A PREPARAÇÃO DO EQUIPAMENTO PARA UMA EXPEDIÇÃO DE PESCA

Parece-me ser fundamental entender que pescar bem não é pescar muito. Um só peixe pode ser tudo!
Um bom dia de pesca não é um dia em que enchemos uma caixa de peixe, é sim um dia em que, por força de um desempenho técnico de qualidade nos superámos, um dia em que fomos melhores que o nosso anterior melhor.
A evolução de um pescador não é linear, depende de inúmeros factores, não necessariamente relacionados com o equipamento de pesca, a embarcação, ou sequer a técnica de pesca. Por vezes o factor limitante é mesmo o peixe.
Bons pescadores podem fazer com que o número e qualidade de contactos seja superior, mas tudo tem os seus limites.
Se acontece um dia em que o peixe não tem fome, se por qualquer acontecimento extra a quantidade de comida na zona excede em muito aquilo que é normal, podemos ter um dia difícil.
Nessas circunstâncias vamos ter toques de valor inferior, sem energia, sem entusiasmo, sem chama. E por isso mesmo iremos falhar alguns deles. Há que saber aceitá-lo, saber conviver com isso.
Nesses dias, por estranho que vos pareça, vamos aprender muito mais que nos dias bons, em que tudo é fácil. Vamos ter de nos superar, de ir além do nosso melhor.
Quantas dezenas ou centenas de vezes temos de falhar para aprender a fazer? Isso depende de cada um, da sua capacidade de aprendizagem, do entusiasmo que coloca na árdua tarefa de melhorar o seu nível de conhecimentos.
Aquilo que pode e deve ser trabalhado antes de acontecerem falhas, é o equipamento. Isso pode ser feito na tranquilidade do lar, em perfeita estabilidade, quer física quer emocional.
Muito do sucesso na pesca deve-se a uma boa preparação prévia do equipamento.


Fantástico peixe, este! Pesquei-o em Angola ao lado do meu amigo Luís Ramos, a foto foi feita por ele. Para mim, resulta mais interessante um peixe de fundo que um tunídeo, por exemplo.


Quando saímos da nossa zona de conforto, quando somos confrontados com realidades que excedem em muito aquilo que costumamos fazer, isso obriga-nos a aprender depressa, sob pena de passarmos um mau bocado. Entendo que interiormente podemos aceitar as derrotas que nos são infligidas pelos peixes, desde que saibamos tudo ter feito para as evitar. Já alguma vez alguém conseguiu pescar todos os peixes que teve oportunidade de pescar?! Penso que ninguém.
Não têm ideia da quantidade de insucessos que tenho na minha coleção de 54 anos de pescador. A quantidade de vezes que tive um toque e não consegui ferrar, ou de um peixe que me escapou por aselhice minha, por trocar as mãos no pior momento. Ou um peixe que cumpriu tudo o que está no caderno de encargos, deu boa luta, trabalhei bem, e ao chegar à superfície, soltou …foi embora.
Isso fez, faz e fará parte da minha aprendizagem, da minha formação como pescador de linha, até ao fim dos meus dias.
Continuo a perder peixes, a cometer erros, felizmente cada vez menos, mas assumo isso sempre como parte integrante do processo de pesca. Quando acontece, tento perceber o porquê, e…lanço de novo.
No próximo número, vou contar-vos a história de uma garoupa monstruosa que tive a oportunidade de pescar por seis vezes, e em todas elas …falhei!
Nunca por falta ou deficiência de planeamento de material, conforme irão ver, mas sim pelas contingências em que a própria pesca é fértil.
Preparem-se para ler um relato na primeira pessoa de um dos meus maiores falhanços de pescador.
E na verdade, analisando friamente, ali e naquele momento, não poderia ter feito melhor. O equipamento esteve à altura, e eu fiz o que devia ter feito.


Alguns peixes são bem mais lutadores que outros. Desafiam as nossas capacidades e brindam-nos com combates que os enobrecem enquanto peixes e dão sentido ao acto de pesca.


