E OS PEIXES-ARANHA, ...SENHOR?

Ninguém gosta deles.
O peixe aranha quase consegue recolher a unanimidade da crítica negativa! Falo-vos de pescadores lúdicos, profissionais, e sobretudo de todos os que se abeiram da praia descalços.
De facto a imagem pública do bicho não é a melhor e não me parece ser possível mudar isso num só artigo. Nem vou hoje e aqui tentar fazê-lo.
De uma ou outra forma todos temos razões pessoais para detestar o dito. Ou amigos próximos que têm muitas razões de queixa.
O aranha é um peixe que ganhou má reputação na praça e nós sabemos e ele sabe que nós sabemos o porquê….
É mau que nem cobras, e nisso todos estamos de acordo.
Mas posso dar-vos uma ideia de como disfrutar da sua pesca com jigs, e da sua utilidade na cozinha.

Ponto prévio: trata-se de um peixe de carnes finas, muito branco, e que, desde que com tamanho e bem cozinhado, pode brilhar. Na verdade é... delicioso!

Pesco-os com jigs em tungsténio (aqui 60 gr…), conseguindo o melhor de dois mundos: um peso a descer bem rápido ao mesmo tempo que lhes apresento uma silhueta pequena, ao nível daquilo que seria uma presa óptima para eles.

Vou fazer-vos uma apresentação sucinta do personagem deste nosso dia de blog, e irei dar-vos uma ideia daquilo que pode fazer-se com ele.
O seu nome latino é Trachinus vipera, e nada mais apropriado para quem é tão traquinas e tem um comportamento tão viperino.
Este é um dado a reter quando nos decidimos ir pescá-lo. Cuidado! Não vale a pena arriscar sermos picados se não temos condições de espaço e equipamento para o manusear.
Devemos preparar as coisas de forma a não sermos surpreendidos por quem faz da brusquidão e surpresa um modo de vida.
Antes de avançarmos com dados relativos à sua pesca, deixem-me dar-vos alguns conselhos em caso de acontecerem problemas:
Por defeito, o peixe-aranha salta e contorce-se como nenhum outro. A razão é simples: depois de a camuflagem ter falhado e estar já preso no anzol, está a tentar utilizar a única arma que lhe pode valer na circunstância.
Os espinhos injectores de veneno, quer os laterais inseridos nos opérculos quer os primeiros raios da sua longa dorsal, estão rígidos, retesados, esperando o menor contacto para poderem actuar.
Caso o consigam, o peixe tem boas possibilidades de conseguir escapar, porque ninguém vai insistir em segurá-lo na mão.

Aqui eu trouxe três peixes para o jantar de duas pessoas. Sobra peixe...

Em caso de picada, deixem-se de “crendices” e mezinhas populares. Se há quem propônha urinar na mão, ou bater com uma tábua na zona afectada, ou queimar com um cigarro, aquilo que me parece mais útil é mesmo submergir a zona afetcada em água quente, a um nível suportável. Caso não tenhamos essa possibilidade, aí vão alternativas que podem, de forma eficaz, desnaturar e neutralizar o veneno injectado:

1- Caso tenhamos o motor desligado há algum tempo, colocar o barco em marcha rápida, a trabalhar em alta rotação durante alguns minutos. A ideia é aquecer bem o motor de forma a podermos, depois de retirar a capota de cobertura, aplicar a mão ou o pé, a zona afectada, sobre essa superfície quente. Bastam dois a três minutos e o problema está resolvido.

2- No caso de termos o motor ligado há algum tempo, é ainda mais simples, basta recolher alguma água do esguicho de refrigeração visível à direita do motor. Um balde, uma caixa, um saco plástico, tudo serve para captar água quente.
A seguir, aplicar o membro afectado dentro dessa água, ou em contacto. Ao fim de alguns minutos, ...continuar a pescar.

3- Se a captura for feita no Verão, ainda mais simples: basta encostar a mão, o pé, a zona afectada, a uma superfície metálica exposta ao sol. Um roll-bar, um varão da consola, a âncora, etc, tudo o que estiver quente serve.

