A pesca nestes próximos três meses, é particularmente interessante. Não demasiado fácil, e precisamente por isso, interessante, pelas dificuldades que nos levanta.
Vamos encontrar os peixes a despertar de uma letargia de Inverno provocada por um arrefecimento acentuado da temperatura das águas.
Os primeiros raios de sol da manhã, a partir de Abril, vão encontrar os peixes a chegar aos pesqueiros habituais, com vontade de aumentar de peso, de recuperar forças, de aumentar os índices de gordura corporal perdidos durante os longos e penosos meses de Inverno. O peixe teve um período de alguns meses em que foi obrigado a recorrer às suas gorduras, para compensar as baixas temperaturas do meio líquido circundante.
Mas pouco a pouco, paulatinamente, vamos assistir a um aumento de alguns graus centígrados, e isso vai pôr todos os bichos a mexer.
É tempo para pescas que exijam um pouco mais do peixe, da sua motivação e condição física. Este é um tempo para utilizar amostras mais rápidas, de tamanhos intermédios a grandes, recolhidas a velocidades um pouco mais rápidas que aquilo que fizemos com as águas muito frias.
E eles vão ser capazes de corresponder, porque as águas ainda estão bem oxigenadas, os temporais de ondas e vento deixaram as águas no ponto certo para eles estarem com vontade de correr. Bem diferente será quando aquecerem a sério, reduzindo o teor de oxigénio, e limitando a actividade do peixe aos primeiros e últimos minutos do dia. Mas isso começa apenas em Junho, Julho.
Uma boa base de trabalho para compreendermos as características únicas da pesca primaveril é pensarmos no tipo de iscas que os predadores agora procuram. Muitos deles focam todas as suas atenções num tipo de presa específica.
Se houver caranguejo pilado em grandes quantidades, é por aí que vão, e as nossas possibilidades reduzem bastante. Mas quando não há, ainda assim somos obrigados a entender qual a preferência do momento. Não há nada de mais ingrato que a Primavera para tentar adivinhar o que “está a dar” no dia, porque a variedade de possibilidades é máxima! Comparado com outras estações, esta é a que mais dificuldades levanta. É possível encontrar robalos a perseguir um cardume de sardinha grande, que ficou do ano passado, há lulas pequenas, saídas da desova de Janeiro, as cavalas começam a chegar aos pontos habituais, os carapaus estão a top, muitos e gordos, as galeotas estão em deslocação permanente, enfim, há muitas possibilidades de encontrar comida.
A variedade e quantidade de iscas disponíveis resulta em dificuldades para quem pesca. As presas potenciais estão muito dispersas, podem estar perto da superfície ou muito junto ao fundo, e isso também dispersa sobremaneira os predadores.
Não nos ajuda em nada a nossa função de os encontrar e fazer uma pescaria avultada.
Se estamos a pretender espreitar locais rasos e próximos da costa, vamos ter de esperar um pouco, os melhores resultados surgem um pouco mais à frente, início de Verão, Junho, por aí, com águas quentes e o peixe muito encostado a terra.
Se por outro lado vamos para locais fundos, então é dar tudo agora em Março, Abril, Maio, em que a temperatura das águas ainda está fria, e ainda há termoclinas que favorecem a existência de peixe a cotas mais profundas.
A partir de Junho, a amplitude de deslocação de comedia é tão grande que pode variar dos 8/ 10 metros, ou até menos, aos 70/ 100 metros. E neste espaço tão largo, há peixes para todos os gostos.
As variações têm muito a ver com a presença ou não de cardumes de comedia, sardinha pequena, por exemplo. Se houver bolas de sardinha, o peixe segue-as e não quer saber de mais nada. Basta-lhe estar por perto. E neste caso, o predador torna-se surpreendentemente selectivo.
Caso lancemos uma amostra de algo um pouco diferente, e a cotas diferentes, não pega. Por isso resulta ter uma caixa de amostras variadas, e até iguais mas de diferentes tamanhos, e tentar acertar na boa, naquela que nos irá encher a caixa de peixe.
Como base, podemos pensar que a cor natural da sardinha será a que melhores resultados dá nesta altura do ano. Relativamente a profundidades a explorar, tudo depende das zonas onde estamos, mas ter um olho na sonda e procurar cardumes ajuda muito. E a seguir, ter a amostra que desce a essas profundidades, se à superfície, um stickbait, se um pouco mais abaixo, uma amostra de pala mais ou menos comprida, afundante. Se estiverem mais fundos ainda, na ordem dos 20 metros, então a solução é avançar para um vinil com cabeçote de chumbo. E se estiverem ainda mais fundos, abaixo dos 30/ 50 metros, então passamos aos jigs. Sabendo que as nossas possibilidades são máximas com um bom vinil…as vibrações que emitem são um apelo irresistível para um predador.
Como alternativa, temos as crias das lulas, que nesta altura terão pouco mais de 3 a 4 cm de comprimento, e que podem ser “reproduzidas” através de jigs ligeiros. A Zeake tem alguns modelos que são muito compactos e que resultam muito bem neste período em que os predadores focam as suas atenções na obtenção deste tipo e tamanho de iscas. Aqui, as cores brancas e metalizadas são as mais eficazes.
