FAZER UM ASSIST JIG EM CASA - ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Podemos pensar que vale a pena fazer porque fica mais bem feito.
Na verdade, não fica, os profissionais fazem bem melhor que nós.
Podemos até imaginar que iremos poupar imenso dinheiro por decidirmos avançar para a construção dos nossos próprios assistes, mas a realidade mostra-nos que não é bem assim. Vamos gastar mais.
Os preços a que compramos os acessórios serão sempre mais altos que aqueles que os profissionais pagam, quando compram às paletes de material.
Pode então haver alguma razão para sermos nós a fazer os nossos próprios assistes para os nossos jigs?
Sim, há um motivo que é absolutamente imbatível: o gozo que nos dá fazer com as nossas próprias mãos o material com que pescamos.
Aí, nenhum fabricante pode competir connosco: o carinho e ilusão que dedicamos a produzir estas pequenas mas importantes peças supera tudo.
Ficamos orgulhosos quando conseguimos um bom peixe, pescado com anzóis preparados por nós!


Como de costume, exigimos tudo: afiamento no limite e resistência à abertura. A Van Fook dá-nos um bom compromisso com o melhor destes dois mundos.


Antes de avançarmos para a construção propriamente dita, será interessante saber qual o princípio de funcionamento dos anzóis assistes, e de que forma podem ser decisivos na captura dos nossos peixes.
Se a linha PE é algo aparentemente pacífico, (embora não o seja…tem mesmo muito que se lhe diga...) e ainda mais a argola fechada em aço inox, (essa sim, sem grande contestação…), já o anzol tem muito a saber e estudar.
Sendo o anzol bastante simples na sua concepção, uma simples haste metálica curva, com um bico afiado e uma barbela, é uma peça um pouco mais importante do que aquilo que julgamos. Desde logo porque é ele que prende o peixe, não o deixando libertar-se.
Um bom anzol tem características físicas e mecânicas nada fáceis de conseguir. Excesso de carbono torna-os quebradiços, mas a sua falta dá origem a arames moles, macios, que dobram facilmente. O teor de carbono é mesmo muito importante!
Na verdade o anzol perfeito não existe, é uma perfeita utopia. As exigências que fazemos passam por uma grande capacidade de perfuração de pele, músculo, cartilagens, dentes e osso duro. Queremo-los também capazes de suportar esforços de tracção, sem abrir, sem ceder.
Gostamos deles muito afiados, mas quando vão à pedra, ….não queremos que a ponta ultrafina, afiada, perca o seu afiamento e fique romba, ou torcida. Entendem a contradição? ...
E não paramos de exigir impossíveis!
Está-se a ver à vista desarmada que aquilo que queremos não é possível conseguir numa só peça, mas ainda assim, não desarmamos. Compramos marcas e marcas, à procura da conjugação ideal de factores que, entre si, são inconciliáveis.
Exigimos um equilíbrio entre afiamento, peso ligeiro, tamanho reduzido, tenacidade e ainda resistência a maus tratos de corrosão que é francamente difícil de conseguir por parte dos fabricantes.
Tenho a certeza do seguinte: se tivéssemos de ser nós a produzir os nossos próprios anzóis, porventura seriamos um pouco menos exigentes em alguns parâmetros. Porque depois de tudo, depois de conseguirmos o anzol ideal, ainda queremos que seja...barato.
Indiscutivelmente o anzol é uma peça muito importante do nosso set de pesca. Quantas vezes dependemos dele em absoluto, quantas vezes rezamos aos céus para que aguente sem abrir?
Ou quantas vezes lhe pedimos para segurar um peixe com uma boca… “dura e impossível”?


Esta é uma boca dura, rija, cheia de dentes e ossos que desafiam as pontas dos nossos anzóis.


