ADIVINHEM O QUE ANDA ALI...

Para quem está habituado a nadar no mar tudo interessa, tudo conta, tudo pode ser um sinal de que algo se está a passar nesse momento.
São as correntes que se cruzam num ponto preciso, são águas de diferentes densidades, de diferentes concentrações de fitoplâncton, logo de diferentes cores e níveis de visibilidade, são os borrifos de espuma feitos pelo vento na mudança da maré, são os animais que dependem de saber onde estão os cardumes de comedia.
Os golfinhos, os espadartes, os atuns, os gansos patolas, alcatrazes, os cagarros, as gaivotas, tudo precisa de se alimentar, e não podem andar por ali para se….divertirem.




Quem sabe observar pode tirar partido de muitos detalhes e situações que, por contra, quem anda distraído nunca poderá entender.
Aquilo que vos trago hoje é um acontecimento diário, a alimentação dos pássaros. Todos os dias acontece, e basta estarmos focados para podermos encontrar aquilo que podem ver abaixo:




Os alcatrazes não mergulham propriamente para…”tomar banho”. Na verdade, eles não gastam uma réstia de energia sem um bom motivo, desde logo porque lhes custa muito a consegui-la.
Se há peixe na zona, se ele está a poucos metros da superfície, há que aproveitar a oportunidade. Na circunstância, algo empurra os cardumes para um patamar onde se tornam acessíveis a partir do ar.
Os pássaros apenas tiram partido da necessidade dos pequenos peixes, e falamos sobretudo de cavalas, carapau, sardinha, se chegarem acima, numa tentativa de escapar a predadores que os apoquentam a partir do fundo. Podem ser golfinhos, o mais comum, mas também podem ser atuns, pargos ou corvinas, robalos ou sarrajões. Há bem pouco tempo, numa das minhas saídas a partir de Setúbal, vi uma passareira enorme feita por robalos.
Podemos olhar para estes casos sob perspectivas diferentes:

1- A captura de isca para as nossas pescas com vivo. Se temos os peixes a rondar a superfície, e mesmo que algo temerosos por qualquer coisa que passa abaixo, a verdade é que picam sempre. E assim, isso garante-nos isca viva para o dia. Em poucos minutos podemos fazer cavalas para o dia, as quais cortaremos em filetes, ou iscaremos inteiras e se possível, vivas. Mas esta é uma reacção básica a uma passareira. Podemos fazer melhor….

2- Podemos por exemplo ser pacientes, mais selectivos, e tentar ver o que está a empurrar para a superfície esses peixes. Caso sejam os golfinhos, está resolvido, é deixar ir. Mas pode ser qualquer outra espécie e nesse caso, é de bom tom não estragarmos tudo por não sabermos fazer. É natural que não possamos conduzir o barco a toda a velocidade contra esta concentração de vida. Se o fizermos, desmanchamos o encanto do momento, os peixes vão entender o ruído do motor, os pássaros voam para longe, onde se sintam mais abrigados e confortáveis, e tudo acaba. No fim, teremos meia dúzia de penas dos gansos patolas à superfície, e nada mais.

3- Nestes casos, aproximamo-nos a uma velocidade regular, e antes de estarmos a incomodar quem está, vamos rapidamente procurar entender quais as condições de deriva: queremos saber de onde vem o vento, para onde corre a corrente nesse momento, e, a uma boa centena de metros, deixamos o barco derivar, com o motor desligado. A passarada acaba por sair, por ganhar o largo, mas os peixes ficam por lá, e com menos essa pressão em cima, o que nos favorece.
Temos a marcação visual que fizemos da zona, a qual corresponde ao perímetro onde os gansos patolas estavam a cair, e a partir daí, passamos a trabalhar com a sonda.

4- Aquilo que procuramos, no caso de robalos ou pargos, por exemplo, são duas situações distintas: tratando-se de robalos, estarão alvorados, a maior parte deles bem perto da superfície, a cinco, dez metros da primeira capa de água. Pescam-se com equipamentos de spinning, a lançar longe, a trabalhar as amostras com muita atenção a possíveis ataques, os quais podem acontecer mesmo até junto ao barco. Caso consigamos alguns, vamos observar que a partir daí os peixes afundam, e vão para cotas mais baixas. Mas continuam a comer.
No caso dos pargos, o mais natural é que estejam do outro lado do canal, do lado oposto, ou seja, nos cinco a dez metros mas acima do fundo, e bem longe da superfície. Neste caso, a sonda passa a ser preciosa. Depois de detectados, é tempo de atacar com jigs, no caso de estarmos sobre uma zona profunda, ou, no caso de haver apenas 15 / 20 metros de água, com vinis equipados sobre um cabeçote de chumbo ou tungsténio. Os vinis sempre melhores que os jigs, até uma determinada profundidade.

5- Mais raramente acontece termos os atuns por baixo, mas nesse caso, ou temos material forte, que aguente pancada, ou devemos abster-nos de lançar. Eu tive atuns de 50/ 60 kgs colados ao barco há cerca de dois meses, e não tentei, por saber qual o resultado disso. Ter a bordo uma cana dedicada a esse tipo de pesca mais rija não é asneira. Pode sempre acontecer, sobretudo nos meses mais querençudos de atuns, o Abril / Maio, e depois o Agosto / Setembro, ou seja, os peixes que entram do Mediterrâneo e os peixes de retorno, que saem, depois de desovar. Estes peixes estão mais magros, mas famintos, e muito disponíveis para as nossas iscas. Neste caso, pescar com cavala viva pode resultar bem.

6- Atenção a um detalhe que me parece importante: vermos golfinhos a sulcar a superfície não significa que sejam apenas eles a contribuir para a arribada dos cardumes de comedia. Muitas vezes, acontece que o trabalho é feito em conjunto, um mano a mano em que os golfinhos sim senhor, estão acima, mas há algo mais abaixo, na casa dos 20 a 30 metros: os atuns.

Tudo começa por observarmos os pássaros. Se não soubermos o que estão ali a fazer, se acharmos que estão apenas entretidos a mergulhar de cabeça na piscina, para refrescar,…então não é nada connosco, apenas passamos ao lado.



Vítor Ganchinho



Artigo Anterior Próximo Artigo

PUB

PUB

نموذج الاتصال