A INFLUÊNCIA DA ÁGUA DA CHUVA NO COMPORTAMENTO DO ROBALO

Temos vindo a explorar em números anteriores alguns dados relativos ao comportamento do robalo.
É um tema infinito, porque também infinito é o mistério que envolve um dos mais emblemáticos peixes da nossa costa, porventura o mais procurado.
Parece-me importante continuar esse tipo de reflexão, até porque há ainda muito a dizer sobre este incrível peixe, ou não fosse este o momento mais fácil do ano para conseguirmos pescar os maiores exemplares.
O tempo de irmos pelos grandes robalos, esses poderosos e imprevisíveis peixes que povoam os nossos sonhos de pescadores, é…agora!
O assunto de hoje é complexo e versa a influência que a água da chuva pode ter no comportamento do robalo, o quanto ela o obriga a uma mudança de profundidades, de estratégias de caça, inclusive de permanência em zonas distantes da costa. Há ou não há diferença entre pescar antes ou depois de uma grande chuvada?
Podemos ou não contar com os robalos se houver uma descarga de uma barragem?




A água da chuva não é propriamente algo que mate os nossos peixes, habituados que estão a conviver com ela. Mas isso não quer dizer que seja recebida com demasiado entusiasmo.
Para a maioria dos peixes de mar, e é sempre desses que falamos, a água doce nem é um “presente caído dos céus”.
Pelo contrário, as chuvas caídas directamente sobre o mar, e mais que isso, as grandes entradas de água doce vindas dos aluviões dos rios, das descargas das barragens, são contratempos que alteram a salinidade do meio ambiente em que os peixes vivem.
Ponto prévio: a água da chuva pode efectivamente mudar o grau de salinidade do habitat do nosso robalo. Pode mesmo. Basta que seja muita e que a água do mar seja pouca.
Onde é que encontramos condições para que isso possa acontecer? Pois sim, nos baixios, em estuários, em rias, por sinal o local preferido pelo Dicentrarchus labrax, o nosso robalo.
Em profundidades baixas, uma quantidade de chuva significativa pode de facto mudar bastante as condições de salinidade da água, e com isso expulsar peixes que não toleram a falta de sais na água.
Para que a água doce seja de facto um incómodo, isso só pode acontecer em locais muito próximos da costa, pois ao largo o problema nem se coloca, a desproporção de volumes não o permite.
Acontece que nós procuramos os robalos junto a terra, não em alto mar, logo, a chuva e todo o fenómeno de mistura de diferentes salinidades …interessa-nos.


O que somos capazes de fazer por um robalo?


A grande questão é esta: devemos considerar o robalo um peixe marinho?
Parece uma questão absurda?! A resposta parece óbvia mas não o é tanto assim.
Se é verdade que o pescamos no mar, e aí é um peixe…marinho, também o pescamos a montante, a muitos quilómetros da foz dos rios, em troços de água absolutamente doce. E aí mandaria o bom senso chamar-lhe peixe de água…doce.
Mais uma vez a sabedoria dos nossos velhos marinheiros nos serve para não sermos demasiado radicais: o “nem muito ao mar nem muito à terra” deve aqui levar-se à letra.
O robalo é um peixe eurialino, e isso quer dizer exactamente que pode indistintamente viver em água salgada, junto com os sargos e as douradas, e ao mesmo tempo pode fazer uma “escapadinha” a um curso de água doce e estar misturado com as carpas e os achigãs.
De que forma essa sua tolerância a diferentes níveis de salinidade o ajudam a suportar a influência das chuvas, é algo que vamos ver em detalhe hoje.


Foto feita na zona da Comenda, junto às pedras “Três Irmãs”, em pleno estuário do Sado. Aqui, a água sofre as influências do efeito de marés e é uma mistura de água do rio e água do mar.