Ao tratarmos de predadores que irão atacar o nosso jig, ou amostra, não fazemos mais que aproveitar factos e circunstâncias que decorrem do próprio processo de rotina alimentar do peixe.
Sabemos que, com um pouco de boa vontade, podemos dividir em dois grandes grupos os predadores da nossa costa: os que aspiram a presa, e os que mordem a presa.
Pode parecer um detalhe insignificante a forma como se alimentam, mas não é. Vamos ter de ir ao detalhe, esmiuçar este assunto, porque isso irá influenciar a forma como construímos os nossos assistes.
De um modo geral, a ideia base que está subjacente aos anzóis auxiliares, ou assistes, é esta: trata-se de um (ou dois) anzóis que se presume venham a ser aspirados,  puxados, sugados, para dentro da boca do peixe aquando do seu ataque à amostra.
Ou mordidos. Em ambos os casos são processos que assentam no acto violento de captura de alimento. A luta pela sobrevivência não é feita com paninhos quentes, é mesmo algo de muito rude e agressivo.
Bocas grandes quase sempre gerando vácuo e por isso sugando o anzol para dentro da boca do predador, e assim ferrando, ou, por contraste, bocas mais estreitas e pequenas, cravando os dentes na presa, leia-se no jig, mordendo pois…. e ferrando.
Faço esta distinção entre aspiração e mordida, para que entendam que a corda dos assistes não deve ser a mesma.
A seleção do cordão de assistência é assim um compromisso entre a flacidez e flexibilidade que pretendemos quando pescamos exemplares que aspiram, e a rigidez que nos ajuda em contactos de peixes que mordem, que actuam por pancada.
Se quiserem um exemplo prático, entre robalos e pargos. Entre bocas grandes e pequenas…
A linha que liga a nossa baixada aos anzóis varia pois, dependendo do tipo de pesca que estamos a pretender fazer, das nossas espécies alvo.
E até o comprimento das linhas. A razão é simples: um peixe que aspira irá, antes de engolir o jig, meter dentro da sua enorme boca as cordas e anzóis, porque mais leves. E nesse caso, a nossa conveniência vai no sentido de lhe “darmos” a aspirar cordas mais compridas, que cravem bem fundo dentro da goela, das partes moles da garganta. Desculpem a insensibilidade para o sofrimento dos bichos… mas eu não fiz a catequese e por isso sou rude.
Por oposição, um peixe que morde, digamos um pargo, produz o seu ataque a um ponto bem definido, o meio do nosso jig. Porque o processo é activo, violento, pode haver alguma margem de erro. Não interessa para o caso se tratamos de um ataque a meio-cabeça, se um ataque a meio-cauda.
Isso são contas de outro rosário, até porque teríamos de considerar outros factores que influenciam, o local da mordida, o saber se o jig desce ou sobe, se a água está tapada ou lusa, o tamanho do jig, etc.
Fixemos a atenção na questão morder o “meio” do jig. Ora se os nossos anzóis estiverem muito longe desse centro, eles andarão a “voar” à volta do jig em função dos movimentos que lhe imprimimos, da tracção e atrito da própria água e não estamos a fazer mais que afastar da boca do peixe aquilo que o pode trazer até nós: os anzóis.
No caso de peixes que mordem, assistes curtos são vantajosos.


Peixes que mordem, como este pargo capatão, nem sempre ficam presos dentro da boca, mas sim pela sua periferia. Neste caso eu usava um assiste duplo em baixo, e um simples em cima, à cabeça. O jig é um Galápagos, GA, de 160 gr, porque estava  pescar abaixo dos 130 metros.


No caso de peixes que sobretudo “aspiram” a presa, teremos vantagens em utilizar anzóis suportados por cordas muito macias, mais flexíveis, (os assistes da Xesta são um bom exemplo de montagens perfeitas para robalos... porque são feitos com cordas macias e entram na boca destes sem dificuldade nenhuma), mas quando pescamos peixes que mordem, que atacam para prender a presa entre os dentes, então a vantagem está do lado dos assistes curtos, feitos com corda mais rígida, e até com fluorocarbono no seu interior. Aí, os pargos que se cuidem, porque estão a entrar num campo minado. Mordem e espetam-se a eles próprios, por força do tremendo impacto com que batem no anzol.
Vamos analisar mais em detalhe a questão das cordas, porque elas são muitas vezes decisivas no que diz respeito à concretização dos toques obtidos.
O primeiro ponto de meditação é o seu diâmetro: queremo-lo fino, para não oferecer atrito e o  consequente atraso à descida do jig. Mas também queremos ter a certeza de que não vai acontecer a desgraça de esta linha ser cortada pelos dentes de algum peixe.
Os atuns sarrajões cortam, e ainda mais as anchovas, por exemplo. Queremos pois linhas finas e linhas grossas, ...ao mesmo tempo. O ideal é ficarmos por material fino, mas de qualidade. 
As linhas em kevlar têm cerca de 50% mais resistência ao corte do que as linhas de assistência PE. Logo serão uma boa opção, embora um pouco rígidas.
A maior parte é feita a 100% com fibra Dupont Kevlar, um material forte, com alto grau de resistência à abrasão, com características de baixo alongamento, bem como alto nível de resistência aos raios UV.
Esta linha possui um núcleo oco, para que nós possamos introduzir uma agulha e trabalhar a colocação de argolas sólidas, se necessário. Fazer a preparação de linhas de assistes para jigs é algo que hoje em dia está generalizado, e podem ver imensos vídeos no Youtube pelo que não irei perder demasiado tempo com a sua explicação. Vamos sim a a outros detalhes que podem ajudar-nos na escolha do material mais indicado.
As linhas PE são mais macias e flexíveis do que o kevlar e são fornecidas em dois tipos diferentes: núcleo oco e sólido. Cada uma tem as suas vantagens e desvantagens, mas fixemo-nos no essencial:
A linha Solid Core PE é uma trança enrolada em torno de um núcleo, como que uma camisa que envolve um determinado número de fibras, tornando-a ligeiramente mais rígida e mais resistente ao desgaste do que o tipo oco, se quiserem a “camisa” apenas, formada por uma trança oca de fibras, um tubo.


A linha de assiste pode ter diferentes diâmetros, resistência, cor, e até diferentes graus de rigidez. Cabe-nos, em função daquilo que queremos pescar, a escolha do tipo mais adequado. 


