Os peixes com algum peso têm destas coisas: põem-nos a duvidar dos nossos materiais, da nossa técnica, e até das nossas mãos.
É nestes momentos que devemos acreditar que sabemos fazer, que estamos prontos para o combate, bem equipados, e que não temos dúvidas.
Os fabricantes de marcas de topo, a Daiwa, a Shimano, a Smith, a Varivas, a Shout, sabem muito bem o que fazem. Eles sabem de produtos de pesca porque a sua vida é essa, fabricar bom, com alta qualidade, para permitir bons desempenhos a quem pesca.
Deixemos para quem sabe fabricar linhas questões relacionadas com linhas. É o trabalho deles, dos engenheiros Daiwa e outros, que tornam possíveis capturas de excepção, e por isso, quando chega o momento crítico, apenas temos de disfrutar, de fazer a nossa parte, e deixar que tudo aconteça.
Foi isso que fiz dia 10.06.21, quando pescava ao pargo com jigs ligeiros, na companhia do meu amigo Carlos Campos. Tenho a rara felicidade de ter um amigo que, para além de ser uma extraordinária pessoa, um coração bom, também é entendido em imagem.
O Carlos Campos sabe muito do oficio, ou não fosse ele funcionário de uma estação de televisão. E isso tem-me permitido guardar imagens de momentos de pesca, captadas no momento certo, no ângulo certo.
Foi o caso deste pargo de que vos falo hoje, cuja captura integral tenho em vídeo. Será apresentado na loja GO Fishing de Almada, logo que nos seja possível voltar a realizar os nossos habituais workshops de pesca.
Muito provavelmente em Setembro, admitindo que a situação da pandemia estará controlada nessa altura.
Este tem sido um ano particularmente estranho em termos de calendário. Desde logo porque estivemos impedidos de sair a pescar durante quatro longos meses, …covid “oblige”…
Isso não deu qualquer tipo de protecção aos nossos peixes, já que a frota profissional continuou a trabalhar normalmente, a largar redes por cima das nossas pedras, como habitualmente.
Mas ainda assim deu algum descanso aos bichos, em termos de pesca lúdica. Sobretudo de pressão de pesca com iscos orgânicos, já que a pesca com artificiais, nomeadamente com jigs, é algo ainda algo raro no nosso país. Que bom para quem quem pesca sobretudo com jigs…a sensação é a mesma de uma criança à solta numa loja de chocolates, tendo tudo à disposição. Olhamos para os barcos ancorados ao fundo e não conseguimos ver neles concorrentes de pesca, …porque estão noutro mundo.
As traineiras não podem colocar 16 pessoas a fazer jigging ao mesmo tempo, e, dado o pouco que cobram, 20 euros, nem se podem deslocar muito. Estão pois limitados a fazer pesca ancorada, vertical, que nada tem a ver com o jigging.
O ano de 2021 tem sido excelente para a pesca do robalo e do pargo. Há muito peixe, e tem sido possível fazer pescarias muito interessantes a cada saída. Para quem conhece as pedras, o peixe tem cumprido, tem estado onde sempre esteve e a fazer o que sempre fez, comendo às horas certas da maré, muito regular, e a permitir prever antecipadamente quando vai ou não estar bom. Não se pesca muitas horas, pesca-se na altura certa, a quantidade de horas devida, aproveitando a conta de água e corrente certas.
É sempre uma pesca de qualidade e não de quantidade. O objectivo não é pescar 90 peixes, sendo que 85 desses peixes têm menos de 100 gramas. Não é por aí.
Aquilo que torna este lance “impossível” é o diâmetro da linha com que foi conseguido: PE 0.6. Ou seja, uma linha com diâmetro nominal de 0.128mm, cuja resistência máxima, para uma linha topo de gama, na circunstância uma Daiwa Morethan 12 PE 0.6, é de 5,8 kgs. |
Este é um factor que me parece decisivo quando se abraça a causa do jigging: muito rapidamente se esquece a questão quantidade, passamos a focar-nos sobretudo na qualidade daquilo que fazemos. Um dia com 5/8 peixes é um dia normal, e se pudermos ter nesse leque de exemplares um acima de 5 ou 6 kgs, já valeu a pena. Este ano tem sido excelente, mas nos anos anteriores esses números foram sempre feitos. Quando alguém que nunca pegou numa vara de jigging consegue um peixe de 3 ou 4 kgs, já tem o dia salvo. Desde que não se atrapalhe, que faça as coisas como deve ser, tem grandes probabilidades de ser bem sucedido. É para isso que o guia de pesca trabalha, para garantir que tudo se passa como é devido e que o resultado final é positivo.
