ROBALOS - DE QUE FORMA A VELOCIDADE DA CORRENTE INFLUENCIA A SUA FORMA DE CAÇA - CAP.2

Quando pensamos em pescar robalos, devemos partir de um princípio muito básico, simples, mas que para o peixe faz todo o sentido: a comida tem de existir em quantidade suficiente, (há locais onde é quase inexistente), e ser relativamente fácil de conseguir.
Os predadores concentram-se nas zonas onde as condições naturais os favorecem, e onde podem conseguir presas com mais facilidade.
As desembocaduras dos rios e saídas de água doce são perfeitas para eles, (também para as corvinas, as bailas…) pois são seres eurialinos, suportam baixos índices de salinidade, o que lhes dá uma vantagem e quase exclusividade no acesso a presas, quando os confrontamos com atuns, tintureiras, anchovas, sarrajões, etc. Estes outros predadores, limitados na sua capacidade de operar em águas com menos sais, ficam fora, em mar aberto.
O que nos remete para a possibilidade de, nos momentos certos, termos concentrações massivas de robalos nas saídas dos estuários. Basta para que isso que tenhamos uma arribada de alevins de qualquer espécie.
Mesmo em zonas de mar aberto isso pode acontecer, dependendo das condições naturais que existam, ou da eventual passagem de cardumes de sardinha pequena, carapau miúdo, caranguejo pilado, etc.
O predador segue sempre a sua presa até esgotar o recurso ou as condições de conseguir comida fácil, e ter de procurar outra situação vantajosa. Há locais mais propícios.
Por isso mesmo temos locais com muito peixe, sempre, e outros que virtualmente não passam de permanentes desertos inóspitos, ou são utilizados apenas como corredores de passagem de peixe de uns spots para outros.
Pensem nos robalos que circulam do Tejo para o Sado…e tantos outros lugares da costa portuguesa.
Por isso, aquilo que é fundamental é que haja comida suficiente, e condições de caça aceitáveis. Antes disto, para eles há apenas que garantir que o local é seguro.
Isto é de tal forma primário que não é necessário complicar mais. Se há segurança, se há comida, e se é possível que a captura se concretize, …chega.
De resto, tratamos de um peixe que nem é tão selectivo assim em termos de alimentação. Pode comer um pequeno peixe, e pode ser uma cavala, uma sardinha, um carapau, mas um caranguejo também lhe serve. E se não houver uma lula pequena, há certamente camarão por ali. Um choco, um verme arenícola, e tudo isto de preferência vivo, …mas se tiver de ser morto…
Não é nada difícil de boca, o nosso robalo.
A parte que nos interessa é a de eles andarem nesse dia à procura de alimentação viva presente no local, já que é isso que podemos tentar imitar com as nossas amostras. E como o fazem, como procuram?
Aquilo que é padrão é um robalo estar virado à corrente e esperar que algo lhe surja pela frente. Sendo um bom nadador, as correntes fortes não o incomodam sobremaneira, embora, por razões que se prendem com a poupança de energia que todos os peixes procuram, eles prefiram caçar na periferia das correntes fortes. Estão “ao lado” dessas correntes. Aqui falamos de postos de caça, de espera, muito mais convenientes que uma longa e fastidiosa perseguição em campo aberto. Ou uma permanência no centro da vertiginosa saída de água.
Onde houver um turbilhão de água, uma corrente muito forte, haverá um recanto, um obstáculo, algo que proporcione uma espera confortável a quem se predispõe a aproveitar a desorientação e incapacidade de as pequenas presas conseguirem manobrar em correntes de água mais fortes que as suas fracas forças de locomoção. Os robalos são bichos oportunistas!


