Olhem para esta foto com muita atenção. Acabam de assistir a um momento único: o nascimento de uma estrela.
Do meio do nevoeiro, eis que surge alguém que nos vem salvar a todos. É este o grande desígnio da figura que vos vou apresentar.
Cada vez mais os alienígenas se parecem com os humanos. Obviamente para nos enganarem, à primeira vista poderia ser um pacato cidadão da Ericeira.
Se virem esta pessoa na rua, afastem-se, sem fazer ruídos ou gestos bruscos…
Carlos Campos, até hoje um quase desconhecido pescador de linha, (vai ser o protagonista de uma série de episódios de pesca aqui no blog), é um moço que tem destas coisas: para além daquele ar descontraído de Coronel Tapioca naturista, brinco malandro na orelha e sorriso franco, é chamado de “irreverente”, à conta do seu característico cabelo branco desgrenhado. Antes de casar tinha cabelo macio e castanho-escuro. Não será estranho a este actual aspecto revolto e esbranquiçado, o facto de lá em casa o shampoo utilizado, SKIP- Nódoas Difíceis, dar para tudo. É o mesmo detergente que a esmerada esposa utiliza para lavar a roupa, para lavar o chão, a loiça, e é também o gel de banho de toda a família. Por isso ele não consegue assentar os remoinhos no cabelo e anda sempre com aquela cara manhosa, semblante fechado de quem recebeu uma carta da Autoridade Tributária há quinze dias, mas ainda não arranjou coragem para abrir o envelope. Sei que ele sofre em silêncio por saber que tem o cabelo áspero.
Segundo consta, Carlos Campos terá sido produzido a partir de células estaminais muito particulares e exclusivas. A maior parte das pessoas que com ele convive, acredita que é alguém que veio de outro mundo. Possuidor de um código genético singular, e de capacidades físicas paranormais, ele vem de série com as unhas do polegar e indicador reforçadas, mais duras e resistentes, exactamente para poder desferrar muito peixe. Trata-se provavelmente de uma evolução industrial da espécie. Um dia toda a humanidade terráquea poderá vir a ser como ele. Não é muito comum um extraterrestre chamar-se Carlos Campos, normalmente têm apelidos como CvpbSgjb#&/», mas pode acontecer. Há vozes discordantes, mas grande parte das pessoas que já pescou com ele à noite garante que a pele do Carlos Campos brilha no escuro. Pode ser um estado muito evoluído de Starlight, uma adaptação à pesca nocturna ao robalo e à lula. Posso referir também que, enquanto todos nós respiramos uma mistura de ar constituído por 20% de oxigénio e 80% de azoto, o Carlos respira uma mistura de 80% de azoto e 20% de oxigénio, o que embora não pareça lhe dá desde logo uma vantagem tremenda. Muitos dos seus movimentos são tão rápidos que se tornam invisíveis à vista desarmada. É ultra-instantâneo ao nível do tempo de reacção de braços, e por isso ferra peixes que não só não estão no pesqueiro como nem sequer tinham ideia de passar por lá, ou até de picar nesse dia. Tem a capacidade de sobredilatação das pupilas dos olhos no escuro e visão integrada de infravermelhos. Consegue também fazer levitação, elevar-se do chão através do poder da mente, embora normalmente só o faça quando se encontra a sós, ou quando vem uma vaga mais alta direito ao seu baixo-ventre. Aliás convém esclarecer este ponto: O Carlos não é propriamente um alienígena comum, é uma outra coisa qualquer, que não cabe nos parâmetros de análise correntes. Começou a pescar há muitos anos, no Cabo Espichel, sendo que deixava a mala térmica no carro, estacionado à sombra junto ao convento, ao lado da roulotte das bifanas. Cada vez que ferrava algo tinha de escalar a falésia acima para vir deixar o peixe na geleira. Na linha dele só caem peixes grandes, pesados. O incómodo da escalada levou-o a pensar numa solução alternativa. Desenvolveu a partir daí uma técnica de levitação muito particular. Não tem nada a ver com teletransporte. Quem é mestre nisso é a minha mulher. A Lena é o meu trevo de 4 folhas, atura-me e nunca direi suficientemente bem dela, mas tem este defeito: andei semanas desesperado à procura da minha amostra azul Super-Surger, da Smith, a da sorte. A minha mulher assegura que não lhe mexeu. Aliás ela nunca mexe em nada, só arruma. Por arrumação entenda-se algo parecido com teletransportar qualquer coisa para outro planeta, porque nunca mais aparece. Isso é teletransporte. O que o Carlos faz é diferente, é levitação, seguida de teletransporte. É estar num momento a lançar a amostra na praia de Carcavelos, e no instante seguinte já estar a recuperar linha num areal da praia do Amado, na Carrapateira. E ainda no mesmo minuto estar a oferecer dois robalos matulões a um casal de turistas na Ponta de Sagres. Encontrou aquilo que os franceses designam por “raison d`être” na actividade da pesca. De mar, de rio e de aquário. Sim, segundo me informaram tem um bacharelato em pesca de aquário, aos góbios luminescentes. Ele conhece os sítios onde moram todos os robalos grandes deste país. E por isso protege-se convenientemente: é do conhecimento público que, para além do chapéu para proteger do sol, muito creme protector no pescoço, o Carlos, por força da quantidade de picadas de robalos de grande porte, quase todos acima de 8 kgs, utiliza a táctica dos epilépticos: pesca sempre com um comprimido calmante Pasalix PI 500 mg, debaixo da língua.