A maior dificuldade é mesmo o nervoso miudinho, as tremeduras, sempre que aparece um peixe grande. Das conversas que tenho com colegas de pesca, quer novatos quer veteranos nas lides, que têm a sorte de ferrar um peixe grande, fica-me a ideia de que há uma altura em que já tudo é posto em dúvida: será que eu vou conseguir ao menos VER O QUE ESTÁ A FAZER TANTA FORÇA LÁ EM BAIXO? …
Quando o peixe puxa a sério, quando o carreto desbobina linha muito rapidamente, apodera-se do pescador uma horrível sensação de que tudo vai falhar. As mãos tremem como se tivesse Parkinson, o artista sente uns formigueiros, umas borboletas no estômago, e a primeira solução é abrir o drag do carreto e deixar ir. E a seguir a um estado de alvoroço e angústia segue-se um interminável número de manobras arriscadas, de improvisos e invenções sucessivas, em regime de aflição. Não é o momento indicado para isso.
Manter a presença de espírito para saber actuar em cada momento, controlando a situação, colocando do lado do pescador tudo aquilo que está ao seu alcance. O resto são imponderáveis próprios da pesca, e que nem sempre jogam a favor de quem está no barco.
Detalhe da cabeça e dentição deste pargo capatão. |
Há coisas que se podem fazer, e outras que nem tanto. Ter medo que o peixe fuja é meio caminho andado para que fuja mesmo! Porque a sequência de erros é tremenda, tudo aquilo que devia ser feito…não é.
E consequentemente o resultado tende para o fraco, para o insucesso, para a irreparável perda do ambicionado e sonhado peixe.
O trabalho de regulação do drag faz-se em casa. Calmamente, sem pressão, analisando as características da linha, sua resistência linear, a resistência ao nó, a capacidade de suportar a abrasão nos passadores, etc.
A lubrificação do carreto, quando descuidada, é um dos melhores aliados dos nossos peixes com tamanho. Tudo aquilo que tem a ver com trabalho de casa, tem de ser feito em casa. Nada pode ser deixado ao acaso.
Em acção de pesca, aquilo que fazemos é pescar, é divertirmo-nos, não é bater com a cana na água e praguejar porque um peixe nos partiu a linha.
Parte se não fomos suficientemente competentes, em casa, a prevenir essas eventualidades. Parte se quando fomos comprar a linha optámos pela mais barata que havia na loja. Aí sim, parte mesmo, irremediavelmente.
Aquilo que serve de motivo ao texto do blog de hoje é um pargo capatão macho que pesquei há dias. Apareceram mais alguns peixes, mas este foi de longe o mais mediático.
É sempre motivo de satisfação conseguir um peixe de qualidade e mais ainda quando o conseguimos fazer com um equipamento ultra ligeiro. Estava preferencialmente a tentar os robalos, que são fracos oponentes, rendem-se muito facilmente e não precisamos de força nem tempo por aí além. No caso dos pargos, a música é outra, e temos de fazer valer experiências passadas, saber quais os nossos limites, saber exactamente até onde podemos ir, ...ou parte. Neste caso, foram necessários mais de 9 minutos até o pargo estar a seco.
O peixe veio preso apenas pelo assiste simples de cabeça. Reparem como estava já bem aberto, a acusar os sucessivos esticões do animal. O triplo não encontrou nenhum ponto de apoio para espetar, já que a cabeça é bastante rija, com muita placa óssea.
O polvinho de vinil tem a ver com o facto de a água estar muito tapada, com muito sedimento, muita água do rio misturada. “Veste-se” o anzol do assiste, e para que fique firme, passa-se um pouco de trançado a meio, bem apertado, para fixar.
Conseguem ver perfeitamente na foto a linha chartreuse que sujeita o vinil ao assiste. O contraste do branco e preto, com o olho fluorescente, ajuda na detecção da amostra, quando as águas estão muito densas, verdes. Era o caso.
Falo-vos um pouco mais em detalhe sobre o equipamento utilizado.
Já aqui vos disse que apenas pesco com materiais de qualidade, porque os anos de pesca que me restam são para ser bem aproveitados….e por isso tenho pouca paciência para perder peixes por poupar alguns euros, adquirindo material ruim.
