Molhamos o dedo na água, provamos e achamos que tem o sabor de sempre: salgado.
Mas porque é que o mar é salgado?
Já aqui explicámos no blog como chegam os sais minerais ao mar. Recordam-se de ler algo sobre as chuvas, os aluviões, a chegada das partículas de minerais aos ribeiros, aos rios e por sua vez ao mar.
A decomposição das rochas, ao longo dos percursos de arrasto sobre outras rochas, produz fragmentos cada vez mais pequenos, até atingir dimensões ultramicroscópicas.
A água do mar é rica em iões (átomos imperfeitos, com electrões a menos ou a mais) de cloro e de sódio, os primeiros positivos e os segundos, negativos.
Esses iões, quando a água se evapora, ligam-se facilmente para formar uma rede de cristais, com os dois tipos de iões regularmente intercalados, conhecida por rede do cloreto de sódio. Ou seja, sal.
Isso é nada mais nada menos do que o vulgar sal de cozinha com que temperamos a comida.
Quase todos sabemos que o sal se extrai, em salinas, da água do mar. No fundo, faz-se uma entrada de água salgada para um recinto de baixa profundidade, e espera-se que o calor do sol evapore a água no seu estado puro, ficando o resíduo depositado no solo.
Ou seja, aquela substância branca, granulada, aqueles cristais a que chamamos de …sal.
Pode morrer-se de sede rodeado de água no meio de um oceano, pois o nosso organismo não aguenta a ingestão de uma quantidade de sal tão elevada. Não conseguimos eliminá-lo do nosso corpo, morremos por alteração do equilíbrio químico do metabolismo do nosso corpo.
O sal é necessário à vida, mas apenas na devida conta. Todos os nossos fluidos corporais - sangue, suor e lágrimas - possuem sal, mas numa proporção bem mais baixa do que aquela que se encontra na água dos oceanos.
Na sua maior parte, estes sais foram-se acumulando ao longo dos tempos a partir da dissolução das rochas. A primeira pessoa a interessar-se pelo tema foi um nome muito conhecido de todos nós: Halley.
Ele, o sr Halley, supôs, e bem, que os iões eram retirados das rochas pelas águas das chuvas e arrastados para o mar. Viria no entanto a ficar famoso por algo completamente diferente: deu nome a um cometa.
Um pouco de conhecimento sobre o aparecimento dos oceanos: nos primeiros tempos de sua formação, a Terra era constituída por uma massa em fusão.
À medida que o planeta foi arrefecendo, os elementos mais densos ficaram no centro e os menos densos migraram para a superfície.
Alguns gases (oxigênio, hidrogénio, metano, vapor de água) escaparam do núcleo do planeta e formaram a atmosfera.
Quando a Terra arrefeceu ainda mais, formou-se uma crosta sólida e o vapor de água condensou sob a forma de líquido, dando lugar aos oceanos. E é aí que nós pescamos, hoje.
Para que fiquem com uma ideia da diferença entre água salgada e água doce, devo dizer-vos que a água “doce” que bebemos tem um grau de salinidade entre 0 e 0.5 gr/ kg.
A água salgada apresenta valores médios na ordem dos 35gr/ kg, não sendo igual em todos os oceanos.
Podem entender a diferença que estes valores fazem para todos os seres que de uma ou outra forma contactam com estes dois tipos de águas. Há uns que podem e outros que não podem viver no mar.
Temos bem próximo do local onde vivo, um exemplo flagrante de um meio termo onde seres de dois mundos diferentes conseguem coabitar: a vala da saída de água da Barragem de Sta Susana, na Comporta.
Aí, a água doce permite a vida de carpas, pimpões, achigãs, lagostins americanos, etc. E ao mesmo tempo, de tainhas, e…robalos.
