TEXTOS DE PESCA - Fenómenos do Entroncamento, em Setúbal


Pesco normalmente a sair de Setúbal, ou Sesimbra. Embora longe do Entroncamento, esta zona é também dada a fenómenos. Apenas falo daqueles que tenho fotos comprovativas….e mesmo assim sabe Deus.

Recordo-vos, sabendo que vão achar que estou exagerando, alguns dos que tenho presenciado: 

1- Há uns anos, quando cheguei ao meu pesqueiro favorito, dei com uma baleia morta, com cerca de 7 metros. Havia tintureiras à volta, elas cortam-nos as linhas, e tive de ir embora. 

Detalhe das barbas. Sem dentes, utilizam estas para filtrar água, ficando a comida presa.

Reparar nas estrias, que permitem que o corpo seja mais elástico, e que se adapte à pressão das profundidades. São longitudinais, o que garante deslizamento mais fácil na água.




É sempre uma visão triste, encontrar uma baleia morta.




Acaba por ser uma tragédia total: depois de tudo, ainda são um perigo à navegação, e por isso devem ser reportadas à autoridade marítima. 


2- Passados uns meses, uns quilómetros mais abaixo, numa outra pedra que costumo visitar, a Pedra 21, outro fenómeno: contra todas as expectativas, numa jornada que, como todas as outras, se antevia de glória, esbarrei com uma orca morta.

Havia tintureiras à volta, elas cortam-nos as linhas, e tive de ir embora. 

Uma orca, um colosso dos mares que também tem prazo de validade.

As gaivotas, quando entendem que o animal já não oferece perigo, pousam em cima e tentam arrancar bocados. Esta tinha os olhos vazados dos bicos das ditas.

A pele , exposta ao sol, começa a escamar.

Não é comum, mas passam orcas na Baía de Sesimbra. Foto feita no barco GO Fishing III por clientes espanhóis.

Esta orca passou a meio metro do nosso barco, GO Fishing III, numa saída de pesca em Sesimbra.

3- Com a minha Lena e o meu amigo Chiquinho, há uns anos atrás, fomos lançar os anzóis à água na zona da Comporta, e tínhamos por lá um espectáculo pouco  habitual: a toda a altura da coluna de água, de baixo acima, uma massa de besugos (pachão) impedia por completo a pesca de qualquer outra coisa.

A sonda ficou preta. Os pontos eram tantos que não havia espaço para mais. Por qualquer conjuntura estranha, este fenómeno, que nunca mais se repetiu, deu à costa aquela arribada de besugo, que o trouxe à lota a 0.04 euros o quilo. Os pescadores profissionais deixaram de ir pescar na zona, porque o preço do peixe não pagava o combustível. Recordo-me de, sem fazermos nada por isso, virem todos os anzóis cheios. À medida que íamos subindo o numero de anzóis, subia o numero de peixes. Não é normal que se atirassem daquela forma aos iscos, ou aos anzóis com penas, ou missangas coloridas. O tempo de espera era nulo, era deixar baixar e subir de imediato, com 8 peixes na linha. 



Tem dias em que as águas ficam cheias de peixe que não se sabe de onde vem….


4- Na Pedra da Vereda, ao largo da Comporta, a 75 metros de fundo, a minha Lena no espaço de 3 horas, fez 32 douradas. Eu só cortava caranguejos, e desferrava peixes. O ritmo era de tal forma que ela, sem forças nos braços, o que fazia era: sentir a pesca chegar ao fundo, contar até três e puxar. E estava lá uma dourada. Ou duas. Deixou fugir uma data delas, por virem “pelos cabelos”, sem o anzol espetado, e por não ter já forças para as ferrar.  O dente redondo da dourada não permite falhas nem ligeirezas, ou se ferra ou se paga isso com uma subida de nada e …mais caranguejo para o fundo. Largar as douradas a meia água foi o que mais aconteceu nesse dia. Haveria uns milhares delas abaixo, e não davam mais de 3 segundos até deixarem os anzóis sem isca. Com ou sem toques na ponteira, era puxar…

Helena Neves já sem forças para puxar mais peixes.

Uma pescaria feita por uma pessoa, em 3 horas.

Uma enorme concentração de douradas.

