo tem de ser escuro, pardo, confundir-se com o fundo, escuro por ausência de luz, mas se o predador estiver numa posição invertida, por baixo da presa, essa mesma cor ventral escura já não lhe serve, porque irá fazer um contraste imenso com a luz branca que chega de cima.
É por isso que em termos gerais, por defeito, os peixes são escuros por cima e brancos por baixo.
Vejam a foto destes carapaus pescados pelas minhas filhas com micro-jigs de 5 gramas:

É evidente a sombra do dorso, e também o ventre claro. Duas cores de camuflagem para dois posicionamentos diferentes de predadores.

Lateralmente, há uma tendência para um mimetismo diferente.
Quando consideramos peixes de cardume, a movimentação de cada um dos elementos é sincronizada de forma a que não se toquem e consigam manter as distâncias entre si.
É muito importante que a distância entre peixes seja a menor possível, e isso não tem apenas a ver com a maior facilidade de deslocação na água, (os ciclistas pedalam mais descansados quando vão atrás na roda de outros, certo?), mas também porque dessa forma a sua silhueta de peixe desaparece. Quando o predador investe contra o cardume, a salvação pode estar no facto de esse predador não ser capaz de tomar um alvo isoladamente.
Se o peixe em termos individuais não oferece dúvidas, é um alvo definido, já quando em grupo a sua silhueta esbate-se na silhueta de outros que estão quase colados a si.
Vou procurar explicar-vos recorrendo a um exemplo muito evidente:

O padrão do corpo de um animal esbate-se no corpo de outros e isso tem a ver com as cores e o recorte do perfil de cada elemento da manada.

Também os peixes o fazem, e com bons resultados, já que muitas vezes conseguem iludir as investidas daqueles que os querem comer.
Para que um predador consiga morder um peixe pequeno, tem de obter um contacto visual suficientemente definido, de forma a que possa calcular com precisão o momento certo de abrir a boca e morder.
Se não o consegue fazer, há grandes probabilidades de falhar o ataque….
Vejam abaixo:

Na presença de um perigo, estes peixes irão compactar-se, colar-se uns aos outros, e tornam muito difícil a tarefa de um predador.

Nestes casos que vimos acima, o efeito de brilho ajuda sobremaneira a criar a ausência de padrão corporal. Aquilo que o predador terá diante dos seus olhos é um muro espelhado.
Não havendo uma silhueta recortada, a armação do ataque torna-se um acto de baixa probabilidade de sucesso.
Certamente já viram e pescaram peixes estropiados, sem pele, mordidos nos flancos. Muitos desses casos serão o resultado de uma movimentação sincronizada de um cardume que por via disso conseguiu salvar alguns dos seus elementos. As cicatrizes ficam, mas a pele regenera e o peixe não morre.
Opção 5- esta cor é por mim utilizada sempre que tenho águas tão limpas que de nada serve dar mais referências ao predador. Isto basta e é muito eficaz. Em zonas com carapau miúdo, peixe-rei, …é isto.

Porque sabemos que em qualquer circunstância teremos sempre mais possibilidades se conseguirmos chegar ao predador com algo que ele identifica como sendo uma presa comum, devemos procurar dar-lhe a ver aquilo que temos de mais próximo da comedia que exista no local.
Em mar aberto, os cardumes de sardinha, cavalas e carapaus abundam.
Mais junto à costa, em fundos de areia, serão as galeotas, pequenos peixes longilíneos que são algo da predileção dos robalos. Se a nossa opção de apresentação for muito diferente daquilo que o peixe habitualmente tem para comer, é natural que os resultados sejam menos bons.
Não ter picadas é muitas vezes a ponta do icebergue, a parte visível de um trabalho que foi mal feito. Escolher amostras nada tem a ver com a cor que nós mais gostamos, é sim o resultado de uma observação criteriosa das condições da água. A prática continuada conduz-nos à escolha certa, mas para isso temos de saber o que fazer, ou estaremos permanentemente do lado errado do que funciona.
São eles que mordem, são eles que decidem o que querem morder, mas somos nós quem escolhe as amostras na caixa, logo a responsabilidade maior é nossa...


Vítor Ganchinho


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