QUANDO FALAMOS DE ATUNS, ... QUE SEJAM ATUNS A SÉRIO!

Algumas pessoas têm dos atuns uma ideia difusa, de fantasmas que existem mas não podem ser encontrados.
Falamos de grandes caminhantes do oceano, peixes que têm um rumo, sabem para onde vão, e cumprem a sua rotina anual com uma precisão matemática.
A nós, pescadores de Setúbal, Sesimbra, Sines, toca-nos a sua presença aquando da entrada no Mediterrâneo, no final da Primavera e a seguir, o seu retorno a águas abertas, no final do Verão. Sobem a partir do Estreito de Gibraltar e tomam rumo norte, a seguir cardumes de comedia. Chegam aqui ávidos de alimento, e nós têmo-lo em abundância, ainda.
A quantidade de sardinha, cavala e carapau que existe na nossa baía atrai estes gigantes e por vezes é possível vê-los a pouco mais de 100 metros da praia, a profundidades que não excedem os 20 metros. Não é por acaso. Os cardumes de que se alimentam, ao sentirem a pressão predatória destes colossos, encostam a zonas mais baixas, tentando escapar tanto quanto possível a uma morte certa.
Este ano vi-os por diversas vezes, embora infelizmente nunca em momentos em que tivesse à mão uma cana de spinning pesado. Passaram-me num dos dias a poucos metros do barco, não mais de 20 mts, na sua faina de engolir cavala de forma desenfreada.
No Algarve os encontros são frequentes, é zona de passagem e por isso estarão mais próximos deles, e durante mais tempo, mas mais a norte não nos podemos queixar muito: têmo-los e podemos ensaiar a sua pesca se houver equipamento pesado e força no braço que chegue.




São barris! O atum grande é um concentrado de músculos, uma bomba de energia que rebenta a partir do momento em que sentem a prisão do anzol.
A este nível, nada pode falhar. Se pescamos com um anzol barato, uma linha de segunda…”linha”, um carreto menos robusto, ou uma cana mais frágil, é certo que o vamos perder.
Começamos a ter alguma chance quando conseguimos colocar do nosso lado o máximo possível de probabilidades. E isso implica ter alguém a conduzir o barco com conhecimento de causa, com experiência do que deve e não deve fazer. Conseguir pescar um atum grande sozinho na embarcação não é impossível, mas é raro. Ser capaz de suster um mastodonte que puxa e repuxa em todas as direcções, que cruza o seu posicionamento com a deslocação do barco, que tenta passar por baixo do hélice, …será tudo menos fácil. Segurar numa cana e dar luta a um peixe destes e manobrar o barco com mestria são duas tarefas difíceis, que exigem alguma habilidade.

Há gente que acaba por se especializar na sua pesca. Conheço no Senegal quem se dedique a este tipo de pesca, que confesso não é o meu, embora já tenha tido os meus momentos, as minhas capturas.
Mas não me revejo na situação standard de me sentar numa cadeira de combate e de ter equipamento de Big Game que faz muita coisa sozinho. Vejam na imagem abaixo o tamanho dos carretos que trabalham estes peixes.
As canas e linhas estarão a condizer em termos de robustêz.
Definitivamente prefiro uma situação de pesca em “stand-up”, em que o pescador acaba por ter um pouco mais de voto na matéria.
Será mais sofrido, o combate é mais longo, mas indiscutivelmente o prazer de conseguir puxar ao barco um destes enormes peixes será maior.


O jantar é sushi...


Já aqui vimos algo sobre os equipamentos necessários, todavia nunca será demais recapitular:

Cana- Invariavelmente curta, de talão forte e preparada para um esfoço máximo. Uma boa opção é a cana PENN International V TUNA 561 Troling, com uma acção de 50 a 130 libras. Vejam as características:

Trata-se de uma cana com um custo de 344 euros, e serve exclusivamente para pescar peixe grosso.


O carreto que faz pendent é uma máquina de enrolar linha em condições de grande pressão, o PENN 80 VSW de 80 libras, preparado para aguentar pancada.


Falamos aqui de um carreto com um valor de mercado de 844 euros, a peça mais cara do conjunto.


Esta sequência de fotos foi-me enviada por um amigo de longa data, o meu inseparável Mohamed Sow, senegalês de quem tanto já vos falei aqui no blog.


