As últimas semanas, para quem pesca tradicionalmente com o método vertical, foram penosas. Tivemos águas a temperaturas baixas, à volta dos 14ºC, e isso mobiliza uma grande quantidade de espécies para uma migração vertical, a cotas onde podem encontrar termoclinas com temperaturas mais favoráveis. Há águas mais quentes umas dezenas de metros mais abaixo, e os peixes têm de as aproveitar.
A sua vida depende disso. O teatro de operações continua quase igual, mas na ordem dos 100/ 150 metros mais abaixo.
Recordam-se de vos ter dito que o tempo estava bem melhor para quem pesca com carretos eléctricos. É isso mesmo, à mão a tarefa torna-se penosa demais, ao fim de meia dúzia de descidas, já nem queremos que os peixes piquem.
Por sua vez, nos pesqueiros habituais, a ausência de peixes desmotiva os mais empedernidos pescadores, e dá-se aquilo que estamos a assistir de momento: uma rarefação de gente a pescar. Os barcos são muito menos, as pessoas estão bem menos motivadas.
Isso acontece, repito, por estarem a pescar fora da zona de acção do peixe, que agora se situa bem mais abaixo.
O tempo das douradas já lá vai, as romarias das saídas a estas estão por agora terminadas, e a ideia que me fica é que as pessoas acham que de repente deixou de haver douradas na costa.
Nada mais errado. Elas apenas mudaram para outros sítios, onde as pessoas não as sabem procurar. Tudo o que não seja ir à Vereda e à Ponta do Espichel, é pedir demasiado a quem segue os outros barcos na esperança que saibam onde é.
O peixe não desaparece, apenas tem ciclos que correspondem à satisfação de necessidades básicas, como segurança, alimentação e reprodução. Infelizmente aquilo que se passa é que as excursões de pescadores de douradas apenas as pescam no período mais crítico da sua vida: o momento em que estão a criar dentro de si a sua descendência. Devia ser motivo de reflexão, mas não o vai ser.
Quando chegar o Outubro de 2022, vamos voltar a assistir à chegada de camionetas de excursão com pescadores ávidos de saber se esse será o seu dia de sorte.
Entretanto, vamos pescando. De uma forma ou de outra, continua a haver peixe na costa para pescar. Uns dias com jigs, outro dia com os vinis, conforme a temperatura que vai fazendo. Este ano tem sido particularmente quente, e com muito pouca ou nenhuma chuva. Isso será um problema daqui a algum tempo.
Seguramente vai afectar a qualidade das nossas pescarias. Menos fitoplâncton, menos zooplâncton, logo menos peixe miúdo, e por consequência, menos predadores.
De momento, temos lulas por aí, com bom ar, até 1,5 kgs, a lançarem-se aos jigs, junto com alguns pargos e bicas de pequeno porte.
Relembro a necessidade de mudar os assistes simples para fateixas nos nossos jigs, para que possamos conseguir algumas. Caso contrário, vamos sentir aquilo que é habitual, uma pancada forte no jig, um pequeno momento de excitação e a seguir…nada. As lulas, num movimento brusco, colam as ventosas à superfície lisa do jig. A seguir largam, ou deixam uma das ventosas agarrada a um dos anzóis e vão embora, agastadas com aquele carapauzinho que é um osso demasiado duro de roer.
Mesmo com frio é possível pescar algo |
O mês de Março vai trazer-nos já alguns dias de maior calor, e os peixes vão poder voltar aos seus postos de caça.
Com um pouco de sorte, vai ser possível conseguir alguns robalos de costa, a pescar perto da rebentação. Os dias com ondulação de Oeste, a entrar certinha, com águas limpas, vai proporcionar alguns peixes de bom tamanho. Vai ser tempo para calçar as botas, pegar na cana de spinning e lançar às primeiras horas do dia.
O momento mágico todos o conhecemos: os primeiros brilhos do nascer do dia são e serão sempre os favoritos dos grandes robalos. Estarão, como habitualmente, reservados para quem madruga, quem tem coragem para se levantar da cama bem cedo. Para todos os outros, aqueles que ficam no quente dos lençóis, espera-os uma possível desilusão.
A Primavera é um período de transição, uma altura do ano compreendida entre o rigor dos frios de Inverno e a altura dos calores do Verão.
Não deixa de ter o seu encanto. Porque fiz muitos registos de capturas, com dados de temperaturas de águas, ventos, horas do dia, acabo por ter um ficheiro que me permite “adivinhar” quando e como devo pescar nesta altura. E digo-vos que é um período muito interessante do ano...
Vítor Ganchinho