As nossas mulheres deixam-nos …pescar?

A minha mulher está vivamente interessada em engravidar. Eu estou mortinho por conseguir um pargo grande, acima dos 8 quilos e passo o tempo no mar. Algo me diz que vai haver uma tragédia conjugal lá em casa… Qualquer dia tenho as roupas, as canas e os carretos à porta, dentro de um saco plástico de supermercado. Podia ter casado com uma mocinha tipicamente açoriana: paciente, baixa e reboluda. Vulgo formato maçã raineta, um aspecto que não é muito cobiçoso cá no continente. Mas não, a Lena é alta e morena…e a paciência não é a melhor característica dela. Por isso não se adivinha nada bom, até porque eu não prescindo mesmo de pescar o pargo. Nada chega a um pargo grande! Tive um sonho profético, no qual eu ferrava um pargo enorme, com sardinha, e por isso não vou desistir enquanto não o conseguir pescar. 

Estou casado há 124 anos. A minha mulher acha que não deve ser tanto, que estou a exagerar. Mas eu estou convicto e seguro que sim, e até provavelmente serão ainda muito mais anos, atendendo à quantidade de vezes que já a ouvi dizer ”não me entres em casa com os pés sujos, cheios de escamas agarradas aos ténis!”. Ora todos nós pescadores sabemos que um individuo que chega a casa cansado da pesca, não tem vontade de entrar em casa a fazer o pino. E as escamas saltam por todo o lado. Já se sabe que alguma pode vir agarrada aos pés. Muito pior é um pescador penitente que nunca traz escamas para casa. No mínimo, isso quer dizer que é um artolas à pesca, colecciona “grades”, zeros redondos, ou que é altamente especializado em safios e polvos. Eu trago peixe de escama para casa. E mesmo assim a minha Leninha parece que anda sempre a esfregar os olhos com rodelas de cebola: chora a cada instante, amargurada pela desgraça de marido que lhe calhou em sorte. Imagino as mulheres dos outros, esses que vão, gastam uma pipa de massa e regressam a casa com o fundo do balde destapadinho.

Conheci a Lena vai para um horror de tempo. Na altura recordo-me vagamente que ela me pareceu bem. Estava bem alimentada, parecia-me ter os ossos no sítio e um sistema imunitário razoável. A mãe, candidata certa a um prémio Nobel de Marketing e Vendas, garantia aos pés juntos que a filha estava desparasitada, e que sabia cozinhar como ninguém. Deve ter treinado o caldo de safio milhares de vezes, porque em minha casa saiu logo bem à primeira. Um molho espesso, de tom alaranjado a puxar para o tomate de lata. Depois de molhar o pão, acabei por ficar convencido e casei com ela. De qualquer forma, com algumas reservas e uns quantos pontos de interrogação. Achei manifestamente exageradas as afirmações da minha sogra, quando afirmava peremptoriamente que a filha era imune a constipações, que nunca pingava do nariz, não tinha queda de cabelo e não largava borbotos nas camisolas de malha. Nós estamos a ver a carroçaria, mas não estamos a ver o chassis. Elas enganam-nos muito facilmente porque os nossos olhos vão atrás daquilo que elas querem que seja visto. Como não me gritava às orelhas por eu sair regularmente à pesca, e porque cozinhava razoavelmente, pareceu-me o assunto do casamento resolvido. E ainda hoje não barafusta demasiado quando saio, penso que por lhe ser conveniente ter-me longe. É por estas e por outras que estou em crer que o melhor amigo do homem não é o cão. É a mulher. Os cães pegam-se mais a nós. O que acham?

Pela parte que me toca, continuo a gostar de pescar pargos e robalos, que têm escamas. Desde logo porque há imensos na zona onde vivo: Setúbal. É um peixe muito comum, e que me permite tentá-lo com muitos tipos de isco. 
Desde os tradicionais filetes de cavala, ou cavala viva, com sardinha, com lingueirão, com vinis, ou melhor ainda, com jigs. Definitivamente, a pesca do pargo é a minha favorita.

Quando o mar está calmo, sem piscar de ondas ao largo, quem é que se lembra de ficar em casa a aturar as mulheres?!...