As linhas a utilizar serão as adequadas a um esforço de tracção contínuo, e prolongado no tempo. Critérios como a resistência à abrasão, ao aquecimento provocado pela sua passagem nos roletes da cana, devem ser consideradas.
Pela parte que me toca, confio em linhas Varivas, à venda na GO Fishing Almada, em bobines de 1000 metros. É importante que a linha não tenha pontos fracos, zonas roçadas no caso do barco, na pôpa junto ao motor, etc, pois a menor fragilidade será o suficiente para que tudo possa correr mal. Um peixe destes não tem preço, a alegria que nos oferece a sua captura só pode ser suplantada pela tristeza de quem o perde porque quis aproveitar meia dúzia de metros de linha que já não estava em condições. Quando o fio parte, é uma tragédia, uma dor que persiste durante semanas.
De notar que não é a linha do carreto que irá ser, na maior parte dos casos, decisiva. A parte que irá determinar a captura, ou não, é o leader, a baixada de nylon que irá ligar à amostra ou ao anzol, se for o caso de pescarmos com isca viva.
Com efeito, e por mais que vos pareça estranho, não é durante a hora, ou horas de combate que corremos mais riscos, mas sim quando o peixe, já cansado, se deixa chegar ao barco. É aí que tudo se decide! E nesse momento, nada mais frustrante que tentar lançar a mão ao terminal e ver que ele cede no último momento. Não imaginam a quantidade de vezes que isso acontece.


Indiscutivelmente são grandes, …sem dúvida.


O atum irá, perante a presença do barco e das pessoas que estão no seu interior, fazer um último esforço para afundar. Nesse momento, a linha que temos na mão deverá ser suficientemente robusta para nos permitir “mandar” no peixe.
Já não é o momento de dar linha, de trabalhar com a embraiagem do carreto, é tempo de impor a vontade pela força. Nunca esquecendo que estamos na presença de um animal que tem mais força que nós. O facto de o termos conseguido encostar ao barco não significa que esteja vencido.
Temos em Portugal muitos e bons especialistas deste tipo de manobra, e cito o meu amigo amigo Carlos Palhinha, da bonita ilha de S. Miguel, como uma das pessoas que conheço com mais experiência nestas lides. E diz o Carlos algo como isto: “no carreto qualquer coisa serve desde que aguente alguma pressão, mas no leader é bom contar com um nylon de 2mm. E às vezes não chega”...
A baixada onde iremos colocar as nossas mãos, já depois de termos trabalhado o peixe, a cana e carreto, é o elemento que nos irá permitir sujeitar o atum de forma a podermos actuar sobre ele. Ou para o marcarmos com um tag de referência, ou para, sendo o caso, de o embarcarmos.


Um peixe do tamanho do rabo deste atum já seria grande para o padrão nacional...


Os anzóis deverão ser suficientemente resistentes para poderem suportar as investidas do atum, pois irão ser colocados à prova diversas vezes. Na sua correria de afunda/sobe, cruza e descruza, irão sofrer esforços de tracção muito significativos.
Cada vez mais estes peixes são pescados e soltos a seguir, depois de devidamente oxigenados. Esta fase é decisiva para a sobrevivência do peixe, já que deu tudo de si na sua tentativa de se soltar.
Não são raros os casos em que o peixe acaba por cair para os abismos, sem a reacção de movimento que lhe permitirá a entrada de água nas branquias e a consequente oxigenação. Talvez não saibam, mas quando se dá um caso de um atum que morre em combate, por esgotamento, se isso acontecer com o peixe a uma profundidade significativa, não o iremos recuperar. É virtualmente impossível levantar o peixe fazendo força pela linha do carreto, o peso é demasiado e a linha rompe. Por isso precisamos que o atum nade, que se debata, que prossiga o seu esforço de natação até o termos à superfície. É aí que o queremos, e que iremos decidir o que fazer com ele. Não vejo necessidade de mais que umas quantas fotos e a sua restituição ao meio líquido, mas muita gente insiste em “trazer para casa”, em comer o resultado da pesca.
Imaginem o que fazer a um peixe de …300 kgs. Para que quer alguém 300 kgs de atum? Mesmo dividido por muita gente, continua a ser demasiado atum. Tenho a experiência própria de ter guardado uma captura, e dos problemas que se seguiram: fiquei com 1 kg para mim, e o resto andei a oferecer, pedindo por tudo para que aceitassem ficar com ele. A resposta mais comum foi “ só quero um pedacinho, não tenho frigorífico para isso”.
Não vale a pena. Uma boa foto, em ambiente marinho, e um “vai, atum…és livre” …enchem-nos bem mais as medidas.
São um património dos oceanos, fazem falta e devem ser preservados.

Vou voltar a este tema, mostrando-vos algo mais.



Vítor Ganchinho



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