As águas já estão frias.
As noites arrefeceram muito, a ausência de vento trouxe algumas geadas, e junto à costa, em zonas mais costeiras, os peixes, por força das temperaturas muito baixas, começam a rarear.
Foram para zonas mais confortáveis, onde o dispêndio de energia é bastante menor.
É tempo para os procurarmos noutros locais, é tempo para irmos aos pesqueiros que nesta altura são mais produtivos: os grandes fundos.
Pescar à mão a profundidades de 120, 150, 180 metros, é um árduo sacrifício físico que não se deseja a ninguém. Ao fim de meia dúzia de lances, e sobretudo se forem daqueles em que apenas aparece um pequeno peixe, ou mesmo nada, temos o pescador esmorecido, sem ânimo para continuar.
A única forma de tornar aceitável e porque não dizê-lo... produtivo, é a utilização de equipamentos desenhados para pescar nessas situações extremas. E obviamente falamos de canas de profundidade e de carretos eléctricos.
Reparem no apoio que uma cana deste tipo dá à linha. A quantidade de passadores faz o acompanhamento do multifilamento de forma muito suportada, sem grandes distâncias entre pontos de contacto. |
Se é possível pescar com uma cana vulgar, construída com o único objectivo de ser barata? Sim, claro que sim.
Sobretudo se não tivermos amor à linha trançada. Se acharmos que podemos trocar de linha do carreto a cada semana de pesca, então sim, uma cana “qualquer” serve perfeitamente.
Se quisermos poupar a nossa linha e mantê-la em boas condições de utilização durante anos, então a qualidade dos passadores, a capacidade de refrigeração do metal dos anéis, a não existência de micro fissuras nestes, e mais uma quantidade de detalhes serão sempre importantes. A maior parte das pessoas compra canas olhando ao seu preço. Exclusivamente isso. É deitar dinheiro fora. A seguir comprarão a outra cana, a que deveria ter sido a primeira opção.
Acaso pensamos nos milhares de quilómetros de fio que passam pelos passadores de uma cana quando pescamos um ano a 100 metros de fundo? E se pescamos com carreto eléctrico, …qual o efeito que a acrescida velocidade de recuperação terá sobre eles?
Será que há desgaste? É possível que uma linha áspera passe indefinidamente por uma superfície lisa sem lhe causar desgaste? Nunca esqueçam que a cana que temos nas mãos é um objecto delicado, sensível, que para nos servir bem tem de cumprir inúmeros requisitos.
Desde logo tem de ser ligeira, sob pena de nos cansar excessivamente. Os carbonos vieram resolver esta questão, mantendo ainda máxima rigidez da vara. A seguir deve ter diâmetro reduzido, para não oferecer demasiada resistência ao vento.
Também deve ter um bom balanço de peso, desde a base à ponta. Deve assentar-nos na mão e ter aí o seu ponto de equilíbrio. Acaso aceitaríamos e conseguiríamos pescar segurando na cana ao contrário, pela …ponteira?
Alguém calculou o ponto de equilíbrio à grama, e esse alguém é um engenheiro especializado na função.
Uma boa cana tem ainda uma diversidade de funções, que normalmente não equacionamos quando estamos a pescar. São elas tão diversas quanto a fácil detecção da picada, (e para isso a cana tem de ser sensível na sua extremidade de topo, mais fina precisamente por isso), a capacidade de ferragem, a transformação da subida vertical da linha em movimento horizontal, directo ao carreto. Também deve permitir um enrolamento eficaz e tanto quanto possível isento de arritmias, (se a cana vibra permanentemente dificulta o trabalho do carreto, não lhe permitindo uniformidade na tensão e distribuição da linha) e deve ainda fazer o amortecimento da luta do peixe, ou seja a absorção de impactos, etc.
Por fim, parece-me útil referir que o comprimento do cabo da cana deve ser confortável, para que a possamos colocar na posição certa. Não esqueçam que a prática continuada de pesca sem o devido apoio pode provocar-nos lesões musculares e, se repetidas durante meses ou anos, mesmo lesões ósseas.
O pescador executa um movimento brusco, violento, aquando da tentativa de ferragem. Quando isso é repetido dezenas ou centenas de vezes, estamos a criar um desequilíbrio muscular entre os lombares e trapézios de um lado e outro do corpo.
As boas canas ajudam muito. Mas são mais caras. No fim, tudo se paga em saúde e peixe. Em peixe que se captura, ou em peixe que …não se captura.
Aqui eu estava a pescar a cerca de 150 mts, aproveitando o facto de os gorazes estarem nesta altura do ano mais acima do que o habitual. “Em Janeiro, vem o goraz ao ribeiro”... |
Podemos não querer pescar demasiado fundo, mas isso não é um óbice a que se consigam peixes interessantes. O critério está bem longe de ser “mais fundo maior peixe”.
Em pesqueiros de 80/ 100 metros podemos fazer pescas interessantes. Aquilo que devemos ter em consideração é que as espécies se encontram escalonadas por patamares de utilização dos fundos marinhos. Não será fácil encontrar chernes a 50 metros de fundo, nem meros a 300 metros de fundo. Há um padrão de comportamento. Os besugos estão acima dos gorazes. Os cantaris estão abaixo dos sargos. Assim sendo, em função das profundidades que escolhermos assim serão os resultados obtidos relativamente a esta ou aquela espécie.
Um carreto Daiwa Seaborg 300 faz um trabalho impecável. Podemos pedir-lhe tudo: velocidade, força, fiabilidade. A bateria de lítio da Daiwa dá-nos autonomia para muitas horas. |
Pescar com baterias de carro a 12v será tudo menos prático. Desde logo porque implicam a ligação a um cabo de transporte de energia.
E isso quer dizer menor mobilidade a bordo. As baterias de lítio vieram resolver esta questão. Para bolsas menos recheadas, uma outra solução possível é a utilização do mesmo modelo de bateria, mas com pilhas de Níquel-Cadmio, que, sendo eficazes, são no entanto muito mais baratas. Não há bela sem senão: porque não são da marca do carreto, a garantia do fabricante de carretos perde-se.
O peso é de tal forma ligeiro, cerca de 250 gr, que acaba por não se notar no conjunto total da cana.
Muitos peixes de fundo, como os gorazes, os cantaris, os besugos, as abróteas, eventualmente algum cherne, são alvos para a pesca de fundo com carretos eléctricos. |
O tempo está para este tipo de pesca. A Primavera ainda demora umas semanas, e com ela vamos ter outros peixes disponíveis. Mas agora é aproveitar para tentar peixes que noutras alturas poderão não ser a nossa primeira preferência. Um besugo gordo, assado na brasa com escama, …marcha. Não é um troféu de pesca, mas também não tem do o ser.
Vítor Ganchinho