AS CORES DAS LINHAS - CAP II

Quando lançamos as nossas iscas ou amostras/ jigs para a água, não temos ideia da quantidade de luz que existe no fundo.
Dependendo da limpidez do meio líquido, a invisibilidade da cor de um jig, por exemplo, pode acontecer a uma cota mais ou menos profunda.
As águas nas nossas ilhas, Açores ou Madeira, têm mais visibilidade que as nossas águas continentais. O que quer dizer que há diferenças e os critérios têm de ser ajustados consoante a nossa localização. Zonas de pesca mais próximas de rios terão menos visibilidade que longe muito longe destes. Se chover durante muitos dias é natural que as águas fiquem mais tapadas de sedimentos, se não houver chuva durante muito tempo estarão mais claras, porque livres desses factores de absorção de luz.
Não fica por aqui: no verão, o calor das águas forma um caldo que promove o aparecimento e desenvolvimento do fitoplâncton, e por isso temos águas mais verdes. Pode também acontecer que por qualquer motivo sejam feitas descargas de barragens, e isso irá trazer aos nossos locais de pesca muitos milhões de litros de água doce, alterando a limpidez da água do mar. Registem que os factores são inúmeros, e que isso irá alterar a percepção que os peixes podem ter das cores dos objectos ou estruturas que os rodeiam.
Quem já fez mergulho, sabe bem que as cores vão desaparecendo aos nossos olhos, e que no fim ficam os verdes e azuis. Isso quer dizer que os nossos olhos deixam de ser capazes de captar essas cores.
Tudo parece azul ou verde, e isso não é apenas porque “a água é azul”, é porque as outras cores do espectro desaparecem. Isso mesmo, elas desaparecem.
Mas como é isso de as cores poderem desaparecer?! Na verdade elas estão sempre lá, mas por falta de luz, o receptor, nós ou os peixes, deixam de as conseguir ver.


Em águas muito limpas, a visibilidade das linhas ganha importância. Os sargos pescam-se bem na espuma, onde a agitação marítima os obriga a tomar a decisão de morder a nossa isca, mas fora dessa zona de turbulência, …são bem mais difíceis de convencer...


Digo-vos isto, por ser um exemplo muito flagrante: um rascasso, peixe muito vermelho à superfície, perde todo o seu vermelho vivo, a partir dos 10 metros de profundidade. Passa a ser castanho. Essa é a cor em que eu os vejo quando mergulho: castanho.
E isso acontece também aos peixes, por mais adaptados que estejam ao seu meio: veem de forma diferente, consoante estejam mais próximos ou mais longe da superfície. Sabemos isso.
Sabemos que os peixes recebem menos luz nos seus olhos à medida que o fundo do mar se encontra mais longe da superfície. Quanto mais fundos, mais incapazes serão de detectar as cores das nossas linhas e também das nossas amostras/ jigs.
Na verdade, a luz não viaja muito longe no oceano (a profundidade média dos oceanos do mundo é de aproximadamente 3.650 metros e a zona mais funda está 11.000 metros abaixo do ponto onde o nosso barco flutua), mas a luz do sol “só” pode atingir como limite máximo e nesse caso apenas alguns ínfimos raios de sol, a cerca de 950 metros abaixo do nível do mar. Isto em condições de visibilidade absolutamente máxima, em zonas sem qualquer tipo de detrito, fitoplâncton, etc.
Mas isso são situações extremas de qualidade de água, a qual nós nunca temos no nossos país. Geralmente não baixa mais de 200 metros, e é a esse valor que devemos reportar-nos quando queremos estudar a questão “ cores de linhas de pesca”.
No entanto não subestimem, os peixes que habitam o fundo do mar têm a capacidade de ver abaixo disso. Isto quer dizer que os peixes frequentadores do fundo do oceano dispõem de sistemas adaptados de visão muito apurados, que aproveitam o menor raio de luz.
Necessariamente sistemas mais simples, e seguramente muito eficazes. Novas pesquisas mostram que várias espécies de peixes de profundidade têm sistemas de visão absolutamente únicos, que lhes permitem ver breves flashes de luz que muitos organismos produzem naturalmente (chamamos isso de "bioluminescência"). Sabemos bem que os peixes têm olhos mais sensíveis e podem ver muito melhor do que nós os humanos, com pouca luz. Faz sentido num mundo em que ver melhor pode ser a diferença entre comer ou ser comido.




