PRIMEIRO DIA DE JIGGING DE ANTÓNIO GASPAR. QUE NÃO O ÚLTIMO…

Fui pescar com um amigo que prezo imenso e que muitos de vós conhecem: António Gaspar.
Para quem eventualmente possa não identificar de imediato, digo-vos tratar-se na actualidade de uma das pessoas mais marcantes da náutica portuguesa. 
Ou não fosse o responsável pela empresa que mais motores marítimos vende em Portugal. 
Reduzindo ao mínimo dos mínimos, falamos dos motores japoneses Honda Marine. E já agora, porque eles não navegam sozinhos, os super barcos Lomac, de fabrico italiano. 
Dois topos de gama, pois sim. A empresa Grow, sua propriedade, distribui uma imensidão de outros produtos, e até outros motores, (Tohatsu), mas fiquemo-nos pelo mínimo de informação. 
Vão ao site da Grow Iberia,  https://www.grow.com.pt/ e passam a ter uma ideia do mundo que essa empresa trabalha. 
Porque me prezo de ser apologista de comprar bom, para não ter de comprar muitas vezes, entreguei a um conjunto Lomac + Honda a responsabilidade de me transportar com o máximo conforto, economia e rapidez para os meus locais de pesca. Isso é o mínimo que aceito ter: tudo.  

Já tive muitos barcos. O melhor de todos é este, um Lomac, equipado com um Honda BF 175, concebido especificamente para pesca à linha. 
 

Não serei um cliente fácil, assumo. 
Desde logo porque sou extremamente exigente em questões de qualidade, de detalhe. 
A seguir porque prezo acima de tudo a minha segurança, e a dos meus. 
Possuir um barco é um tremendo prazer, proporciona-nos incontáveis alegrias, mas é também um equipamento que, não estando em conformidade com todas as regras de segurança, pode ser um verdadeiro problema. 
No mar, uma avaria absolutamente inócua em terra, pode transformar-se numa tremenda dor de cabeça. Por isso mesmo, eu, que pesco “para lá do sol posto”, em locais onde pouca gente vai, isolados, não posso arriscar. 
Exijo fiabilidade total, zero falhas, zero avarias, zero dúvidas. 
A minha família espera por mim em terra, e por isso, …Honda. Dou à chave e volto a casa. 
Não faço concessões de “um preço um pouquinho mais baixo”, ou “este também já é bonzinho”, …
E o António Gaspar sabe disso e sabe que para mim, que não sou esquisito, o melhor topo de gama já me basta. Por isso, quando me aconselha barcos ou motores, sabe que está a tratar de um assunto sério, de alguém que vai para o mar e joga a sua pele a cada dia. Alguém que quer ir… descansado. 

No caso vertente, a saída foi feita a partir do Clube Naval Setubalense, e o destino era nem mais que um conjunto de pedras ao largo de Sines. Complicado? Nem tanto, para um barco Lomac Big Game 660 equipado com motor BF 175 Honda. Este conjunto é mais um avião que um barco, porque voa! 
Voa baixo. Por vezes tão baixo que tenho até a percepção de que o hélice toca na água. 
Eu tinha saído no dia anterior, e porque entrei já muito justo de tempo por ter outros afazeres urgentes, não fui meter gasolina. A dada altura, e já bem ao largo, e com muitas milhas feitas, o meu convidado olhou para o ponteiro do manómetro e perguntou-me: “Vitor, o combustível chega para voltarmos…?” 

Encolhi os ombros. Olhei para ele nos olhos e sei que resmunguei qualquer coisa que lhe serviu de consolo. É verdade que a estrada é larga e eu nunca ando devagarinho, mas conheço bem a minha máquina e sei o que posso pedir-lhe. 
 
Aqui, o SPRINT no “aeródromo” do Clube Naval Setubalense, quase pronto a entrar para a pista e levantar voo. 


