NÓS, ... NO PAPEL DE ROBALOS

Estamos encostados a uma rocha, a sofrer os balanços da água que passa rápida ao lado. Temos fome e sabemos que o momento da maré é bom para que passe um pequeno peixe. De que lado nos chega? Qual o posicionamento que devemos adoptar realtivamente à corrente? Podem os alevins vencer a força da corrente e chegar-nos pelas costas? Em princípio não.
E isso quer dizer que o nosso robalo estará atento ao que lhe vai surgir pela frente, não pelas costas. Ao lançarmos a nossa amostra, sabemos que a trajectória natural desta deve ser algo oblíqua, de montante para jusante da corrente, se esta for muito forte. Esse é o movimento habitual das presas, fracas de forças, ao serem arrastadas pela massa de água. O contrário seria estranho, e isso já nos dá algumas pistas de como actuar.
Podemos fazer ao contrário, de resto podemos fazer tudo com a cana e amostra que temos em mãos, mas reparem a seguir como isso pode ser entendido pelo predador.
Quando se pesca com amostras de pala, emissoras de vibrações fortes, devemos tentar imaginar o quanto isso difere da movimentação normal de um peixe. Se este procura manter-se vivo, tenta passar despercebido e isso significa nadar sem chamar a atenção sobre si.
Se puxamos uma amostra de pala contra uma corrente, (e repito a questão do “muito forte”, porque há muitos momentos em que a deslocação de água é ínfima e este princípio não se aplica), estamos a criar uma enorme tensão na zona frontal da amostra.
Neste caso temos algo que se pode assemelhar a uma “ambulância de rotativas ligadas”. Nenhum peixe, em circunstância alguma, provoca semelhante tensão na água. Os que estão saudáveis, porque nadam de forma regular, e estão fisicamente estruturados para avançar na água sem provocar aquela turbulência, e os fracos, eventualmente até moribundos, porque nunca teriam forças para avançar contra a corrente. Logo é perfeitamente destituído de lógica que um robalo possa acreditar numa amostra a nadar daquela forma absurda, contra a corrente.


Na perspectiva de um robalo (ou qualquer outro predador), ver e não ser visto é uma incrível vantagem.


As vibrações de uma amostra de pala propagam-se a muitas dezenas de metros. Assustam mais do que convencem.
O mais natural é que um robalo deixe passar “aquilo”, aquele estranho ser que desloca água de uma forma anormal, que nada violentamente contra a corrente quando todos os outros o fazem a favor.
E assim sendo estamos a pescar sem nexo, e seguramente sem resultados.
Faz sentido pensar qual a deslocação natural de um cardume de pequenos peixes perante uma corrente forte? Normalmente não o fazemos.
Porque nos resulta igual lançar a favor ou contra a corrente, não nos parece que isso possa fazer qualquer diferença a quem estará por ali a tentar encontrar comida.
Por vezes, não perderíamos por ficar alguns minutos a olhar o mar e tentar entender aquilo que os nossos olhos veem. Saber observar dá-nos peixe.


Guardamos as amostras de pala para momentos de mar em que temos condições de ondulação que nos obrigam a utilizar chamarizes mais ruidosos, e a emitir vibrações que se sobreponham ao som ambiente. Por exemplo nas condições desta foto acima, em que o ruído das vagas a bater na pedra, a deslocação de pedras e areias no fundo é uma constante.


Em águas turvas, mexidas, com sedimentos e muita espuma, conforme a foto abaixo (da autoria do meu companheiro Carlos Campos), os sensores do robalo passam a entrar em actividade como as primeiras unidades de detecção. Se em águas claras a visão é o sentido eleito, já nestas condições de invisibilidade quase total, aquilo que funciona é a linha lateral, a qual é activada em primeira instância para a detecção de presas.
A sermos nós os robalos, e por falta de capacidade de distinguir os vultos dos peixes comedia, não nos sentiríamos diminuídos, antes iriamos tentar partido da situação. Não ver também significa não ser visto.
Os robalos estão de tal forma bem adaptados ao meio que são perfeitamente capazes de se alimentar em situações de águas revoltas. A prova disso são as capturas frequentes que são efectuadas com mar alterado.
A maior dificuldade prende-se com a capacidade de lançamento das canas de spinning, que nem sempre é a melhor. E nem sempre as amostras ajudam, o que aumenta o handicap.
Ser capaz de chegar atrás da onda, quantas vezes contra o vento, é o problema a resolver. E existe equipamento que permite fazer isso.


Este é um mar “robaleiro”!


Em dias em que a água está mais calma, os princípios de pesca serão outros.


Nos caneiros de rocha, a movimentação e permanência do nosso peixe é feita tendo em atenção as correntes cruzadas. Há sempre uma zona abrigada da corrente, e que esconda o predador das vistas dos pequenos peixes que entram no espaço de água. Entram para a morte.


Em situações de mar calmo, tudo o que for movimentar amostras com pala pode ser contraproducente. Podemos enganar um peixe, mas não o conseguiremos fazer com muitos dos outros que podem estar nas imediações. Os distúrbios causados pelo arraste da amostra chamam a atenção dos predadores, mas estes têm os seus limites, e passam a jogar pelo seguro. Isso quer dizer manter a boca fechada.
Nestes casos, com águas como as que podem ver abaixo, a amostra sem pala, um stickbait, são bem mais produtivas, desde que nas mãos de quem sabe.
Há quem só tenha amostras com pala. Percebo a facilidade de lançar e recolher linha linearmente, sem mais nada.
A ser assim, os fabricantes estariam todos errados em fabricar amostras sem pala. E não estão!
O que faz confusão às pessoas é que ao lançarem e efectuarem a recuperação linear, …parece nada acontecer, e parece ainda que a amostra não será suficientemente convincente para atrair as atenções do predador.
Isso advém do facto de não saberem utilizar a amostra, e nada tem a ver com a sua qualidade.
Uma amostra sem pala, por definição um stickbait, é uma ferramenta que implica um lançamento idêntico ao das outras amostras, (normalmente voa um pouco mais longe, por força do menor atrito no ar), mas a partir daí, tudo é diferente. Devemos pensá-la da seguinte forma: uma primeira recuperação linear de alguns metros, e uma primeira paragem. Após alguns segundos, 2 a 3, um novo arranque, com movimentação irregular, arranques entrecortados por pausas ou toques de ponteira a exigir mudanças de rumo e velocidade. Para um predador, isso é uma presa viva, em dificuldades, perdida, sem rumo, diminuída e sem capacidade de manter a sua discrição.
Se estão preocupados com o facto de a amostra poder passar sem ser vista ou sentida (na maior parte dos casos a visibilidade não excede os 3 a 4 metros), pois fiquem a saber que os robalos estão equipados com sensores laterais, ramificações nervosas directamente ligadas ao cérebro, que lhes dão toda a informação necessária. Já foram escritos aqui no blog artigos a versar o tema.
A partir do momento em que a amostra cai na água, é detectada! Tudo o que acontece a seguir, é responsabilidade do pescador, que, ao escolher o peso, a dimensão, a cor certas, e ao dar a animação correcta, pode fazer pender a balança para o seu lado.
O que não vai acontecer é que os robalos façam demasiadas concessões, que se lancem sem cuidados, indefinidamente, sobre uma amostra que não cumpre os requisitos mínimos.


Em águas deste tipo, a pala frontal da amostra prejudica muito mais do que ajuda. Rouba-nos peixe...


Vamos continuar com este tema amanhã.



Vítor Ganchinho



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