Trago-vos hoje um tema bem curioso, e que versa o robalo e a sua estranha forma de se livrar de parasitas.
A maior parte dos nossos predadores sofrem, nalgum momento da sua vida, com parasitismo. No caso concreto do robalo, isso acontece por este frequentar zonas com águas menos... convenientes.
Se gostamos de o imaginar em turbulentas e revoltas águas na costa rochosa, e a imagem que queremos guardar dele é muito essa, também não deixa de ser verdade que o “malandro” do robalo vai muitas vezes... onde não deve, a águas bem mais paradas e... impuras.
Podem ir vê-los rebolar sobre infindáveis cardumes de tainhas, milhares delas, na saída do emissário do Clube Naval de Setúbal, por exemplo. Os meses de Verão trazem esse espectáculo à luz dos candeeiros de luz.
Para aqueles que conhecem, sabem que não será raro que surjam robalos de peso superior a 8 kgs a “trancar” tainhas naquele spot.
Na verdade, as tainhas são tantas que literalmente entram dentro das goelas do predador, sem que este tenha de fazer mais que abrir a boca. No escuro da noite, todos os gatos são pardos, e por isso mesmo, as tainhas nem reagem à proximidade daquelas estranhas “tainhas” de tamanho descomunal. A visibilidade tão pouco ajuda, é um caldo de lama e detritos fétidos.
Essas águas serão tudo menos …cristalinas, mas é aí que o robalo consegue alimento de maneira fácil. A segurança é obtida dentro do Clube, onde os barcos, cabos, boias, impedem qualquer acto de pesca.
Esta situação promove nestes animais uma grande proliferação de tudo o que sejam parasitas e a dada altura é necessário retirá-los.
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| Nem sempre as águas serão como estas, oxigenadas, com correntes fortes, cheias de vida. |
O robalo pode fazê-lo de diversas formas, por exemplo visitando saídas de água doce, as quais aportam aos parasitas marinhos muito baixas salinidades, e consequentemente a necessidade de saltarem do dorso do seu hospedeiro.
Uma outra forma é a exposição solar directa. Já repararam que muitas vezes encontramos peixes encostados à linha de água, em dias de muito calor. Ficam como que parados a “tostar” ao sol, e quando passamos no barco fazem
uma descida abrupta, seguramente forçada pela passagem de um inconveniente intruso. Eles sabem que estão ali por uma razão muito especifica: libertarem-se de inquilinos indesejados. O sistema é simples, como é afinal tudo o que envolve a natureza: os raios de luz incomodam os parasitas, os quais são obrigados a largar, e a retirar para o fundo.
Também os saltos fora de água com o consequente “chapão” não são propriamente brincadeiras de peixes, são algo de muito mais sério.
Há muitas outras formas e um das mais comuns é mesmo a “esfregadela” numa superfície rugosa. Isso pode acontecer numa pedra, na areia do fundo, ou até numa estrutura em cimento, por exemplo num cais.
Certamente já o viram com os vossos olhos, aquele “flash” brilhante, que mais não é que a passagem rápida por qualquer coisa que se assemelhe a “lixa”, e que possa servir para remover as inoportunas “carraças” que pululam nas águas costeiras.
Muitos outros peixes o fazem, e basta que estejamos perto da água, com algumas condições de visibilidade, para que o fenómeno surja à luz dos nossos olhos. Os sargos, as douradas, as salemas, as tainhas, todos esses peixes são atacados pela bicheza e todos eles começam por “raspar” sobre uma pedra, ou algo similar, para conseguirem manter a pele e as escamas limpas.
Aquilo que os robalos mais fazem é mesmo esfregarem-se violentamente contra o fundo. O chamado fenómeno ‘flashing’ é um daqueles comportamentos peculiares do robalo cuja origem apenas adivinhamos, mas que não andará muito longe de uma necessidade absoluta de limpeza. Penso que todos vós já viram peixes fazer isto. Em águas rasas e límpidas é possível, por vezes, avistar o robalo pelo clarão prateado do seu flanco. Este flash é produzido quando o peixe vira de um lado e parece esfregar um dos flancos na areia.