E posto isto, chegamos à questão dos anzóis.
Não é um assunto pacifico!
A maioria dos jigs metálicos não vem com anzóis, pois há muitas configurações diferentes, tamanhos e graus de resistência, dependendo das condições de pesca e das espécies pretendidas.
Se algo podemos assumir como sendo consensual é que o tamanho do anzol, ou se quiserem a distância entre a haste e a curvatura do bico deve exceder a largura do jig. Sob pena de termos o anzol “preenchido” e tapado com o corpo metálico do jig.
É de bom tom que seja um pouco mais largo, ajuda muito a ferrar o peixe.
Ainda assim, não em excesso. A maioria dos anzóis usados no jigging são relativamente pequenos em tamanho se comparados com um anzol que usaríamos para o mesmo peixe se estivéssemos pescando com isca orgânica. O motivo prende-se com o facto de não usarmos isco nos anzóis de jigging, utilizamo-los simples, limpos, despidos de obstáculos. 
Não esqueçam que queremos pescar vários tipos de peixe, e não apenas um. Por isso, um tamanho mais universal, ajuda. 
Mais ainda: dado que as canas de jigging mais macias permitem um trabalho muito confortável sobre o peixe, são muito elásticas, isso permite-nos, fazendo uso do drag do carreto, garantir que não vai haver desferragem. Aquilo que queremos é mesmo ter contacto com o peixe, e aí deixamos que os vários pontos de fixação dos nossos anzóis sejam, cada um por si, suficientes para aguentar a pressão que será inevitavelmente exercida.
Os peixes grandes fazem força, são violentos a puxar, mas quando ferrados por dois ou três pontos, digamos dois assistes de cauda e um de cabeça, isso torna-lhes a fuga muito difícil.
Mesmo anzóis aparentemente frágeis, leves, são muito difíceis de endireitar porque os fabricantes calculam com muita precisão os pontos de pressão a que estes irão estar sujeitos. Na fase de projecto, conceber um anzol é algo de muito interessante.
Não preciso de vos dizer que é de toda a conveniência que algumas partes dos vossos assistes tenham um alto grau de resistência à corrosão. Aí é mesmo de utilizar material em aço inox de grau marítimo. É o caso das argolas, quer as divididas, os split-ring, quer as argolas sólidas, fechadas.


Duplos à cauda, simples à cabeça é uma combinação muito usual. Devemos utilizar o tamanho adequado ao peixe que temos na nossa zona de pesca. 


Mas no caso dos anzóis, nem é bom que o sejam! Por dois motivos principais:
A têmpera de qualidade garante que os anzóis resistem à abertura, mas nós não queremos só isso, queremos ainda que sejam muito afiados. 
Porque o primeiro contacto que temos com o peixe na maior parte das vezes é mesmo o único e o último, é bom que o peixe fique preso assim que toca no anzol. Se este não tiver o afiamento de uma agulha, pode não penetrar o suficiente para passar a barbela. E nesse caso, arriscamos a perda do exemplar.
Logo, afiamento irrepreensível! Mas este não é compatível com a maior parte dos aços inox que conhecemos. É a questão do teor de carbono, a tal percentagem de carbono que deve ser optimizada de forma a permitir o trabalho do anzol em fábrica até um alto grau de afiamento.
A dada altura, é feito um tratamento químico à ponta, e os dados estão lançados, o anzol tem o máximo de afiamento que esse material, essa mistura de ferro com carbono permitem. E aí, os artesãos japoneses sabem fazer, porque é algo que para eles é profissão.
A experiência ganha por diversas gerações de fabricantes oferece-nos hoje em dia material de primeira qualidade. Material bom, que aguenta as corridas de peixes que correm muito duro pelo fundo.
Depois, passa a ser connosco, sermos ou não capazes de descobrir peixe, e de o trabalhar, e convencer a subir à superfície.


Podemos ser mais ou menos criativos, aplicar destorcedores, ou mesmo chapas brilhantes, por exemplo.


Em resumo, ao considerarmos a possibilidade de feitura de um assiste “caseiro”, deveremos interrogar-nos se temos ou não conhecimentos técnicos suficientes para o efeito.
Caso a resposta seja positiva, podemos adquirir os diversos componentes, anzóis, argolas fendidas, argolas fechadas, linha PE ou kevlar. Eventualmente também tubo termoretráctil fino, se quisermos isolar o trabalho de empate do anzol.
Depois, é executar, sabendo que dificilmente o faremos tão bem quanto um profissional que só faz isso na vida. E a quem podemos lançar pragas se houver um azar de ficarmos sem um bom peixe por falha da montagem do assiste. Normalmente não acontece, os assistes de fabrica são muito seguros. 
Já se formos nós a fazer...eles rebentam, ficamos doentes, perdemos o peixe, e aí atiramos as culpas para o signo desfavorável, a conjuntura económica, o raio que parta. Tudo menos nós. 
Queixamo-nos de tudo menos da nossa aselhice...



Vítor Ganchinho



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