A nível europeu, durante muitos anos, porventura demasiados, não cuidámos dos nossos robalos como o devíamos ter feito.
Cometeram-se excessos, pescaram-se indiscriminadamente os grandes reprodutores e peixes ainda juvenis, de todos eles muito, e a dada altura, por todo o lado, começaram a fazer-se sentir os previsíveis efeitos desses abusos. Deixou de haver.
O robalo, uma espécie icónica para os pescadores de todo o continente europeu, passou a espécie ameaçada de extinção.
O robalo, rei da espuma. Ninguém como ele tira partido das condições difíceis de mar. |
Aquilo que ficou, o património genético residual que ainda sobreviveu, apenas nos garante a manutenção da espécie caso seja feita uma gestão sustentável.
Por toda a Europa vozes se levantaram a protestar, reclamando uma nova postura relativamente a este peixe em particular. Exigiram-se medidas que evitassem a todo o custo o seu desaparecimento.
E é neste ponto que algo ocorre de estranho: o ênfase na gestão dos recursos passou a ser colocado na pesca recreativa e não na pesca comercial.
De repente, alguém na Holanda fez contas e percebeu que os profissionais das redes não valiam o mesmo em termos de movimentação de valores expressos em euros.
Os números não enganam: o valor socioeconómico da pesca recreativa do robalo nos Países Baixos é mais de quatro vezes superior ao do robalo capturado profissionalmente.
São aqueles que pescam de forma desportiva quem mais dinheiro movimenta, pelo elevado custo dos equipamentos de pesca, das deslocações, combustíveis, barcos, restauração, hotéis, licenças, etc.
Na verdade, o pescador lúdico gasta fortunas para conseguir um peixe.
E, feitas as contas, chegaram os holandeses à conclusão de que quer em termos de economia quer em termos ecológicos, a fileira do pescador desportivo deveria prevalecer sobre a pesca profissional.
Por cá, receio não podermos dizer o mesmo.
Sabemos o suficiente sobre a reprodução da espécie, ou não fôssemos grandes produtores de peixe em aquacultura, mas adoptamos uma política de “deixar andar”, de “seja o que Deus quiser”, e um dia iremos arrepender-nos disso.
Os franceses já se lastimam, agora que estão limitados a 2 peixes /dia por pescador. E já foi pior, a dado momento, dividiram o país em dois paralelos, e num deles, o sector norte, a proibição de pesca com retenção era total.
Enquanto que a nós nos são permitidos exemplares de 36cm, os franceses só têm permissão de conservar robalos de 42 cm a norte e 48 cm mínimos no paralelo sul.
Para quem sempre esteve habituado a pescar indiscriminadamente, estas medidas doem. Os franceses reagiram, mas tarde demais, o mal estava feito, não havia peixes e tiveram de se conformar e aceitar de que agora teria de ser assim.
Nós ainda não chegámos a este ponto, mas não estaremos longe de atingir este patamar, o de “severa preocupação” sobre a quantidade de robalo disponível para pesca.
Águas que sobem, águas que descem. No meio, fica um caranguejo ou um camarão mais descuidado, ….que é comida para robalo. |
Trata-se de um peixe incrivelmente desportivo! Pode ser extremamente fácil, morder tudo o que lhe aparece à frente, ou ser absurdamente difícil, a ponto de não o conseguirmos convencer com nada.
Muitos daqueles que o pescam, pouco mais sabem que se lança e recolhe uma amostra. E que a dado ponto, algo fica preso.
Parece-me que devemos saber mais, que pode ser importante ir mais longe.
Porque estamos na altura deles, porque o robalo é o rei deste período do ano, este Outono que nos chega estranho e descompensado, vamos iniciar uma série de artigos que versam o peixe mais icónico que temos na nossa costa. Há sargos, há pargos, mas o robalo é o peixe que mais paixões suscita, sem dúvida.
Vamos conhecê-lo nos próximos artigos, por dentro e por fora, virar do avesso um peixe que achamos que sim, mas afinal muito poucos conhecem a sério.
Do lado de fora é muito difícil dizer a diferença entre um robalo macho e uma fêmea. Existem muito poucas características físicas na sua aparência exterior que possam indicar-nos de imediato o sexo do peixe em questão.
Algumas pessoas mais atentas e experientes conseguem detectar pequenas diferenças, tais como o comprimento da cabeça e a distância medida da ponta do focinho até a extremidade anterior da barbatana dorsal.
Ambos são ligeiramente maiores nas fêmeas. A cabeça de um robalo fêmea também é mais pontiaguda, mais afunilada, em comparação com a do seu congénere masculino.
