O BLOG RESPONDE - Os robalos mordem, mas não ficam….

Resposta à questão colocada pelo Luís Teixeira:

"Vitor, já alguma vez lhe aconteceu estar a pescar com vinil, no caso os da Savage, mais precisamente os shads, e o peixe andar a ferrar o vinil e não ficar preso no anzol? Eu tenho uma sugestão para colmatar essa questão mas no fundo ainda não consegui na perfeição criar algo que seja prático e rápido. Tem alguma sugestão? No caso os vinis que uso são os Savage gear mini sandeel kit com cabeçote de 7 e 10gr. Obrigado"


Luís Teixeira, de Matosinhos, com um simpático robalo feito com um vinil da Savage. 


Luís, esta é uma questão extremamente interessante! Reflecte seguramente um problema que já todos sentimos ao longo do nosso percurso de pescadores e por isso interessa a muita gente. Por consequência um bom tema para o nosso blog, que procura acima de tudo ajudar a entender e a pensar a pesca. Aquilo que nos interessa não é saber quantos quilos de robalo se fazem aqui ou ali, deixamos isso para quem gosta de se medir aos quilos, é saber por que razão este robalo picou na nossa amostra. 

É inglório que estejamos a pescar, que tenhamos picadas, e que isso não resulte em capturas. Desde logo porque já conseguimos aquilo que é mais difícil: que o peixe pique. 
Quando temos contacto, isso significa que já ultrapassámos uma série de barreiras, que estivemos no sítio certo, na hora certa, com a amostra certa, velocidade de recuperação certa, e conseguimos aquilo que em gíria se chama “levantar o peixe”. 

A perfeição máxima em vinis: a marca Fish Arrow fabrica material a sério. Olhar para o seu catálogo é ver material… do outro mundo. 


Vamos tentar analisar esta questão à luz daquilo que depende de nós, daquilo que pode ser chamado de “trabalho de casa”. Pescar bem não é uma ciência oculta, pelo contrário, é algo de simples, de ancestral, e que resulta mais ou menos difícil consoante as dificuldades que lhe quisermos imprimir. 
Não é igual pescar com uma sardinha viva presa pelo lombo com um anzol, do que lançar uma amostra com a vaga forma de uma sardinha. Também não é igual lançar para o fundo um camarão vivo, ou um camarão de vinil. As dificuldades que sentimos e que queremos ultrapassar resultam muito do handicap com que queremos jogar o jogo. 
Para quem não pretende correr riscos e quer assegurar a captura, então força, que faça aquilo que é mais simples, que consiste em dar ao peixe aquilo que ele está a comer, com um anzol dentro. Mas isso é simples pesca extractiva, não dá ao pescador muitas razões de orgulho.
Já tentar pescar robalos com um vinil como o Luís Teixeira faz, é algo de muito diferente. Acredito que um pequeno robalo seu tenha um valor muito acima de uma centena de robalos capturados por um profissional com uma rede. São realidades distintas, não comparáveis!

Lopes Vieira com um robalo com pronuncia do norte, mais uma vítima da eficácia dos vinis da Savage. 


Sobre a questão das picadas de robalos que não ficam anzolados, poderíamos pôr em questão vários procedimentos. Vou apenas dar-lhe pistas, para que pense por si na melhor forma de contornar essa questão: 

