Aprende-se a pescar, …pescando.
A capacidade técnica de pescar não é algo inato, não nasce connosco, é antes um conjunto de conhecimentos e técnicas que cada um de nós aprende e pode desenvolver mais ou menos consoante o seu empenho e capacidade de reflexão.
No fim de tudo, e de forma fria, pescar tem apenas a ver com o desempenho de uma tarefa, e da maneira eficaz como ela pode ser desempenhada.
Haverá sempre pessoas com mais capacidade, mais habilidade de mãos, e porque não dizê-lo, com mais talento para trazer um peixe à superfície.
Conseguir entender o mar, saber ler aquilo que está à frente, ter a percepção de identificar aquilo que é preciso fazer não é, nem nunca será, tarefa igual para todos. Mas tudo pode ser aprendido e melhorado por cada um de nós.
O tempo ajuda a aprimorar as habilidades de execução e, no fim, com muita prática, as diferenças entre pares não serão dramáticas, embora existam sempre.
É nos momentos verdadeiramente difíceis que elas mais se notam. Mais que a capacidade técnica de executar bem, pede-se a um pescador que saiba improvisar, saltar sobre uma dificuldade, e isso só pode ser feito por quem tenha em si uma dose suficiente de criatividade e conhecimento.
Há felizmente entre nós muitos pescadores competentes, pessoas que arriscam, gente com coragem suficiente para experimentar fazer diferente. São quase sempre esses que marcam a diferença, quem, pelos seus bons resultados, leva outros atrás.
No fundo, inspiram todos os outros a fazer igual, a seguir o método, porque todos queremos pescar.
Gostava de deixar aqui bem marcada a minha posição: a pesca lúdica é algo com pouca importância.
Ninguém é mais ou melhor que qualquer outra pessoa por obter melhores resultados de pesca, por encher mais depressa que outros uma caixa de peixe.
Trata-se apenas de uma habilidade acrescida, um detalhe, e em caso algum o indivíduo menos dotado deve sentir-se menos bom. A vida coloca a cada um de nós dificuldades bem maiores que a pesca e, melhor ou pior, todos as ultrapassamos.
Pescar, sendo importante para alguns, será seguramente das coisas menos importantes em que temos mesmo de ser bons. Nas prioridades da vida, relações familiares, trabalho, amigos, etc, a pesca aparece numa escala bem mais baixa.
Por isso mesmo, há que relativizar a importância de alguém ser ou não um campeão a rebocar pargos à superfície. Se não for melhor, …é pior, e não vem mal ao mundo por isso, desde que se divirta a fazer ou a tentar fazer.
Penso no entanto que qualquer pessoa pode, se tiver força de vontade para isso, melhorar, procurando saber mais.
E isso faz-se com formação técnica.
Não falta informação e quem ensine, assim as pessoas queiram verdadeiramente aprender.
A melhoria é continua e morre-se para a pesca sem saber tudo. No meu caso sinto isso: sou melhor hoje que ontem. Experimento mais, arrisco mais fazer diferente, invento, inovo, falho, tento de novo e não me sinto vencido por não conseguir.
Porque procuro pensar “fora da caixa”, e abordo as questões de forma menos corrente, por vezes consigo resultados positivos. E registo-os. A seguir, partindo de um patamar mais elevado, procuro ir ainda mais além, empurro as fronteiras das minhas capacidades um pouco mais.
O processo é este. No fim da nossa vida de pescadores, depois de dezenas de anos a aprender, percebemos que o importante não é mesmo o grau de sabedoria que atingimos quando temos 80 anos e pouca força no braço para lutar um peixe, mas sim o caminho, o percurso que fizemos e nos levou a chegar muito próximo da perfeição. E a seguir, o ciclo renova-se, e vem um criança de sorriso nos lábios pedir-nos insistentemente para a ensinarmos a pescar…
Nunca me cansarei de estimular a criatividade daqueles que comigo saem à pesca, pois é isso que pode fazer a diferença quando chega o momento de resolver os difíceis problemas colocados pelos peixes.
Transformar em acções rotineiras e bem assimiladas acções técnicas de difícil execução, saber “manusear” linhas e amostras, canas e carretos, sob a pressão emocional extrema a que a pessoa está sujeita, não é fácil.
Nem sempre o pescador ao trabalhar um inesperado e fogoso peixe tem a lucidez de decidir da melhor forma. Se decide mal, …perde-o.
Nesses momentos, é a experiência, a mecanização de gestos técnicos dada pelos anos de pesca, aquilo que pode ajudar a resolver. Ou seja, a prática, nos momentos de “aflição”, conta bastante.
Mas essa prática tem de ser suportada em alicerces que advêm da formação teórica, ou pelo menos de alguma reflexão individual, pois não nascem de geração espontânea. Temos mesmo de querer saber mais, para podermos evoluir.
De qualquer forma, e peço-vos que sigam o meu raciocínio, tratamos sempre de dar racionalidade a um acto puramente emocional.