Um caso curioso: o meu amigo Carlos Silva, pessoa com quem muito gosto de pescar, trazia um carapau para cima. Apareceu entretanto um robalo…oportunista…


Todos nós conhecemos lugares costeiros onde o mar oferece fundos bastante irregulares, com muita pedra partida, blocos rochosos que levantam do fundo e quebram a corrente. Nesses sítios, sendo mais difícil pescar por força da possibilidade de perda de algumas amostras, também será bem mais fácil conseguir encontrar robalos a caçar. A corrente quebra, sofre desvios, a sua força primária é repartida por esses “deflectores” naturais e a dada altura é mais facilmente tolerável por quem pretende permanecer nela. Um predador experiente não tenta nadar até à exaustão contra uma corrente forte, na expectativa de conseguir uma presa. Aqui funciona o princípio básico da perda de energia: o ser que é capturado tem de fornecer mais energia ao predador que a consumida por este para o capturar.
Nesse âmbito, os fundos irregulares, quer naturais quer construídos pelo homem, portos, paredões, cais, pilares, etc, trazem vantagens por permitirem caçar sem fatigar o predador.
Por contra, em fundos lisos, por exemplo as praias de areia simples, sem pedras, o problema que se coloca é que estas, ao não oferecerem resistência mecânica ao avanço das águas, acabam por permitir a estas uma aceleração progressiva, e por isso mesmo tornam-se menos interessantes do ponto de vista do dispêndio de energia.
Poderíamos então considerar, em termos genéricos, que os momentos mais favoráveis para lançarmos as nossas amostras seriam aqueles em que a quantidade de água seria a suficiente para oferecer segurança ao nosso peixe, em que a corrente seria submáxima, a possibilitar permanecer directamente nela sem depender directamente da existência ou não de um obstáculo providencial, mas todavia suficientemente forte para incomodar os pequenos peixes que nela se deslocam.
Isso existe em inúmeros locais da cossa costa, e quem os conhece sabe que é ali que pode fazer, no momento certo, os seus peixes para o jantar. Há momentos fracos, de zero actividade e há um momento ideal, diríamos …“bom”. E há um antes que é “quase bom” e um depois que é “…ainda bom”.
Os nossos pescadores mais antigos conhecem o fenómeno e chamam-lhe tão simplesmente “conta de água”. E o que é esta coisa da “conta de água”, traduzida por palavras um pouco mais modernas, mais entendíveis aos dias de hoje?!
Pensem nisto: num determinado local, a massa de água que se move terá uma velocidade de deslocação maior ou menor consoante a sua altura. Águas profundas movem-se de forma mais lenta, águas baixas aceleram a velocidades muito elevadas.
Quando a corrente começa a subir num local pouco profundo, a primeira entrada de água é rápida, cansativa, e não serve ao predador. O robalo ainda não pode estar lá, tem de esperar!
Como temos pouca água, a força da gravidade que a atrai é suficientemente forte para a acelerar bastante. Corre muito. Não serve ao nosso peixe.
A dada altura, com a chegada de mais e mais água, a profundidade aumenta, a massa de água aumenta, fica mais pesada e por isso mesmo mais difícil de mover. E fica um pouco mais lenta. É agora!
Quando a maré completa o seu ciclo de enchente, voltamos a ter um estofo de maré, uma pausa. A água abranda a sua movimentação.
Nessa altura já não existem vantagens assinaláveis para o nosso robalo, ele tem muita água no local, mas vai ter de mudar de táctica: a comida já não vem até ele, empurrada pela corrente. Vai ter de se deslocar ele próprio, em vez de esperar pelas suas presas.
Falamos aqui de momentos da maré, ou do período em que os peixes efectivamente podem caçar. E por consequência, dos momentos em que os podemos enganar com as nossas amostras, certo?!
Gostava que ficassem com a ideia de que há um momento óptimo, um ponto certo de velocidade de deslocação de corrente que torna a vida mais fácil ao nosso robalo. E a nós…


A eterna eficácia dos jigs pequenos, armados com triplos...