As águas em que pesca têm boa visibilidade? Olhando a esta foto, não nos parece, e isso está longe de constituir um problema. Tenho amigos que pescam em autêntico “barro” e não deixam de ferrar muitos e bons robalos. De resto, se há peixes que “aguentam pancada” nesse sentido, o robalo e a corvina estão sempre à frente do pelotão. Vivem perfeitamente dentro dos rios. Mas poderemos nós pescar da mesma forma em águas turvas no rio e em águas limpas no mar? A velocidade de recuperação pode ser a mesma? 
Pescamos com amostras de cor neutra, ou utilizamos cores contrastantes? 
Pescamos em águas frias ou quentes? 
O peixe está activo, ou já deixámos passar a hora da maré que coincide com o período de alimentação? 
A nossa aposta é feita na vibração da amostra, por termos águas tapadas, ou estamos a recorrer ao sentido da visão, por termos águas limpas? Que sentido queremos preferencialmente estimular no nosso peixe?
Estaremos a dar tempo ao peixe para morder, ou ele chega atrasado pela grande velocidade de recuperação? A maior parte de nós, quando adquirimos um carreto, olhamos a factores que têm um interesse francamente relativo: se leva ou não muita linha, ( como se fôssemos capazes de efectuar lançamentos de 300 metros com uma amostra…), se recupera muito rápido, ( a velocidade de recuperação pode ter interesse quando se pesca na vertical, ao fundo, e é necessário vencer dezenas de vezes a distância de 60 a 90 metros, que nos separam do peixe, mas tem interesse nulo na maior parte das pescas de spinning). Logo, comprar um carreto HF, High Frequency, quando se pesca com regularidade em águas tapadas, ….é um contracenso. A velocidade que imprimimos à amostra tem muito a ver com aquilo que o nosso carreto nos obriga a fazer….na verdade, com um carreto rápido dificilmente pescaremos lento. O paradoxo está em que compramos esse carreto exigindo ao vendedor que ele seja rápido, quando deveríamos ter um carreto lento. 
Pode acontecer que a nossa amostra seja demasiado grande para o tamanho da boca do peixe? Temos robalos grandes no pesqueiro e vale a pena apostarmos nesses, ou aquilo que temos na zona são robalotes de tamanho júnior, até 1 kg, e vale a pena reduzir o tamanho? É certo e sabido que um robalo de 30 cm não hesita em lançar-se a uma amostra de 18cm….e eles têm a boca grande. O problema quase nunca é esse. 
Colocar um anzol assiste fixo ao cabeçote é uma medida que é muito utilizada em amostras mais longas. Para isso necessita de um fio de nylon muito fino, uma agulha e um anzol. A operação é feita da seguinte forma: 
Empata o anzol com um nylon 0.50mm e deixa uma ponta com cerca de 35/ 40 cm cm, para poder trabalhar à vontade. A seguir, introduz numa agulha de pesca um fio de nylon muito fino, 0.16 ou 0.18mm, e passa de um lado ao outro. Faz uma laçada no nylon 0.50 e outra no 0.18. Com as duas pontas unidas e  firmes, introduz a agulha no vinil, no sentido cauda / cabeça. Passa a agulha por completo, segura no nylon fino e puxa. A dado momento já lhe é possível puxar pelo nylon grosso. Ajusta o anzol a posição que lhe parece conveniente, e ata ao cabeçote. Há duzentos nós que servem para a função e desde que fique firme, todos são bons. Fica com um vinil que tem o anzol fixo à cabeça de chumbo, e outro que vai à cauda. Se quiser, eu faço um filme para exemplificar. 

Pormenor de dois anzóis colocados à boca de uma lula de vinil.


Detalhe de um anzol colocado num camarão de vinil.


Num cabeçote que tem o anzol nesta posição, é possível colocar um anzol extra mais próximo da cauda. Não na ponta já que vamos limitar a acção da amostra. Ela tem de vibrar!....

Questões: 
- pode optar por deixar o anzol virado para baixo, e com isso tem de ter em atenção o seguinte: se pescar em zonas rochosas muito baixas, ….está a passar a sua amostra com um anzol à vista que vai agarrar à primeira oportunidade. Se pescar em areia, ou calhau rolado, tudo bem. Em termos teóricos, o anzol deveria ficar nesta posição, virado para baixo, porque o ataque vai ser, sobretudo, feito de baixo para cima. Lembre-se daquilo que já vimos aqui no blog sobre a posição dos olhos no crâneo do predador. 
- pode optar por deixar o anzol virado para cima. Resolve a questão dos encalhes, mas passa a ter dois anzóis na mesma posição, seguidos e afastados por poucos centímetros. É seguramente menos eficaz. 