Basta meia hora de pesca e temos uma caixa cheia. Podemos restituir à água os mais pequenos, desferrando-os com cuidado para não molestar o peixe.

Agora sim, que já nos sabemos desenvencilhar das agruras de termos sido picados, vamos então ver onde e como pescar o aranha.
Procurar fundos de 40 a 60 metros, em areia, numa zona com pouca movimentação de águas. Eles podem surgir em fundos baixos, ou até próximos dos 100 metros de fundo, mas nós queremos duas coisas ao mesmo tempo: regularidade de picadas, (e podem acontecer a cada lance, garanto-vos...) e ao mesmo tempo bichos com um tamanho XXL.
Deixar bater o jig no fundo, e fazer uma recuperação lenta mas vibrante. Eles são muito bem capazes de morder em ataques rápidos, não se preocupem demasiado com o estilo.
Tenho um spot que é garantido: são sempre muitos e podem chegar bem perto de 1 kg de peso. A média naqueles fundos será na casa dos 300 a 400 gramas, mas de quando em vez pode aparecer um de 800/ 900 gramas.

Podem ser “cachuchos” deste tamanho. Como referência, o maior que consegui em Sines rasava o quilo de peso.

Utilizo jigs de tungsténio, por razões que se prendem com a rapidez de descida versus o tamanho da boca do peixe-aranha. Mas não se iludam, este vigoroso e destemido atleta lança-se a jigs do seu tamanho.
Não há critério definido quanto a relação entre peso e profundidade. Podemos ferrar peixes grandes a 40 metros e pequenos a 70 metros.
Um jig armado de triplo garante-nos mais capturas, pese embora sejam peixes muito agressivos e fortes, eles nem sempre batem no jig nas melhores condições. Por vezes a picada acontece duas dezenas de metros acima do fundo, quando o peixe já está no limite das suas capacidades físicas. Não esqueçam os problemas de descompressão decorrentes de uma perseguição deste tipo. Por isso, jigs com triplos podem ajudar. Quanto a cores é quase indiferente, sendo que aquilo que tenho vindo a apurar é que ficam particularmente excitados com brilhos e fitas. A aplicação de uma lulazinha de silicone em cores claras a cobrir o anzol ajuda muito. Mas se não houver...
Há sim, e isso sempre, a necessidade de ter a bordo os utensílios certos para o desferrar: uma pinça de grande tamanho para o imobilizar, e um alicate para retirar o anzol.
Não os abandonem espalhados no barco. A seguir, e na agitação da luta com outro, vão passar perto dele e, num dos seus saltos inadvertidos, podem ser alcançados pelos espinhos venenosos.
Um balde ou uma geleira de peixe fazem falta.
O equipamento standard de jigging serve na perfeição e preparem-se para algumas surpresas. O aranha bate forte e defende-se bem.
Vão sentir que a força que fazem é a de atletas olímpicos, ainda que o seu tamanho possa não ter correspondência ao esforço. São muito mais fortes do que …grandes.

Cortar a cabeça, neste caso, é de bom tom. Sendo algo meio bárbaro, e pouco edificante, ainda assim liberta-nos de problemas já que mesmo depois do peixe morto, o veneno continua a estar activo durante algum tempo. Cabeça fora, problema fora.

As barbatanas dorsais e ventrais são macias, destituídas de espinhos e não apresentam qualquer tipo de perigo.
Depois de cortarmos a cabeça é um peixe comum, sem qualquer tipo de perigo. Da mesma forma, o veneno fica excluído, ainda que após alguns segundos de culinária esteja completamente desactivado.
Trata-se de um veneno proteico, de desintegração fácil e completa, pelo que este peixe pode inclusive ser dado a uma criança. As minhas filhas comeram muitos filetes de peixe-aranha, não sei se o seu mau feitio advém daí mas estou certo que não, …saem apenas ao progenitor.