Com regularidade, aparece-me gente para ir pescar comigo. Normalmente o grosso da coluna são homens, e de todas as idades, desde os 10 aos 70 anos, mas ultimamente aparecem cada vez mais mulheres, e aí, normalmente dos 30 aos 60 anos. 
Procuro fazer com que as senhoras se sintam confortáveis, encontrando para elas pesqueiros baixos, menos exigentes do ponto de vista técnico e atlético, mas onde possam ferrar uns peixes grandes. Recordo-me de uma balzaquiana que estaria pelos seus 45 anos, não muito simpática, e que queria obter um grande troféu de sargo. Fez-me esperar por ela a valer. Andei eu a embelezar-me, a retocar as madeixas loiras, para depois estar à seca na doca mais de uma hora. Mas os clientes têm sempre razão. 
A senhora via-se que já teria conhecido melhores dias. Estava de caras que teria feito uma implantação de cabelo nos sovacos, e muito bem sucedida. Aquilo mais parecia tratarem-se de extensões capilares. 
Dei por mim a reparar que a pessoa tinha uma cara fechada, carrancuda, coluna muito direita, uma espécie de estátua de pedra da Ilha de Páscoa, pouco expressiva. Apareceu-me com mais penduricalhos e acessórios do que um guarda-redes de hóquei. 
Eram brincos e anéis aos molhos, eram óculos de sol e chapéu de abas, mala para lanche e mala para o peixe, mala para telemóvel e mala para cremes e protector solar. Mas engoli em seco, arrumei a carga toda e lá saímos no barco, direitos ao meu sítio dos sargos. 
Para ajeitar as suas coisas, começou por mudar de local as minhas sacolas de acessórios. Ora eu gosto de as ter por perto, para substituir um anzol, pegar num alicate, uma tesoura, etc. E estão ali porque efectivamente me ficam mais à mão. 
Mas a criatura era daquelas que mexem em tudo. Deixam as nossas caixas de amostras com impressões digitais marcadas em tudo, menos infelizmente nos bicos das fateixas e anzóis. E logo eu que sou muito cioso dos meus equipamentos. Poupo-os muito, lavo com água doce, seco, substituo um ou outro anzol triplo, enfim, faço com que durem. Estou a guardar religiosamente uma amostra da Lucky Craft dourada que nas minhas mãos já tem anos. Por mim fica para o enxoval da minha filha mais nova, a Mafalda. As coisas de momento apresentam-se negras porque a tendência da miúda, até ver, é procurar no campo setas de pedra do período Paleolítico. 
Mas voltando à senhora dos 45 anos: Não sei se já vos aconteceu, por vezes basta olharmos para uma pessoa e conseguimos de imediato entender que os pais se envolveram sem entusiasmo, sem ganas nenhumas, sem garra nem “frisson”. Era o caso. 
Levei-a para umas pedras a norte do Cano Espichel. Estão sempre cheias de sargos bons, velhos, de dentes pretos. Disse-lhe: _Você agora vai pescar aqui, neste sítio. Até o Stevie Wonder era capaz de encher uma caixa, mesmo sem saber para onde atirar os peixes! Há muitos e grandes. 

E o peixe estava lá! Vocês sabem que depois daquele artigo sobre a pesca à boga, em que eu dizia que as bogas tinham para cima de 1 quilo, eu fiquei em regime de apresentação periódica às autoridades, e não posso falhar no peso dos bichos. Eram sargos grandes. 
Ao fim de uns minutos já tinha um ferrado. A senhora ia tendo um enfarte do miocárdio com o esticão que levou na cana. Ela olhava para mim como quem estava puxar uma bomba de plutónio. E até cá acima foi um instante, mas o peixe, quando o foi levantar da água, e tal como o pão dos pobres que cai sempre na terra com a manteiga para baixo, desferrou-se, bateu na amura do barco, e caiu à água. A cara que me fez. Por força que eu teria sido o culpado. 

_ Então o peixe agora foge?! Você quer atirar-me para um divã de um psicanalista caro, ou quê?

Para ir à pesca com pessoas mal dispostas, mais valia ter sido preso por posse ilegal de erva. Eu por vezes chego a duvidar da minha capacidade de pôr estas pessoas a pescar um peixe de jeito. 

Para andarmos com mulheres nas palminhas nas mãos... mais vale segurar uma navalheira. Pelo menos sabemos que vamos mesmo levar uma dentada dolorosa, de certeza!


