OS SENTIDOS DAS LULAS

Sabemos que têm grandes e bons olhos, deslocam-se com facilidade durante a noite nas suas intermináveis migrações verticais à procura de comida, e também que são predadores muito eficazes.
As lulas fazem parte de uma família muito bem sucedida em termos reprodutivos e por isso podemos esperar que existam sempre mais e mais na zona onde capturamos uma.
Mas há muito mais a saber que isso…

Para todos aqueles que já tiveram o prazer de as encontrar no fundo do mar aquando de um mergulho, e eu felizmente tive muitos encontros imediatos do 1º grau com elas, fica-nos sempre um “ar de espanto” com as suas reacções.
A mudança repentina de cores, de branco para castanho, de malhas camufladas para vermelho escuro, o quase transparente, fica-nos na retina.
Não são fáceis de enganar. Quando pensamos estar a controlar a situação, eis que expelem água pelo seu sifão e desaparecem no azul.
Têm excelentes olhos, grandes e expressivos. Conseguem ver-nos com facilidade e não obstante as manobras que possamos fazer para nos aproximar-mos, elas detectam-nas e agem em conformidade para garantirem segurança.
Se alguma forma mais fácil há de as conseguir enganar é um mergulho vertical, com uma queda mesmo por cima delas, e aí sim, ficam sem saber que lado escolher para a fuga. E deixam-se aproximar.
O resto é uma assombrosa capacidade de detectar vibrações (usam-na para detectar peixes em dificuldades...), boa audição, e ao que se sabe um olfacto e tacto bem desenvolvido. Chama-se a isso em termos científicos algo como capacidade quimiossensorial.


Quanto mais pequenos os jigs, mais fácil é pescá-las... os bicos das fateixas ficam mais próximos.


De facto, há muito se sabe entre os cientistas que os cefalópodes são moluscos como os perceves, os mexilhões, os búzios, mas estão funcionalmente muito mais próximos dos peixes.
Como moluscos evoluídos, os cefalópodes têm uma variedade de sentidos muito parecidos com estes.
Em particular, lulas, polvos e chocos têm três sentidos que são muito importantes: habilidades quimiossensoriais, que monitorizam constantemente o ambiente químico ao seu redor.
A capacidade quimiossensorial geral da pele, a capacidade quimiossensorial remota e ainda a capacidade quimiossensorial ao toque.
A sensibilidade da pele detecta qualquer tipo de informação química que exista em redor. No caso de haver algum tipo de acidez, e pode acontecer por intervenção humana, em descargas de fábricas, etc, as lulas tratam de se afastar de imediato daqueles vestígios de substância irritante.
Têm também a capacidade de “cheirar” produtos químicos dissolvidos na água. As lulas têm um órgão olfativo atrás dos seus globos oculares, perto do sifão através do qual a lula expele água.
Este órgão olfativo é capaz de "quimiorecepção remota", ou seja, a capacidade de analisar os odores de substâncias a alguma distância. O olfato da lula não é usado apenas para se proteger de predadores e detectar odores sexuais para reprodução, mas também para rastrear e examinar presas à distância. Quando uma lula encontra um ténue cheiro emitido pelos peixes ou camarão de que se alimenta, ela pode detectá-los em frações de segundo.
E falta referir a capacidade quimiossensorial mais remarcável dos cefalópodes: a capacidade de "detecção química por contato", ou seja, "sabor".
Os receptores gustativos das lulas, polvos e chocos estão localizados principalmente nos braços, tentáculos e ventosas implantados à volta da boca.
As lulas e demais cefalópodes têm um sentido de paladar muito forte. Por exemplo, o polvo tem cerca de 10.000 receptores de sabor apenas numa das suas ventosas.
Um braço tem mais de 200 ventosas, logo um polvo crescido tem cerca de 16 milhões de receptores de “gosto” ou se preferirem…paladar. A lula é um pouco menos dotada, mas ainda assim tem características que a tornam um ser incrível.




Para elas, o cheiro é algo muito importante. Conseguem analisar a textura e sabor das suas presas, sem lhes tocarem. Porque é algo que nós humanos não conseguimos fazer, causa-nos estranheza.
É por isso que atrativos químicos e iscas com cheiro a peixe comedia são tão importantes na pesca das lulas. Podemos “esfregar” a nossa toneira em sardinha, e isso irá incrementar imenso a atractividade desta.
No cérebro da lula, a informações sensorial do olfato e a informações visual são integradas, ocorrem em conjunto, de modo que a lula pode distinguir facilmente entre iscas com ou sem sabor a peixe.
O cheiro da comida, eventualmente sardinha ou cavala, tem o poder de atrair as lulas para mais perto. Seguem a amostra. Porque são canibais assumidas, (as lulas comem outras lulas e não necessariamente mais pequenas), não vale a pena trocar de amostra/toneira ao fim de algumas capturas.
O facto de haver cheiro a outras lulas na amostra acaba por as excitar ainda mais.
Quando conseguem contacto com a amostra, pese esta tenha uma consistência muito mais dura que as suas presas habituais, e pese a presença dos alfinetes onde se picam, se a amostra tiver cheiro a isca, elas irão agarrar-se ferozmente.
Quando convencidas que conseguiram uma presa, mesmo que seja apenas a nossa toneira, não largam mesmo que já na presença do barco. Algumas delas nem cabem no nosso barco…..


Há lulas a avizinhar com tentáculos incluídos, algo como 20 metros e de peso... uma tonelada. Não as tentem pescar…porque mandam o barco abaixo.


As lulas "testam" qualquer objecto que capturem e tentam determinar se é comida ou não. Se um objeto for insípido ou tiver um sabor que não lhes agrada, as lulas decidirão que não é comida e tentarão soltá-lo imediatamente.
Por vezes é demasiado tarde... se acertarmos com as fateixas certas. Um triplo leve, afiado e no tamanho certo...
Vale a pena gastar algum tempo a procurar este tipo de cefalópodes. Na cozinha são sempre bem recebidas.
A próxima época forte será o mês de Janeiro, quando as águas já estão bem frias. Podem pescar-se facilmente com jigs, pelo que podem ser encaradas como complemento a uma saída de mar aos pargos, por exemplo.
Não são difíceis, de resto dão-nos sempre a possibilidade de podermos mudar de amostras, fazer novas passagens na zona onde se concentram, já que permanecem activas durante bastante tempo nos pesqueiros.

É tentar!



Vítor Ganchinho



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