Carretos: capacidade de linha versus conforto de pesca

O Prof. José Rodrigues, um apaixonado pela pesca e mais especificamente pelo jigging profundo, e um não menos profundo conhecedor de equipamentos e técnicas de pesca, é aquele tipo de pessoa que todos nós gostaríamos de ter sempre a nosso lado quando temos dúvidas. 
Tem a palavra certa no momento certo, e fundamenta-a com dados concretos, e mensuráveis. Ou não fosse ele um eminente investigador, e alguém que tem responsabilidades na área do ensino. 
Comentávamos há dias a questão da necessidade de pescar com a bobine do carreto bem preenchida, e isto a propósito de pesca jigging muito profundo. O assunto nasceu a partir da tentativa que irá fazer de pescar na casa dos 800 metros de fundo, e de toda a adaptação que o equipamento terá de sofrer para que tenha bons desempenhos, mesmo em tão difíceis condições. Para isso adquiriu na GO Fishing um carreto de jigging de grande capacidade de linha, o qual importámos do Japão. 
Passo-vos, com a devida vénia a quem de direito, um excerto da nossa troca de impressões e dos seus argumentos: 

_Vitor, uma das grandes vantagens destes carretos de grande capacidade é podermos pescar a 600m com algum conforto. Eu tenho um Shimano OceaJigger 2000 que leva 640m de linha #2, e isso teoricamente dava para pescar a 600m. 

Na prática não dá porque:

1) O jig nem sequer toca no fundo por problemas de verticalidade.

2) Mesmo que tocasse, a recuperação do carreto cheio é de 115 cm por manivelada, e vazio é de pouco mais de 20 cm. O carreto Studio Ocean Mark, (SOM) leva 1200 mts de linha PE #2, e assim sendo, mesmo a 600m de linha fica meio cheio e a recuperação não é inferior a 55/60 cm por manivelada.

3) Se a linha parte por qualquer motivo e desde que não parta junto ao carreto (600m por hipótese) ainda dá para continuar a pescar com o SOM. Se eu perder entre 100m a 200m de linha no SOM, nem mexo no carreto, menos do que isso eu tiro a linha toda fora, meto um backup por baixo e fico com mais de 900m de linha sem descontinuidades. Se por hipótese eu preferisse pescar com PE #3 este carreto começava a ficava curto porque só leva 800 m. Dava mas já não chegava para ir pescar até aos 800m que é um dos próximos destinos...


Trago-vos este excerto de conversa por dois motivos. Primeiro porque gostava que soubessem que há pessoas no nosso país que pensam a pesca muito antes de chegarem ao mar. Não são muitas, mas existem. 
E fazem-no a este nível, com ponderação, com rigor, com sabedoria, com poder de observação, e isso tem forçosamente de ser enaltecido. A publicação de uma conversa privada parte da autorização prévia do autor e da convicção que tenho de que pode ser importante para os meus leitores seguir esta linha de raciocínio, retirar daqui elações sobre o seu procedimento pessoal, e corrigir, sendo o caso. 
Segundo porque este é um bom argumento para que vos escreva sobre a questão do enchimento dos carretos de pesca, na sua generalidade, quer sejam equipamentos de jigging quer sejam de pesca vertical, spinning, etc. 

O tema aqui tem a ver com matemática pura, e a aplicação de uma fórmula que bem conhecemos: o cálculo do perímetro de uma circunferência. 
Temos então que P = 2π x R, e serve-nos de ponto de partida para poder entender quanta linha podemos enrolar numa bobine quase vazia, ou bem cheia. Se quiserem, em linguagem comum e procurando facilitar-vos um pouco a vida, não será igual dar uma manivelada completa sobre um carreto quase vazio, com pouca linha, ou completamente cheio de linha, no que diz respeito ao resultado do enrolamento. Com mais linha, a medida do diâmetro da bobine aumenta e, com a mesma manivelada, recuperamos muito mais fio. 

Tenho um carreto Daiwa Saltiga 8000 que faz 144 centímetros de enrolamento de linha por cada manivelada completa. Quase 1,5 metros. Calculo que faria bem menos se eu o utilizasse apenas com uma quantidade de fio residual no fundo da bobine. Ora o objectivo de quem pesca com equipamentos destes é conseguir peixes grandes, ou utilizaria máquinas mais pequenas, mais leves e também mais cómodas. Logo, a alternativa para mim nem se coloca, é bobine cheia de linha e que venham os tais peixes grandes que todos estamos sempre a aguardar. 

Carreto Daiwa Saltiga 2020 cheio de linha, preparado para grandes combates.