Escolher uma amostra de acordo com aquilo que o predador consegue encontrar no seu meio ambiente é uma medida que garante resultados. Configurar um jig ou qualquer outro tipo de amostra de acordo com o padrão ajuda, e mais ainda se reduzirmos um pouco o tamanho. Se temos sardinhas adultas, com 20 cm, a utilização de uma amostra com 14cm potencia os ataques. Os mais novos são menos experientes, e logo mais fáceis de capturar. Por isso os alevins são tão procurados, por serem pouco conscientes dos perigos. Entendam este fenómeno como um ciclo ininterrupto de nascimento/captura que termina apenas com uma pequena percentagem de cada postura bem sucedida. Em termos de valores médios, porventura menos de 3% de cada postura chegarão a peixes adultos. O efeito predatório faz-se sentir ao longo dos meses, e por isso mesmo, porque os juvenis vão crescendo ao longo do tempo, também é natural que o tamanho das iscas seja aumentado ao longo do ano. É necessário ter os olhos bem abertos e saber valorizar todo o tipo de informação. Se detectamos um cardume de pequenos peixes a saltar sobressaltado à superfície, é bom de ver que temos por baixo um predador a apoquentá-los.
Há um alinhamento natural do tamanho da presa com o tamanho do predador, (a um cardume de peixinhos de 3cm corresponderá porventura um robalo de 15cm…), mas isto não é uma verdade absoluta, porque há períodos do ano em que os grandes peixes também atacam peixinho miúdo. E isso acontece sobretudo quando temos as águas muito quentes, acima dos 20ºC, e a digestão de grandes presas se torna penosa. Daí a explicação para que no Verão e Outono seja tão fácil convencer robalos grandes a morder os pequenos vinis e jigs com que fazemos Light Rock Fishing.
E aqui chegamos a um dilema que quem pesca acaba sempre por ter de resolver: que equipamento utilizar quando o peixe grande está a atacar presas tão pequeninas?
A equação é difícil de resolver, e levanta problemas muito mais complexos do que parece à primeira vista. Senão vejamos:
- Para diminuirmos o tamanho da amostra a um nível aceitável, digamos um artificial de 3/ 4 gramas, necessitamos de um equipamento que possa operar com algo tão leve. E os problemas começam na linha do chicote, necessariamente fina, um 0.18mm como máximo, a seguir um multifilamento que não deverá exceder o PE0.4, e por aí acima, um carreto tamanho 1000, e uma cana fina compatível, macia, com um peso não superior a 80 gr. Com este material é possível trabalhar bem um jig ou uma amostra de tamanho diminuto. Mas não esqueçamos que o peixe pretendido tem peso, e vai arrancar desabrido para onde quiser. Não é fácil ter sucesso nestas condições. Se aumentarmos o calibre da cana e carreto, a linha não irá voar, não seremos capazes sequer de lançar a amostra.
Por vezes falo com o meu amigo Raúl Gil, e o valenciano queixa-se de que tem momentos em que os atuns grandes estão a comer sardinelas pequeninas e não ligam a mais nada. O maior problema dele é o seguinte: como esconder um anzol que seja suficientemente forte para aguentar uma atum de 50/ 80 kgs, numa amostra tão diminuta? No fundo, é a mesma questão que tratamos aqui, quando queremos estar próximos do tamanho das presas de 3 a 4 cm do nosso robalo... sabendo que a linha fina dificilmente aguentará o peixe.
Ignorar a possibilidade de conseguir um robalo grande e pescar os outros? Apostar na captura do grande, utilizar material pesado e com isso perder a possibilidade de ter muitas picadas? Depende sempre do pescador e das suas intenções. Um meio termo possível é apostar na aquisição e material leve, fino, mas resistente, que necessariamente é mais caro...
É também nesta altura do ano que podemos dar largas à imaginação, pescando com tudo aquilo que nos parece ser capaz de conseguir obter os favores dos nossos predadores. Não é por acaso. Dada a variedade de presas que deambulam pelas nossas águas, os peixes têm uma variedade muito grande de potenciais vitimas. E isso potencializa a utilização de muitos tipos de amostras. Os grandes vinis foram firmemente adoptados para a pesca das grandes corvinas. Os resultados são excelentes. Curiosamente a versão mais pequena é olhada com algum cepticismo por quem pesca outros predadores mais pequenos, como se pudesse não ser eficaz. Na verdade um vinil é por defeito mais eficaz que qualquer jig. Os robalos, os sarrajões e os lírios adoram! Um vinil armado com um cabeçote de chumbo, ou tungsténio, lançado ao fundo, é uma arma mortífera de pesca. É deixar ir até abaixo e dar uma ligeira animação, trabalhar a cana com o pulso a fazê-lo saltar, a executar movimentos erráticos, descontrolados, e se houver um peixe a caçar, …vai morder!
Vítor Ganchinho