Vimos anteriormente que as correntes são mais fracas ou mais fortes consoante a menor ou maior altura do fundo que pescamos.
E também tecemos algumas considerações sobre a questão da estrutura de fundos, e da sua influência sobre a capacidade do nosso robalo permanecer no meio de massas de água de deslocação rápida.
Vamos hoje continuar a explorar esta ideia de entrada e saída dos pesqueiros, de acordo com a velocidade de passagem da água por esse local.
Em zonas com muita pedra partida, com muitos obstáculos naturais, é bem mais fácil que um peixe possa encontrar um posto de caça que lhe permita ficar, ainda que a corrente seja forte.
Conheço locais onde, por força da quantidade de estruturas existentes, é bem fácil a um robalo conseguir abrigo e não se cansar demasiado enquanto espera a aproximação de uma presa.
Já outras zonas, menos favorecidas pela natureza, obrigam a incursões rápidas, sob pena de provocarem um enorme desgaste energético no predador.
Essas zonas, menos estruturadas, mais lisas, não deixam de ter alimento, mas a sua captura não é fácil de todo. Desde logo porque não permitem caça de emboscada, (o peixe não tem onde se esconder), obrigam sim a uma perseguição que não é de todo aquilo que convém a quem persegue.
Pensando que a terceira e quarta hora de um ciclo de maré são as que apresentam uma velocidade de deslocação de água superiores, podemos pensar que em zonas muito baixas, o tempo que um robalo tem para entrar na zona e sair é algo limitado. Este tempo está umbilicalmente ligado ao perfil do local, mais pedra igual a mais travões, mais deflectores de corrente, logo mais possibilidades de permanência.
Se a zona é muito lisa, terá o nosso peixe menos protecção das correntes fortes, logo o dispêndio de energia será sempre superior. E por vezes as dificuldades são tantas que não possibilitam a obtenção de uma presa no espaço de tempo em que isso seria pressuposto.
Isso explica a razão de por vezes pescarmos peixes de estômagos vazios, peixes que passaram todo o ciclo de maré sem encontrar comida e acabam por morder na nossa amostra mais tarde, num momento que teoricamente seria menos provável.
Estômagos vazios ao fim das seis horas de subida de maré espelham precisamente essa dificuldade. Nem sempre o peixe encontra comida, porque não há seis horas para a procurar, por vezes serão poucos os espaços de tempo com verdadeiras condições de caça.
Em dias de lua cheia, lua grande, e em que o sol se encontra também no mesmo alinhamento, as correntes são de tal forma fortes que iriam exigir um tremendo esforço para que o predador pudesse permanecer e enfrentar a força das águas. Logo, o tempo de caça reduz drasticamente, o peixe entra ao local já condicionado por ter de esperar pela velocidade de corrente certa, e por vezes isso significa pouco tempo.
Não esqueçam que em pesqueiros baixos, a questão segurança também se coloca, eles não podem abandonar o local numa vazante já muito tardia, porque arriscam ficar a sêco. Tudo é considerado, sendo que a alimentação necessária não vem antes da segurança.
Podemos então considerar que há momentos certos para dar entrada nos pesqueiros, a corrente que estes apresentam depende da estrutura do fundo e da hora da maré. Claro?!
Os nossos robalos são bichos resistentes, sabem viver em ambientes agrestes, mas não são movidos a gasolina! Eles têm de comer para poderem gastar.
Geralmente, no início de uma maré vazante, não teremos os robalos demasiado activos.
Digamos que esse é o período em que eles, fartos de correr atrás de pequenos peixes, se reservam o direito a um merecido descanso. Mas já comeram.
Já todos nós pescámos peixes completamente “atulhados” de comida. Quantos de nós não ferrámos já robalos com o estômago cheio, com a boca cheia, e ainda assim tentaram encontrar espaço livre para morder mais a nossa amostra?!
A questão é que as oportunidades não são demasiadas, a comida também se defende, e os predadores têm de aproveitar dos momentos em que as circunstâncias os favorecem.
Bem sei que neste momento estarão a pensar que morder uma amostra não é propriamente uma boa oportunidade de encontrar comida. Errado!
Pensar assim é ver a questão pelo prisma humano, esquecendo que aquilo que conta não é isso mas sim a percepção que o peixe tem de uma oportunidade de se alimentar.
Nós sabemos que uma amostra é um presente envenenado, porque se trata apenas de um pedaço de plástico armado de anzóis. E seguimos esse raciocínio até ao fim, sabendo sempre e previamente qual o resultado final, caso o peixe morda o engano.
Mas eles não sabem! Para um robalo, uma amostra é apenas um peixe desvalido, lento, com um rumo muito bem definido, e por isso fácil de capturar.
As presas naturais dos robalos, porque se defendem, porque tentam escapar e sabem que a sua vida depende disso, criam estratégias de fuga que por vezes resultam. Ou já não existiriam.
Eles, os peixes pequeninos, recorrem a tudo, e sobretudo apostam em nadar em zonas com amplos campos de visão. A sua atenção será sempre máxima, todos os seus sentidos estão alerta procurando indícios e razões de alarme.
E por isso escapam, os predadores têm uma determinada taxa de sucesso mas essa taxa depende muito das circunstâncias do local de caça.
Já as nossas amostras, são pensadas para parecerem presas fáceis, e tudo aquilo que fazemos em termos técnicos vai no sentido de as tornar “presas” ainda mais fáceis, mais cegas e acessíveis a quem tem uma velocidade explosiva tremenda e as pode facilmente alcançar e morder.
Nós sabemos o que se irá passar a seguir, sabemos dos anzóis, sabemos dos seus bicos afiados e das barbelas, mas para um peixe esses “apêndices” nada significam.
A sua concentração é total no corpo da amostra, no seu volume, na sua velocidade de deslocação, nas vibrações, na direcção que leva, e naquilo que é necessário fazer para conseguir preparar um ataque que seja efectivo, que termine com a boca a engolir o alvo.
E isso já implica muitos cálculos de “engenharia”. Não será fácil fazer uma perseguição, calcular linhas, tempos, trajectória, desvios, forças e perturbação da corrente, abertura de boca e intensidade de mordida.
Se a isto juntarmos o facto de nem sempre a visibilidade da água ser a melhor, podem imaginar a dificuldade da tarefa.
Só entenderemos aquilo que os nossos peixes são obrigados a calcular em termos matemáticos, no dia em que tentarmos, debaixo de água, morder um peixe com os nossos próprios dentes!! Aí sim, daremos valor a quem o tem, e entenderemos a extraordinária precisão que é necessária para que um robalo consiga chegar a ter uma amostra na sua boca.
Vamos voltar a seguir com um tema interessante, que versa o tipo de fundos mais favoráveis aos peixes, que não às nossas amostras...
Vítor Ganchinho
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