COMO ESCOLHER O EQUIPAMENTO DE PESCA?

Sou frequentemente confrontado com perguntas relativas à escolha dos equipamentos de pesca mais indicados para esta ou aquela função.
O jigging motiva grande parte destas questões, por ser uma técnica relativamente nova, e por isso mesmo, menos conhecida.
Importado do Japão, onde os fabricantes de equipamentos o tratam como algo muito corrente, (por ser de facto muito normal pescar-se dessa forma naquelas águas), o jigging tem vindo a popularizar-se entre nós na sua versão mais moderna. E faço esta ressalva porque não devemos esquecer que os nossos marinheiros portugueses, há muitas dezenas de anos, já pescavam na Terranova ao bacalhau com…jigs.
Alguns deles, mais aptos para a função, acabaram por tentar fazê-lo em águas portuguesas continentais e os resultados foram animadores.
Quem não se lembra de pescarias de 500 kgs de peixe (pargos, corvinas, robalos...) feitas por duas pessoas, a bordo de um pequeno barco de madeira, na Pedra do Barril, em Tavira?
Já aqui no blog foi publicado um artigo sobre o tema e nunca é demais revisitar. Eram tempos em que os jigs não passavam de anzóis de tamanho generoso, cobertos a chumbo, que, para brilhar, era raspado nas pedras da calçada antes da saída para o mar (!!). Tivessem essas pessoa os materiais que nós temos hoje, e fariam milagres ainda maiores. Tivéssemos nós a quantidade de peixe que eles tinham e também, muito provavelmente, faríamos melhor que aquilo que fazemos nos nossos dias...


Este parguinho sucumbiu a um jig da Little Jack, versão 40 gramas.
Ver na Loja


No sentido de ajudar a resolver o nada estranho enigma da escolha dos materiais e técnicas a utilizar, vou tentar dar-vos uma ideia da forma como decido da utilização de uma ou outra opção.
Começo por vos dizer que tenho essas opções. Não vou ao mar com uma cana apenas, nem sequer preparado para uma só possibilidade. Já aqui vos disse que para mim, o normal é ir a o mar com cinco a seis canas, e os meus companheiros mais habituais, e falo do Gustavo Garcia e do Carlos Campos, chamemos-lhes pescadores “residentes” a bordo dos meus barcos podem confirmá-lo. Quando saio, vou para o mar para fazer aquilo que esse dia e essa hora de mar me pedem. Posso começar por fazer spinning ao raiar do dia, mas porque sei que o peixe irá estar activo apenas uma ou duas horas, e a partir daí é chover no molhado e não vale a pena insistir, acabo por ir fazer outra coisa. E é por isso mesmo que, na minha óptica, se impõe ter equipamento diverso a bordo, para que, a cada momento, possamos optar por aquilo que é mais indicado. Ter uma ou duas canas mais polivalentes ajuda, mas na verdade, quando são boas para isto não são boas para aquilo. Uma cana de spinning nunca será uma boa cana de jigging, e ponto final.
Os meios termos acabam sempre por nos obrigar a fazer concessões que no fim do dia custam peixes.
Mas podemos, caso não tenhamos outros meios, tentar “inventar” algo. Senão vejamos:
É mais fácil conseguir adaptar uma cana de spinning a jigging que o inverso. Por definição, utilizamos no spinning um carreto de tambor fixo e no jigging um carreto de tambor móvel.
Caso queiramos lançar, está visto que o carreto de spinning tem vantagens evidentes. Abrimos a alça, lançamos e o assunto está resolvido. Fazê-lo com o carreto de jigging é ver a amostra cair-nos aos pés...
As próprias canas têm fins tão específicos que dificilmente serão boas para duas técnicas, mas também aqui a cana de spinning, porque permite lançar mas também deixar cair um jig na vertical, pode ser mais útil.


O mar é tão imenso quanto as possibilidades que temos de inventar estratégias de pesca. Está nas nossas mãos decidir o que fazer.


