Há um momento do ano em que as capturas de robalos adultos, por mais aficionados que sejamos da sua pesca, não nos trazem boas sensações.
O final de Janeiro, Fevereiro e início de Março são penosos para o nosso peixe. Estão amorfos, gelados, não lutam, não têm força.
Nesses meses, tudo se conjuga para que a sua figura e o seu desempenho não estejam no seu melhor. Os peixes disponíveis não são muitos, nem se defendem bem.
Há boas razões para isso.
As águas de Inverno arrefecem, passam dos aprazíveis 19 a 20º de Verão para uns arrepiantes 12 a 13ºC, exigindo deles um consumo extra de energia.
A água fria força-os a uma deslocação para fundos que podem chegar bem abaixo de 100 metros, para onde baixam à procura das termoclinas, as faixas de água mais quente que lhe garantem um pouco mais de conforto.
Por estarem muito mais fundos, é natural que não estejam acessíveis aos pescadores de spinning, que não os encontram nos pesqueiros habituais à superfície, e os julgam para outras paragens.
Não estão longe, apenas estão mais fundos.
Nesta fase, os picos de actividade são curtos, por vezes de poucos minutos, e centram-se sobretudo em presas de mais fácil captura.
Este é um tempo em que as lulas de meio tamanho encaixam na perfeição, mas também os jovens chocos, fáceis de capturar.
Porque o número de presas disponíveis não é significativo, a aposta passa a ser feita em comedia de maior tamanho, sobretudo cavala, carapau, sardinha se a houver, e os inevitáveis caranguejos pilados.
Longe vão os tempos de abundância, os dias fáceis de muito peixe miúdo, biqueirão, galeotas, camarões, etc.
Durante o Verão, e porque o robalo não é de forma alguma muito exigente, os peixes estão sempre bem alimentados e em ótimas condições físicas.
Mas durante o período invernoso emagrecem a olhos vistos, o teor de gordura do peixe pode diminuir do nível padrão, mais de 10% do peso corporal, para quase 0%.
Dias mais curtos, noites mais longas, frio, permanência longe da costa onde há menos possibilidades de obtenção de alimento, …estes são ingredientes que pouco ajudam ao nosso robalo.
Em cima disso, a pesca profissional lança-lhes redes, persegue-os numa fase em que eles pouco podem fazer para escapar. Estão debilitados.
Quando nós ferramos um robalo, ao contacto da mão sentimo-lo frio, e isso diz bem das suas possibilidades físicas ao momento.
Lembro que os peixes são animais de sangue frio, ou seja, a sua temperatura corporal interna corresponde à temperatura da água que os envolve.
Os nossos peixes passam de um momento áureo, de pujança física, de força, aquando da sua migração anual para os locais de desova, (onde cada fêmea madura pode produzir entre um quarto e meio milhão de ovos por quilograma do seu próprio peso corporal), para um estado depauperado de energia, de enorme fraqueza e que nos decepciona a cada lance.
São vários os acontecimentos que se conjugam para este estado de debilidade, e podemos enumerar alguns: stress reprodutivo, abstinência de alimentação, maior exigência física por tentativa de compensação do arrefecimento das águas.
Com efeito, ao início de Dezembro temos do robalo o melhor que há em si: peixes sexualmente maduros a concorrer por fêmeas carregadas de óvulos, gordos.
A seguir, e por acção desta fase reprodutiva em que pouco ou nada se alimenta, somada ao abaixamento da temperatura da água e à forçada migração para zonas menos produtivas em comida, passamos a ter o pior que eles podem apresentar.
Os robalos baixam o seu metabolismo, recolhem a locais abrigados que lhes proporcionem segurança e esperam.
Os meses após desova revelam-nos robalos já bem fundos, em busca das temperaturas consistentes encontradas em águas longe dos gelos da superfície.
Não é pois surpresa nenhuma que os peixes que regressam das zonas fundas, e que serão os primeiros que iremos capturar com jigs em pedras a 50/ 60/70 metros, sejam geralmente muito magros e, em geral, não tão poderosos e fortes em comparação com aqueles que pescamos agora, em pleno Outono.