Em função do coeficiente de maré desse dia e dessa maré em concreto, assim o robalo terá mais ou menos tempo para permanecer no local com condições efectivas de caça.
As marés grandes movimentam muita água, e podem, no caso de baixas profundidades, acelerar de tal forma a sua movimentação que o tempo de trabalho efectivo para o predador pode ser inferior ao proporcionado por uma maré pequena, mais estável, mais lenta.
Mas nesse caso, também lhe será mais difícil conseguir encontrar postos de caça que lhe proporcionem tanta facilidade de captura. Porque os peixinhos pequenos conseguem controlar melhor a sua deslocação, tornam-se mais difíceis de capturar.
Mais que isso, também, por força da paragem da corrente, a água ganha alguma visibilidade acrescida, e isso mostra o predador mais longe. Todas as vantagens são exploradas até ao mais ínfimo detalhe, sempre, por todos.
Vejamos agora a questão dos pesqueiros mais profundos, onde o efeito das marés é bem menos notado, e onde a estabilidade das águas serve menos a quem ataca, e mais a quem defende.
Se consideramos zonas afastadas da costa, onde os peixes têm um campo de visão bem mais largo, não tão limitado por estruturas e vegetação, então aí as técnicas de caça terão de mudar. E isso irá afectar a nossa forma de pescar, consequentemente.
Os ciclos de alimentação em águas profundas, (de que vos falo há anos….) são menos marcados que junto à costa, mas existem, de igual forma.
Se a realidade do robalo costeiro, caçador de águas rasas, é aproveitar os minutos que tem para chagar à comida e sair antes que a água desapareça do local, já quando falamos de zonas fundas essa circunstância não se coloca.
Mas continuo a encontrar razões para acreditar nos ciclos alimentares, e a meu ver, as últimas três horas de enchente são de facto as mais favoráveis para conseguirmos peixes. É aí que o peixe come.
A partir desse período, a nossa vida de pescadores esvazia-se de sentido, porque estamos a querer vender areia no deserto.
Se a água vaza e o peixe conseguiu comer, passamos a ter peixes desinteressados, fartos, a vaguear pelo fundo, sem grandes preocupações que não sejam repousar e eventualmente encontrar algum alvo fácil, que não o obrigue a demasiadas correrias.
Caso existam na zona, as algas laminárias acolhem os grandes senhores da caça, no seu momento de paz e descanso. Se as não houver, haverá uma rocha, um buraco escuro, uma solapa entre a pedras e a areia, algo que permita o descanso.
O peixe não se movimenta mais que o necessário neste período.
É pois o tempo do slow-jigging, por excelência! Provocamo-los com “presas” fáceis, lentas, fáceis de capturar…mas devemos ter a noção de que estamos a oferecer um almoço a seguir a um almoço….


O autor, com um robalinho atrevido que foi ao jig Xesta, de 20 gramas, …côr cavala. Reparem na linha contínua lateral, a nascer junto ao opérculo e a prolongar-se até à cauda. Isso é aquilo que faz com que consigam “ ver” em plena noite, ou águas barrentas.


Votarão a comer passadas algumas horas, no novo ciclo de maré, independentemente de ele se verificar de noite ou dia. Não é isso, noite ou dia, o que muda o princípio de actuação, sobretudo nos meses em que as águas estão mais quentes. Ser noite ou dia não influencia decisivamente o comportamento do peixe predador, sobretudo de quem vê particularmente bem no escuro, e ainda mais a quem está de tal forma bem equipado com sensores, leia-se linha lateral. Diria que no Verão, com águas quentes, os robalos comem sobretudo à noite.
De Inverno, os ciclos alimentares do robalo são bem mais reduzidos, quase sempre diurnos. Por vezes duram apenas minutos e normalmente em zonas mais favoráveis em termos de temperaturas. Falamos de termoclinas, evidentemente.
Em águas mais profundas, os momentos em que podemos ter mais possibilidades reais de pesca são ainda assim quase previsíveis.
Podem calcular-se mediante uma análise cuidada do momento em que ocorre a maré, o coeficiente de subida e descida dessa maré, e as condições gerais de tempo dos dias anteriores.
Vou dar-vos um elemento de análise que vos pode ser muito útil: nada mais nada menos que a relação de velocidade de deslocação da água em função da hora da maré.
Podem pensar que não é informação útil, porque obriga a pensar, mas para quem leu com atenção aquilo que foi dito no artigo anterior e neste, fará sentido.
Chama-se “lei dos doze avos” e diz-nos que a progressão de entrada e saída de águas das marés não é linear, sempre igual, mas sim uma curva de forma sinusoidal.
A partir de um determinado momento de maré enchente, as águas aceleram de forma nítida, e a seguir desaceleram, a massa de água deslocada torna-se mais lenta.

