QUANTO VALE UMA BOA ELECTRÓNICA?

Por vezes um pequeno detalhe pode estragar-nos um dia de pesca.
Quando esse “pequeno detalhe” se chama electrónica, as possibilidades de termos um dia “azedo” são enormes.
Cada vez mais dependemos daqueles pequenos instrumentos, para encontrar as pedras onde queremos ir pescar.
Se essas pedras ficarem a dezenas de quilómetros de terra, e se não houver o mais pequeno ponto de referência, sem costa à vista, a sua importância acresce bastante.
Era o caso.

Pescar no Senegal num barco velho e “escaqueirado”, com problemas de toda a ordem é algo que ali acontece a todos. Quase todos os barcos são velhos.
Mas nem todos têm problemas de electrónica e este tinha. Em tudo!
Sonda que não sonda, e que exige deitar água do mar no transdutor para “pegar”, segundo eles, e um GPS que pura e simplesmente não permite fazer zoom, serve de tanto como nada.
Se marcamos um ponto e ao fim de 60 km chegamos hipoteticamente a esse ponto, pode servir. A questão é que as pedras não são imensas, têm dimensões que por vezes nem são exageradas.
E sem fazer zoom a esse GPS, podemos estar “quase” no sítio, mas a 300 metros dele. Foi o que se passou e que me fez lançar dúzias de vezes em seco, que é como quem diz sobre a areia.
Quando não temos prisões no fundo, quando não sentimos bater o jig na pedra, mas sim assentar em algo macio, os sinais não poderiam ser piores. E por fim, se não temos toques de peixe, deixa de haver dúvidas.


As operações básicas de ligar e desligar são algo que se pode fazer. Não dá em nada, mas anima o “turista”, na circunstância …eu.


Serve de nada fazer esse tipo de malabarismos, de truques, porque no fim de tudo estarão sempre uns arreliadores grãos de areia a receber o impacto dos nossos jigs. E não é aí que está o peixe de fundo.
A consequência disso é que as poucas picadas que aconteceram foram de peixes pelágicos, aqueles que atravessam os fundos e conseguem encontrar comida entre pedras. São barracudas, são encharéus, tunídeos vários, lírios e toda a sorte de peixes de água livre. Mas meros e badejos, nem vê-los. Por azar era isso mesmo que eu procurava.


Num barco que tem como elemento mais valioso a gasolina dos seus depósitos, não estranha que a “electrónica” seja deprimente.


A capacidade de improviso desta gente é enorme. Já aqui vos falei disso. Mas quando se trata de electrónica pura, o improviso não resulta tão bem.
Eles reparam motores com uma faca, cortam garrafas e fazem funis para vazar gasolina para os depósitos, limpam e mudam velas, e fazem tudo aquilo que é preciso para continuar a avançar. Mas quando o problema é de GPS, pouco se pode fazer a não ser comprar um novo.
Comprar um GPS novo significa ir a uma loja e escolher um “novo”, ou seja um dos que foi comprado em refugo a um importador que o comprou num lote de umas dezenas por meia dúzia de euros, na Europa. Quando alguém já não quer uma GPS por ele estar a falhar a toda a linha, ou deita fora para o lixo, ou entrega na loja onde irá adquirir uma máquina nova.
E esse velho GPS “encalicado” irá um dia chagar ao Senegal onde, melhor ou pior, voltará a ser “novo”.
E assim se faz a vida naquelas paragens. Tudo serve para ganhar algum dinheiro, mesmo quando aquilo que se compra não vale quase nada.


Não imaginam as distâncias que se fazem para o largo, para ir pescar a pedras que afinal, não se encontram, por problemas de GPS. Pura perda de tempo e recursos.


Se algum de vós tiver a ousadia de experimentar a ir pescar num destes barcos, bom mesmo é nem perguntar se o VHF funciona. Porque a resposta invariavelmente é sempre não.
Nada funciona. Partam sempre desse princípio. Numa situação de emergência, a única solução, possível é esperar que passe alguém que possa rebocar o barco.
E isso pode demorar ….dias. Não preciso de vos dizer que não há medicamentos a bordo, não há comida, a água é levada por nós, e os ventos de Verão empurram para fora, para o largo. Sempre.
Conseguem imaginar o que isso quer dizer em termos de segurança. Zero.


E todavia, eles pescam.



Vítor Ganchinho



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