Pescamos ligeiro porque queremos ou porque …tem de ser?....
Não é uma pergunta a que se possa responder facilmente, nem é muito evidente que exista um quadrado onde possa ser colocada uma cruz, um sim ou não.
Na verdade, é um complexo e intrincado labirinto de perguntas, cujas respostas dependem mais de nós que dos nossos peixes.
Praticar Light Rock Fishing, LRF, é, no limite, um reflexo dos tempos que vivemos: da falta de tempo, da falta de peixes e da falta de paciência das pessoas.
Queremos pescar das tantas às tantas, porque a seguir temos um compromisso. O ritmo é o nosso, e só o nosso, já não é o da natureza, das marés e dos peixes.
E hoje em dia, os resultados só podem ser positivos e imediatos. Tudo o que seja diferente disso não interessa, é para descartar, ninguém tem tempo a perder.
Sabemos disso, os grandes exemplares são cada vez mais raros, obrigando o pescador a uma procura exaustiva, demorada, e a gastar um dia de pesca que no fim pode resultar ou não.
Se não há paciência para esperar pela oportunidade, por um peixe grande, então provavelmente haverá que virar agulha para aquilo que é imediato, que está sempre disponível, e não dá trabalho.
Assim sendo, os fabricantes de equipamentos de pesca coçaram a cabeça e lançaram mãos ao trabalho: produzir conjuntos de pesca adaptados ao tipo de peixe mais corrente, o de pequeno porte.
Canas, carretos, linhas e anzóis de tal forma minúsculos, ligeiros e sensíveis que possam reproduzir na integra as sensações que só os grandes peixes podiam trazer-nos, há muitos anos atrás.
Descargas de adrenalina intensas, capazes de nos motivar mais e mais a ir pescar, de nos fazer voltar a querer ser pescadores.
Como chegámos aqui? Porque não existe peixe no mar?....que fizemos nós que alterou a ordem e equilíbrio dos nossos mares?
O LRF dá-nos peixes que por vezes excedem em muito as expectativas mais optimistas de quem pesca com pequenos artificiais... |
Somos nós quem, ao pescarmos em excesso, (sobretudo através das redes e palangres da pesca profissional, mas com a ajuda e conivência da pesca lúdica no que respeita à pesca de exemplares juvenis, imaturos), colocámos tensão no meio aquático.
Mudámos tudo e mudámos para muito pior.
E hoje e no futuro vamos ter de pagar por isso. Vamos cada vez mais sofrer na carne a ausência de peixes adultos, os grandes exemplares que ainda povoam os nossos sonhos de pescadores, mas que afinal não passam de miragens, de ar que nos passa pelas mãos abertas. Porque já estragámos irremediavelmente muito daquilo que podíamos estragar. Para onde vamos?
A grande questão é saber se hoje somos nós que mudamos o equilíbrio natural do habitat dos peixes, retirando-lhe os grandes predadores, trabalhando em exclusivo a faixa de peixe que nos interessa, (exponenciando assim o crescimento descontrolado do número das suas presas naturais), influenciando equilíbrios ancestrais, ou se é afinal apenas uma evolução expectável, o "destino" de um mar que mudou, para pior, de "per si". As alterações climáticas terão muito a ver com o assunto.
Indiscutivelmente tudo isto é algo que nos molda, ao obrigar-nos a reagir tecnicamente perante as dificuldades que nos coloca.
A solução óbvia, que não a melhor, para continuarmos a pescar, para sairmos do zero, é baixar um grau na escala de tamanhos. Para isso necessitamos de equipamentos adaptados a essa nanopesca, a algo que não sendo o óptimo, é ainda assim o possível.
Os pesqueiros estão lá, a capacidade de produzirem peixes grandes não desapareceu, não falta alimento. Há condições! No dia em que não houver um peixe na Carrapateira, não vale a pena procurar em mais lado nenhum.
Toda aquela mistura de minerais, microrganismos, zooplâncton, fitoplâncton, peixe miúdo, tem a capacidade material de dar um dia origem a um peixe de tamanho recorde. Nada está a mais, nada existe em excesso, ali a natureza equilibra-se de forma perfeita.
E seria assim em quase todos os lugares do nosso país, temos condições naturais em Portugal para “dar e vender” peixe de qualidade.