Há uns anos atrás, a marca japonesa Smith encomendou a um conceituado expert em pesca que concebesse uma linha de canas com a preocupação de que pelo menos uma das canas dessa série fosse o mais universal possível.
Chamaram a essa série algo como a K. O. Z Expedition. Eu adquiri uma dessas canas e na verdade vos digo que sim, será “universal” q. b. mas a mim não me convence. São canas de gama alta, na ordem dos 400 a 600 euros cada, e ainda assim, as que são verdadeiramente boas, são as canas que são destinadas de raiz a isto ou aquilo. Sempre que tentamos fazer um “desvio” sentimos sempre que algo não está no seu máximo.
Ainda assim, é uma das canas que aceito levar quando vou pescar para zonas desconhecidas e não sei com exactidão aquilo que posso esperar. Vejam a série abaixo, para que fiquem com uma ideia do que vos falo.




E como definir então o material certo?

Eu por princípio divido o plano de água em várias camadas, e em função da época do ano, das temperaturas das águas e daquilo que procuro, assim opto por esta ou aquela solução.
Se estou numa zona baixa, digamos que até aos 10 metros, tenho como opção mais provável uma cana de spinning, normalmente de 3 metros de comprimento, com um carreto 4000, linha PE 1,5 e amostras de superfície.
Entenda-se por isto vinis, que prefiro, ou amostras rígidas, sobretudo sem pala frontal, que utilizo mais assiduamente.
Se a profundidade for um pouco maior, até aos 20 metros, a opção pode recair numa cana de casting, e eventualmente num jig de 12 a 15 gramas, que deixo afundar tempo suficiente para que avizinhe o fundo.
A partir dos 20 metros, a opção é sempre mais musculada, e passo a canas de jigging. E daí para a frente, sendo que o meu limite de conforto para utilizar jigs ligeiros anda por volta dos 70 a 80 metros. Mais abaixo já opto por
outras soluções, e sempre com material mais pesado. Mas faço 90% da minha vida de pescador acima dos 80 metros, sem dúvida.
Queria só abordar um detalhe que me parece importante, para quando estamos a pescar em zonas onde os pampos (Balistes carolinensis, ou capriscus, como queiram...) vivem, e onde de facto podem ser incómodos: nesses casos, não utilizo vinis. Nunca sabemos quando virá de lá de baixo um cardume atrás do nosso vinil e nem sempre temos a possibilidade de os evitar a tempo e ir para outro lado.
O material é caro, (cada vez mais), os dentes deles são fortes e deixam marcas permanentes, leia-se cortam os vinis ao meio…e por isso, a opção nesses casos são jigs metálicos e está decidido. Se pescarmos com jigs, nem sequer temos de fugir em debandada, podemos continuar, tentando não os deixar morder o jig. Se pudermos...


Um flagelo, estes bichos! Mas existem e temos de os saber contornar. 


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Quais são então os princípios técnicos base que devemos considerar, quando temos de fazer a nossa opção de material, em zonas “cinzentas”, ou seja, em locais em que tanto podemos pescar de uma ou outra forma?

