VERÃO - SAIR CEDO PARA A PESCA

As noites chegam-nos agora com temperaturas mais amenas, mais agradáveis, os frios intensos ficaram para trás.
Em Portugal, a meio do dia temos regularmente valores de 30 a 35ºC, o que é, mesmo para um país de sol como o nosso, algo acima do que chamamos de “zona de conforto”.
Embora ajude, não é por isso que as águas do Atlântico aquecem.
Fazer subir um grau centigrado uma massa de água tão impressionante quanto um oceano, não é trabalho fácil, não se faz com uma caixa de fósforos, só um mecanismo muito forte pode fazê-lo.
A corrente do Golfo (Gulf Stream) encarrega-se de trazer às nossas praias água quente, e essa sim, é uma razão de peso para termos alterações significativas na nossa costa.
Para os menos informados, esta corrente desloca-se a uma velocidade de 2 nós, sensivelmente 3.6 km/h, tem uma largura que varia entre 100 a 200 km e potência suficiente para mudar muita coisa à sua passagem.
Oriunda do golfo do México, segue via Estreito da Flórida na direcção da costa Leste dos Estados Unidos. Daí, faz uma inflexão que a traz às costas da Europa, aumentando a temperatura das águas por onde passa.
Esta corrente dirige-se ao Atlântico Norte, mantendo-se activa por força de circulação a que se dá o nome de “termoalina”. Essa circulação oceânica é tão profunda que não é sequer influenciada pela temperatura atmosférica.
O motor da circulação termoalina global é a diferença de densidade das águas, por existirem diferenças de salinidade e de temperatura entre elas.
As águas do polos são mais frias e menos salgadas, e as águas do equador mais quentes e mais salgadas, e é isso que promove o movimento e as decorrentes alterações de temperatura.




Não devemos pensar que isso é indiferente ao peixe que pescamos. Para os mais atentos à realidade do comportamento dos nossos peixes, a pesca já mudou em Maio, e em Junho aconteceu uma explosão de vida nos baixios.
A massa crítica de peixe que até aí pescávamos abaixo dos 60 metros, passou a estar mais próxima da costa. E não só, também os horários de alimentação mudaram, o peixe alterou o seu comportamento.
Este é o momento de enfrentarmos uma realidade distinta: o peixe come sobretudo a horas que nos são menos convenientes.


Saída do SPRINT para a pesca, a horas…”menos decentes”. Reparar que em frente à Arrábida temos a lua, em fase descendente...


Por força de mais horas de sol, da maior proximidade orbital do astro rei ao nosso planeta, (logo temperaturas mais altas), e poucos temporais a agitar as águas, a promover a mistura gasosa, a quantidade de oxigénio disponível nos pesqueiros, sobretudo nos de baixa profundidade, é bastante menor.
Isso, associado ao facto de a água manter agora uma maior uniformidade de temperatura ao longo do dia e noite em pesqueiros baixos (adeus ventos frios e geadas matinais), permite a algumas espécies de peixes uma maior aproximação a zonas rasas, promove em termos gerais uma maior actividade nocturna, junto à costa.
O fenómeno nada tem de estranho. Tudo se joga em termos de escolha das melhores condições ao longo do período dia/ noite, e o peixe tem tempo, pode escolher, e opta pelo que lhe é mais conveniente.
Quando analisamos quais os momentos de maior actividade alimentar dos nossos peixes, eles coincidem agora com os extremos do nosso humano ciclo de vida, o dito ciclo circadiano. Falamos do pôr do sol, do período nocturno, e do alvorecer.
Por azar nosso, a opção do peixe, neste período verão/ outono, recai em comer a horas em que nós pescadores deveríamos estar deitados.


Um robalo feito em plena noite, com amostra de superfície, de cor escura. A prova que me faltava de que eles caçam utilizando sobretudo a linha lateral, não os olhos. 


E como começa, qual o momento em que tudo passa a ser diferente?
Como podemos saber que o peixe já “mudou a hora”, que o seu relógio biológico já está noutro ritmo, em horário de Verão, a comer sobretudo durante a noite?
Simples, eles começam a fazer isso logo que a temperatura das águas sobe de forma consistente. Por experiências anteriores sabem que em profundidades mais reduzidas a abundância de alimento é superior.
Assim que as condições estão reunidas, dá-se uma migração massiva de peixe para os baixios, a mais rica zona do oceano em termos de possibilidades de encontrar alimento.
Se podemos considerar os primeiros 200 metros costeiros a faixa de maior concentração de vida em todo o oceano, também não estamos errados ao acreditar que nessa zona mais rica, aquela que se mostra mais favorável à ocorrência de oportunidades de conseguir alimentação são precisamente os primeiros 20 a 30 metros. Chega luz, chegam nutrientes, e isso basta para que se desenvolva vida.
Mas há outras razões para que objectivamente se concentrem nesta faixa milhões de seres que teriam menos possibilidades a outras cotas. A pressão dos grandes predadores faz-se sentir mais ao largo, e por isso mesmo, a tendência para encostar à praia, à costa, de forma a escapar a quem a boca demasiado grande...


Estas plantas aquáticas, sargaços, chegam-nos transportadas pelas correntes de águas quentes da corrente do Golfo.


