Vimos no último dia a alteração das condições de mar até ao ponto em que forças de vento e ondas se descontrolam por completo. A dada altura já não há sítios demasiado seguros, apenas alguns onde bate menos. Mas bate.
Pedras maiores ou menores voam em todas as direcções, ao ritmo das ondas, para trás e para a frente, partindo e voltando a partir algas, plantas, tapando frestas, abrindo outras. No meio destas pedras estão pequenos seres que não conseguiram escapar a tempo.
Para esses, a luta pela sobrevivência conhece aqui um desafio extremo: sair ou morrer.
A massa rochosa que é projectada por ondas de 6 / 8 metros de altura não poupa nada à sua passagem. Pequenos seres de lenta deslocação, são apanhados neste reboliço de pedras e têm poucas hipóteses de sobrevivência. Muitos irão conseguir escapar, mas outros conhecem aqui o fim da sua existência.
Dentro dos buracos, a vida deixa de valer, e tudo o que está dentro, é para morrer. Nada consegue sobreviver a este turbilhão que tudo esmaga à sua passagem.
A força da corrente que se gera impede peixes, crustáceos, anelídeos, etc, de conseguirem sair. As paredes que davam protecção, passam a ser sinónimo de morte.
Numa faixa de costa onde as pedras das derrocadas rolam até atingirem formatos redondos, o efeito de esmagamento faz-se sentir. Seria curioso pensar que, por efeito liliputiano, o meu leitor seria neste momento um pequeno peixe, a tentar escapar de alguma forma deste labirinto escuro, com força de água impossível de vencer, com visibilidade reduzida, limitada pela areia e algas que esvoaçam por todos os lados. Tente imaginar-se sem conseguir ver, sem saber para que lado é o baixo e o cima, a esquerda e a direita.
Tente entender que mesmo que saiba para onde pode sair, não consegue lá chegar porque a força das águas impele-o contra as paredes.
Os peixes que nós pescamos, numa ou outra fase da sua vida, já passaram por isto. Alguns deles dezenas de vezes. E conseguiram aguentar.
Vejam como é fácil passar a respeitar os tamanhos mínimos, quando pensamos que aqueles que estão na nossa mão, enganados por um qualquer anzol traiçoeiro, são sobreviventes desta turbulência. Olhá-los com respeito é o mínimo que podemos fazer por quem consegue aguentar estas provações.
E chega a noite. Com falta de luz, e visibilidade escassa, tudo se complica. A força avassaladora das ondas continua a massacrar tudo aquilo que ainda vive dentro dos buracos.
Pedras e areia massacram todos os recantos onde algo possa estar vivo.
Imaginem o que é passar uma noite de tempestade no mar, com ondas a bater, dentro de um buraco. Não é algo que queiramos imaginar, nem nos nossos piores pesadelos.
A tudo os nossos bichinhos tentam resistir….e a verdade é que alguns conseguem. Há vida marinha que luta diariamente pela sua sobrevivência, e essa vida aguenta tudo isto.
Amanhã, o final. Vamos ver como tudo ficou, depois da passagem da tempestade.
Vítor Ganchinho