Devemos ter muito cuidado em devolver estes peixes cansados, desgastados, para que possam alimentar-se bem e vir a desovar novamente no futuro. Não é o momento de os trazermos para casa, porque de pouco nos servem na cozinha.
Aqueles que os pescam de terra, irão tê-los em força a partir da Primavera. Isso acontece quando as águas aquecem ligeiramente, e é chegado o tempo de arribar à costa, para comer desenfreadamente.
Toda a pesca que fazemos ao robalo em Portugal é efectuada neste recanto do Atlântico Nordeste, (aquilo que está escrito nas placas de informação de preço nos mercados, com a designação “capturado”), já que nas nossas ilhas este peixe não existe, pelo menos por enquanto. Pode acontecer que, por força da existência de unidades de produção industrial de robalos e douradas, de aquacultura, venham a escapar efectivos e possa haver alguma colonização. Mas de momento isso não tem expressão. Há robalos no continente, e hoje em dia não são muitos.
Acresce a preocupação de termos as populações de robalos em vertiginoso declínio. A diminuição da biomassa das unidades populacionais reprodutoras, (os robalos de muito grande tamanho), coincidiu com o aumento da mortalidade por pesca, à conta da grande eficácia das redes de emalhar. Este fenómeno agravou-se sobretudo a partir do ano 2000, há vinte e poucos anos atrás.
Pior que isso, os stocks de peixe ainda existentes não têm tamanho nem idade para podermos alimentar grandes expectativas. Eles precisam de tempo!
Há muita gente preocupada e a estudar afincadamente este assunto. Decorrem estudos genéticos, fazem-se marcações de peixes, analisam-se dados relativos a capturas profissionais, lúdicas, a sua distribuição por toda a Europa, e estimam-se tendências.
E aquilo que vos posso dizer analisando esses dados é que a situação não está muito longe de negra.
Temos muita informação, sabemos onde andam os robalos o ano todo, conseguimos ter alguma certeza quanto à sua distribuição no plano de água, profundidades, distância à costa, e sabemos até quais as perspectivas de recrutamento de novos robalos, a iniciar a sua vida adulta de peixes maturos.
Mas também sabemos, recolhendo todos os contributos de informação existentes a nível europeu, tendências de deslocação de biomassa, mortalidade por pesca causada pelas redes, aparelhos, anzóis da pesca lúdica, etc, que o robalo tem o seu futuro particularmente ameaçado. Há nuvens negras no horizonte….
Houve um período, o qual conseguimos situar entre 1990 e o ano 2000, em que foi registado um ligeiro aumento de efectivos, impulsionado pelo recrutamento de uma grande quantidade de novas populações reprodutoras.
O ano de 1989 foi bombástico para a reprodução, vingaram milhões de robalos juvenis por toda a Europa. O aquecimento das águas não foi alheio a esse facto.
Mas infelizmente, a isso respondemos com mais redes, mais capturas, e o efeito de recuperação perdeu-se. Pescámos demasiado.
A seguir, e por grande azar, tivemos longos invernos com temperaturas da água muito baixas, em 2005, 2006 e 2008 a 2011. Isto afectou a criação e crescimento do robalo das desovas dos anos anteriores, resultando numa criação muito baixa de robalos juvenis nesses anos.
Poucos vingaram e chegaram a adultos. E os stocks disponíveis imediatamente baixaram.
A tendência decrescente das unidades populacionais de robalo no Atlântico Nordeste deixa bem claro que não há tempo a perder para salvaguardar o futuro do nosso querido Dicentrarchus labrax.
Em termos profissionais, em alguns países europeus a pesca do robalo é vista como fundamental, já que ela mobiliza frotas que o fazem em exclusivo. Em Portugal isso também acontece.
Mas há que abrandar, deixar crescer, deixar reproduzir.
Já aqui vos trouxe a informação de que a pesca desportiva movimenta valores mais elevados que a pesca comercial, no que a dinheiro vivo concerne.