Em estudos recentes, os cientistas examinaram os genes de 101 peixes de profundidade que abrangeram 26 espécies diferentes e descobriram que eles carregavam mais genes para opsina de bastão do que os pesquisadores esperavam.
As opsinas são proteínas sensíveis à luz na retina do olho que ajudam a converter a luz em um sinal eletroquímico que o cérebro pode interpretar.
E as opsinas de bastonetes são usadas especificamente em ambientes com temperaturas estáveis e pouca luz. No entanto, onde os humanos têm apenas um único gene de opsina de bastão, os pesquisadores descobriram que peixes que vivem a profundidades superiores a 2.000 metros, de nome ”spinyfin prateado”, têm trinta e oito genes de opsina de bastão.
Se nós temos uma unidade e eles trinta e oito, imaginem a diferença de capacidades. No geral, metade das espécies neste estudo tinha sempre mais de um gene de opsina, o que quer dizer que todos os peixes analisados estariam acima das nossas possibilidades de ver no escuro. Esses genes adicionais aumentam a sensibilidade dos peixes a diferentes factores coloridos, o que os torna assim mais capazes que nós humanos na detecção das cores. E sabemos quais as últimas cores a desaparecer, certo?
“Acreditamos piamente que eles podem detectar muito mais tons de azul e verde do que nós”, diz o responsável pelo estudo.
Então se assim é, e como forma de passarmos mais facilmente despercebidos, talvez possamos utilizar como estratégia não utilizar linhas trançadas nas cores verdes e azuis, junto à nossa baixada…ou não?!
Vamos então falar sobre as linhas. Vamos então ver estes princípios aplicados especificamente à visão dos peixes. E de que forma podemos adequar as nossas linhas a situações de invisibilidade debaixo de água.




Elas são lançadas para um meio em que os seus habitantes não dispõem de um sistema visual igual ao nosso. Muitos peixes não conseguem sequer discernir diferenças na intensidade da cor.
Experiências mostraram que vermelhos escuros, verdes e castanhos são todos percebidos como "escuros", enquanto cores muito abertas, como amarelo-limão brilhante, (o “chartreuse” das nossas linhas multifilamento) são todas percebidas como "claras".
Logo, pode ser indiferente pescar com um amarelo claro ou com um laranja. São todas elas cores claras, de baixo contraste no meio marinho. Nós somos capazes de as ver à superfície, mas os peixes a partir de uma determinada profundidade, (a qual depende sempre da suspensão existente, conforme vimos anteriormente), não conseguem.
Voltamos ao conceito de reflexão de cores a partir da incidência da luz solar. Sabemos que quanto mais profunda a água, mais a luz vermelha é absorvida pelas moléculas de água, tornando mais difícil para os peixes vê-la.
O vermelho é a primeira cor a desaparecer no espectro de cores visíveis, desaparece a uma profundidade de 10 a 20mts. Repito: dependendo da limpidez da água e da incidência do sol sobre ela. Pode até acontecer que desapareça antes dos 10 metros, se a visibilidade for muito má.
Bem sei que isto vos pode parecer estranho. Na verdade, trata-se de um facto científico, existe, é assim, e pouco podemos fazer para o explicar melhor que não seja isto:
Basicamente, as cores são comprimentos de onda da luz. Esses comprimentos de onda têm comprimentos diferentes, de acordo com a quantidade de energia que carregam.
O espectro de luz visível (cores que vocês podem ver com os vossos olhos) é ordenado da menor para a maior energia: vermelho, laranja, amarelo, verde, azul e violeta. As cores com menor energia são as primeiras a serem absorvidas pela água.

É só isto!