Sobre o tema “consumo” há algo que eu posso dizer-vos: para os percursos que faço no mar, (posso sair de Setúbal e ir lançar linhas aos grandes robalos de Vila Nova de Mil Fontes!), e as velocidades a que ando, aquilo que gasto em gasolina é quase nada. 
Diria que o meu motor Honda trabalha a… “cheiro de gasolina”. Eu faço é uma barbaridade de distâncias, porque quando saio com alguém aquilo que me interessa é o resultado ao fim do dia, o peixe grande que entra na caixa, e não o consumo de combustível gasto para o obter. 
Assim sendo, as minhas saídas nunca serão baratas, mas à anteriori isso são sempre custos assumidos. Não há muitas concessões a fazer em termos de gastos porque eu quero mesmo é pescar, não ir ao mar fazer um mero exercício de poupança. 
Porque vou pescar muitas vezes e porque os valores são sempre… “valentes”, isso deixa marca. Quando chego à bomba de combustível a senhora que me atende… trata-me pelo meu nome. 

Cada um no seu ramo. Da mesma forma que o António não repara em pequenos detalhes de pesca, (a forma como as derivas são feitas em função do vento, da corrente, do diâmetro das linhas, do peso dos jigs, as cores, as canas e linhas utilizadas, etc.), também eu serei capaz de não reparar em alguns dados que ele conhece bem, porque trabalha estes motores e barcos há anos. Seguramente ele vê coisas no meu barco que eu não consigo ver. 
E sim, é verdade que o percurso que idealizei era ambicioso, e a velocidade de deslocação nesse dia foi porventura algo excessiva. 
Por isso entendi a preocupação dele: velocidades loucas significam consumos de gasolina absurdos, mas neste caso, havia razões fortes para eu apertar a sério com o motor. 
 
Os golfinhos aceitam fazer corridas comigo, mas só até às 1.500 RPM.
A partir daí abrem alas e ficam a ver aquilo que está escrito em letras grandes, nas costas da minha camisola.


Concretamente nesse dia, era necessário ser rápido. 
A razão teve a ver com o facto de termos uma maré cheia com estofo por volta das 6.30 da manhã, e o Clube Naval de Setúbal estar atestado de barcos para colocar na água nesse dia. 
Saímos já para o tarde, uma hora depois e com a maré já a descer, ou seja, em perda para aquilo que queríamos tratar: ver das lulas e tentar algum pargo bom que tivesse passado a noite em cima da pedra. 
A época do ano indicava a possibilidade de pescarmos peixes do azul: atuns sarrajões, sardas, algumas lulas, as inevitáveis cavalas. E bem no fundo, as bicas e os pargos das Canárias, que estão aí agora, em força. 
O quadro de pesca previsível era este, e a estratégia foi direcionada neste sentido. 
Pressionei o barco Sprint para tentar ganhar algum tempo mais, queria ainda água alta a correr nos pesqueiros, sabendo de antemão que teria de ser muito rápido a decidir sobre os locais a visitar, e a forma de lhes fazer a abordagem.  
O mar em Sines, embora sem vento, estava com alguma força de fundo, com ondas ocasionalmente a trepar aos 2 metros, e isso muda um pouco a forma de trabalhar os jigs ao longo dos diversos planos de água. Expliquei-lhe isso. 

Quando levamos connosco uma pessoa que vai fazer jigging pela primeira vez, é muito importante que os princípios básicos da técnica sejam passados de forma clara, precisa, pois serão eles que irão nortear toda a manhã de pesca, e determinar os resultados obtidos. 
Independentemente da maior ou menor capacidade que a pessoa possa revelar, (e há pessoas que pura e simplesmente não entendem o que devem fazer, mesmo a ver fazer), ajuda que se tenha algum instinto de pesca. E ainda mais: que se goste de pesca. 
O António tem isso tudo e tem mais: tem a percepção do princípio técnico, da mecânica que está subjacente ao acto de lançar e recuperar jigs. Senti que conseguiu interiorizar o conceito muito rapidamente. Ajuda o facto de ter formação superior e o espírito suficientemente aberto para aceitar passar um dia com alguém que lhe iria mostrar algo novo: o jigging ligeiro. 
 