No fundo, com o carreto cheio melhoramos bastante a nossa capacidade de recolha da baixada, ou da amostra. Logo, depende de nós e do trabalho caseiro, prévio, fazer aumentar a eficácia das nossas maniveladas. Os dados objectivos são estes: 

1cm de raio = enrola 6,2 cm de linha

4 cm de raio = enrola 25,1 cm de linha

5 cm de raio = enrola 31 cm de linha

8 cm de raio = enrola 50 cm de linha

E por aí fora, até atingirmos o limite de capacidade da bobine. Partir de 8 cm é bem melhor do que partir de 1 cm, obviamente. Quando o objectivo é enrolar mais depressa, e isso pode ser interessante quando se pretende recuperar um peixe, ou apenas substituir a isca, ou recuperar um jig, para voltar a lançar noutra zona, é importante ter num carreto cheio. 
Existe um outro factor que me parece importante referir, para que não cometam erros: o tamanho do carreto deve estar dimensionado de acordo com o tipo de peixe que procuramos. Não se pescam atuns com carretos ligeiros tamanho 2000, nem se pescam robalos com carretos de Big-Game. E a linha deverá estar equilibrada com a máquina, não faz sentido uma linha muito fina num carreto de grande tamanho, ou o inverso. 

Carreto Daiwa Seaborg 500 J, uma máquina para puxar peixes de grandes fundos. Muito prático, muito eficaz, aqui a fazer a recolha de linha a 150.20 mts por minuto.


Existe à venda na GO Fishing Portugal uma versão mais económica, o Leobritz 500 J


Temos ainda a considerar que o facto de a manivela do carreto ter um comprimento fixo, e passar exactamente pelo mesmo sítio, à mesma velocidade, não significa que a cada manivelada o comprimento de linha recolhida seja sempre igual. E não é porque a cada entrada de linha o diâmetro da nossa bobine irá aumentar, complicando um pouco as contas simples que vos estou a apresentar. Teríamos de entrar em linha de conta com o diâmetro do nosso fio, que vai adicionar ao que já está enrolado. Mas grosso modo, o conceito é este: para podermos ter uma recuperação de linha mais eficiente, não basta ter um carreto que possua um rotor com uma grande desmultiplicação, com uma alça que passe muitas vezes pelo ponto zero, é também necessário que a base de partida para essa recuperação de linha seja boa, ou seja, que a bobine esteja cheia. Em suma, que o carreto tenha a quantidade de linha exacta, para nos permitir a melhor performance. 


Fica a sugestão.



Vítor Ganchinho



2 Comentários

  1. Boa tarde Vitor,

    Espero que se encontre de boa saúde e restante família.
    Ora aqui está mais uma excelente explicação de algo tão simples e que muita diferença faz em algumas situações!

    Ainda há uns dias falei desta questão com um amigo meu, do qual prontamente me disse que não havia grande diferença e era completamente irrelevante este facto!

    Não o consegui demover da sua ideia, nem com molho de tomate!

    Grande abraço!
    A. Duarte


    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá António Tente explicar a esse seu amigo o seguinte: se é verdade que certos tipos de pesca ganham numa recuperação lenta, pausada, ( por exemplo o slow-jigging), outros há em que a velocidade de recuperação pode ser determinante na obtenção de resultados. Para quem nunca pescou em África aos grandes carangídeos, ou às barracudas, poderá parecer estranho isto. Quem já fez Popping, com poppers pesados, digamos de 200 gramas ou mais, aos GT´s, sabe o que digo. Tem outro caso bem mais próximo: se tentar ferrar um lírio aqui na costa, no Verão, a fazer uma recolha lenta, pode estar lá dez dias e não tem um toque. Mas se recolher rápido, eles motivam-se e atacam. São peixes que são muito rápidos, e que se excitam com desafios deste tipo. Os atuns por exemplo, são outro caso idêntico. As pessoas perguntam-me muitas vezes como é que eu ferro tantos atuns sarrajões ( temo-los na costa neste momento), e isso tem a ver com velocidade de recuperação. A técnica é recuperar rápido, e fazer pausas breves. Normalmente a picada dá-se no momento em que a amostra, ou jig vai arrancar de novo, nos primeiros instantes.
      Caso não tenha um carreto com a conta certa de linha isso só pode fazer-se à custa de muitíssimo trabalho de braço, a enrolar linha como se não houvesse amanhã. E cansamo-nos rapidamente. Fazer bem feito não custa nada, basta ter o carreto cheio, ainda que lhe coloque um enchimento por baixo, para fazer altura.
      Não adianta ter um bom carreto, se depois não lhe colocamos a linha de que necessita para desenvolver trabalho. A uma velocidade constante, digamos a velocidade a que normalmente costumamos enrolar linha, quem tiver o carreto meio enrola menos de metade da linha, com o mesmo número de maniveladas. Menos de metade. E com o mesmo esforço.
      Veja o caso da pesca vertical, que tão vem as pessoas conhecem: Se tiver uma picada a 80 metros e tiver de enrolar linha num carreto meio, .....bem pode sentar-se. Perde tempo, perde oportunidades, e não consegue motivar o peixe a ficar no pesqueiro, porque o ritmo a que cai isca lá em baixo é fraco. Não há vantagens em ter carretos a meio gás.

      Abraço
      Vitor

      Eliminar
Artigo Anterior Próximo Artigo

PUB

PUB

نموذج الاتصال