Pesca para quem não tem barco

Indiscutivelmente é um handicap em termos de limitação de zona de trabalho, mas não é impeditivo de pescar, e muito menos de fazer pescas interessantes.
Fazer spinning a partir de terra é um desafio que obriga, desde logo, a conhecer a costa, a controlar muito bem as marés, a saber quais as zonas mais frequentadas.
Os bons postos são conhecidos, são muito pescados, e isso limita as boas pescarias a certas condições de mar.
Nada pior do que levantar cedo, sair da cama com frio, caminhar por vezes muitos minutos até ao local, e ao chegar ao ambicionado pesqueiro constatar que já lá estão alguns pescadores.
Quando se dispõe de um barco, a solução é sair e visitar outra pedra. Mas a pé, sem outras alternativas próximas, por vezes isso significa abortar a missão de pesca para esse dia.
Se alguma vantagem esta pesca apeada tem, é a de não obrigar às despesas inerentes a quem possui uma embarcação, as quais, para quem não sabe, são um verdadeiro pesadelo.

Vamos hoje falar um pouco no tipo de equipamentos mais aconselháveis para quem pesca de terra, deixando o surfcasting de lado, já que se trata de uma técnica que não pratico e por isso mesmo, não opino sobre ela.
O spinning de terra tem algumas condicionantes, e não é exactamente idêntico ao que se pratica a partir de uma embarcação. Há todo um conjunto de requisitos que são necessários, que o tornam diferente, e por isso é importante caracterizar esses elementos, para podermos seguir para a técnica de pesca em si.


Pescar estes peixes com jigs ligeiros pode ser muito divertido. Este é um jig da Xesta, de 15 gramas. Há versões em 5, 7, 12 e 15 gramas. A escolha deverá ser feita em função da profundidade do pesqueiro.


Quando pescamos apeados, a distância de lançamento é ainda mais decisiva. Porque não podemos contar com a deslocação do barco, da maré, do vento, temos de ser mesmo nós a sair de onde estamos, a mover os nossos pés, ou a lançar a diferentes zonas. Sob pena de pescarmos invariavelmente águas já pescadas. Para lançar a grandes distâncias, o comprimento da cana deverá andar entre 2,70 e 3 metros. Os fabricantes japoneses têm muita experiência e sabem fazer excelentes canas para esta função. As acções variam em função daquilo que é expectável pescar: é diferente tentar um robalo em Portugal, ou experimentar a lançar uma amostra numa praia de …Angola. Por isso, consideremos que uma acção mais ou menos universal seria algo como uma 15-80, algo que se enquadre a meio destes valores. Tanto lança uma amostra de baixo peso, com 12 a 18 gramas, como lança uma de 40 a 50 gramas, em dias em que o vento nos surge de frente e impede o lançamento de amostras ligeiras.
Nesses dias ventosos, não tão raros como isso, lançar uma amostra de 12 gramas é fazê-la cair aos nossos pés. Já com o vento a favor, tudo o que lançarmos vai sair disparado como um foguetão e certamente cairá mais além do que o esperado.
O peso do conjunto é decisivo para assegurar o conforto do pescador. Desde logo porque iremos lançar muitas vezes com apoios fragilizados, quantas vezes com os pés dentro de água, assentes na areia que nos foge debaixo por acção das ondas, logo este é um factor a não desprezar.
Um equipamento pesado limita os movimentos, cansa, e por isso é de apostar num carreto de tamanho 3500, como máximo 4000. Eu pesco com um 3000, desde logo porque tenho carretos de boa qualidade, porque são mais leves e porque a quantidade de linha que lhes coloco, cerca de 200 metros, é muito mais que o suficiente para a distância a que vou lançar. E não vejo por cá peixes corredores que me levem toda a linha do carreto. Porque pescamos em Portugal, uma linha multifilar 0.12mm, de boa qualidade, faz muito bem a função. Ganha-se em distância, e continuamos a ter uma reserva de segurança que pode ser importante para um exemplar de maior tamanho. Por questões financeiras, a opção pode ser de um trançado de 8 fios, mais económico. Mas penso que sabem que uma linha de alta qualidade tem 12 fios, é mais redonda, é mais resistente à abrasão que a anterior, e traz um aporte de maior duração e segurança. Mas é mais cara.
Por fim, um chicote de nylon ou fluocarbono, eventualmente entre o 0.30 e o 0.35mm, que não precisa de ter mais de alguns metros, apenas o suficiente para tornar o baixo de linha invisível aos olhos do peixe, bem como proporcionar um acréscimo de resistência ao atrito que pode ser provocado pela areia, quando pescamos nas vagas, caso se trate de uma zona baixa. Os trançados reagem muito mal a esforços de abrasão. Hoje em dia já existem versões de multifilamentos “rock fish” que são mais indicadas para zonas onde o atrito pode cortar as nossas linhas.
Relativamente às amostras a utilizar, elas não serão muito diferentes das que são usuais na pesca embarcada. Os propósitos são muito idênticos. Como factor limitante, sem dúvida o vento! É ele que, ao existir e estando de frente, nos pode obrigar a ter de fazer opções que não seriam as nossas para esse dia, ou para os peixes que esperávamos poder encontrar no pesqueiro. Se está pelas nossas costas, todas as amostras são boas, tudo é lançável sem forçar demasiado os braços e as costas. Mas se está de frente, então temos um problema!
Na minha opinião, e é apenas a opinião de alguém que faz jigging e costuma pescar peixes com esses artefactos, uma boa solução é pescar de costa utilizando pequenos jigs, com peso de acordo com as limitações que o vento nos impõe. Lançar podemos sempre fazê-lo, mas à medida que aumentamos o peso do jig, reduzimos as nossas hipóteses de apresentar o engano em boas condições ao peixe. Digamos que a boa solução é o jig o mais leve possível, mas a chegar onde queremos que chegue. Por vezes, é mesmo muito importante chegar longe, por detrás das ondas, pois é aí que se encontra o peixe.
Para quem não acredita que os jigs pescam peixe, e há muita gente ainda nesse estado, então as propostas dos fabricantes passam por amostras com um peso acrescido. Vão vê-las na GO Fishing Portugal, até às 52 gramas! A DUO, a Daiwa, a Shimano, a SMITH, têm excelentes amostras para este tipo de condições. Também existem híbridos de amostra/jig, que fazem muito bem esta função.
Os comprimentos das amostras são algo que depende directamente da expectativa de pesca que temos. Se estamos convictos de que existem robalos grandes na zona, ...vale a pena pescar com uma amostra de 5 cm boa para as bailas? Por outro lado, se apenas temos bailas, vamos pescar com uma amostra de 18 cm? Tudo depende daquilo que achamos poder fazer nesse dia, a essa hora da maré, ao peixe que temos como alvo.