António Gaspar com uma bica das antigas… meio “desgrenhada” nas barbatanas, do camaroeiro. 


Eu sinto alguma apreensão quando digo às pessoas: hoje vamos pescar com estas peças metálicas. Com jigs. 
Franzem o sobrolho, engolem em seco, e acho que interiormente assumem o dia como perdido. 
Olham-me como se eu tivesse acabado de aterrar de outro planeta, sem ter tido tempo para ir comprar iscas. 
Mas os jigs dão-me tudo o que preciso, e a prova disso foi a pescaria que acabámos por fazer. Com jigs e nada mais que jigs. 
Para mim, e sabendo que o iria retirar da sua zona de conforto, foi ainda assim muito fácil passar-lhe a ideia daquilo que teríamos de fazer nesse dia, perante aquelas condições. 
Ao fim de 10 minutos de pesca já estava a subir peixes bonitos, e a convencer-se de que a minha aposta em sair de casa apenas com meia dúzia de canas e uma caixa de amostras de chumbo coloridas, afinal poderia não ser tão despropositada assim. 
Os peixes entraram no barco de acordo com as minhas expectativas: fomos de mais a menos, a actividade decresceu conforme eu tinha avisado à saída de Setúbal. 
A maré a descer desmobiliza progressivamente o peixe, esvazia-o de agressividade, e da necessidade de comer. 
 
Uma lula vítima de um jig. Viria a ser a única do dia. 


O ciclo de alimentação na nossa costa é algo longo, prolonga-se ao longo das seis horas de enchente, indo de menos a mais, aumentando significativamente nas últimas três horas. 
Isso não nada tem de estranho, pois coincide com o aumento da força da corrente, dando vantagens nítidas aos predadores sobre as suas presas. 
Por estarem melhor equipados para trabalhar em condições adversas, tiram partido sobre os mais fracos e indefesos. É assim e pouco há a fazer para alterar leis naturais que não são nossas. 
A seguir a este pico de actividade, volta a calma, tudo abranda. Os peixes não comem 24 sobre 24 horas, porque ...não precisam. 
O que aconteceu neste dia, com a maré a descer, foi precisamente isso: um ritmo de mais a menos, em que explorámos cada possibilidade até ao fim. A gestão dos timings foi minha e senti confiança da sua parte nas minhas capacidades. 
Num período em que o peixe já estava mais a querer descansar que a procurar comida, o António Gaspar fez ainda assim muito mais que aquilo que era pressuposto. 
Os peixes que deixou escapar decorreram de ajustes técnicos que chegam com o tempo, com a experiência. 
São de resto detalhes muito comuns a quem começa. A falta de reacção imediata e instintiva à picada, o afrouxar a recolha na subida, (e a consequente perda de tensão permanente na linha), a recolha do leader até onde não pode ser recolhido, deixando o peixe com a boca encostada à ponteira, etc, acarretaram a inevitável perda de alguns exemplares de bom porte. 
Mas isso é facilmente corrigível, nada que não se melhore numa saída seguinte. Felizmente nunca os pescamos todos. 

António Gaspar com o seu primeiro robalo. Um momento que nunca esquecerá. 

 
As bicas, sempre posicionadas no limite da pedra, são clientes de jigs ligeiros. Fez duas e ficou feliz. Senti-o feliz. 
Daí a pouco, e já numa outra pedra, um robalo de 2 kgs veio ajudar a encher a geleira. 
Ouvi dizer qualquer coisa sobre comprar uns quilos de sal, para o fazer essa noite. Um robalo ao sal não é de deitar fora…
O António merecia aquele peixe, e felizmente conseguiu trazê-lo até acima. Acho que fiquei ainda mais satisfeito do que ele. Um guia de pesca realiza-se a passar conhecimento, e a ver utilizar essa informação daquela forma, com resultados palpáveis. 