Preparar equipamentos não é uma ciência oculta, mas trata-se de um trabalho que exige paciência, conhecimento, e alguma rotina, experiência.
Há que imaginar o tipo de esforço a que os equipamentos irão estar sujeitos, e limitar os pontos fracos de forma a que não sejamos vencidos por um nó, uma argola de um jig, uma linha.
Em zonas onde a quantidade de pescado é superior ao normal, podemos nem “sofrer” demasiado com isso. Vai um e chega outro, e o dia de pesca segue.
Mas os peixes grandes fazem-se merecer, e podemos não ter duas oportunidades, nem no mesmo dia, nem na mesma viagem. Por isso, há que aproveitar muito bem as possibilidades de fazer um bom peixe.
Os equipamentos de pesca devem ser preparados de forma a serem efectivos auxiliares de pesca, e não algo que nos atrapalha, que não nos deixa manobrar convenientemente.
Lutar contra os peixes já é suficientemente difícil, não precisamos de mais handicaps.
Nesse sentido, parece-me útil que se peçam conselhos a quem tem experiência prévia, nomeadamente a quem está no local e sabe por inerência de cargo aquilo que faz falta, e o que não faz mesmo falta nenhuma.


Uma abrótea local, bem diferente das nossas. Trata-se de uma Brotula barbata, (Bloch and Schneider, 1801), em inglês Bearded brotula. Este peixe, que pode atingir 1 metro de comprimento e vive até aos 650 metros de fundo, lançou-se a um pequeno peixe que bateu no assiste ainda na descida. Os atuns sarrajões são iguais aos nossos.


Algo a que atribuo uma importância acrescida é a questão da linha multifilamento. Para que tenham uma ideia da diferença de velocidade de queda do nosso jig, digo-vos que, para pesos idênticos,
e lançando o jig ao mesmo tempo, cheguei a ter diferenças de 15 segundos na chegada ao fundo, a 135 metros. Eu tinha PE 4 e o Luís estava com PE 2,5.
Podem pensar que não faz diferença, mas 15 segundos fazem mesmo muita diferença!
Tentem imaginar que pescam numa embarcação com amuras algo altas. E que está a soprar uma brisa de vento. Depois de posicionarem correctamente o barco, e de fazerem o vosso lançamento, vão desbaratar, para além do tempo normal de queda do jig, mais 15 segundos, antes de estarem efectivamente a pescar. E isso significa que podem dizer adeus ao ponto alvo, onde pretendiam colocar a peça, eventualmente um cardume posicionado num determinado lugar. O jig irá cair onde não está o peixe porque a deriva vai ser grande. Não vão pescar na vertical, e pior que isso, vão pescar longe do peixe.
Por outras palavras, podem estragar a pesca, à conta do medo de pescar mais fino.
Tudo começou na escolha errada da linha. Daí ser tão importante seguir os conselhos de quem está habituado a pescar na zona, logo a saber muito bem o que faz.


As pequenas corvinas são muitas, e voluntariosas. Imaginem que chegamos a considerá-las um…”estorvo” que não quereríamos ter na linha.


Nunca é demais referir a importância do leader, o baixo de linha que liga o multifilamento ao jig, e que lhe confere a necessária invisibilidade. São três a quatro metros de um polímero que queremos tão fino quanto possível, mas com a resistência necessária para aguentar os embates do peixe. Ao mesmo tempo, terá de poder suportar a fricção com os dentes do predador, pois nunca sabemos quando este irá conseguir engolir a totalidade da peça. Se isso acontecer, o nylon, ou preferencialmente o fluorocarbono, irá ficar em contacto directo com a dentição do peixe e sabemos o quanto esta é abrasiva para as linhas.
Ter uma rotura de linha a pescar um peixe de 1 ou 2 kgs, deixa-nos tristes e desapontados, mas ter uma rotura de linha a pescar um peixe de 40 kgs, deixa-nos furiosos e impossíveis de aturar!
Por isso, e sem olhar a que pode custar mais alguns euros, iremos optar em definitivo por fazer as nossas baixadas em fluorocarbono. A diferença, mais que a hipotética invisibilidade por menor refração da luz, prende-se com uma característica física do fluorocarbono, a sua enorme resistência ao desgaste, à abrasão.
Isso pode dar-nos, ou tirar-nos, um peixe bom.


