Ocorre-me que possam achar interessante ler algo sobre a caracterização de uma cana de slow-jigging quanto à sua utilização.
Comecemos pelo princípio: para que serve uma cana de SLJ?
O slow jigging é uma técnica de pesca que distingue claramente a função de trabalhar o jig e a função de lutar contra o peixe. O mestre Norihiro Sato sensei diz isso claramente:
É função da cana trabalhar os jigs, excitá-los, e fazer assim com que os peixes se sintam atraídos por eles. É função do carreto e da linha trazer o peixe para o barco.
Consigo perceber a decepção de todos aqueles que compram uma cana pela sua robustez, pela sua capacidade de permitir fazer força contra algo.
Infelizmente para todos esses, a cana é utilizada para uma função diferente, a de dar vida ao nosso jig. Apenas isso.
Aqui ao largo de Sines, com a minha Deep Liner Logical 55 #5, uma excelente cana, para trabalhar jigs. Mas que iria partir se tentasse levantar em peso esta garoupa que fiz em Angola. |
Podemos adquirir canas de várias marcas e modelos, o mercado está inundado de opções, mas todas elas acabam por confluir para uma verdade absoluta: não há nenhuma cana que sirva para tudo.
Este conceito é válido para qualquer técnica de pesca e obviamente também para o jigging.
As canas de jigging também podem ser agrupadas por especialidades, sendo mais corrente a distinção entre canas de speed jigging e slow-jigging. As características são diferentes.
Mais que isso: a cada gramagem de peso de jigs corresponde uma cana ideal. Por isso se fala em “acção de cana”, e em "potência de cana" ou seja, cada vara terá características especificas para trabalhar jigs de x gramas até y gramas.
As fábricas afinam os blanks das canas para que estes consigam fazer vibrar um jig compreendido entre dois determinados pesos. Se quisermos saber qual a gramagem de jig em que uma cana será mais indicada, basta somar esses dois valores e dividir por dois. O valor encontrado é o ponto em que a cana terá efectividade máxima. O que não quer dizer que não possa ser utilizada próximo dos limites mínimos e máximos, não deixa de ser possível pescar com ela.
Momento da ferragem: a cana baixa de imediato. O polegar fica próximo da bobine da linha, para pressionar e interromper a saída desta, se for necessário. |
Vale a pena então perguntar: “então assim sendo, quer dizer que a cana não serve para trabalhar o peixe, é isso”?...
Afirmativo. No momento em que a luta se inicia, a cana é apontada para baixo, conserva apenas uma residual inclinação para controle de entrada de linha e por isso quase…sai de cena.
A partir desse momento, o trabalho de força passa a ser feito com o carreto, com o drag mais aberto, menos aberto, ou mesmo completamente fechado, conforme as circunstâncias do local e do peixe.
Trata-se de um tipo de pesca em que bombear a cana, leia-se tentar levantar o peixe com ela e recolhendo linha de seguida, pode significar ficar sem ela. Se considerarmos que os peixes serão sempre muito mais pesados que a cana, e atendendo a que as canas têm um limite elástico que apenas suporta um determinado peso, sob um determinado ângulo, (nunca mais de 45º de inclinação), fácil é de ver que tentar levantar um peixe de 20 kgs com uma vara de 100 gramas é condená-la à morte. Parte de certeza absoluta!
Assim sendo, a seguir ao acto de ferragem apontamos a cana de jigging para baixo, inclinando mais ou menos em função do peso e força do peixe, e mantendo-a nessa posição de forma a manter apenas a tensão na linha.
A posição a cana junto ao corpo permite-nos relaxar, e respirar. Explico-vos este detalhe:
O talão que vai do porta-carretos ao cabo da cana deve ter um determinado comprimento para ser confortável. Há um comprimento certo, ideal, para cada pessoa, sendo que se presume que não irão pescar pessoas com 1 metro de altura, nem de 3 metros de altura. Os fabricantes procuram ajustar as medidas de acordo com a necessidade geral de uma pessoa média, (seja o que for que isso queira dizer quando se comparam europeus com japoneses, por exemplo). Não será igual que se tenha uma altura corporal de 1,60 mts ou 1.90 mts. Demasiado curto é ruim, demasiado comprido ainda pior, porque vai bater nas roupas, no corpo, e torna-se desconfortável.
Se esse comprimento for curto, o trabalho passa a ser feito pelo pulso, e vamos cansar-nos muito rapidamente, esgotamos os músculos do braço e antebraço, por excesso de pressão da mão sobre o porta-carretos.
Quando temos um comprimento suficiente, digamos que o indicado para o nosso corpo e comprimento de braços, temos mais capacidade de “alavancagem”. Em combate, travamos a posição da cana sob o braço, mais concretamente entre o braço e a axila, e tudo funciona bem.
Há uma inegável economia de esforço e acreditem que, num ambiente de calor, enorme humidade, cansaço acumulado, e grande poder de força bruta por parte dos peixes que combatemos, todos os detalhes contam.
Aquilo que nos pode obrigar a mudar a posição da cana será a luta que o peixe irá dar-nos, e, um factor pouco notado, o balanceamento do barco, em função das ondas, com a consequente subida e descida da embarcação.
Iremos pois ajustar o ângulo que a cana irá fazer relativamente à água em função daquilo que sentimos estar a acontecer na outra extremidade da linha. É o peixe e os seus arranques que determinam se podemos ou não enrolar linha.