Os cardumes de robalos frequentam locais muito bem definidos, de rotina, onde montam os seus postos de caça. Não serão imprevisíveis de todo.  
Para quem tem a responsabilidade de decidir sobre os sítios onde vai, chegar ao sítio e constatar que o peixe está lá é… reconfortante. E se sai um peixe bonito, e na linha de um amigo, mais ainda. 
É uma satisfação imensa estar num barco com uma pessoa que vibra daquela maneira, que está a desfrutar da pesca pela pesca, pela paz de espírito que o mar transmite. 
Eu estava a pescar, algo que gosto muito de fazer, com um amigo que estava bem, que se sentia bem. Perfeito.  
A partir daquele momento, não acontecer mais nada não seria dramático. Mas aconteceu.

A entrada de uma bica com cerca de 1,2 kgs, deixou-lhe os olhos a brilhar de alegria. E a seguir …o robalo, que o fez tocar as campainhas do céu. 


Pescou isto e mais dois chocos, tamanho XL, e uma lula, no seu primeiro dia de jigging. 
Depois de uma passagem pelos meus amigos golfinhos, que nos presentearam com um passeio animado ao longo de umas centenas de metros, chegámos a uma zona onde eu costumo parar para pescar alguns peixes aranha. São peixes adultos, com pesos que podem rondar os 500 gramas, por vezes mais. São corpulentos, interessam-se pelos jigs, e são muito bons no prato. Por isso os pesco. 
Desta vez não apareceu nenhum desse calibre, mas ainda assim houve meia dúzia deles que se lançaram aos jigs. 
E, surpresa das surpresas, começaram a entrar os chocos. Primeiro a mim, a seguir ao António. Subiram três, mas poderiam ter sido mais, pois houve oportunidades para isso.   

Gosto particularmente desta foto. Este choco foi o primeiro a sair, mas haveria mais dois a entrar no barco nesse dia, ainda maiores. 


Subir chocos com toneiras é algo que se faz todos os dias no Sado. Se multiplicarmos por todos os barcos e pescadores destes cefalópodes, diria que acontece muitas centenas de vezes. 
Pescar chocos com jigs não será tão comum. 
As imagens que podem aqui ver indicam que também é possível. Segunda-feira, num artigo que vai complementar este, passo-vos um filme feito sobre esta pesca de chocos. 
Não percam porque vale a pena. Prometo algumas surpresas….
 
Francamente! O realismo destes jigs da Little Jack é incrível! Enganamos os peixes com eles porque isto é o que eles comem todos os dias. 


Existem na GO Fishing versões em 20, 30, 40, 60 e 80 gramas, em diversas cores, todas muito próximas do real. 
Mais dois ruivos, e a pesca jigging estava feita. O tempo pára quando estamos no mar, mas não pára em terra. Tempo para voltar a casa, para junto das famílias. 
De retorno ao porto, senti que tinha valido a pena, que tinha sido uma manhã muito bem passada, com alguém que faz muito bom ambiente. O tipo de pessoas que queremos ter perto de nós, porque é assim que a vida faz sentido. 
E já agora: a gasolina sobrou, mesmo com o motor a ser apertado a sério. 
Entrámos ainda com 1/4 de depósito por gastar. 


3 Comentários

  1. Fantástico Vitor
    Até eu sentado no sofá vibro com toda a descrição dessa pescaria. Top!
    Grande abraço
    Toze

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    Respostas
    1. Olá Tozé!

      O jigging é uma modalidade que permite a obtenção de bons resultados, logo nos primeiros dias de prática. Com o António Gaspar foi tiro e queda, que é como quem diz: chegou e começou a levantar peixe.
      Há pessoas com mais intuição, outras menos, mas regra geral, desde que a pescaria seja preparada com algum cuidado, bons materiais, uma zona de pesca boa, aparecem sempre peixes bonitos.
      Agora estamos numa altura que é "supimpa" para isso, porque há menos gente nos pesqueiros, o peixe está mais descansado, logo mais disponível para morder os jigs.
      Este fim de semana foi de arromba!

      Abraço
      Vitor

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