Aqui bem visíveis os espinhos dos opérculos e os que são de facto perigosos na dorsal.

Há pessoas que fazem pífias tentativas de cozinhar peixes-aranha, mas pecam por quererem utilizar peixes pequenos, que não são mais que uma fiada de espinhas, e muitas vezes colocam-nos na grelha. O que conseguem é um elástico duro. E seco.
No Algarve este é um peixe que vai à lota, vende-se, mas no resto do país não me consta, salvo melhor informação, que assim seja.
Vale a pena experimentar mas partindo de peixes adultos, com peso e tamanho.

Sobre culinária, falem com a Helena da GO Fishing, eu sou da área das pescas... Posso garantir que este peixe é uma maravilha.


Vítor Ganchinho


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4 Comentários

  1. Pedro Evangelista27 fevereiro, 2024

    Também os apanho com jigs, mas o medo de me picar, acaba normalmente com o peixe a ser sacrificado(morto), ainda antes de lhes tirar o anzol.
    Cumprimentos

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    Respostas
    1. Olá Pedro Os bichinhos não são propriamente "mansos", mas posso garantir que não são mais difíceis de manusear que uma italiana morena de 32 anos.
      Eu utilizo uma pinça serrilhada, com bicos, para apertar pelo corpo, (junto à cabeça), bem firmes, e a seguir, com um alicate de pontas compridas, saco-lhes o anzol da boca. Estou a falar dos peixes aranha...

      Quanto à culinária, digo-lhe que vale a pena, é das coisas boas que podemos comer.
      Estou ainda a falar dos peixes aranha...


      Abraço
      Vitor

      Eliminar
  2. Olá Victor sem dúvida é um peixe que se deve ter cuidado a manusear mas deixo aqui uma ideia aliás como faço quando os apanho com uma tesoura conto-lhe as espinhas venenosas e pronto está o caso resolvido depois é fritar ou fazer de ensopado são uma delícia forte abraço e boas proas

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    Respostas
    1. Bom dia! Atenção que eles não são peixinhos apenas perigosos pelos três raios da dorsal!
      Os aranhas também injectam veneno através dos espinhos da cabeça. Reparem nos opérculos....
      Vale a pena guardar apenas os grandes, os mais pequenos são pouco interessantes e devem ser libertados.
      Na área onde pesco com mais assiduidade, em Sines, há toneladas deles.

      Tenho uma marca numa zona de areia onde a cada lance aparece um. A questão é dar com o local onde se concentram os maiores, e a seguir, com três ou quatro está o assunto resolvido.

      Mas insisto, a boa prática é uma pinça serrilhada que envolve o corpo do bicho, e a seguir, um alicate de pontas compridas para o desferrar.
      Porque são muito elásticos de corpo, na maior parte dos casos acabam por vir presos por mais de um anzol. Nesses casos, o último anzol a retirar é o da boca, primeiro tratamos dos que estão cravados no corpo.
      A ideia é termos sempre o peixe controlado nos seus movimentos, e não que o pior aconteça, ou seja, que ele "esperneie" e acabe por nos picar quando estamos a tentar desenvencilhar o anzol cravado a meio do corpo.

      A seguir, não devemos misturar com os outros peixes. Se tivermos um balde, uma caixa, é preferível. Tem a ver com o facto de podermos ter a necessidade de lavar o peixe a seguir, e aí, no meio da água suja de sangue, vamos espetar os dedos neles.
      Para além disso, se tivermos, como é o meu caso, o peixe dentro de água, eles vão manter-se vivos durante horas. E o perigo está lá.

      Merecem um tratamento especial, ....mesmo que eu os desferre muitas vezes apenas com as mãos...e por isso mesmo já fui picado umas dezenas de vezes. O que faço a seguir é aquilo que vos relatei no artigo. E dois minutos depois estou a pescar normalmente, como se não tivesse acontecido nada.


      Para as pessoas menos habituadas a estas situações, há que ter cuidado, mas a seguir a isso, é um peixe excelente na cozinha.

      Abraço
      Vitor

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