Sim, há um momento em que a maré cheia traz água salgada do estuário do Sado para dentro da vala real, criando uma terra de ninguém, um ponto em que as espécies marinhas que suportam água um pouco mais doce, leia-se com menos gramas de sal, se encontra com as espécies de água dita doce, e que ainda assim tolera alguma salinidade. Numa faixa de algumas centenas de metros, é possível ver à superfície peixes que pertencem a habitats diferentes, juntos.
Se quisermos, e por habituação/ adaptação e capacidades orgânicas competentes para a função de eliminar sais, temos que algumas espécies são capazes de viver naquele meio ambiente.
Outras seriam incapazes de o fazer, e aí entram todas as espécies que vivem em mar aberto e que nunca adentram o rio.
Também as espécies vegetais passam pelo mesmo processo, existindo algumas que conseguem sobreviver em ambientes particularmente adversos, pela sua indefinição. É a salinidade que determina quais são essas espécies, as que ocupam o leito submerso ou as áreas emersas vizinhas a um corpo de água. Plantas adaptadas a viver sob condições de alta salinidade são conhecidas como halófitas.
Há mesmo alguns moluscos, crustáceos e peixes que o fazem em ciclos diários e/ou sazonais e, por isso, são chamadas eurialinos. O nosso mais conhecido exemplo é o do robalo, encontrado muitas vezes em águas praticamente” doces”.
Eles têm uma adaptação ao stress causado pela baixa salinidade que lhes permite viver onde outros concorrentes não o podem fazer. Para a espécie, isso é uma tremenda vantagem em termos de território de caça.
A nível de capacidade física, isso envolve para os nossos robalos peculiaridades fisiológicas, caminhos metabólicos e configurações muito especificas, já que tanto entram nos rios, como daí a dias podem estar fora, em mar aberto, sujeitos a condições de salinidade muito mais severas.
A circulação oceânica superficial é forçada, principalmente, pela transferência de energia dos ventos para a superfície da água. Abaixo desta camada superficial, não mais espessa do que algumas centenas de metros, as principais forças responsáveis pela movimentação da água derivam da rotação da Terra, do relevo dos fundos, das bacias oceânicas, e das diferenças de densidade e pressão entre massas de água. E aqui, a salinidade joga um factor importante.
Dado que os oceanos não são sistemas fechados, ou seja, não estão isolados em compartimentos estanques, (todos estão em contacto, pelo que até poderíamos aceitar a ideia de que existe apenas um só), o seu grau de salinidade acaba por ser a resultantes de todas estas misturas provocadas pela circulação de massas de água oceânicas.
A densidade da água varia em função da salinidade e temperatura e as diferenças de densidade (e, portanto, de flutuabilidade e posicionamento na coluna de água transportada) são responsáveis por movimentos verticais e de mistura de massas de água.
Para além de ter um papel importante nos movimentos e na mistura das massas de água, devido ao seu efeito na densidade, os sais dissolvidos na água condicionam a fisiologia dos organismos que ali vivem. Os nossos peixinhos sentem na pele os efeitos de tudo isto.
Quando há momentos, dias ou semanas em que eles estão “impossíveis”, podem perfeitamente estar a lutar contra alterações de condições naturais que nos escapam. Pode acontecer que estejam a chegar águas diferentes, com características diferentes das habituais.
Um exemplo prático e muito próximo: se há descargas de água doce das barragens, isso altera momentaneamente a densidade da água, a sua salinidade, e nós, que vamos pescar e queremos pescar, não entendemos porque razão o comportamento do peixe pode mudar de uns dias para outros.
Eles sabem sempre.
Os factores que influenciam o comportamento dos peixes são tantos, que aquilo que podemos fazer é sempre dar-lhes o beneficio da dúvida, aceitar que tenham dias difíceis e voltar a insistir, até conseguirmos o tal dia...
Há sempre um dia que é de glória para o pescador, mas para o encontrarmos, temos de tentar perceber as razões, estudar os assuntos, e sobretudo…ir pescar muitas vezes.
Vítor Ganchinho