Algo como isto:

1ª hora----velocidade 1/ 12 avos
2ª hora----velocidade 2/ 12 avos
3ª hora----velocidade 3/12 avos
4ª hora----velocidade 3/ 12 avos
5ª hora----velocidade 2/ 12 avos
6ª hora----velocidade 1/12 avos

Temos pois que, embora não parem nunca de subir, as maiores deslocações de massas de água ocorrem entre a 3ª e a 4ª hora de enchente, a meio do ciclo de subida.
Sabemos também que as marés altas, de movimento ascendente, são sempre mais rápidas que as marés que baixam.
Para bom entendedor, para quem lê com mais atenção, isto dá-lhe o momento certo para estar no local, a lançar as suas amostras, os seus jigs.
De acordo com aquilo que lemos acima, podemos prever que em areais puros, baixos, sem pedra, a segunda e a quinta hora serão os momentos certos, mas em pesqueiros baixos, mas com rocha alta ou irregular, com obstáculos protectores da corrente, esses períodos podem ser outros, nomeadamente e 3ª , 4ª e a 5ª hora.
Se pescamos ao largo, temos a considerar que o peixe terá o seu pico de actividade nos momentos em que pode tirar vantagem da sua mais fácil capacidade de deslocação rápida relativamente aos seus alvos. A corrente limita de movimentos os mais pequenos, mais leves.
A caça é feita através de ataques relâmpago, leia-se caça de emboscada utilizando a cobertura rochosa ou plantas que possam existir.
Isso situa-nos num período entre a 3ª hora e a 5ª hora, e, já por mudança de estratégia, a 6ª hora de enchente, agora numa perspectiva de caça em movimento.
Coincide com as três últimas horas de maré de que tanto vos falo, e onde sinto que a actividade do peixe que pesco aumenta exponencialmente. Bate certo...


Todos os obstáculos são passíveis de serem utilizados como pontos de emboscada. Por detrás desta pedra, imóvel, pode estar um robalo à espreita...


Nada garante que alguém pesca de certeza, isso em pesca não existe. Até porque existem inúmeros factores que também contam, uma baixa de pressão atmosférica, um vento que muda, temperatura fria das águas, a nossa incapacidade técnica, a falta de equipamento adequado, etc, mas ainda assim, podemos ter uma ideia geral de como fazer e quando fazer.
Cada um de nós deve anotar num bloco as condições em que conseguiu ter sucesso, ou o inverso. Os fracassos ensinam-nos mesmo muito!
Ao fim de centenas de anotações, poderão passar a ter um “livro” que vos dá um filme mais ou menos fidedigno daquilo que irá passar-se. E conseguem prever.
Nunca esqueçam que as condições de mar mudam a cada minuto e que há um momento em que ainda não está bom, a seguir já está bom e daí a algum tempo …já deixou de estar bom.
Nada é eterno, e sobretudo em termos de pesca, temos de ser capazes de executar bem quando o momento chega.
Nada de falhas, nada de erros técnicos, …concentração absoluta.

Boas pescas! Espero que tenham gostado destes dois artigos.



Vítor Ganchinho



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