Nós pescadores lúdicos gastamos uma barbaridade de euros por cada quilo de robalo capturado. Licenças, canas, linhas carretos, amostras, etc…
E não é de hoje, sempre foi assim, desde há muito tempo. Em Inglaterra, já se pescava o robalo em moldes desportivos, em 1820.
Em Portugal não sei, não consegui obter dados, há poucos registos disponíveis, mas se nós sabemos pescar robalos, e sabemos mesmo, isso significa que a houve muito tempo de aprendizagem, muitas gerações sucessivas a passar informação às seguintes.
Não sabemos é preservar.
Se soltarmos os robalos magros do pós desova, e os juvenis que batem nas nossas amostras, nós pescadores desportivos responsáveis, já estamos a ajudar.
Vítor Ganchinho
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E como fazer chegar este estudo e os outros do blogue ao ministério das pescas e do mar, bem como a outros departamentos da pesca e estudos marinhos. Em Portugal não há fiscalização porque depois disso o fruto proibido será o mais apetecido.
ResponderEliminarBom dia!
EliminarSai fora do âmbito desta publicação a tomada de decisões que serão sempre mais politicas que ecológicas e ambientais.
O tempo disponível para manter o blog activo é tempo retirado à família, aos negócios, e inclusive à própria pesca. Eu já deixei de ir pescar para poder manter a regularidade da publicação.
Parece-me importante passar informação sobre equipamentos, sobre peixes, sobre técnicas de pesca, e isso vamos continuar a fazer. De momento, estamos numa sequência de artigos relacionados com um peixe pressupostamente conhecido, mas que na minha opinião não o é tanto assim.
Os próximos artigos vão incidir sobre aspectos relacionados com a vida do robalo.
Espero que gostem.
Vitor Ganchinho
Continuo a achar que Portugal sendo um país com mais território náutico do que terrestre, devia pensar melhor sobre a esta quetão da manutençao dos recursos maritimos. Estudar as nossas águas e ajudar o meio aquático a recompôr-se face à tradicional dependencia qte temos deste nosso mar. Somos um povo que gosta de estar perto do mar, gosta de atividades relacionadas com o mar e sobretudo gosta de comer pescado. Não deveriamos ter fortes politicas sobre manter este recurso ?
ResponderEliminarO dinheiro que os pescadores contribuem em licenças e afins dava perfeitamente para montar uma rede que até poderia ser em parceria com as diversas universidades pelo nosso Portugal fora e por exemplo montar unidades de aquacultura ou reprodução assistida e algumas vezes ao ano fazerem libertação de exemplares pelo nosso território. Não será rápido e muito menos fácil de ver os resultados, mas por isso é que é necessário TRABALHO e nas nossas universidades temos pessoas muito boas capazes de ajudar num projeto destes.
Na América isto já acontece há vários anos com a pesca do Salmão, onde inclusive já é tradição os pescadores ajudarem estas unidades de reprodução assistida. A diferença na população foi brutal! Tanto que agora eles têm um sistema de diferenciar (cortam uma barbatana adiposa) os salmoes de "viveiro" dos salmões selvagens, onde o salmão selvagem é de libertação obrigatória e o salmão de viveiro pode ser levado para casa com uma certa quota por dia.
Soluções há muitas, é preciso é o ministério do mar ter interesse em investir neste recurso.
Bom dia André. É muito importante que se levantem vozes contra o estado de coisas, contra este marasmo de nada fazer.
EliminarE só por isso, é de enorme importância a sua contribuição, a de apontar uma direcção.
Eu concordo consigo, e acho que em meia dúzia de frases tocou em inúmeros pontos extremamente importantes. Não deveria ser necessário mais para pôr muita gente a pensar e a executar.
Fazer a gestão dos recursos marinhos, em todas as suas variantes, é algo que deveria ser um desígnio nacional. Todos os meios deveriam ser utilizados no sentido de garantir
o resultado final que refere.
Porque no fim, todos ganham por haver ..."algo mais que nada", como diria o meu amigo Robert Roussel.
Um grande abraço e obrigado pela sua participação no blog.
Vitor