O meu cão Scott odeia pesca

Estou que nem posso!

Não se consegue pregar olho nesta casa, à conta da porcaria da pesca! À conta da brincadeirinha das saídas de pesca dele, não consigo dormir capazmente.
E o que eu preciso das minhas retemperadoras vinte e duas horas de sono! Ando aqui que nem um zombie. Custa-me a abrir os olhos e não suporto a luz do dia. Sim, ardem-me os olhos.
Provavelmente vou ter que pôr uns palitos nos olhos para os manter abertos. Não durmo há anos e até digo mais: ninguém nesta casa consegue dormir decentemente! Às seis da manhã já ele anda feito tresloucado, com as canas de pesca na mão, os carretos a bater nas paredes, mais os …”enxalavares”…..
A minha dona Lena leva o tempo a fazer “lanchinhos”, que mais não são que umas placas de “pão”, com presunto lá dentro. Não percebo porque insistem em estragar a comida com tanto pão dos dois lados. Porquê o pão?!

Olá! Eu sou o Scott José, um pastor alemão disfarçado de cão de colo. Estou compactado, mas não subestimem, sou mesmo um pastor alemão. Reparem nas cores...


Mas tem alguma graça andar de cana na mão de um lado para o outro? O que é isso de “ir à pesca”?!
Por amor de Deus, tem alguma graça tirar uma foto com um peixe? Porque não faz antes uma pose bonita com uma cadela caniche branquinha ao colo? Vêm de lá a tresandar a “pexum” das roupas, a apanhar frio, feitos parvos….
Eu cá não gosto de peixe. Fiquei com umas cólicas intestinais de morrer, depois de me forçarem a comer um filete de faneca cozida. Por algum motivo há Friskies de frango, e não de faneca.

Alguém tem de pôr a pata nisto: a situação está descãotrolada.
Por mim, ficava em casa a fazer-me festas e a dar-me bolinhas de ração à boca, uma a uma.


Estou com uma dor de cabeça horrível! Fui mais uma vez acordado a meio da noite com o barulho das botas de pesca na escada. Mas esta gente não descansa?!


E pescam aquelas “gosmas” com feitios estranhos, as chamadas “douradas”, que afinal são umas bugigangas cinzentas, sem graça nem serventia nenhuma.
Traz para casa aquelas desgraças dos tais de “peixes”, de cheiro pestilento. Andam por aí uns malucos de uns caranguejos a passear pela casa. Ele é a roupa, o carro, as caixas, tudo cheira a sardinha. Acabo por ter de me lamber todo, para tirar aquela sensação de também eu próprio ter ido pescar. Deus me livre! E se vem alguma cadela fina cá a casa? Vou estar nestes preparos de cão de …pescador? Que miséria é esta?!!




Ele que não me venha cá com mimos, nem com aquela mariquice de estalar os dedos e muitos sorrisinhos. Se é para abanar o rabo, ele que abane.
Se me querem ver alegre, pois que me tirem esta tal de “coleira”. A chapinha com este nº de telemóvel é para eu ligar a alguém? Mas eu por acaso tenho Alzheimer, eu não sei o meu número?!

Acordo estremunhado e cada vez me sinto mais próximo de ter de ir fazer psicanálise. Ando com os olhos bogalhudos de não pregar olho, dias e dias.
Bem que me podiam oferecer uns óculos escuros. Há que parar esta demência, esta loucura! Não queria, mas parece-me que tem de ser: há que o chamar à razão, e à falta de alguém com coragem nesta casa, …terei de ser eu.
Sim que as manas cockers não vão fazer nada, elas não querem saber de nada sem ser comida, parece-me que terei de ser mesmo eu. A gata Carlota é uma delambida, uma interesseira.
Ela até lhe dá apoio, porque ela come aquelas mistelas que fazem com os tais de …”peixes”. Acho que lhe chamam “pargo no forno”…
Eu detesto gatos. São uns vendidos, fazem tudo por peixe.




Parece-me que isto só vai lá com medidas drásticas: Ele tem de ser internado.
Eu estou possesso, porque vejo-o a crescer nesta decadência, de só olhar para carretos e canas, e quase nada para os Friskies de perna de borrego.
Lançou-me um carapau pequeno. Pensei que era para ir guardar, deixei-o debaixo da cama do quarto dos hóspedes. Pelos vistos não precisavam dele, porque ficou lá mais de duas semanas.


Sou o Scott, o cão do Vitor. Faço Yoga.


Cada vez vai mais à pesca, e para mim isto é uma doença. Leva tanto tempo fora no barco que eu por vezes já nem o reconheço e… ladro-lhe.
Ele sai para a pesca muito cedo e isso altera-me o meu biorritmo por completo. O que lhe custa sair sem fazer barulho?
Porque não vai às onze da manhã e volta ao meio-dia, a tempo de me dar a ração?
Custa-me vê-lo sofrer desta forma. Para mim, a situação está a atingir níveis de calamidade. Por mim, era internado de urgência e só saía do hospital quando já não se lembrasse de nada sobre pescas…
Vêm cá a casa pessoas que estão no mesmo estado dele, metem-se nos mesmos opiáceos, estão completamente agarradas. Só falam de pesca de linhas, de carretos de pesca, de peixes.
Com tanta coisa que podia fazer, ir-me passear ao campo, vai dar-lhe para esta desgraça da pesca!...já não lhe bastava aquela coisa de ficarem a olhar para o rectângulo onde aparecem uns malucos a correr atrás de uma bolinha branca.




Estou farto desta vida de cão. Um destes dias fujo de casa e vou à procura de uma dono que trabalhe numa loja de rações para cães. Isso é que era um sonho…
Tenho de ser capaz de parar esta loucura: se isto continuar estou a ver que tenho de tomar uma posição drástica e fazer-lhe um xi-xi para a roda do carro!....
Estou por tudo. Se não resultar, vai ser preciso pô-lo com pulseira electrónica e com apresentações regulares na minha casota. O chamado termo de identidade e residência…



Vítor Ganchinho



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