A melhor solução depende do local onde pesca, do tamanho do peixe que pesca, e muito provavelmente não irá acertar à primeira. Mas não é isso a pesca?
Se o Luís quer saber a minha opinião sobre a possibilidade de alguém acertar sempre na técnica certa, na amostra certa, na cor e peso certos, deixe-me dizer-lhe que as possibilidades são reduzidas. Mas todos nós, em conjunto, podemos reflectir e chegar a um melhor resultado. 
No fundo, é algo como isto: se pedir a uma pessoa da cidade que nunca pescou, para lhe dizer quanto pesa um peixe grande, …provavelmente irá falhar. E falha por alguns quilos de diferença, por falta de sensibilidade. Mas se o Luís alargar o âmbito da questão a duzentas pessoas, sendo muitas delas pescadores de linha habituados a pesar as suas capturas, já vai obter um resultado mais fidedigno com o peso desse peixe. Ganharam essa sensibilidade, pela experiência anterior. Se alargar o âmbito a mais duas mil pessoas, incluindo pescadores profissionais que capturam esse peixe e o vendem em lota, vai reduzir as possibilidades de falha. Se aumentar o leque de opiniões a todas as peixeiras do país que pesam e arranjam esse peixe todos os dias, e a todos aqueles que participam de uma forma ou de outra no processo da captura, da venda e comercialização, a muitos milhares de pessoas, aquilo que vai acontecer é que vai obter um resultado que vai ser cada vez mais certinho. A média de todas as opiniões vai dar-lhe o peso rigoroso do peixe à grama. Quanto mais opiniões, quanto mais experiências diferentes colocar em cima de uma questão, mais certa ela vai aparecer. Entende?
É da troca de experiências de todos nós que sai a sabedoria, o conhecimento. É da soma de todos os conhecimentos, todas as opiniões, da sua, da minha, do saber de todos aqueles que fabricam canas, carretos, linhas, amostras, anzóis, que resulta a melhor das decisões de pesca. 
E isso Luís, o resultado do conhecimento que tem acumulado ao longo da sua vida, quando chega a altura do peixe morder, faz toda a diferença. 

E vai mais um robalo, com a cauda vibratória…a fazer das suas. 


As variáveis na pesca são tantas que dificilmente alguém poderá um dia  dizer “Eu sei tudo sobre pesca”. Eu não acredito nisso, não acredito nessas pessoas nem um pouco. O que podemos ter é mais e mais informação, preparar-nos bem, falar muito com quem sabe, com quem pesca a sério, e fazer com que a componente teórica nos ajude a enfrentar os desafios que a prática, preto no branco, no local de pesca, nos levanta a cada instante. Há pessoas mais adaptadas, com mais intuição, mas não há, a meu ver, alguém que saiba tudo. Até porque em termos de técnicas, a diversidade possível mata logo à nascença qualquer veleidade de alguém um dia conseguir uma receita milagrosa que resulte sempre, em todo o lado, em todas as situações. Durante o ano, factores como o período reprodutivo, a temperatura das águas, a presença ou não de comida fácil, etc, tudo isso influência o comportamento dos nossos peixes. Mesmo apenas ao longo de um dia, as condições mudam continuamente: as marés sobem e baixam, mudando o sentido e a força das correntes, a limpidez das águas, o dia e a noite, a luz, o ciclo de alimentação do peixe, o posicionamento lunar, o vento, a ondulação, a presença ou não de embarcações de pesca profissional, de redes, tudo isso altera aquilo que seria um comportamento linear e constante do peixe, que está em luta permanente pela sobrevivência. Nunca é igual! O peixe não conhece outra forma de vida: lutar para comer e não ser comido. E isso obriga, ao peixe e a nós, a uma adaptação constante, a aprender e a sermos mais eficazes, mais aptos. É um pouco como os animais na savana africana: desde o raiar do dia até ao anoitecer a mais lenta das gazelas sabe que terá de ser sempre um pouco mais rápida do que o mais rápido dos leões. Ou morre. 


Um abraço, amigo!


Vítor Ganchinho




1 Comentários

  1. Caro Vítor.

    Antes de mais queremos agradecer a publicação no seu blog.
    De facto o Vítor é um poço de conhecimento, e fazer o que está a fazer, neste seu projeto é de louvar. Já não há pessoas assim, e as que há não o fazem de forma gratuita.

    É uma honra para nós (Team Lopes 😂) podermos fazer parte deste seu projeto, e ainda, por termos tido explicadas algumas das nossas dúvidas.

    Nunca pensamos que alguém que vive a mais de 300Km de distância de nós, nos desse "voz" neste assunto que é a pesca em LRF, tão complexo.

    Não temos palavras para descrever a nossa gratidão, e esperamos que possamos continuar a fazer parte deste seu projeto.

    Desejamos-lhe o melhor!

    Vemo-nos em breve!

    Um abraço,

    Team Lopes

    ResponderEliminar
Artigo Anterior Próximo Artigo

PUB

PUB

نموذج الاتصال