Confesso que me causa alguma perplexidade saber que o Carlos Campos, cuja técnica de pesca base é tão virada para o surf-casting, e tão pouco para a pesca à bóia, quase ganhou um concurso de pesca desportiva às tainhas, em Alpiarça. O prémio era uma noite de folia com uma alentejana loira de contrafação, de 82 anos, e ele lutou desesperadamente pela vitória até ao último segundo.
Reparem neste detalhe: Ele está no areal de Tróia, a preparar o lançamento de um pequeno jig. Todos sabemos que esta zona é um deserto de peixe. Mas ele tem uma potência brutal de braços. Muito provavelmente irá lançar para a costa da Flórida, aos lírios americanos….
Ele pescar, pesca! Não é um pescador com excesso de brilhantismo, nem de perto, mas ainda assim é suficiente bom para poder ser considerado um talento emergente, alguém que daqui a 50, 70 anos pode perfeitamente estar na selecção nacional de defuntos. Bem trabalhado pode vir a ser muito bom, e sei que as marcas de canas e carretos andam a segui-lo e querem apostar nele. O reportório do Carlos varia entre a pesca simples ao sargo na espuma com bóia de cortiça, o spinning e a apanha da amêijoa a duas mãos, nos lodos de Alcochete. Tecnicamente não será o pior que já vi, mas encontro-lhe mais tiques estranhos e jeitinhos de mãos que a um jogador de flippers, ou um cabeleireiro de homens. Acho que pode melhorar muito. Ao fundo também pesca, mas não há bela sem senão: mercê de uma técnica de ferragem pouco verticalizada, diria até marcadamente oblíqua, sente regularmente dores lombares. Os médicos apontam para as cargas de centenas de quilos de robalos pescados diariamente, durante largos anos da sua juventude, que lhe deram cabo da saúde. Suspeita-se que tenha feito um nó lais de guia na coluna, à conta dos movimentos bruscos de ferragem. Também pesca muito à bóia com beliscos de sardinha. No fim da pescaria, tresanda! Convém ter sempre à mão um spray de gás pimenta, no caso de ele se aproximar de nós em demasia.
Minhas senhoras e meus senhores, apresento-vos Carlos Campos, uma força da natureza. Amanhã, não perca o primeiro lance de uma série que vai fazer furor. Tenho a certeza que ele, se chegar a ler metade dos episódios, vai reagir largando tinta, muita tinta preta, como os chocos….
Vítor Ganchinho
Parabéns ao autor deste projecto que escreve com um intusiasmo tal que dá vontade de não parar de ler o que ele escreve ��❤️
ResponderEliminarVitor não tenho palavras para agradecer,este texto que me deixou imocionado,um abraço e um grande bem haja a tanta inspiração na forma mais profunda de escrever qual quer assunto com tanta suavidade e delicadeza é um orgulho para mim privar da sua amizade e companheirismo .
ResponderEliminarBoa tarde Vitor,
EliminarUm excelente regresso, com o registo habitual de nos provocar rasgados sorrisos e entusiasmo!
Venham lá esses textos!
Abraço,
A. Duarte
Boa tarde a todos.
EliminarComeça hoje uma segunda tranche de textos. Segundo o meu amigo Hugo Pimenta, a pessoa que faz a gestão do material a publicar, já temos até meio de Novembro.....todos os dias vai sair uma publicação, sendo que os primeiros 10 são aquilo que se pode chamar de "DEZ MANDAMENTOS"...ou seja, algo como dez dias a desancar o meu amigo Carlos Campos. Quase que se poderia chamar de uma saga de atirar dez pedradas, dez mandamentos de pedras. O que fiz foi apenas aproveitar algumas fotos que tinha dele, e dar-lhe ..."corpo". Aposto que vão ficar surpreendidos com o fim desta história. Antes de mais, eu quero dizer-vos que eu acho o Carlos Campos uma das pessoas mais fascinantes que me apareceu à frente nos últimos vinte anos! Adoro estar com ele! É muito fácil ser amigo do Carlos. Embora não pareça, pelos textos cheios de zinabre que irão sair, ...mas no fim, eu peço desculpa.....
Abraço a todos e muito obrigado por serem leitores deste blog.
Vitor Ganchinho
Olá meu Caro Vitor
ResponderEliminarVê-se que vem revigorado e cheio de boas energias, que se aguentem as costas do nosso comum amigo Carlos, que conhecendo-o a si como conheço a coisa não vai ser fácil, certamente que vão ser textos de pura magia como o que acabo de ler.
Já me faziam muita falta estas leituras diárias.
Forte Abraço
cs
Bom dia Carlos Silva
EliminarNa minha opinião, ninguém merece sofrer tanto, .....o Carlos Campos é boa pessoa, bom chefe de família, e gosta de pesca. Não deixa de ser uma atrocidade aquilo que eu lhe vou fazer, mas estas coisas são assim, a vida é por vezes injusta. Mas ele também se põe a jeito, .....repare nisto: fomos pescar juntos e ele fez um goraz de bom tamanho. Fiz uma foto e pedi-lhe para me informar quanto pesaria o bicho, para ter uma ideia. Sabe o que ele me disse? " Vitor, o goraz pesou 12.185 kgs!"....
Ora já se está a ver, ....um individuo destes tem de ser desancado! E começa já hoje, com uma série de verdades que têm de ser ditas....
Abraço!
Vitor