Quando alguém nos pergunta algo sobre peixes, temos uma tendência nata para mostrar aquilo que já fizemos de maior. O que impressiona são os peixes grandes, o tamanho, e quer queiramos quer não, o estatuto da pessoa sobe ou desce em função do peso do peixe. Peixe grande é aquilo que vende, a imagem que impressiona.
Já os pesquei grandes e também já tive muitos dias de pescar pequenos, por não haver grandes, ou eu não ser capaz de os pescar. A pesca não é uma ciência exacta, e quando pensamos controlar todas as variáveis, eis que surge algo que nos desorganiza as nossas previsões, as melhores expectativas, e tudo se desmorona como um dominó. Ou porque entrou uma arribada de caranguejo pilado e o peixe está atestado, ou porque no momento em que chegamos ao pesqueiro deparamos com uma traineira na sua faina, ou porque as condições de mar são impossíveis…tudo pode acontecer. E ainda temos de contar com os nossos erros. Os peixes grandes são mais sensíveis a ruídos, a factores estranhos, muito mais do que os mais pequenos.
Pescar um pargo de 1 kg é muito fácil, pode fazer-se todos os dias, mas conseguir um de 8 kgs é muito mais difícil. Não se pescam da mesma forma, e por vezes conseguir um implica mudar muitos dos nossos comportamentos.
Já aqui falámos no blog sobre ruídos, sobre barulhos, que são coisas diferentes, e também sobre a percepção que os peixes têm das nossas movimentações no barco. E o efeito das nossas acções, quando chega o momento da verdade: picar ou não picar…..
E todavia, de todos os grandes peixes que já oportunidade de pescar, (o meu limite até hoje é um peixe de 230 kgs...), não guardo recordações de prazer em particular. Com esses peixes, foi mais sofrimento do que prazer.
Aqueles que me deram “pica” a sério foram sempre mais pequenos, mais terrenos, mais deste mundo. Digamos que não serão tão mediáticos, mas por vezes correspondem a um lance que nos fica na memória para sempre.
Os peixes pequenos também têm o seu encanto. Refiro-me evidentemente a peixes cujo tamanho é modesto, mas correspondem a exemplares adultos, formados. Não confundir com alevins, porque esses não devem ser objecto de pesca, sob qualquer forma ou arte.
Recordo-me de quando comecei a pescar com vinis, e já vai para uns anos, achava uma graça imensa a ferrar garoupinhas, serranos, com o camarão azul de 5 cm, da Savage. A técnica aprendi-a em Valência, e a partir daí criei o meu próprio estilo, pensei-o, fui muitas vezes ao mar para testes, e passados estes anos, acho que hoje sou melhor pescador. Pensar a pesca é fundamental. A maior parte das pessoas não o faz, apenas copia o que os outros fazem. E por isso obtêm resultados idênticos aos que os outros obtêm. Alberto Einstein disse-o: “ A definição de insanidade é fazer a mesma coisa repetidamente e esperar resultados diferentes”….de facto, querer pescar com um chumbo e dois anzóis por cima e pretender obter algo de diferente de todos aqueles que assim o fazem, é um absurdo. E passamos para a segunda frase mais conhecida de Einstein: a” a imaginação é mais importante do que o conhecimento”. O conhecimento é aquilo que já está disponível, à nossa frente. A imaginação permite-nos dar a volta ao mundo. Efectivamente, o que está para trás está feito e cabe a cada um de nós tentar empurrar os limites daquilo que é conhecido, imaginar de que forma é possível conseguir algo mais. Ou ficaremos a pescar com uma chumbada e dois anzóis por cima …toda a vida. Imaginar novas formas de pescar é algo que não deveria estar reservado apenas à meia dúzia de pessoas que ousa ir mais longe, que testa, quer experimenta e quer fazer diferente. Porque esses são, logicamente, os que irão obter resultados de pesca diferentes. É muito importante questionar, colocar interrogações a quem sabe, mas sobretudo a nós próprios. Num mundo em que os peixes são cada vez mais pequenos, houve um dia alguém que pensou ser boa ideia reduzir o peso das canas, dos carretos, o diâmetro das linhas, dos iscos, e inventou uma nova forma de pesca, o Light Rock Fishing.
Antonio Pradillo a pescar comigo dentro do rio Sado em Setúbal. Ele utiliza como ninguém as canas macias, elásticas, de LRF. |
Já aqui vos disse que com equipamentos muito ligeiros de LRF, todos os peixes são grandes. Quanto mais fragilizamos o nosso conjunto de pesca, mais técnicos temos de ser, para conseguir resultados. Passa a ser um confronto de todas as capacidades do peixe, contra as mãos que temos para eles, …ou não temos.
Perfeita ilusão de óptica: não são peixes pequenos…. |
Não subestimem…se pensam que aqui vos trago peixes pequenos, digo-vos que esta caçada acima foi memorável, corresponde a algo feito há muitos anos, e dificilmente replicável hoje.
Até porque a idade vai-me pesando, já não desço aquilo que descia, a água do mar começou a parecer-me muito mais, os fundos ganharam metros, estão mais longe da superfície.
Para vos dar a verdadeira dimensão dos peixes digo-vos isto: estão dentro de um frigorífico vertical, que foi aproveitado para preservar o peixe do calor do sol.
É minha opinião que mais do que o tamanho, é o lance aquilo que devemos procurar. É aquele rasgo de criatividade que, quando bem sucedido, nos faz sentir felizes. Porque a pesca é isso mesmo, é sentirmo-nos bem connosco
próprios, com o meio que nos rodeia. Não tem de estar um peixe grande do outro lado da linha. Pode até ser pequeno, mas deu luta, fez-se difícil e conseguimos. É isso que conta.
Antonio Pradillo, um dos expoentes máximos da pesca na Europa. Milhares de horas a olhar a água…. |
Recordo-me de falar com um dos melhores pescadores europeus, o António Pradillo, de Espanha, e de ele me contar que ia com a sua filha Valéria à pesca do robalo dentro do rio Turia, com água pelos joelhos, e fazia 60, 70 robalos com o seu equipamento de Light Rock Fishing. O Pradillo desenvolve amostras e canas para a marca SavageGear. A dada altura mostrou-me uns poppers pequeninos, 8mm de diâmetro e cerca de 4cm de comprimento, curiosos, coloridos, feitos por ele de forma artesanal, e que davam um resultadão naquelas condições de águas rasas. Pescava com pequenos tirões na linha, muito fina, e os robalos entravam de seguida, ao remoínho de superfície criado pela amostra.
Aqueles pequenos tubos de espuma tinham sido feitos com os restos de um chinelo de enfiar no dedo da sua filha, e vocês imaginam o gozo que dava a ambos saberem o que estavam a fazer.
Os robalos? A média não chegava a 1 kg, e os maiores não excediam o 1,2 kgs, mas isso é importante neste caso?