A partir daqui, cabe-nos utilizar isso em nosso proveito, tirando partido daquilo que sabemos. Sabemos que à medida que a nossa linha afunda, as suas cores irã ser absorvidas.
Então, basta-nos ter uma escala de cores e saberemos se a uma determinada profundidade estaremos a pescar com linha de cor neutra, ou não.
Aí vai a escala, por ordem de comprimento de onda, e por ordem de “desaparecimento” de cores no meio marinho:





Simples?
Podemos então jogar com este conhecimento, utilizando-o a nosso favor quando lançamos as nossas linhas para baixo.
A que profundidade pescamos?


A natureza vale-se de uma incrível paleta de cores para conseguir o milagre da sobrevivência, da vida. 


À medida que a profundidade aumenta, a cor vermelha é cada vez mais absorvida, aparece a tons de cinza, e torna-se em si uma camuflagem. O vermelho desaparece mais depressa por ser a cor que apresenta um nível de energia mais baixo.
Se quiserem voltem ao quadro de cores e confirmem.
Então esta será sempre uma boa escolha para a cor de linha multifilamento a aplicar, mesmo que pesquemos em águas baixas. Porque todas as outras serão sempre mais visíveis.
Um exemplo de utilização deste princípio: colocar no carreto linha multifilamento vermelha, para pescar perto da superfície:


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Não quero complicar-vos a vida, mas há ainda algo em que vocês não pensaram…

Então se é assim em termos de profundidade, de deslocação vertical, e faz sentido que assim seja, o que podemos pensar em termos de visibilidade mas…horizontal? Em distância?....
Se um peixe estiver perto da nossa amostra, à superfície, ele vai vê-la nas suas cores naturais, (melhor dizendo, as cores que nós humanos consideramos naturais…porque são aquelas que conseguimos ver).
Mas à medida que nós recuperamos linha e afastamos a amostra do peixe, ou lançamos mais longe dele, ele irá vê-la com as cores ditas “naturais”, mas cada vez mais influenciadas pela absorção de luz que essa distância horizontal irá acarretar.
Há absorção de luz mesmo perto da superfície.
Basicamente, a água é cerca de 800 vezes mais densa que o ar. Vocês já notaram que é mais difícil para o vosso corpo mover-se dentro ou debaixo de água, que fora de água. Custa-nos mais movermo-nos na água.
O princípio também vale para a luz. Na água existem toneladas de partículas microscópicas que refletem e absorvem a luz. Quando a luz atinge essas partículas, é espalhada ou absorvida, e a luz que resta apresenta-se assim menos capaz de mostrar cores que poderíamos facilmente ver à superfície.
Quanto mais a luz viaja através do meio líquido, em distância, menos cores são visíveis a partir de um determinado ponto. Não é no local onde está o objecto, é a partir do ponto de referência considerado.
Mais uma vez temos aqui uma cor que é campeã em distância: o azul.
Esta é a cor que mais metros penetra na água. Quer tratemos de uma questão horizontal, aplicando o princípio a um ponto de partida específico, quer em termos de verticalidade, a uma determinada profundidade.
Isso quer dizer que a pescar, se quisermos tornar as nossas linhas menos visíveis, devemos evitar os azuis.
As cores estão sempre lá, e retornarão a ser visíveis assim que as iluminarmos de novo com uma quantidade de luz suficiente. Mesmo no fundo, o tal rascasso de que vos falei, (que é de um lindíssimo vermelho vivo à superfície, e castanho a uma dezena de metros abaixo), esse peixe pode ser vermelho vivo seja a que profundidade for, se o conseguirmos iluminar com luz perto dele. Tem é de chegar a ele luz não absorvida pela distância!
E aqui falamos de diferença entre a cor percebida (a cor como a vemos num determinado ponto) e a cor real (a cor real de um objeto iluminado à superfície, com luz do sol).
Podia tudo isto ser mais simples de entender. Claro que sim. Mas a matéria é complexa, porque os factores a enumerar são também eles muito diversificados.
Há processos constantemente em acção: luz a ser emitida, espalhada, a ser absorvida, a ser refletida, etc. Sendo complexo, é todavia isso que nos permite testemunhar a vasta e diversificada beleza do mundo à nossa volta...





No fim de tudo, parece haver um consenso geral em que pescadores e cientistas estão de acordo: ninguém sabe o que um peixe vê.
Provavelmente nunca saberemos.



Vítor Ganchinho



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