Esse comportamento geralmente ocorre quando os peixes estão em cardume, repousando das suas correrias de caça, descansando próximo do fundo. Tenho a certeza que já viram isto, admitindo que na altura possam ter desvalorizado o assunto.
Funciona assim: ocasionalmente, um dos indivíduos afunda lentamente em direção à areia, ou uma pedra, e, de repente, avança, vira de lado e parece esfregar um flanco no substrato.
Para quem está acima da linha de água, o que é perceptível é o movimento brusco, o brilho, e a seguir o retorno à calma.
Embora seja principalmente uma característica do robalo, as tainhas, os sargos, as douradas, às vezes também exibem esse comportamento. Roçam-se no fundo.
Mas vou falar-vos a seguir de uma outra atitude que não estará muito longe desta.
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| A ponta do cabo Espichel. Por aqui passam robalos, corvinas, sargos, etc, etc... |
Um outro comportamento que já vi aos robalos, e sobretudo às douradas e sargos, é o facto de eles conseguirem esconder-se na areia, enterrando-se.
Essa atitude é algo estranho e seguramente muito raramente observada por pessoas.
Por mim isso foi descoberto há umas dezenas de anos atrás, quando estava a mergulhar aos sargos numa pedra a que chamo o “cogumelo”. Dei-lhe esse nome por ter essa forma, estreita em baixo e um pouco mais larga acima, com prateleiras exteriores paralelas ao fundo a meter muito sargo.
Mas é no seu interior que ela é mais valiosa. Sendo uma pedra oval, toda ela oca por dentro, tem uma enorme câmara escura e ampla, resguardada, com apenas uma entrada e fundo interior em areia fina. É um sitio privilegiado para receber muito peixe, e de boas dimensões.
Ali, tudo está a salvo de qualquer tipo de rede, o peixe sente-se seguro e por isso se juntam muitas dezenas de peixes de bom porte. Estão a salvo de tudo, mas não de caçadores submarinos que desçam aos 20 mts de fundo.
A dada altura, e depois de já ter arpoado uma dezena de sargos acima de 1,5 kg, e uma saima de 4 kgs, reparei que havia zonas da areia que... mexiam. Numa inspeção mais próxima, reparei que aquilo que se movia na areia eram... peixes enterrados.
Aas barbatanas caudais e os opérculos podiam ser vistos projetando-se um pouco acima do substrato arenoso, o que os denunciava. Eram douradas de 3 a 4 kgs.
Depois disso voltei a ver o fenómeno mais algumas vezes, e atribuo o facto a ser a derradeira possibilidade de o peixe conseguir esconder-se quando já não tem outra possibilidade de fuga.
Para mim é isso, a única explicação que lhe encontro é que esse comportamento de o peixe revolver a areia para se enterrar possa tratar-se de um mecanismo instintivo de sobrevivência.
Mas recordo-me também de, noutra ocasião, estar a mergulhar e já no fundo, parado, ver um jovem robalo fazê-lo, enterrar-se no sedimento de forma discreta.
Uma possível explicação é que isso lhe possa servir de ponto de partida para um emboscado acto de caça, ou, no caso de sentir perigo, de uma tentativa de “desaparecer” de cena, uma forma de se esconder face à ameaça de predadores.
Cada vez mais as pessoas partilham experiências pessoais, e por isso mesmo, cada vez o comportamento dos nossos peixes será mais claro, mais nítido.
Num mundo globalizado, e partilhado, as pesquisas sobre o robalo revelam cada vez mais informações sobre esta incrível espécie.
No entanto, ainda existem muitas coisas sobre o Dicentrarchus labrax que permanecem um completo mistério para nós. Por isso, temos ainda margem de progressão, podemos ainda vir a saber muito mais sobre ele, e também sobre todos os outros peixes.
O blog peixepelobeicinho vai continuar a passar-vos informação!
Vítor Ganchinho
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