Aquilo que vos passo é o resultado de algumas dezenas de anos a “passear” debaixo de água. Pressupostamente a fazer caça submarina, mas dando prioridade absoluta ao lance, ao momento, respeitando os protagonistas, tentando interferir o mínimo possível. Tão pouco quanto aquilo que pode um ser humano, uma “coisa desajeitada” com mais de dois metros de silhueta, corpo+ barbatanas, que nada pior que qualquer peixe, que não tem a mínima aquaticidade quando comparado com uma vulgar e reles boga, mas que ainda assim foi capaz de ver coisas com estes olhos que a terra irá um dia comer.
Fazer mergulho é algo de fascinante, e dá-nos a possibilidade de viver emoções incríveis. Na descida mais insuspeita, de repente aparece-nos algo que é absolutamente transcendente. Quando nos parece que vamos baixar uma ou duas dezenas de metros e que vamos ver o que vimos anteriormente, um buraco preenchido com um imponente safio, rodeado dos seus inseparáveis camarões, ou cavaquinhos, ou santolas, ou tudo junto, acantonados cada um a seu canto da gruta, eventualmente uma abrótea vaidosa dos seus bigodes brancos, ou um preguiçoso rascasso entretido a comer uns quantos alevins de peixinhos mais atrevidos, eis que surge aquele espectáculo diante dos nossos olhos.
Tenho felizmente assistido a centenas ou milhares deles, desde que ainda moço novo arrisquei meter a cabeça debaixo de água.
O que vai na cabeça de um robalo? Como podemos um dia conseguir adivinhar aquilo que pretendem, como decidem ir aqui ou ali, e quando?... |
Hoje é uma parede de dezenas de corvinas, no seu cobreado brilhante, com os seus pontos laterais bem marcados, amanhã é uma nuvem de robalos com milhares de peixes que nos cercam e rodopiam à nossa volta, curiosos.
Maravilhas que encontrei em tantos sítios da nossa costa, dos Farilhões, ao largo das Berlengas, às pedras de Sines, onde ainda hoje pesco à linha. Nessas alturas, a prioridade sempre foi a de respeitar a harmonia de um cardume que merece mais que um mísero disparo de uma arma de elásticos. Nessas alturas, o caçador cede ao biólogo, e aquilo que se faz é aproveitar, disfrutar de uma visão que muito poucas pessoas já tiveram. Nunca poderei ter a veleidade de contar peixes, uma a um, mas estimo ter estado a espreitar em frestas atestadas, porventura com mais de 1000 sargos de grande tamanho. Sim, aqueles com dentes pretos, velhos, largos de dorso e imponentes nos seus 2 kgs de peso. Nessas alturas, o caçador desaparece, desvanece-se como por artes mágicas e dá lugar a quem tem a perfeita noção de que há prioridades a respeitar.
Ter o privilégio de estar a um metro de uma “palete” de peixes é algo que devemos saber merecer. E isso começa por saber guardar o local, não o divulgar, de forma a que esses peixes possam reproduzir em descanso.
A informação que consegui recolher durante anos a fio de mergulhos intensivos, para mim…preciosa, serve-me para poder confirmar ideias que tenho sobre a dinâmica dos cardumes.
Estar presente nos momentos em que acontece algo é de tal forma positivo que muitas vezes é o suficiente para fazer o nosso dia. Um lance é tudo aquilo que faz falta.
Um pargo riscado de 6 kgs que se aproxima de nós atraído pelo esgravatar de um dedo na areia, …pelo levantar do poalho, um cardume de lírios que roda curioso sobre nós, a cumprir um comportamento conhecido de todos aqueles que estão habituados a visitar aquele estranho mundo, vale sempre a pena.
Temos muita gente boa, gente a mergulhar com muita genica, com entusiasmo. Quando a forma física reduz as nossas possibilidades de ir lá abaixo, lançamos jigs, lançamos amostras. Sabendo antecipadamente qual o terreno de jogo. Acreditem que hoje, quando pesco em determinadas zonas, naturalmente mais baixas, na casa dos 20/ 25 metros, sei exactamente em que local o meu jig está a cair, de onde pode sair um robalo, um pargo, uma bica. E isso é uma vantagem enorme.
Ter tido acesso a estes locais, ter aproveitado aqueles míseros 30/ 40 segundos de permanência colados ao fundo, (que a quem mergulha parecem sempre poucos porque tem de adicionar mais o tempo de descida e subida), para ver como acontecem as coisas, ajuda-nos a entender de que forma cada espécie faz pela sua vida.
Ser capaz de ficar colado a uma ponta de rocha e observar como um pargo ataca uma lula, ou um robalo engole um carapau, ou um polvo se lança aberto sobre uma navalheira desprevenida, é um espectáculo da natureza que devemos saber merecer.
Aquilo que vos trago hoje ao blog é resultado desses anos de mergulho. Os predadores não procuram, encontram e atacam as suas presas todos da mesma forma.
As diferenças são mesmo muito significativas e se o resultado final é o mesmo, peixe grande come peixe pequeno, os métodos não podiam ser mais diferenciados.
Pode ajudar-nos a pescar saber como tomam a iniciativa de arrancar direitos a um pequeno peixe. Porque isso ensina-nos a conseguir visualizar a forma como irão atacar a nossa amostra.
Questões como tamanhos, pesos, velocidade de recuperação de uma amostra, têm a ver com as capacidades físicas e voluntariedade que os predadores aplicam quando mordem os nossos anzóis.
Sei que conseguem imaginar a velocidade necessária para que um destes peixes consiga vencer a resistência que o meio líquido impõe a quem se quer deslocar de um ponto para outro.
Os nossos predadores são naturalmente rápidos, embora a mim, em termos pessoais, me pareça que alguns de nós pescadores “exigimos” demasiado dos peixes que queremos pescar.
Para algumas pessoas, pescar de Verão ou de Inverno é igual. Se em Julho um robalo ataca uma amostra a uma velocidade felina, se faz um sulco à superfície e consegue mordê-la, porque não faria o mesmo no Inverno? Pois, é um erro crasso. Com águas frias, o peixe “congela” e todos os seus movimentos são muito mais pastosos, lentos, e por isso mesmo, a velocidade de pesca que imprimimos à amostra no Verão não nos rende peixe na caixa.
Algumas pessoas adquirem carretos HF, High Frequency, concebidos para pescas muito rápidas, onde a velocidade de recuperação se impõe. Na verdade, nem sempre. Pode mesmo ser contraproducente. Não será por acaso que os fabricantes de renome têm nas suas gamas carretos ditos standard, e outros de alta velocidade. Há momentos para uns e momentos para outros.
Bem sei que está fora de questão que alguém adquira um carreto de spinning para águas quentes, e outro para pescar de Inverno. Na maior parte dos casos, o carreto acaba por ser o mesmo que é usado para pesca vertical, onde a velocidade de recuperação se impõe, à falta de peixes de grande porte.
Se aquilo que pescamos é sempre pequeno, qual o motivo de comprar carretos de força? Aquilo que podemos fazer é recolher de forma mais lenta no Inverno, dando tempo, dando possibilidades ao peixe de conseguir reagir.
Mas não queria desviar-me demasiado da questão “predadores”.
Robalo croata. Foto enviada por um cliente GO Fishing com uma amostra de superfície da DUO. A utilizar em zonas baixas, até 3/4 metros. |
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Amanhã vamos tentar entender de que forma caçam os peixes, que diferenças existem entre eles.
Vítor Ganchinho