Também o tipo de amostra varia em função das condições de mar. Com mar calmo, sabemos que um popper ou um stickbait podem ser eficazes, se temos mar formado, com vagas altas, essas amostras fazem menos sentido. Sempre que é possível, uma amostra de superfície é muito produtiva, e pode transmitir-nos sensações que não teremos com uma amostra de fundo. Um ataque de um robalo à superfície enche os nossos olhos de alegria! Ver o sulco de água que fazem quando perseguem a amostra, antes mesmo de a abocar, é algo de extraordinário.

A questão da pala ou não pala, é algo que nunca me cansarei de tentar desmistificar: as amostras não têm de ter pala para serem boas! Nem têm de ter esferas ou pistons, para serem boas! Nem precisam de fazer barulho para que o peixe as veja. O peixe só vê as amostras no ultimo instante, antes de as morder. Na maior parte dos casos, a visibilidade na zona de rebentação nem lhes permite ver o que seja! O peixe não funciona como nós, humanos, nem tem as nossas limitações. Poupem-me a ter de vos falar novamente na linha lateral, nos sensores nervosos. Eles sabem onde está a amostra, qual o tamanho, qual a velocidade, qual o sentido de deslocação, …sem a ver! Há inúmeros artigos anteriormente escritos e publicados no blog, vão atrás e leiam. Os sentidos dos peixes são diferentes dos nossos e por isso, uma boa amostra não tem de ter pala. Pelo contrário, em zonas muito massacradas pelos pescadores, essas amostras são as que serão sempre menos produtivas. Uma amostra sem chumbos, sem ratling, sem pala, pode ser muito mais eficaz que a versão “ Banda Filarmónica” com pala. Os peixes estão saturados de amostras com pala, que provocam vibrações tremendas, e que, em zonas onde são muito pescados, os…assustam muito mais do que atraem. Em zonas muito batidas por pescadores, os peixes fogem das amostras com pala! Sejam discretos, aprendam a trabalhar amostras sem pala, mas a fazê-lo com mestria, com conhecimento. A amostra sem pala é pelo menos tão eficaz quanto qualquer das outras. Experimentem a lançar para o mesmo sítio onde lançariam as outras, e trabalhem com o pulso, com pequenos esticões. A dada altura, parem. Após três ou quatro segundos, voltem a imprimir movimento irregular, e a seguir voltem a parar. Num destes arranques, se houver um bom robalo na zona, ele engole a amostra por completo! Se houver robalos na zona, e se estiverem a caçar, a comer, é muito mais provável que apareçam assim, com este tipo de trabalho.
A grande questão é que a maior parte das pessoas apenas quer dar à manivela do carreto, deixando à amostra o trabalho de excitação. Mas há outros mundos….


O meu amigo Luís Lemos fez este robalo de 2,5 kgs a meu lado, com um vinil, com um equipamento de Light Rock Fishing.


Finalmente, os locais a pescar: todos sabemos que as entradas de água doce são sítios em que os robalos apostam muito para procurar, e encontrar, a sua comida. As desembocaduras de um rio, de um pequeno riacho que seja, são sempre motivo para que, à hora certa da maré, tenham robalos nas imediações.
Na baixa mar, estarão mais longe, emboscados à espera dos cardumes de alevins que possam estar a afastar-se da costa por haver cada vez menos água, na enchente, e assim que o mar avança e tem a conta de água certa, o peixe sobe e procura a comida que ficou fragilizada e exposta durante a vazante.
Zero segredos para isto, é assim porque é assim e porque sempre foi assim. E se querem outra verdade insofismável, aí vai: peixe grande como peixe pequeno. O inverso é muito mais raro.
Se forem de férias com a família e tiverem a possibilidade de pescar uma zona desconhecida, fixem-se no propósito de encontrar saídas de água, obstáculos como rochas, visíveis ou não, pontões, tudo aquilo que possa dar vantagem a um predador que queira fazer uma emboscada a um peixe pequeno.
Sempre que há possibilidade de tirar vantagem de algo, o predador está lá. As últimas horas de maré, quer enchente quer vazante, são importantes, e é obrigatório estar lá. Mais que isso, e sempre que estas coincidem com o nascer ou pôr do sol, mais importante ainda estar lá.
O peixe faz a sua vida de sempre: sabemos onde está, o que faz, como faz, porque é assim que vivem e sempre viveram. Para o pescarmos sabemos que temos de utilizar, e de forma muito convicta, algo muito mais importante que canas, carretos e amostras. Mais que equipamentos de pesca, aquilo que devemos lançar para o terreno de caça dos robalos é…a nossa inteligência.



Vítor Ganchinho



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