Este pargo capatão, pescado em águas nacionais, seria um bom peixe. Ali, está ao nível de um peixe …comum. Tudo é relativo.


Dada a profundidade a que se pesca, e a luta fratricida que é trazer cada um dos peixes para cima, acaba por ser mais avisado pescar com assistes duplos, quer à cauda, quer à cabeça.
O Luís faz isso, sempre, e percebo a intenção. Ter a noção de que todos os pontos de contacto de anzóis com o peixe são pontos de apoio, é importante.
Àquele nível, nada é dispensável.
Também o tamanho dos anzóis deve ser generoso, entre nº 4 e 5. Passo-vos uma imagem de um assiste standard, utilizado por este profissional:




Durante a subida, pode sempre acontecer que um dos anzóis se desprenda. Da mesma forma que um outro, no calor da refrega, acabe por se espetar. E isso garante-nos segurança. Perder um peixe por falta de cuidado nosso é um perfeito horror!
Vejam como eles nos surgem quando chegam cá acima:




Os lírios são peixes nobres, lutadores, que invariavelmente são devolvidos com vida e em boas condições de sobrevivência ao mar.
O Luis Ramos faz isso por uma questão de ética, pois sabe que se tratam de peixes que crescem até muitas dezenas de quilos, acima de 100 kgs, (temo-los com 80 a 90 kgs na Madeira) e por isso resulta inglório matar um peixe em idade juvenil.
Respeitar a vida um peixe juvenil faz-nos sentir muito bem, traz-nos felicidade, sentir que somos mais pescadores.
Lutamos com peixes adultos, e não vencemos sempre, porque esses estão em condições de nos desfeitear. Por vezes vencem eles!...
Mesmo sendo um peixe facilmente vendável, ele abdica de o fazer, de receber o valor que poderia obter. Encontrei lírios num supermercado local, vendidos sob a forma de peixe seco e sob o nome de “piazeite”.
Os angolanos chamam “peixe-azeite” ao lírio, vamos lá saber porquê. Vejam as fotos:


Não deixa de ser desolador que um supermercado tenha na sua banca de peixe apenas este peixe seco e …latas de conserva. As pessoas não compram peixe em supermercado, porque têm o hábito de o comprar nos mercados de peixe.


Relativamente a canas, se algo pode ser dito é isto: nunca serão demasiado resistentes, tendo em conta os esforços a que serão submetidas, nem demasiado leves, atendendo às horas de esforço diário, e ao calor e humidade que iremos ter sempre presentes. Na verdade queremos tudo, exigimos a uma cana que seja tudo, ao mesmo tempo.
O que me parece importante é a sua solidez, as ligações dos guia fios, a ponteira, o porta-carretos, tudo é importante. Num meio onde a compra de outra é impossível, é bom que todos os detalhes sejam acautelados.
E obviamente levar canas de reserva, uma é pouco, ou nada. Tudo nos pode acontecer.
O gatilho, a pega de combate é importante. Porque irá ser permanentemente solicitada, os peixes irão colocar-nos à prova, a distância a vencer é sempre grande.
Robustez física ajuda, o esforço a desenvolver sob temperaturas elevadas obriga a um treino específico e é de bom tom que a pessoa se encontre de perfeita saúde.

Terei muito gosto em ajudar se alguém achar que necessita de algum apoio técnico. Para isso, basta contactar a GO Fishing Portugal, e estarei disponível.
De resto, o próprio Luís Ramos é frequentemente solicitado a dar a sua opinião e nunca a nega a ninguém.
É um luxo poder contar com semelhante ajuda, vinda de alguém que “trabalha”, e o termo é esse mesmo, no assunto. Todos os dias.
Acreditem que eu aprendi imenso com ele. Aconteceu a perfeita alquimia de alguém que sabe e gosta de ensinar com alguém ávido de aprender.
E isso resultou em pleno. Obrigado, Luís Ramos!



Vítor Ganchinho



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