Decidir e executar tecnicamente bem é isso mesmo; ser capaz de pensar com clarividência, manter o espirito calmo, decidir bem quando tudo empurra para uma reacção puramente instintiva.
Por definição, o pescador tem a mente em constante reboliço, em alvoroço, porque quer queira quer não acaba por ter de considerar mil e uma variantes, água suja ou limpa, vento norte ou sul, muito ou pouco peixe, tipos de espécies presentes, diferentes técnicas de captura, profundidades e correntes, etc, etc. O cérebro de quem pesca é um computador sempre activo na procura de soluções para problemas que nunca são iguais. E por isso mesmo, não chega a sair da unidade de cuidados intensivos, …nunca tem alta. Porque há sempre mais problemas!
Quando pensamos ter o peixe um determinado padrão de comportamento, eis que surge algo novo, (exemplo: entrada de água com temperatura muito baixa) e faz com que todo o peixe existente dias antes …desapareça.
E volta tudo ao princípio, o cérebro dá voltas e voltas, até encontrar a solução para continuar a pescar.
Ser pescador já implica em si uma grande e intrínseca capacidade de ser suficientemente flexível para adaptar o equipamento e técnica de pesca à realidade que se encontra no mar, nesse dia.
Não há dias iguais!
O foco de quem quer obter resultados deve estar na capacidade de analisar todas as variantes que estão perante si. O resto é domínio da ansiedade, do instinto de puxar com força para cima por um peixe quando a decisão correcta é deixá-lo ir para baixo e respeitar os limites de carga da linha. É saber não ter pressa.
Não preciso de vos dizer que isso pouco ou nada tem a ver com “grades de minis” e chouriço assado. Se o objectivo é a pesca, a concentração é um factor primordial.
Pequenos nadas, mudanças de direcção de vento, de marés, tudo tem a sua importância. Procuro chamar a atenção para esses pormenores a quem está comigo no barco.
Por vezes, basta uma frase curta e a pessoa passa a ver algo que até aí não estava a entender, a valorizar. A atenção a tudo o que se passa à nossa volta, a subtis detalhes, não rima com garrafões de vinho abertos.
Aquilo que somos capazes de ver no mar, de sentir, decorre de inúmeros factores, e a vivência, experiência e formação teórica revelam-se um factor decisivo. Quando expostos a uma situação diferenciada, reagimos de acordo com a nossa capacidade intelectual de entender o que está a passar-se. Por isso, quanto mais formação técnica temos mais alargamos o leque de possibilidades de saber entender o que desfila em frente dos nossos olhos. Hesitamos menos, chegamos mais rápido à melhor solução.
Quanto mais dias de mar, mais depressa entendemos aquilo que é necessário fazer, mas se não os temos, se somos iniciados, então vale a pena escutar quem teve a oportunidade de conseguir mais conhecimento, quem circunstancialmente já passou pelas situações.
E que por isso mesmo sabe que por baixo de cada salpico de espuma, cada salto de um peixe, há um padrão subjacente, uma forma de tirar partido de algo.
Pequenas sardinhas saltam à superfície. Robalo por baixo.....?
E é essa capacidade de “adivinhar” o que se passa que nos dá vantagens imediatas, que nos permite diagnosticar a velocidade supersónica e ir ainda a tempo de lançar a amostra no local certo.
Foi para mim um prazer estar com pescadores amigos, e fazer novos amigos, nestas duas apresentações que mais não foram que uma passagem rápida de três horas + três horas por simples conceitos de pesca.
Vamos voltar a repetir, a realizar mais workshops, desta vez na GO Fishing Almada, numa data a marcar oportunamente.
Aqui no blog daremos conta das datas possíveis, as quais terão certamente em conta a necessidade de aproveitarmos um mau dia de mar, com muito vento e ondas, para que ninguém fique privado de poder sair a pescar nesse dia.
A formação é importante, mas a prática também...
Por isso mesmo, e porque necessitamos de marcar a data a partir de uma previsão fidedigna, somos forçados a avisar da nossa reunião com uma antecedência curta, não mais de 6 a 8 dias.
O blog será o elo de ligação, e aqui será dada a informação, logo que possível.
Agradeço a vossa compreensão.
Vítor Ganchinho
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Muito obrigado Vitor.
ResponderEliminarTudo o que partilha é fantástico.
O livro, para quando ?😀
Abraço
Toze
Não tenho avançado nada.
EliminarEstou numa fase difícil, com imenso trabalho, e a definir um barco novo, que quero mesmo à minha medida.
Aquilo que aí vem, um barco semirrígido com 8 metros, com dois motores Honda de 150 HP,
vai ter de corresponder em pleno ao que eu faço.
O "caderno de encargos" não é fácil: tem de ser rápido, ter pouca deriva, espaçoso, bom em ondas altas, WC, viveiro para peixe vivo, etc, etc...
Estou a desenhar....
Abraço
Vitor