A NATUREZA PROTEGE OS SEUS...

É mais forte que nós: exigimos que ao dia da nossa saída de mar tudo esteja perfeito: mar calmo, águas azuis, muito peixe.
Peixe grande, e se possível fácil de pescar!
Bem sei que as pessoas esperam dias e dias por aquele momento, a expectativa é alta, o investimento em equipamentos e logística é pesado, e assim sendo, esperam sempre que tudo corra pelo melhor. E obviamente, já agora, que a jornada, se não for pedir muito, seja compensadora em termos financeiros.
Há um inconsciente deve e haver na mente de cada um daqueles que adquire iscos, canas, carretos, linhas, licenças, etc. Bom mesmo é que a casa saia a ganhar, logo, caixas de peixes cheias, sem concessões a espécies menos nobres. Robalos, douradas e pargos, …muitos.
Porém, nem sempre é assim, ou se quisermos ser francos, quase nunca é assim.


Estas duas pessoas acordaram cedo, saíram de casa ainda de noite e quando chegaram ao sítio, depois de uma valente caminhada pelo areal, depararam com um mar cheio de algas...


O mar não se compadece de dias marcados, de humanas conveniências, e por isso mesmo, balança ao seu ritmo próprio, sem querer saber de vontades, suspiros ou desejos.
Todos sabemos que nesta altura será muito provável que existam robalos encostados a terra. E estão particularmente receptivos a morder as nossas amostras.
O momento é de ganharem peso, aumentar força, criar reservas de gorduras e preparar dessa forma o duplo ciclo que se avizinha, o Inverno frio que se adivinha e algo mesmo muito importante: a reprodução.
Em termos de biologia marinha, o período outonal precede a fase de frenesim reprodutivo, que irá decorrer de Dezembro até final de Janeiro/ meio de Fevereiro, para a grande maioria dos peixes sexualmente activos desta espécie. O grosso da coluna dos robalos irá reproduzir nesse período.
Nessa altura, os machos, mais pequenos, concentram as suas energias na procura de fêmeas prontas a libertar os óvulos. Seguem-nas dia e noite, em grupos que podem ter mais de 20 exemplares, e quando chega o momento, todos participam na cobertura do seu precioso tesouro com sémen em abundância.
Nesta fase, a preocupação deles não é sequer comer, pelo que as nossas amostras são relegadas para segundo plano. É um período menos produtivo e ao qual se segue a debandada para fundos mais significativos, por força do arrefecimento superficial das águas.
A reprodução é um período terrivelmente crítico para o nosso robalo. Do sucesso das suas posturas e fecundação dos óvulos dependerá a abundância de peixes nos próximos anos, sabendo nós que por vezes um simples detalhe pode pôr em causa a gestação dos alevins. Temperaturas demasiado elevadas manterão por perto das desovas peixes indesejáveis nesta altura do ano, sobretudo carapaus e cavalas, grandes devoradores de óvulos do nosso predador.
Caso as águas venham frias, a debandada destes peixes será uma realidade e aí fica aberto o caminho para um aproveitamento massivo das posturas. Caso contrário, muitas toneladas de robalos não chegarão a conhecer o contacto directo com a água do mar, serão comidos ainda dentro dos óvulos, por estes serem pelágicos, leia-se que derivam na coluna de água, ao sabor das correntes e ventos.
Alinhar toda uma série de fenómenos naturais para que tudo corra bem é trabalho de enorme precisão, conforme podem adivinhar. A temperaturas das águas, a quantidade certa de luz, alimento em abundância, muita segurança para aqueles minúsculos seres que nem reconhecemos como robalos são dados que têm de ajustar-se e coincidir todos ao mesmo tempo. Sob pena de se perderem as esperanças de toda uma geração de reprodutores.
Basta que um destes dados não se concretize, e todos os outros caem como um baralho de cartas. E perdem-se milhares de robalos...




As tempestades de Outono e as ondas, sobretudo aquelas acima dos 3 a 4 metros, trazem consigo uma movimentação violenta de águas que, por serem as primeiras, arrancam as algas de Verão, agarradas às pedras.
Numa primeira fase, estas algas (chamemos-lhe isso mas são na verdade plantas aquáticas...) ficam em suspensão em toda a coluna de água, sendo que posteriormente a quase totalidade delas irá assentar sobre o fundo. Este é um momento em que os camarões e muitos outros seres minúsculos as irão colonizar, escondendo-se sob elas, encontrando aí alimento e alguma segurança.
Após o início do seu estado de decomposição, acontecem transformações químicas e isso altera a sua capacidade de flutuação. Com a formação de gases internos, a tendência será para que aconteça a emersão destas algas até à superfície.
Chamadas de “tabaco”, serão tudo menos amigas de quem lança linhas, porque se prendem em tudo, nós, anzóis, amostras, de tal forma que chegam a impedir estas de trabalhar convenientemente, e por fim, inviabilizar mesmo a pesca por absoluto.
Para quem chega de longe e pretende pescar de terra, nada mais arreliador que palmilhar quilómetros e ao chegar à zona de pesca deparar com estas condições.