5- Há uns 10 anos, uma arribada de caranguejo pilado cobriu literalmente o fundo, com pilados empilhados uns sobre os outros. Na coluna de água, a quantidade era tanta, bicheza de 30 em 30 cm, que impedia de ver para além dos caranguejos. Raramente é possível fazer ao mergulho corvinas e anchovas na zona de Setúbal, e nesse dia tive sorte. A água tinha uma cor estranha, quase um castanho cobreado, pressuponho da desova desenfreada de todas aquelas criaturas. Os caranguejos eram tantos que os profissionais deixaram de ir pescar, para não ter de desembaraçar as redes. Para além disso, este caranguejo ataca ferozmente os peixes emalhados, pelo que não adianta ter redes a pescar. Numa das zonas onde consegui mergulhar com menos bichos, andava um cardume de corvinas, com umas centenas delas, embora de fraco tamanho, uns 4 quilos. Todos os peixes capturados nesse dia estavam atestados de caranguejo até à boca. 

O caranguejo pilado é um pelágico, e um alimento muito apreciado por robalos, corvinas, douradas, ...

6- Recordo-me de um dia de mergulho na Praia das Bicas, ao lado do Meco. Fiz uma entrada à barbatana, com saída da praia. Um daqueles dias em que apenas vamos fazer água para manter a forma e pouco mais. Um barco tentava os chocos, e via-se que as pessoas estavam aborrecidas de não pescar nada. Deixaram descair a embarcação na corrente, de forma a que, passados minutos, estavam em cima de mim. Perguntei-lhes como estava a pesca e a resposta “ até estamos agoniados de não tirar um choco”…não animava muito. Porque sabia em que recantos havia bons chocos, disse-lhes: 

_Se quiserem fazer uns chocos bons, têm de sair daqui, e ir a uns 300 metros, há umas pedras baixas, a uns 7 metros que costumam estar cheias deles. 

Devem ter entendido que os estava a despachar, e ficaram por ali, a insistir. Depois de arpoar uns sargos, voltei a perguntar-lhes: “E então, ….nada”…?

A resposta foi elucidativa: “Agora piorou, porque já estamos os dois com pele de enjoo, já lançámos tudo o que tínhamos no estômago …isto não dá nada, vamos embora.”

Resolvi fazer a distância à barbatana e onde sabia que eles andavam, arpoar uns quantos chocos para grelhar em casa. Porque havia muitos, e grandes, rapidamente fiz um bom enfião. 

O barco dos enjoados veio novamente ter comigo, para ver como estavam as coisas. Estavam bem, ….tinha uns 12 chocos na bóia. “ Eu tinha-vos dito que era deste lado”….

Acabei por lhes oferecer uns quantos, e eles, que estavam a sair de retorno à Marina de Sesimbra, ficaram felizes da vida. Para mim, trouxe apenas três chocos para casa. O maior tinha 6 kgs…..

Três chocos, 1kg, 2,5 kgs, e o choco maior tinha 6 kgs.

7- Há vinte anos atrás, os pampos eram um peixe desconhecido no continente português. Chegavam e eram vistos e pescados no Verão, a partir de Julho, até Setembro. Quando as águas arrefeciam, debandavam com as correntes de águas quentes, e deixavam-nos passar o Inverno descansados. Embora o pampo seja o rei do filete, quando são muitos impedem a pesca de outros peixes. E a verdade é que hoje em dia já são demasiados! Passaram a ficar entre nós, mesmo de Inverno, e porque não têm por cá predadores ( a nível global, que se saiba, apenas os Marlins lhes tocam!), não há muito a fazer, é aguentar. Recordo uma bióloga maçarica, no Correio da Manhã, ter publicado algo como isto: Pampo- Balistes Carolinenses, peixe raro, astuto, inteligente, e desconfiado. Bom, eu predisponho-me já a levar a senhora a ver os pampos, aos milhares, a dar provas de pouco raros, pouco astutos, pouco desconfiados….e até pouco inteligentes. Por amor de Deus!

Os cardumes de pampos podem ser muito densos.


Quando estão de maré, ... é impossível pescar outra coisa. Há que ir embora.


Vítor Ganchinho




Artigo Anterior Próximo Artigo

PUB

PUB

نموذج الاتصال