Vamos ver:
A cana equipada com carreto de tambor fixo, com passadores a trabalhar para baixo, (primeiro bloco de imagens das canas KOZ), é uma cana que nos permite lançar, através da acção conjunta da flexibilidade e reactividade da cana, somada ao peso da amostra.
Lançamos e tentamos fazê-lo longe, de forma a termos mais tempo de permanência da amostra na água. É facilmente entendível que as forças físicas que intervêm neste processo são inúmeras.
Desde logo a capacidade que a cana possa ter para catapultar a amostra a longa distância, a fricção da linha no bordo exterior da bobine do carreto, o atrito que a linha irá sentir ao bater nos passadores da cana, a própria resistência do vento à progressão da amostra, etc.
Na verdade este sistema funciona, e tem provado que dá peixes, pese embora todas as limitações referidas. Aquilo que sentimos é alguma falta de controlo da linha na sua fase final de voo, a amostra cai sem que possamos imprimir-lhe movimento imediato, a não ser que deliberadamente queiramos fechar o pick-up e comecemos a enrolar antes mesmo de a amostra cair na água. Mas ainda assim, nada de grave, conseguimos pescar. Mas estamos a considerar a pesca com amostras de superfície, a fazer o dito spinning.
Se quisermos fazer jigging com este conjunto, infelizmente já não é bem assim. É possível pescar, mas já estamos a perder em muitos detalhes. Senão vejamos:
Com a nossa cana de spinning, deixamos cair um jig para o fundo. Porque o movimento de saída da linha é perpendicular ao sentido do armazenamento da linha, ou seja porque a linha sai de uma posição “horizontal”, faz um ângulo de 90º, e passa a correr pelos passadores de uma forma “ vertical”, já estamos a sofrer algo. Esse atrito da linha na bobine vai custar-nos alguns segundos de chegada ao fundo. Em dias de vento, o barco irá derivar da posição inicial …esses segundos, retirando-nos verticalidade. Ficamos com a pesca “espiada”, oblíqua.
A seguir, quando percebemos que o jig chegou ao fundo, temos de fechar a alça, e esse é mais um movimento sem o qual não podemos começar a pescar. E voltamos a inverter a posição da linha, agora de uma posição de entrada na cana no sentido longitudinal, para transversal, a posição de armazenamento da linha. A sensibilidade que podemos ter a ataques na caída é muito inferior, e efectivamente grande parte dos toques que temos são na descida, e não na subida.
As pessoas sentem quase todos os toques a subir, mas aí é porque a linha está em tracção, e a cana flecte ao toque. Não é necessário ter sensibilidade nenhuma para isso, é uma detecção de toques “à bruta”, sem ciência nenhuma. Uma pessoa que pesque jigging pela primeira na sua vida, ao fim de um minuto já detecta estes toques na subida. Mas os toques bons são os outros, e francamente não são para todos os pescadores, são para quem tem bom equipamento, bons olhos e boas mãos.
Voltando ao assunto:
A opção por um conjunto de jigging dá-nos algo mais. Desde logo, o sistema apenas pede a aplicação do polegar sobre a patilha de travamento. A saída de linha é imediata, e é feita no sentido longitudinal da cana, a direito se quiserem, e o atrito é reduzido ao mínimo. Temos que a bobine passa a girar no mesmo sentido da deslocação de linha, e para ajudar a acelerar a saída ainda podemos virar a cana no sentido vertical em que o jig está a descer. Atrito mínimo. Ganhamos tempo!
Mas não ganhamos só isso. Recordam-se de vos ter dito que na fase final do lançamento de spinning temos de decidir quando interromper a saída de linha, e que ficamos sem controle por alguns instantes sobre aquilo que se passa com a amostra. Pois aqui no jigging, com equipamento de jigging isso não é assim. Em cada momento, temos um controlo absoluto sobre a posição da linha. Basta-nos bloquear com a manivela de recuperação e todo o sistema está automaticamente pronto a funcionar. Ao menor movimento de girar a manivela já estamos a fechar tudo, está tudo engatado e pronto a recolher. Isso dá-nos peixes.
É extremamente útil que assim seja quando detectamos que algo se passa com a nossa linha, pois parou antes do momento em que deveria ter parado. Porque somos pescadores informados e previdentes, utilizamos linha multicolor, que está marcada com uma cor diferente a cada dez metros. Se na primeira baixada do jig fomos até à cor verde, e na segunda a linha parou no vermelho, das duas uma: ou estamos a pescar num fundo muito irregular, com altos e baixos, ou…há “mouros na costa”, que é como quem diz: temos peixe a impedir a queda normal do jig. E aí, teremos de ferrar rápido.
E por isso mesmo, ter um sistema que fica armado em menos de um segundo permite-nos reagir a tempo.
Este segundo sistema, para além de ter as vantagens de ter sido concebido para a função, não recolhe as preferências dos pescadores por acaso: é que em zonas muito profundas, ou com correntes fortes, ou em dias de vento, é uma vantagem tremenda.
Deixem-me dizer-vos isto: quando tentamos inventar e pescamos com uma cana de spinning, somos obrigados a tê-la na mão em permanência. A cana de jigging é colocada debaixo do braço, fica apontada na direcção de saída de linha, e isso basta. Não sentimos o peso, está colada a nós.
Pode parecer pouco, mas de facto permite-nos repousar bastante. Ao fim de um dia, teremos uma vantagem declarada de quem utiliza carretos de jigging. Em conforto, em comodidade e em…peixe.



Vítor Ganchinho



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