Temos alguma forma de saber que isso já aconteceu? Sim, temos uma forma simples, e não é propriamente colocar o indicador na água e ver se está quente.
Um dos sinais mais certos de que a corrente do Golfo já chegou são os tufos de sargaços que nos chegam do largo.
Trazem com eles espécies pelágicas, peixes que os acompanham na sua placidez descomprometida, mas que ainda assim estão desejando ser “empurrados” para terra por estas correntes.
Porquê? Porque a fome a meio do oceano Atlântico aperta e mata.
Os peixes chegam-nos num estado miserável, magros, famintos, e é nesse período que devemos deixá-los recompor.
Nesta altura não é nobre pescá-los, porque é o tempo em que aceitam tudo, mesmo tudo, aquilo que lhes pareça comida. Ainda que seja um anzol brilhante, despido de qualquer vestígio de alimento.
Para além da fome imensa, são ainda portadores de toda a sorte de doenças e parasitas. Carregam consigo pequenos seres oportunistas que trazem nos sítios mais bizarros, incluindo a língua!
Não é raro que as pulgas lhes estejam associadas, agarradas aos opérculos, presas ao lombo, e até dentro da boca. Estas “carraças” do mar sugam-lhes o sangue, e por isso mesmo chegam a mudar a sua cor natural, branco sujo, para um rosa, ou mesmo vermelho. Vejam a foto abaixo.


Pulga do mar, cheia de sangue do seu famigerado portador. Um flagelo


Os peixes pelágicos, como os pampos, os lírios, necessitam nesta fase de algum descanso, e sobretudo de comer avidamente. Ao fim de algumas semanas já os teremos de novo na posse das suas faculdades, fortes, a dar luta, como gostamos deles.
As espécies residentes, aproveitando o tempo de canícula, aproximam-se da costa, e disfrutam da imensa variedade de alimento disponível, a baixas profundidades.
Não é difícil encontrar agora os pequenos pargos, até 1 kg de peso, algumas bicas, muitas garoupinhas, e, para quem pesca em zonas mais descansadas, as douradas e os robalos.
Este é o tempo de os tentarmos com amostras macias, os vinis, (ver exemplos em: https://store.gofishing.pt/pt/) equipados de cabeçotes adequados à profundidade a que pretendemos pescar.
Pois se a água que temos por baixo é pouca, digamos 6 a 10 metros, podemos pescar com cabeçotes de 4 a 6 gramas. Se temos 15 a 25 metros, pesos de 9 a 12 gramas são suficientes, partindo do princípio que a linha multifilamento que temos no carreto não excede o PE 0.6.
Marcas como a Fish Arrow, a Berkley, produzem imitações bastante fidedignas de pequenos peixes e alevins. São de tal forma convincentes que não é raro o mesmo peixe morder mais que uma vez, ou seja, a dar-nos a segunda hipótese de ferragem.


Pacotes de 6 unidades fazem vários dias de pesca.



Muitas vezes perguntam-me como “iscar” os vinis no anzol. Quero crer que a maior parte das pessoas não terá uma ideia firme e clara sobre o assunto.
Por isso mesmo, resolvi fazer um pequeno e despretensioso filme, que vos passo aqui:


Clique na imagem para visualizar e na rodinha das definições para melhorar a qualidade.


Para melhorar, aquilo que podem fazer é passar um pouco de cola entre o cabeçote e o vinil, e têm amostra para algum tempo.
Ao fim de 6/10 peixes será natural que o vinil já se encontre muito mordido, desgastado, mas podem pescar com ele até que se parta por completo, porque não perde a sua efectividade.
Digo-vos que, sem sombra de dúvida, este sistema é mais eficaz que o jig, em igualdade de circunstâncias. Assumo que nos é mais conveniente utilizar jigs, mais confortáveis. A profundidade a que podemos pescar com os jigs, e a comodidade de contarmos com uma “isca” dura, não perecível é de facto superior. Mas em termos de atractividade, de pesca pura e dura, e até de diversão, o vinil ganha! Sem dúvida.
Porque agora o peixe já se aproximou dos baixios, resulta até mais difícil pescar com jigs que com amostras macias. Pescamos menos bem com jigs em águas rasas, encalham mais.
O vinil é a minha opção para estes meses de Verão, em que o peixe se encontra em águas rasas.


Talos de laminárias, a alga mágica que atrai todo o tipo de espécies de peixes.


Caso tenham perto algum campo de laminárias, pois fiquem a saber que devem explorar o seu potencial. As laminárias são plantas aquáticas de grande porte, altas e muito protectoras, já que no seu interior os peixes podem encontrar a paz e repouso que necessitam.
Serão cada vez menos, por razões que se prendem com temperaturas das águas, poluição, e porventura outras razões naturais que nos escapam.
A verdade é que os campos de laminárias da Arrábida já quase não existem.
Recordo-me de as haver em tal abundância que tapavam a passagem dos barcos junto à costa. 
Os seus mantos castanhos largos de muitas dezenas de metros impediam inclusive a natação dos banhistas nas praias junto ao Portinho da Arrábida, Pedra da Anicha, etc.
Outros tempos.
Estas algas eram colónias de férias de santolas, navalheiras, sargos, douradas, robalos, bodiões, etc.
Metiam peixe dentro pela protecção que davam contra aparelhos e redes. Hoje, infelizmente já não existem muitas laminárias...
Onde as encontrarem, não hesitem, experimentem a lançar vinis na sua periferia e vão ver que os peixes aparecem, vindos de lá de dentro.

Boas pescas!



Vítor Ganchinho



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2 Comentários

  1. Olá Vitor

    Fico deliciado a ler estes artigos com informação científica e ficar a entender um pouco mais as coisas, que ditas pelo Vítor nos parecem "tão simples".
    Abraço
    Toze

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    Respostas
    1. Tozé, estas coisas estão todas ligadas entre si, cada detalhe depende da conjugação de todos os outros.
      Por vezes temos a possibilidade de os conseguir encontrar todos alinhados e fazemos pescas incríveis, e outros dias estão mais desfavoráveis e temos de lutar para conseguir alguns peixes.

      Mas ir ao mar e pescar será sempre um desafio tremendo, porque exige de todos nós o nosso melhor.

      Abraço
      Vitor

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