A densidade de algas pode ser de tal forma que se constituem como uma massa compacta, a ponto de estragarem as nossas praias para o turismo, e a pesca para nós, conforme podem ver nas imagens colhidas pelo meu amigo Carlos Campos. De facto, contra uma arribada de algas desta envergadura pouco há a fazer em termos de pesca, e não vale a pena pensar em “técnicas alternativas” que resolvam.
Para quem pesca apeado, aquilo que pode solucionar é a mudança de local, ou, no caso de a pesca estar a ser feita de barco, a deslocação para uma zona não afectada por este flagelo.




Ainda assim, permitam-me dar-vos conta da necessidade imperiosa que as nossas águas costeiras têm deste tipo de fenómenos, já que no fim, tudo isto, toda esta massa vegetal será utilizada como matéria orgânica e alimento por micro-organismos que não conseguimos ver, mas que contam e de que maneira para a existência de peixe.
Zooplancton alimanta-se de fitoplancton, e será por sua vez o alimento necessário para os nossos peixes filtradores, sardinhas, cavalas, etc. E esses por sua vez a razão de existirem predadores na nossa costa.
Porque têm esses pequenos peixes por alimento.

Vejam aqui quem come os resíduos vegetais que tanto odiamos:

Clique na imagem para visualizar e na rodinha das definições para melhorar a qualidade.


As sardinhas são essencialmente peixes vegetarianos, mas não substimem, podem mesmo lançar-se sobre jigs, ou amostras, o que indica uma actuação predatória sobre organismos vivos com tamanhos insuspeitos. Vejam a imagem abaixo:


Neste dia estava a testar um jig de 40 gr da Major Craft que acho curioso. Tem tudo o que se pode adicionar num só jig: cor azul marinho, espelhado, e ainda uma faixa luminescente no ventre. Para além disso é assimétrico, o que lhe confere um movimento “woobling” muito atractivo.


Não devemos ser tão precipitados que consideremos que as algas só nos maçam e retiram possibilidades de pesca.
Pelo contrário, devemos sim tentar entender que se temos peixe ao longo de todo o ano na nossa costa, isso se deve ao facto de haver algas, e com isso um caldo de efectivo alimento para a base da nossa cadeia alimentar marinha. Começa aqui e vai até às orcas, às baleias, aos tubarões, etc.
Águas cristalinas e bacteriologicamente puras, a existirem, são desertos de vida!


Para quem faz surf-casting isto pode ser considerado um flagelo.


Por vezes a faixa de algas é mais densa junto à rebentação, e há possibilidades de conseguir lançar mais longe, onde já é provável que os nossos peixes encontrem condições mínimas para respirar e encontrar comida.
Nesses casos, ter uma bobine com linha muito fina, permite fazer lançamentos longos. Deve o pescador estar munido de diferentes opções e jogar de acordo com as condições que encontre. Há um ponto óptimo entre o diâmetro mínimo utilizável para lançar longe e a resistência mínima exigida pelo calibre do peixe que podemos vir a conseguir.
No meio está a virtude.


Aqui podemos perceber que bem longe há água menos carregada de sedimentos. A questão é conseguir chegar lá, e para isso uma cana com qualidade é imprescindível.


Longe vão os tempos em que as algas eram utilizadas como fertilizantes nos campos, hoje os adubos sintéticos substituem tudo isso.
O ágar-ágar sempre foi uma boa solução para a indústria farmacêutica, mas tratam-se de nichos de mercado, e não são de todo representativos.
Em Sesimbra eram famosas as barcas amarelas, que se dedicavam à apanha em fundos baixos dessa alga. Terminou…
De qualquer forma, gostava que ficassem com a ideia de que as algas, (repito: em rigor deveríamos chamar-lhes plantas…as algas são elementos microscópicos…), não são apenas um flagelo.
Não é contra elas que devemos praguejar, já que são precisamente elas que nos permitem ter o peixe que tanto gostamos de pescar.


Foto Carlos Campos, alguém que se preocupa em fornecer material de imagem para que eu possa desenvolver as minhas ideias. Obrigado Carlos!



Vítor Ganchinho



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