Não há forma de conseguir suportar uma mulher com mau feitio. Razão tinha o Zé Pedro quando se divorciou e jurou que nunca mais se ia meter com nenhuma. 
Depois da separação, não lhe conheci mais caso nenhum, tirando uma paixão de relance por uma manequim. Esteve efectivamente embeiçado por uma manequim alta e esbelta, cabelo preto brilhante, mas pouco tempo, foi uma relação amorosa relativamente instável com um manequim de plástico de uma montra de pronto a vestir que ficava no caminho da doca onde tinha o barco. E mesmo assim foi uma relação de idílio amoroso de apenas dois dias, nada muito sério. Dizia ele ao princípio: “ Aquelas curvas matam-me. Acho-a perfeita! Tem mais curvas que uma estrada secundária de província…”
Cansou-se rapidamente, provavelmente por não ter sinais de ser correspondido. Os amigos estavam a ver que seria um amor assolapado curto, de Pedro & Inês, com final trágico, como deve ser. 
O que ele tinha era uma paixão assolapada pela pesca. Saía muitas vezes de barco, na verdade quase todos os dias. Posteriormente nunca mais tentou casar-se, ou até amantizar-se, porque tinha a certeza de que iria resultar muito mal. É muito difícil para uma mulher entender uma paixão daquelas, não sentir ciúmes das sarguetas, das cavalas, das garoupinhas, das salemas. 

Outros casamentos resultam bem e são para sempre. É o caso de um casal espanhol de Madrid, que saiu a pescar comigo. Ela pescava robalos e ele ajeitava-os delicadamente dentro da caixa. Na verdade, ele dizia-lhe que sim a tudo. A Mari Carmen pescou uma cavala hemofílica que encheu tudo de sangue, ficou tudo sujo, mas ele foi logo limpar com um pano. A dada altura, a moça estava a puxar uma cavala daquelas que era um portento de força, com uns 2 quilos. Já transpirava. Dizia o espanhol Jiménez para sua querida e amada Carmen: “ Cariño, quieres que te tire la sudadera”? Isto traduzido dá algo como, “ Querida, queres que te dispa a camisola sweat shirt?”. 
Achei melhor não. A moça era bem apessoada, elegante, e por baixo teria apenas o bikini, o que não é boa ideia quando se têm outros índios a bordo. Vocês sabem que pescar e ter alguém do sexo feminino a bordo, em tronco nu, não é compatível, até porque podemos cravar um anzol num olho. 

Ainda quando elas vão para a praia e nós saímos para o largo, ...


Isto das senhoras à pesca é sempre muito relativo, depende das latitudes. Há países onde é mais usual e noutros nem pensar. Recordo-me de ter ido aos Emirados Árabes para pescar. Chegámos ao Dubai pela fresquinha da noite. Estavam 38 ºC e nós a derreter. Eles vestem um lençol branco, ao qual fazem um buraco para passar a cabeça e está o fato armado. Para elas a coisa pia mais fino, tapam-se todas, não fica nada a vista. Como usam aquela coisa da burka preta, da cabeça até aos pés, e não se vêem senão os olhos, presumo que cada homem pega na primeira que lhe aparece e leva-a para casa. É um pouco como as bicicletas de aluguer. Isto é de um machismo atroz, mas deve ser assim que as coisas acontecem por aqueles lados. Mulheres a pescar nem vê-las. 

Podemos dar muitas voltas ao mundo, mas não encontramos como as nossas queridas portuguesinhas, quando têm bom feitio. Não digo que não existam suecas loiras que fiquem em casa e até consigam aguentar as nossas saídas à pesca, mas ainda assim sem a paciência e categoria de uma moça das nossas. Nada como uma maçã riscadinha de Palmela. Estimem as vossas namoradas e mulheres, porque não encontram melhor em lado nenhum. Não precisam de desatar a agradecer-me, temos de ser uns para os outros, e este é um conselho que vos dou gratuito. 
Estou a escrever estas coisas mas estou a recibos verdes, não ganho quase nada com isto, talvez uma sandes de mortadela, logo também não podem exigir muito….. 

Se com este artigo não chego aos duzentos milhões de visualizações, é natural que o editor, o Hugo Pimenta, me despeça. Basta que cada português leia isto umas vinte e duas vezes. E coloque uns quantos “likes”…não custa nada.




Vítor Ganchinho



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