Carreto Daiwa Saltiga 15 HL, com manivela à esquerda. Solidez a toda a prova, uma máquina para toda a vida. Para avariar um carreto destes é preciso ser muito desleixado... |
Esta linha é algo de espantoso! Permite fazer com um diâmetro muito fino, (logo a fazer muito pouca resistência na água e por isso a descer muito rápido, o que é vital nesta pesca), aquilo que teríamos de fazer com linha muito mais grossa, prejudicando assim a descida e a apresentação do jig. Na circunstância, utilizei linha desta mas marcada com diversas cores, a cada dez metros um nova cor, o que me parece ser importante quando pescamos na vertical. |
Este fluorocarbono da Varivas é à prova de bala. O Ti Nicks Hard Top aguenta tudo o que lhe pedimos. |
A Zeake é uma marca japonesa que aposta muito no realismo dos produtos. Vejam na loja on-line GO Fishing outras cores, a imitar cavalas, carapaus, etc. Em movimento, são peixes vivos. Nesse dia, e porque tinha as águas muito tapadas, achei por bem adicionar um pequeno polvinho de vinil, do qual vos falei acima. |
Luvas, pois claro. Não temos de chegar ao fim do dia com os dedos todos cortados e espetados das espinhas dos peixes e das roçaduras da cana e carreto. Trabalhar com as mãos protegidas é algo que não dispenso. |
Este combate durou um pouco mais de 9 minutos. Para quem está dentro do barco, é o suficiente para cansar o braço. Vão ver no filme que por vezes a mão esquerda auxilia um pouco a subir a cana, aliviando a pressão, deixando descansar o braço direito. Por vezes perguntam-me o porquê de utilizar um triplo na retaguarda do jig. Não é sempre. Utilizo-o apenas em momentos em que sei que andam lulas grandes no pesqueiro, com 1,5 a 2 kgs, e são mais fáceis de ferrar desta forma. Em condições normais, utilizo assistes duplos, dois anzóis simples independentes, normalmente da marca japonesa Shout, dado que a abertura do anzol é maior do que no triplo e por isso garante mais segurança.
Estes peixes tanto engolem uma fateixa tripla, um ou dois assistes, ou uma caixa completa de fateixas ou uma saqueta de assistes. Facilmente mordem e engolem uma cavala de 0.5 kg…. inteira.
É o que dá ter geleiras Daiwa pequenas, com 80 cm,….não a consegui fechar. |
O tamanho do peixe não é o mais importante numa saída de pesca. Todos gostamos de peixes grandes, mas há que ter em conta que também é possível ter um dia muito divertido a pescar sargos ou douradas com vinis, ou mesmo com jigs minúsculos. O Light Rock Fishing é uma técnica que utiliza equipamentos muito ligeiros, ultra-light, preparados pelos fabricantes para nos transmitirem emoções mesmo quando se trata de um peixe de tamanho mais modesto. E o caminho pode perfeitamente ser esse.
Temos muito peixe interessante na nossa costa, a levantar-nos dificuldades, a obrigar-nos a ir ao fundo dos nossos conhecimentos técnicos, a levar ao limite os nossos materiais. Este caso é um bom exemplo de um peixe que teria tudo para ser mais um caso de um peixe perdido. Mas o equipamento ultraleve LRF aguentou! Tentem fazer e vão ver que se divertem. Nem precisam de peixes grandes, precisam é de peixes difíceis!...
De resto, deixem-me dizer-vos isto: dos peixes muito grandes que já pesquei, tubarões, atuns, etc, (o maior acima de 230 kgs), a memória que guardo é má, é uma memória de desconforto, de sofrimento.
Pensem nisto.
Vítor Ganchinho
Magnífico 🎣. Espero um dia pescar um metade desse...😁. Abraço e parabéns pela captura e partilha do texto.
ResponderEliminarBom dia Simão Aquilo que torna este caso interessante é a constatação de que as linhas muito finas também nos dão a possibilidade de pôr a seco peixes com algum peso. Muitas pessoas optam por colocar linhas grossas porque têm receio de que possa surgir um peixe maior. E com isso, prejudicam imenso as pescas que fazem diariamente. Estão sempre a pescar menos, porque fizeram uma opção errada. Linhas grossas dão segurança, mas roubam peixes. Com esta publicação quis mostrar que com linhas aparentemente impossíveis também se pesca. E ainda com menos que isto, o Raul Gil fez um pargo de 9 kgs em Dezembro do ano passado. É um sinal, para quem o sabe ler.