Num momento em que o peixe carrega para o fundo, (com o drag completamente bloqueado ainda assim eles conseguem retirar-nos linha do carreto!!), não nos deve ocorrer enrolar linha ao mesmo tempo.
Nessa altura, temos contra nós o peso e força do peixe, e dificilmente o poderemos convencer a subir. O peixe entende que a sua salvação reside no fundo, e faz tudo o que pode para lá chegar. Cuidado! O momento é dele, não é nosso.
Se o fizermos, ou tentarmos fazer, aquilo que poderá acontecer será a rotura da linha, dos nós, das argolas, a abertura dos anzóis, etc, etc. Ou pode acontecer uma desferragem pelo facto de os tecidos à volta do anzol não suportarem a tensão criada.
O peixe rasga e liberta-se.
Não se trata de ver quem tem mais força, trata-se de “negociar” o momento seguinte, enrolando linha assim que isso seja possível.
Norihiro Satoh sensei diz o seguinte: “Não enfureçam os peixes”...
Segundo ele, deve lutar-se com calma e suavidade. Se lutarmos com demasiado entusiasmo, com brusquidão, mudando a cada instante a tensão da linha, o peixe reage, dando-nos mais trabalho.
Mas aplicando um esforço uniforme, constante, recolhendo linha a um dado compasso, os peixes sobem sem se debater tanto.
Quando trabalhamos peixes com muito peso, o acto de bombearmos a cana, utilizando o seu poder de elevação máximo, não nos garante trabalho efectivo. Podemos elevar a cana sem mover o peixe do mesmo sítio.
Digamos que um “pau de vassoura”, uma cana rígida, levanta o peixe tanto aquilo que a levantarmos a ela. Assim tenhamos força nos braços.
Podem perguntar: “Vitor, mas nesse caso, porque não se utilizam apenas canas rígidas?”…
Porque não. Há várias razões para isso.
A primeira delas tem a ver com o facto de ser impossível trabalhar um jig com uma “cana” que seja totalmente rígida. Não esqueçam que as coisas não começam com o peixe ferrado!
Antes de mais há que trabalhar o jig, fazê-lo vibrar e torná-lo atractivo aos olhos do dito peixe.
A seguir, há que considerar que uma cana rígida não absorve qualquer parte dos impactos da luta do peixe. Nesse caso seriam a linha e o carreto a fazê-lo em exclusivo. A curvatura da cana, por ínfima que seja, é um elástico amortecedor, algo que cede sob pressão e com isso suaviza os choques que o peixe não deixa de imprimir ao nosso set-up, o nosso conjunto de pesca.
Mas o oposto também não nos deixa respirar muito. Uma cana demasiado flexível torna infrutíferos os nossos esforços de a usar para levantar o peixe. Faz parte.
Se é verdade que as canas SLJ são normalmente flexíveis, de forma a conseguirmos imprimir movimento ascendente e lateral à peça de chumbo, também por outro lado quando chega a hora da verdade não passam de uma vareta amorfa, sem capacidade para bombear aquilo que está preso na outra ponta da linha. Mais que isso: se o fizermos, os nossos esforços de nada valem. Muita gente que faz outros tipos de pesca acha as canas SLJ inúteis, porque acham-nas moles, sem acção.
Dizem eles algo como: “estas canas não têm …osso”!!...
Daiwa Saltiga, as canas inquebráveis!... |
A verdade é que funcionam. Vejam aqui dois filmes com a utilização de uma delas:
Clique nas imagens para visualizar e na rodinha das definições para melhorar a qualidade.
Continuamos no próximo número a desenvolver este tema.
Não deixem de acompanhar porque vai valer a pena.
Vítor Ganchinho
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Mais uma excelente partilha, mesmo não sendo canas com atributos para erguer peixes é surpreendente as curvaturas a que muitas vezes são sujeitas.
ResponderEliminarAssim como a resistência de certas linhas e quando se vê a malta a fugir de linhas finas porque não servem para peixes grandes😀.
Emanuel Fernandes
Vamos hoje ter a conclusão deste assunto.
EliminarEm relação às canas, deixe-me dizer o seguinte: A Daiwa Japão desafiou-me a tentar partir estas canas Saltiga de que eu falo nesta expedição a Angola.
Acredite que eu não sou propriamente fraquinho de braços e fiz o meu máximo de força. Não partiram!!
O conceito de cana " sem osso" aplica-se a canas ocas, que têm características óptimas para trabalhar os jigs, mas são muito frágeis. Não é o caso das canas de carbono sólido, que aguentam tudo, mas mesmo tudo, não partem mesmo. Não são tão reactivas quanto as outras mas são o melhor que se pode ter num ambiente inóspito coo é Angola, onde não temos lojas para adquirir outras em caso de acidente.
Para Angola, ou outro local parecido, quero ter canas em carbono sólido. Com osso.
Vamos ver se gosta do artigo de hoje.
Eu solicito o comentário do Luis porque esta é a praia dele.
E sobre linhas, se quer saber a minha opinião, eu acho que se pesca duas a três vezes mais grosso que o necessário nas nossas águas.
Podem pôr os olhos no Luis, que faz com PE 2,5 ou PE 3 peixes de 50 kgs.
Por cá, pescamos com essas linhas a peixes de 1 kg...
Abraço
Vitor
Saudades disso... Abraço, Vitor.
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