ENCONTRAR PEIXES APÓS A PASSAGEM DE UM TEMPORAL

Sabemos que durante o tempo de Verão e Outono, temos no nosso país uma situação de mar bastante estabilizada. Raramente temos ondulação que se veja.
Os peixes estão nos seus postos de caça regulares, sabemos onde os encontrar, e com mais ou menos esforço, acabamos sempre por pescar uns peixes bons.
Digamos que beneficiamos de ter o peixe fixo no seu habitat, e de o termos referenciado: sabemos onde está.
Com mais ou menos técnica, com melhores ou piores equipamento de pesca, todos podemos pescar algo.
Mas a entrada do Inverno, as suas depressões, os seus sistemas frontais, e a inevitável instabilidade das condições de ondulação acabam com essa paz.

Desde logo porque mudam as condições para algo de muito importante na vida dos peixes: a sua alimentação. A mudança de temperaturas de água, a chegada das primeiras chuvas, as diferenças de salinidade, tudo isso afecta a presença de seres microscópicos e em seguida toda a cadeia alimentar que depende de si. Por outro lado, durante todo o período de estabilidade, os pequenos peixes alimentaram-se, cresceram, já estão maiores, já aguentam mais mar, e sobretudo já sabem mais.
Deixaram de ser os peixinhos indefesos e inocentes, de captura fácil. Desconfiam da fartura de ver aproximar os predadores, e passam a ser mais capazes de zelar pela sua vida. Também a temperatura das águas baixa drasticamente e isso força tudo e todos a encontrar novas formas de protecção. E por fim, chegam as tempestades.


As forças envolvidas num estado de tempestade são tremendamente fortes e poderosas. Junto à costa é difícil ficar.


Num temporal, nada pode ficar estático. Se o predador tem sempre de se preocupar em estar por perto da sua comida, há um momento em que a procura de comida já não é a prioridade. Há um momento em que tem de zelar por algo ainda mais importante: a sua vida.
Quando temos ondulação de 5/6 metros, os postos de caça mais baixos deixam de estar operacionais, o peixe não os pode utilizar. São situações extremas, em que apenas os mais dotados, os robalos, os sargos, conseguem aproximar-se um pouco mais da costa, quedando-se pelas zonas limite, onde ainda existe alguma visibilidade, e o risco de acidente é aceitável. Haver comida disponível, destapada pela agitação marítima, é uma razão para que não estejam longe, mas tudo tem os seus limites, e a sobrevivência impõe-se a tudo. Não é bom para nenhum ser vivo ser apanhado no meio de milhares de pedras e areia projectada.
Não sei se têm a noção do que será estar no meio de uma tempestade de mar. Quando temos vagas que se deslocam a alguns metros por segundo, estamos perante uma força altamente destruidora.
Se acham que não é assim tanto, então digo-vos que é uma violência parecida com isto: uma massa de água com milhares de quilos de peso que embate contra uma rocha e levanta 7 ou 8 metros acima do nível do mar. Há pedras com toneladas que são arrastadas dezenas de metros. São forças tremendas.
Os peixes não têm medo do mar, mas só lá estão quando existem condições para isso.
Os peixes menos dotados afundam, afastam-se para zonas seguras. O peixe espera o seu momento, e isso acontece quando o mar dá tréguas, quando volta a acalmar.


O peixe afunda, vai para profundidades onde possa encontrar alguma estabilidade.


E que acontece aos peixes mais pequenos? Aqueles que são as presas habituais dos mais crescidos, são apanhados a meio de um temporal, e sofrem com ele. Desde logo porque são jovens, são pequenos, são imaturos, e podem não saber o que fazer.
Por falta de experiência, são sempre quem mais sofre. Pela falta de habituação, mas também por sentirem que de um lado está a costa, as paredes de rocha batida que a essa altura é inabitável, que não lhes pode oferecer refúgio, e do outro os seus predadores, que os esperam num terreno onde
os juvenis não têm a vantagem de se poderem esconder. É isso que atrai os robalos à costa quando o mar levanta! Sabem que vão ter oportunidades que de outra forma seriam mais difíceis de conseguir.
Iremos encontrá-los precisamente nas zonas mais batidas pelas ondas, onde o mar esteve mais implacável. É aí que as suas possibilidades de encontrar alimento aumentam.


Os peixes mais pequenos são forçados a deixar as suas zonas de refúgio, e vão meter-se na boca dos predadores, que os esperam.


O processo de agitação marítima não dura semanas, há sempre momentos de alguma acalmia, que os peixes nunca sabem quando irá acabar. Cada tentativa de voltar ao ponto de partida pode ser fatal. Muitos irão morrer, e serão vítimas dos caranguejos, dos polvos, dos safios, em suma dos predadores necrófagos.
Se é verdade que nos funerais há sempre quem chore e quem venda lenços para enxugar os olhos, também na natureza aos desfalecimentos de uns correspondem sempre as oportunidades de alimentação de outros. A selecção natural trata de aperfeiçoar as capacidades de uns e de outros, sendo que no fim, deverá existir um equilíbrio funcional. Os peixes deixam as suas zonas seguras, sobem na coluna de água, e aproximam-se das zonas mais baixas. Vão procurar comida. Mas estarão em trânsito, em movimento, e nesse processo necessitam de tempo.




Assim, devemos pensar que ao saímos ao mar no dia, (ou dias), a seguir a um forte temporal, dificilmente iremos encontrar tudo igual ao que estava. Seguramente não está. Podemos até ver ainda pouca vida nas pedras onde antes, durante o período de mar estável, havia bastante.
As tempestades são uma forma natural de baralhar e dar jogo de novo, em que os mais aptos encontram sempre forma de sair a ganhar. O mais natural quando lançamos as nossas linhas na água logo a seguir à pancada mais forte, é que tenhamos menos possibilidades de sucesso. Não é logo de imediato que iremos ter as melhores oportunidades. Com o passar das horas e dias, as nossas chances aumentam. Tendencialmente, vamos encontrar o peixe a procurar e a encontrar comida fácil, (todos os seres que pereceram durante o período de instabilidade), mas isso tem timings certos.
Nestas alturas, em final de temporal, pode até acontecer que piorem as nossas hipóteses de ter sucesso na pesca. Comida disponível existe, em grandes quantidades, e pode por isso mesmo haver menos procura e apetência pelos nossos iscos. É um período transitório, que passa. De início, o peixe está farto, bem alimentado, há muita comida desenterrada, morta, as pedras ficam lavadas, sem plantas de folhas largas, partidas pelo mar, e por isso com menos esconderijos.
No entanto, a evolução será a nosso favor. Progressivamente os predadores, que estão num período pré-desova, precisam de energia, estão com fome. Porque nesta fase estão sempre com fome.
Por outro lado estiveram descansados, sem amostras, sem iscos com anzóis. Isso vai torná-los menos cuidadosos, mais receptivos às nossas "propostas"...

É esperar pela nossa oportunidade.



Vítor Ganchinho



Artigo Anterior Próximo Artigo

PUB

PUB

نموذج الاتصال