EliminarQuando pescamos fino, pescamos mais vertical, e as nossas possibilidades de conseguir animar os jigs correctamente sobem em flecha. Tenho um amigo que faz jigging regularmente. Cuida tão mal das suas linhas que não tem outra opção que não comprar mais grossas. E por isso fica limitado a cada minuto. Basta estar um pouco de vento e para ele torna-se impossível pescar com menos de 150 gr. Porque a linha faz muita resistência na água, e ele passa a pescar com o jig a 45º.....
O que ele faz é atirar pedregulhos para o fundo, na esperança que um peixe possa acreditar que aquilo faz sentido. Eu pesquei este pargo de 11 kgs com um jig Zeake de 30 gr...
Chegaram ontem do Japão mais umas centenas deles, não falta stock na GO Fishing Almada.
Abraço
VItor
Sem dúvida pescar "leve e fino" é uma sensação diferente com resultados magnifcos e mais adrenalina,aprendi isso consigo :-) Já cá moram uns jigs da Zeake a ver se em breve os molho...
ResponderEliminarAbraço
Força aí nesse kayak, Simão! Tem havido muito robalo a norte do Espichel.
EliminarAbraço!
Vitor
Olá Vitor.
ResponderEliminarNa imagem do "Parguinho", apercebo-me que o jig tem um acessório, uma pequena "lula"? quer comentar?
Olá Paulo Claro que sim, tenho muito gosto. De resto já o fiz no próprio artigo, se reparar bem. A explicação é a seguinte:
EliminarNós tivemos nesta zona, entre a Arrábida e Vila Nova de Mil Fontes, ( até onde fui de barco...não quer dizer que não estivesse suja até mais abaixo...), águas muito tapadas. Tem a ver com o facto de ter soprado vento norte durante vários dias. Isso empurra a água do Tejo e do Sado para sul, e faz com que os pesqueiros fiquem inundados de água com muitos sedimentos, tornando a visibilidade extremamente reduzida. Os peixes estão lá, mas têm mais dificuldade em caçar à vista, passam a fazê-lo utilizando outros argumentos, nomeadamente a linha lateral, olfacto. Esses sensores laterais, (dos quais já falei aqui no blog em detalhe), dão-lhes muita informação, vibrações, sabor, velocidade de deslocação, volume deslocado, ( tamanho da presa....), direcção de deslocação, etc. Eles conseguem comer em água/lama.
Porque estamos a pescar com algo que não tem cheiro, um jig, e porque estamos essencialmente a apelar a um tipo de caça à vista, a opção nunca poderia ser um jig de côr neutra, um castanho, ou verde, que iriam fazer pouco contraste com a água, que também estava castanha. Assim, optei pela colocação de uma lula da Xesta, bicolor, em que o branco é altamente visível, ganhando assim para os peixes mais um ponto de contraste, dando-lhes a possibilidade de conseguirem seguir o jig durante mais alguns centímetros, ou metros, dependendo da visibilidade da água no fundo. Nem sempre a água está igual, acima ou abaixo. Os caçadores submarinos sabem disso. Ou seja, basicamente a ideia foi, numa água suja, dar um ponto de referência ao peixe para que possa, por força da deslocação vertical do jig, ter um pouco mais de tempo para reagir e conseguir mordê-lo. Se o Paulo inverter as posições e pensar pelo lado do peixe, entende o que eu fiz. Nós tendemos a humanizar as nossas opções. Tente pensar fora da caixa, inverta o que está a fazer, colocando-se do lado do peixe....
No fundo, basta pensar que não lhe serve de nada lançar o melhor jig do mundo, a um peixe que apenas se apercebe fugazmente da sua passagem, mas que o perde de vista na água suja, de imediato, sem ter a possibilidade de reagir a tempo.
Não sei se lhe consegui explicar.
Eu faço muitas vezes isto, altero os equipamentos em função das condições em que pesco.
Quando for pescar comigo eu explico-lhe tudo com muito detalhe. Agora já só para fim de Setembro, tenho os fins de semana todos tomados, por contrato de saídas de pesca com uma agência de viagens, até final de Setembro...
Abraço!
VItor
parabéns excelente captura, ainda para mais com linhas finas!
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