No entanto, identificar o género nas diferenças morfológicas não é um método muito fiável.
Isto deve-se a uma margem de erro percentual que subsiste, e que ainda assim anda à volta dos 20%.
A única certeza que podemos ter é que os robalos muito grandes são praticamente todos fêmeas. O comprimento máximo de um robalo macho é de cerca de 75 cm, as fêmeas podem atingir até 100 cm de comprimento (Pickett, 1994).
Os machos crescem mais lentamente, não vivem tanto quanto as fêmeas e, em média, também pesam menos que as fêmeas.
Sei que em Peniche foi capturada à rede uma fêmea que sobre passava os 14kgs, o que é notável.
Os robalos são máquinas de criação.
Uma fêmea adulta de robalo carrega de 250.000 a 500.000 ovos para cada quilo de peso corporal, logo, quanto maior o peixe, mais ovos irá produzir.
Demoram de quatro a sete anos até atingirem a maturidade sexual, o que os torna bastante vulneráveis. Basta que algo ocorra durante esse período de tempo, (e podem ser 7 anos o tempo de espera) para que a cadeia de reprodução fique amputada desse potencial de propagação.
Nessa altura têm um comprimento médio de 35 a 42 centímetros, dependendo do seu habitat, o que nos leva a pensar que a medida mínima que lhe temos atribuída, 36 cm, pode ser insuficiente.
Sendo esta espécie capaz de reproduzir durante cerca de vinte anos, e tendo em consideração que as maiores fêmeas podem atingir um metro de comprimento e uma idade de 30 anos, é-nos fácil entender a importância que cada uma destas fêmeas tem para a perpectuação da espécie.
Efectivamente, e dado que o robalo é uma espécie de crescimento lento, as grandes fêmeas adultas desempenham um papel muito importante na salvaguarda do futuro. São elas que produzem óvulos em quantidade significativa.
Os jigs Coltsniper da Shimano produzem o tipo de queda que os robalos apreciam. Este engoliu o jig por completo. |
É preocupante ver que os robalos estão a tornar-se cada vez mais raros, e isso acontece por toda a Europa.
Basta que aconteça um verão mau, muito quente, e logo a seguir um inverno muito rigoroso, e esse ano pode não ser tão produtivo em termos de “novo recrutamento” de alevins.
Nestes casos, e por falta de muitas fêmeas grandes, um ano perdido significa muitos milhares de peixes não produzidos, não concretizados.
Porque todos nós procuramos sobretudo os grandes, isso dá-nos uma ideia do quanto é difícil reverter o declínio da espécie. A solução imediata poderia passar por aumentar significativamente o tamanho mínimo de captura, neste momento demasiado curto. Pensemos que um robalo de 50cm terá reproduzido, com garantia, apenas duas vezes.
Vamos continuar este trabalho no próximo número.
Vítor Ganchinho
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Para além da medida mínima, é ainda mais importante proteger os grandes reprodutores com fixação de medida máxima. Redução da quantidade de capturas, é ridículo que um lúdico possa capturar 10kg+grande exemplar...ninguém consome pessoalmente todo esse peixe e congelar para quê? Para ficar queimado e quando sair da arca ir direito para o lixo? Primeiro há que mudar mentalidades e fomentar uma postura sustentável. Depois há que abolir os arrastos...etc
ResponderEliminarVamos continuar deste lado a chamar a atenção das pessoas para detalhes que, no seu conjunto, podem ser muito importantes para a preservação dos nossos peixes.
EliminarAmanhã teremos mais um artigo na linha dos anteriores sobre robalos, e depois de um breve intervalo, ( temos um caso curioso com um mero pescado pelo Luis Ramos para divulgar na próxima semana...), voltaremos a este assunto.
O momento dos robalos é este, e vamos dar mais umas achegas ao assunto.
A pesca de arrasto, (bem como outras que por cá se praticam), deveria pura e simplesmente ser abolida, não existir, ser proibida. No fim, haveria mais peixe disponível, para todos, incluindo os profissionais.
Penso ser consensual que algo mais deve ser feito, e a GO Fishing estará sempre na linha da frente em questões de preservação.
Um bom dia
Vitor
O artigo está muito bom mas peca por não referir a questão mais importante. O defeso da pesca ao robalo em época de desova. Aqui , em Peniche, é arrepiante ver caixas com robalos , em lota, estando as caixas cheias de ovas. Sou pescador lúdico embarcado e em ano que apanhe 4/5 robalos já é um grande ano.
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