Mas nós humanos existimos, somos ávidos de resultados imediatos, a pesca profissional faz dinheiro com o pescado que captura, e por isso a pressão que existe é …demasiada.
Somos ávidos de emoções, mas também de peixe, de muito peixe, e isso colide com o calendário lento e pausado da natureza. Não temos tempo a dar para que os peixes cresçam.
Daí, resulta uma escapatória de pesca a uma escala menor, e ela chama-se LRF. Mas o que é isso de Light Rock Fishing? Porque está o seu número de adeptos a aumentar tão depressa na Europa?
É a isso que iremos procurar responder a seguir. Vamos ver em detalhe quais os equipamentos utilizados.
As canas
Para lançar pesos minúsculos, irrisórios, tendo em conta os padrões de pesca habituais, precisamos de canas extremamente leves e sensíveis.
Se o jigging normal, heavy jigging, é frequentemente feito a mais de 100 metros de profundidade, e com pesos muitas vezes acima dos 150 a 200 gramas, as canas LRF lançarão jigs com pesos de não mais que 10 gramas, correntemente de 3 a 5 gramas.
Embora isso possa parecer estranho aos pescadores mais tradicionais, por exemplo aos que praticam surf-casting, acostumados a usar longas e pesadas canas de 4 a 5 metros, capazes de lançar chumbadas com pesos até 200 gramas, ou a quem pesca vertical e utiliza linhas PE3, e carretos tamanho 6.000, o LRF recorre a equipamentos muito leves para provocar espécies de peixes quase sempre de reduzida dimensão, encontrados em águas muito rasas, perto da costa.
Estas canas têm acções muito específicas que não ultrapassam os 3-12 gr, sendo 1-7 gr o mais corrente, diríamos a medida padrão.
A maioria das canas LRF tem entre 1,90 e 2,40 mts de comprimento. É material muito ligeiro, adequado aos alvos que temos em vista. As mais leves poderão pesar entre 55 e 60 gramas, sendo os 100 gramas de peso um limite máximo razoável para uma cana dedicada a esta técnica.
Trabalhar com uma cana com acção 1-7 gr, é poder lançar tudo aquilo que é a essência desta pesca, vinis (a imitar peixinhos, camarões ou pura e simplesmente “criaturas” que se assemelham algo com possíveis presas), e jigs de baixo peso.
Grosso modo, desde que uma vara permita lançar correctamente amostras de 10 gramas ou menos, ela será adequada para LRF.
O pescador deve garantir que a cana que está a comprar foi projetada especificamente para Light Rock Fishing, pois algumas das canas baratas que circulam no mercado, sobretudo em lojas chinesas, são aparentemente aptas para lançar iscas muito leves, por serem finas, mas
carecem de alma, de nervo, e não têm a sensibilidade de uma verdadeira cana de LRF. Vamos trabalhar no sentido de perceber toques ínfimos, subtis, e para os detectarmos vamos precisar de equipamento fino, ligeiro e com muita sensibilidade.
Carapaus, cavalas, sargos, choupas, agulhas, douradas, um ou outro pargo, e outras espécies nobres semelhantes, como as bicas, os robalos, são alvos para pescadores LRF.
A cana deve pois responder a pequenos toques provocados por peixes de baixo peso. Neste jogo de “gato e rato”, aquilo que nos serve é saber que um peixe está a tocar no nosso artificial, sem que esse peixe consiga entender que está a morder em algo que pode ser perigoso para si. Nós temos de saber antes do peixe que algo se passa.
E isso só se consegue com boas canas: muito reactivas e ressonantes, que nos deem toda a informação sem oferecer demasiada resistência aos avanços do exemplar que ataca o nosso vinil.
As douradas mordem muito bem os artificiais, nomeadamente o camarão de vinil. Mas também outros formatos, os pequenos peixes de vinil são capazes de nos surpreender… |
Onde podemos procurar estes peixes? Que locais são mais propícios?
Podemos entender um pesqueiro como uma estrutura laminada de água, em que cada nível é ocupado por um determinado número de espécies. Assim sendo, iremos encontrar os peixes estratificados por patamares. Dificilmente encontraremos rascassos à superfície, e ainda mais dificilmente iremos pescar agulhas junto às rochas do fundo. Porque os seus habitats são precisamente opostos.
Assim, e em função das profundidades a que podemos lançar os nossos artificiais, encontraremos peixes de superfície, meia água e fundo.
