Os preços absurdos do atum, no Japão

Temo-los entre nós, mas nem todos sabemos o valor daquilo que nada livremente nas nossas águas. Falamos hoje de atuns rabilhos, que cada vez mais passam na nossa zona, cada vez mais nos surpreendem ao aparecer nas proas dos barcos. 
Quando comparados com outros peixes de grande porte, os atuns são de facto um mundo à parte. 
Passam aqui duas vezes, a primeira em finais de Julho, princípios de Agosto, os chamados “atuns de direito”, ou seja aqueles que vão entrar no Mediterrâneo, para desovar, e que estão gordos e prontos a consumir. 
Na volta, e já com o seu trabalho de reprodução feito, estão magros e valem muito menos. Chamam-se nessa altura “atuns de revés”, e para que possam ser vendidos têm de ser alimentados dentro das armações, as almadrabas, ou almadravas. 
Este é um termo árabe e diz bem da longevidade com que estas técnicas de pesca chegam até aos nossos dias. 
Esta alimentação de aquacultura forçada acontece no Algarve, onde duas empresas dividem a totalidade das capturas, a Real Atunara, de capital espanhol, e a Tunipex, empresa japonesa. 
Estes peixes vêm até nós partindo do meio do Atlântico, e seguramente que alguns viajam mesmo da costa dos USA, procurando a entrada do Estreito de Gibraltar para entrar no Mediterrâneo. Longas viagens fazem os atuns rabilhos. 
Após duas dezenas de anos de afastamento, e de bastante receio pelo futuro da espécie, eis que o atum vermelho voltou a recuperar os seus efectivos, e volta a dar trabalho a alguém. Não há empresas portuguesas neste negócio, o que é pena, são peixes capturados nas nossas águas, mas as mais valias saem para outros países. Para que tenham uma ideia dos valores, aí vão: um quilo de atum pode valer no mercado de Tóquio algo como 1.000 euros. 
Aquilo que fica por cá é atum magro, que os japoneses e coreanos não pretendem adquirir, por ter pouco valor comercial. Para nós poderá parecer estranho, mas para os nipónicos apreciadores de sushi, habituais consumidores do producto, a diferença entre um bom e um mau atum é enorme. Eles medem os níveis de gordura, e têm aparelhos que o fazem ao milímetro. Os preços por exemplares que encaixam nos parâmetros pretendidos são exorbitantes, pelo menos para nós europeus. Se é possível comprar atum nos Açores, em supermercado a 4.00 euros /kg, imaginem o que sentirão os açorianos quando leem que um atum de 278 kgs foi vendido no tradicional leilão de Ano Novo, em Tóquio, por 2.7 milhões de euros!! Ou seja, a cadeia de restaurantes Sushizanmai pagou algo como 9.712 euros por quilo……, uma barbaridade por um peixe que, para além do negócio que eventualmente lhe possa proporcionar, seguramente servirá mais como acção de marketing …. 
Com o espírito crítico aguçado e mal intencionado de um português, (e se nós somos capazes de ser maldosos), já se está a ver que dos milhares de pessoas que forem a uma das unidades desta cadeia de restaurantes comer uma fatia deste atum tão especial, umas centenas talvez o consigam, os outros todos irão comer atum que é …um pouco ao lado, …uns atuns primos afastados deste. Seguramente que no final, e depois de descascados mais uns 20 atuns, a empresa terá os seus lucros. Mas isso somos nós portugueses a pensar, que somos “afiadinhos” para estas coisas de armadilhar o povo. O eterno dilema de ir a um restaurante, ver o sargo na montra, escolher o mais bonito e ir para a mesa esperar que chegue, bem grelhado. Entretanto, o sargo do expositor muda ligeiramente de posição, e aquele que é grelhado é outro, logo por azar um que tinha ficado na caixa, do dia anterior….portuguesices…

Atum de 278 kgs, capturado em Aomori, costa norte japonesa, e vendido ao sr Kiyoshi Kimura, na lota de Tóquio por 2,7 milhões de euros.


Para um povo que adora comer atum, e que os tem de bom tamanho nas suas costas, nada mais natural que existam fabricantes de equipamentos de pesca dedicados a esta nobre espécie. 
Todos os grandes produtores de canas, carretos, linhas e amostras os têm, e de muito boa qualidade. Se são famosos os carretos Stella, da Shimano, também a linha Saltiga, o topo de gama da Daiwa, apresenta produtos de primeira água e que são utilizados por pescadores preocupados com a qualidade dos seus equipamentos. E que têm poder financeiro para os adquirir. O mercado interno japonês, só por si, representa cerca de 130 milhões de potenciais consumidores de canas e carretos. E isso basta-lhes. O resto é um acréscimo, que pesa algo, mas pouco. 

O atum só por si é o motor de uma indústria que envolve milhões de pessoas, a uma escala que nos é difícil entender.


Existem milhares de japoneses especialistas no corte deste tremendo peixe que é o atum.


A GO Fishing tem vindo a alertar para a existência de atuns entre nós. Tivemos um Verão particularmente mexido nesse aspecto, com cardumes de atuns entre os 60 e os 100 kgs a passar pelas nossas águas, a mostrar-se, a comer as sardinhas, as cavalas, os nossos carapaus. Estiveram por cá, deixaram-se ver e no meu caso, estiveram a poucos metros do barco, em dias em que eu estava a pescar a outros peixes, com canas ligeiras que na melhor das hipóteses apenas os fariam sorrir. O único dia em que fui por eles em exclusivo, perfeitamente equipado com material para peixe de peso, …estava um nevoeiro cerrado, que se manteve até final da manhã….

O atum é sangrado aquando da captura, de forma a chegar ao consumidor nas melhores condições possíveis. Tive a oportunidade de, ao esperar um pouco para fazer estas fotos, verificar que há todo um ritual, uma arte ancestral, por detrás de cada corte deste peixe.


Entre nós, é possível adquirir atum patudo, e, de melhor qualidade, atum rabilho, em mercados de peixe. Em Setúbal há sempre duas a três bancas que o vendem, a preços razoáveis, não mais de 15 euros/ kg. Tratam-se na sua quase esmagadora maioria de peixes que vêm das ilhas, quer dos Açores quer da Madeira, embora a frota profissional faça capturas cá no continente.
Para aqueles pescadores que pretendem dar um passo no sentido de introduzir atum fresco em sua casa, a GO Fishing Portugal resolveu proceder a uma importação de facas de corte japonesas, com diferentes tamanhos, e que seguramente irão permitir dar os primeiros passos. São de tal forma afiadas que bom mesmo é cuidar dos dedos, eventualmente deixando que esses cortes sejam feitos pela nossa parceira. Temos uma boa razão: os pescadores precisam dos dedos para iscar os anzóis….



Vítor Ganchinho



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