SABER DE GAIVOTA

Não sei se têm a noção da quantidade de espécies de gaivotas que existem por cá: 19 tipos diferentes, com registo em Portugal. Existem muitas outras, mas até ao momento não constam da nossa lista de visitantes nacionais.
Gaivota-d`asa-escura, Gaivota-argêntea, Guincho, Gaivota-de-cabeça-preta, Gaivota de Andouin, Alcatraz, Gaivota parda, Gaivota de bico fino, Gaivota pequena, Gaivota-tridáctila, Gaivota-hiperbórea, Gaivota de Sabine, Gaivota-de-bico-riscado, Gaivota-risonha, Gaivota-polar, Gaivota-prateada, Gaivota de Franklin, Gaivota-prateada-americana e Gaivota de Bonaparte. E aqui têm as 19 gaivotas que têm ocorrência no nosso país.
Estes pássaros, da família dos laridae, são muito mais interessantes do que aquilo que se possa pensar à primeira vista.
Provavelmente nem acreditam, mas há pessoas que ocupam todos os seus fins de semana a sair ao mar para ver aves, e fazem um registo rigoroso das espécies que conseguem encontrar.
Eu próprio já saí algumas vezes a acompanhar clientes que a única coisa que queriam fazer era isso mesmo: ver aves marinhas. E nem imaginam como eles vibram quando encontram um cagarro, um alcatraz, ….vibram como se o clube deles tivesse marcado um golo.
Porque falamos de muitas dezenas de pássaros, passo-vos um link que podem consultar, e que está muito bem feito: www.atlasavesmarinhas.pt/


A mais comum de todas, a gaivota-argentea, Larus michahellis, uma ave que entra muito no imaginário de quem se quer lembrar de uma ave marinha.


São relativamente grandes e invariavelmente olham-nos com desdém, como se não nos valorizassem demasiado. As suas patas amarelas e uma mancha vermelha no bico amarelo não enganam.
Na verdade, é um pássaro bonito, altivo, com um voo muito bonito, especialmente quando estão perto de falésias, com correntes de ar ascendentes. Como tudo na vida, também têm os seus contras, e provavelmente o maior terá a ver com o facto de se terem “reconvertido” a comedoras de detritos humanos nas lixeiras. Em espaços abertos onde o homem deposita os seus lixos, aí estão elas, a aproveitar a oportunidade. Por esse motivo, há que ter algum cuidado porque tratamos de uma ave potencialmente perigosa em termos sanitários. Bem mais interessantes são aquelas que se dedicam a tentar comover os pescadores a oferecerem-lhes os peixes que não pretendem consumir, estando as bogas, “Boops boops”, na linha da frente.
Dou-lhes de comer, especialmente às mais novas, na esperança que se fixem, que tendam a estar no mar, em detrimento de visitarem as lixeiras. É uma ave que se reproduz com muita eficácia, e por isso atinge números que podem chegar a ser incómodos. Por esse motivo, por vezes é necessário fazer desbastes, e procede-se a um controlo de efectivos, que é a forma simpática de dizer …matam-se uns milhares para reduzir os problemas. Enquanto se alimentam dos desperdícios de pesca, até nos prestam um favor, e ajudam na higiene. O problema é que quando está mau tempo no mar, as gaivotas ficam em terra, e aí, são as lixeiras que lhes valem, e com isso, os indissociáveis problemas sanitários.
Pontualmente acontecem acidentes com pescadores, nomeadamente com pássaros a conseguirem morder ou mesmo engolir um dos anzóis das pessoas que pescam com isca orgânica.
Nestes casos devem ser trazidas ao barco, e com a ajuda de um alicate de pontas, e muito cuidado, deve retirar-se o anzol.
Chamo a atenção para o seguinte: é tão importante termos cuidado com a desferragem do pássaro quanto o de protegermos os nossos olhos de uma eventual picada. São animais selvagens e não entendem que estamos a tentar ajudar.


Aqui um juvenil, uma gaivota que ainda não se libertou da penugem castanho/cinza escuro que acompanha as aves novas até atingirem a maioridade. A partir do 2º e 3º ano de vida, as cores começam a mudar, a clarear para tons suaves de cinza e branco, e a partir daí, são adultas.


Não sei se têm ideia mas aqui há uns anos, havia um restaurante da Costa da Caparica que fazia algo a que chamava “sopa de gaivota”. Não constava do menu oficial, digamos que não existia em termos de fiscalização, mas encomendando por baixo da mesa, era possível marcar um prato de gaivota para daí a dias. Pressuponho que o método de captura era algo parecido com pesca à linha:
De madrugada, um pequeno chumbo, uma linha e um anzol, e uma isca. A pobre engolia e era arrastada até ao “ pescador”, conhecendo um fim trágico.
Sabemos que estes pássaros visitam as lixeiras, pelo que é preciso ter alguma coragem, arrojo e desprezo pela vida para que alguém se atreva a comer semelhante ave.


Não será por acaso que estas raias estão a secar penduradas com uma guita um pouco mais comprida. Se for mais curta, as gaivotas chegam-lhe, e comem o petisco.


Os pescadores mais antigos continuam a ter a paciência necessária para tratar o resultado das suas pescarias desta forma. A salga, que de resto já vimos aqui no blog anteriormente, era a forma mais segura de conservar os alimentos durante muitos meses. Quanto saber têm os pescadores mais velhos, quanto podemos nós aprender com eles?...


À primeira vista, trata-se apenas de um hélice normal. Mas quem trabalha com redes e não tem a possibilidade de mergulhar, tem de encontrar outras formas de se desembaraçar de um pano de rede que, inadvertidamente, ficou enrolado no hélice. O que torna este hélice diferente é a lâmina de protecção que tem à sua frente. Reparem bem na peça em frente ao hélice: aqui mal a conseguem perceber. Vejam a foto seguinte. 


Aqui está! Uma engenhosa forma de cortar pano de rede, para que o hélice fique liberto e não origine problemas bem maiores. A rede cose-se, mas ficar no mar pode ser bem mais complicado porque há dias em que ficar lá pode significar a morte.


Estas gaivotas estão aqui num período de vazante, e não estão propriamente na praia, ….estão a procurar comida. Quando a água vai, fica muito animal refém da vazante, e perfeitamente acessível a estes pássaros. Falamos de caranguejos, camarões, teagem, ouriços, peixes mortos, etc. Não falta comida.


Pontualmente conseguimos obter financiamentos de Bruxelas, para projectos de controle de natalidade. Um desses projectos, do qual omito propositadamente o nome, conseguiu uma verba à volta de 1,5 milhões de euros, com o objectivo de desenvolver acções de controle e conservação de espécies de aves marinhas raras. Sabem o que isto quer dizer: são 10.000 euros para comprar veneno para os ratos e pôr dentro de umas “sandochas” que se deixam esquecidas no chão, ou para envenenar uns quilos de sardinha, e o resto fica para comprar uns barcos. Assim aparecem os “Lucky me” das nossas marinas.
Muito provavelmente seria mais fácil e barato contratar o homem da Caparica por meia dúzia de dias e deixá-lo fazer as suas “sopas de gaivota”.


Será que sabemos assim tanto sobre a vida de uma gaivota? Esta acha que não... Fantástica foto do meu amigo Carlos Campos.



Vítor Ganchinho



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