Devemos entender os equipamentos LRF como algo que é tão mais eficaz quanto mais próximos estivermos do ponto de acção. Se pudermos pescar a 10 metros de fundo, isso será mais produtivo que tentar fazê-lo a 120 metros de fundo. Não que não existam meios de lançar a essas profundidades, há cabeçotes de chumbo com 200 gramas que permitem pescar com vinis a …250 metros de fundo(!), mas porque isso implica divergir totalmente do princípio que está subjacente a uma pesca que se quer ligeira. Ligeira mesmo! E por isso, os primeiros 50 metros de profundidade, e sobretudo a faixa dos 0 aos 20 metros serão o nosso campo privilegiado de batalha.
Os peixes de menor tamanho têm uma tendência natural para se encostar à costa, pois é aí que estão mais protegidos dos ataques dos grandes predadores do oceano. Mas há zonas de pesca onde, por força de profundidades mais acessíveis, o peixe também está presente em bom número.
Para quem pesca ao largo, embarcado, há sinais que podem conduzir-nos a concentrações de peixes. Linhas de água, correntes, diferenças de temperatura, diferentes cargas de sedimentos, tudo muda as oportunidades para cada espécie de peixe ao longo do dia, do mês, do ano.
Os ventos são importantes porque permitem transferências de energia, de alimentos, de oxigénio. Misturam águas e regulam temperaturas, equilibram-nas, e com isso, o meio ambiente.
Mudam-no física e quimicamente, por acção de forças muito poderosas. Ao empurrarem sedimentos, não estão a fazer mais que a concentrar micro-organismos vivos, alimento, num local preciso, que outros irão explorar.
Qualquer possibilidade de obtenção de alimento fácil é aproveitada até à exaustão por todos aqueles que puderem participar no processo, em cadeia alimentar, aumentando de tamanho a cada instante.
De seres de tamanho microscópico, a grandes predadores, todos irão beneficiar de haver algo mais que nada.
Peixes de poucos centímetros serão atraídos pelo zoo e fitoplâncton. A seguir, chegam os que se alimentam desses peixinhos, as cavalas, os carapaus, os robalos, os sarrajões, os agulhas, etc.
E no fim, os atuns, os golfinhos, as tintureiras, os makos, as baleias, vêm alimentar-se do peixe de cardume, e fecham o circulo.
Falamos de carretos e linhas?
A grande maioria dos pescadores que praticam Light Rock Fishing utilizam um pequeno carreto, geralmente nos tamanhos 1000, 1500 ou 2000. Não tem de ser caro, porque esta é indiscutivelmente a peça menos importante do conjunto.
A linha tem de ser boa, a cana tem de ser boa. O carreto pode ser apenas razoável. Deve acima de tudo permitir a libertação de linha de forma muito rápida, e para isso devemos ter em atenção a questão da sua perfeita lubrificação.
Porque vai haver um momento em que isso é o mais importante!
Os carretos de bobine fixa, de funcionamento standard, são preferidos aos pequenos desmultiplicadores devido à sua simplicidade e facilidade de uso, e porque permitem lançar com facilidade.
Esse pode ser um factor decisivo, pois ganhar alguma distância de lançamento adicional ajuda-nos bastante.
Um outro factor que joga a favor da pequena dimensão dos carretos é a sua ligeireza. Nunca esqueçam que todo o conjunto pressupõe baixo peso, e por isso, cada componente conta.
Além disso, os carretos de bobine fixa funcionam melhor com linha trançada muito fina, (falamos maioritariamente de PE 0.4 a 0.6, máximo PE 0.8), utilizada por quase todos os pescadores LRF.
Esta linha multifilamento, por ser pouco elástica, permite um contacto muito directo ao peixe, dá-nos a possibilidade de sentir cada pequeno toque, e por isso não deve sequer ser considerada a possibilidade de utilizarmos nylon na bobine.
A parte final da montagem é feita com um fluorocarbono de diâmetro entre 0.20 e 0.23mm, quase invisível sob a água e mais que suficiente para qualquer peixe que venha a atacar o vinil ou pequeno jig.
No próximo número vamos continuar a espreitar detalhes LRF.
Vítor Ganchinho
😀 A sua opinião conta! Clique abaixo se gostou (ou não) deste artigo e deixe o seu comentário.