Não vos quero dificultar a vida, mas chamo a atenção para o seguinte: falamos de águas diferentes, salgada e doce, certo?
Essas duas águas podem misturar-se, mas não o fazem de imediato, necessitam de tempo, e de “motores” muito potentes, leia-se o vento, as ondas, as vagas, e a força das correntes.
A entrada e saída de águas num estuário movimenta muitos milhões de litros de água, e por isso mesmo as marés são um factor preponderante a ter em conta.
Para além disso, temos que a água salgada tem uma densidade bastante superior à água doce. O que quer dizer que afunda na presença de água da chuva.
Isso quer dizer que podemos estar a pescar num dia de chuva intensa e ainda assim estaremos a tentar robalos que estão imersos em água salgada pura, desde que a dois ou três metros de fundo.
Serão os elementos atmosféricos e as marés a proceder à mistura, e esses levam o seu tempo.
Todavia, os robalos suportam perfeitamente estas variações, pois estão fisiologicamente preparados para elas. A excreção de sal é algo que fazem com facilidade, e por isso podem viver em ambos os ambientes.
Se chover, e seja onde for, não se inibam de ir pescar robalos em cursos de água doce pois eles estão lá.


Estes pequeninos são para devolver ao mar.


Há ainda um outro detalhe, a questão da temperatura das águas...
A água do mar tem uma temperatura muito estável. A massa de água é de tal forma significativa que mudar um grau centígrado à sua temperatura é trabalho para muito tempo.
Em contrapartida, a temperatura da água da chuva depende apenas do estado do tempo: mais ou menos sol, e maior ou menor proximidade do planeta ao sol ou seja, depende da estação do ano.
Pode chover de Inverno, mas também chove bastante na Primavera, ou no Outono. A chover de Verão, a existirem condições de formação de chuva, ou seja, uma combinação entre calor e humidade, isso quase sempre significa a queda de água a temperaturas mais elevadas. É raro mas pode acontecer, as chuvas de Verão são normalmente associadas a trovoadas, a quedas de água rápidas e violentas.
Dificilmente poderemos assistir a chuva fraca e prolongada no tempo em Agosto, pois esse é um tipo de chuva que implica condições de Inverno, muita nebulosidade, humidade persistente, a durar um ou vários dias.
Assim sendo, de que forma as enxurradas de água repentinas afectam o nosso robalo?


Em mar aberto, a questão salinidade não é tão problemática, embora seja possível detectar diferenças.


Se eles estiverem situados em bacias de escoamento de águas doces, sim, sem dúvida, mas é sol de pouca dura, eles conseguem resistir ao impacto inicial, e seguem fazendo a sua vida.
Rios e ribeiros que correm para o mar têm boas probabilidades de ter sempre robalos no seu interior.
Eles entram pois é precisamente aí que encontram mais facilmente alimentação. E porque estão praticamente sós, a concorrência pela comedia existente quase não se coloca.
Por isso eles fazem uso da sua incrível capacidade de adaptação ao meio, do facto de tolerarem bem a água doce, para tirarem vantagens sobre os outros peixes predadores.
É um facto de que as condições meteorológicas têm um impacto enorme sobre o comportamento dos nossos robalos. Vejam o seu comportamento quando acontece uma trovoada. Nas horas anteriores, e por efeito de uma mudança da pressão atmosférica, temos robalos a comer como loucos!
A maré, e sobretudo o seu coeficiente, (a diferença entre a cota mais alta e a cota mais baixa) jogam um papel importante, pois quanto maior mais água irá correr, mais e mais depressa a mistura de água doce com água salgada irá acontecer.
Sabemos que o aumento brusco da pressão atmosférica afecta o sistema cardiovascular humano. A nossa pressão arterial sobe durante o inverno e baixa no verão, devido a uma contração dos vasos sanguíneos e isto devido ao facto de, em tempos mais frios, ser necessária mais pressão para fazer circular o sangue através das veias. Porque elas estreitam.
Até que ponto isso poderá acontecer com os robalos, ou seja, se podem ou não sentir estas variações de pressão e reagem fisicamente a elas, é algo que não tenho dados para confirmar.
Não podemos esquecer que eles já vivem num meio de si muito sujeito a pressões báricas...
Mas posso garantir que o comportamento dos robalos muda radicalmente quando acontecem condições que antecipam trovadas, isso é um facto.

No próximo número vamos continuar a vasculhar nos pequenos segredos deste entusiasmante peixe.
Até lá!



Vítor Ganchinho



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