Gostava de vos explicar hoje algumas das razões que me podem levar a pescar com jigs equipados de um atrelado em vinil.
Não o faço sempre, nem a todas as horas do dia e nem todas as condições de mar.
De resto, acho mesmo que pode ser mais prejudicial utilizar estas borrachas que benéfico, se não as soubermos utilizar.
Vou explicar-vos as razões daquilo que aqui afirmo, e tentar que entendam os motivos pelos quais recorro a este expediente para conseguir mais alguns peixes de excepção.
Um jig Little Jack que muito peixe me tem dado. Há um outro modelo com o ventre luminescente que utilizo frequentemente às primeiras horas do dia, ou em dias de céu muito carregado de nuvens. |
Não resulta muito claro que se adicione algo que, à primeira vista, apenas irá atrasar, retardar, roubar a fluidez de trabalho ao nosso jig. Mas há boas razões para insistir.
Como em tudo na vida há que negociar os pequenos detalhes para que o resultado final do trabalho seja aceitável. E neste caso, há mesmo boas razões para que isso seja feito.
Começo por vos dizer que a minha primeira preocupação ao chegar ao local de pesca é observar a quantidade de sedimentos que está em suspensão. A quantidade de fitoplâncton que podemos ver à superfície poderá não ser exactamente a mesma que se encontra no fundo, mas podemos ficar com uma ideia de qual a visibilidade possível lá em baixo.
Nunca esqueçam que as várias camadas de água que nos separam do fundo podem esconder muitos mistérios. Pode ocorrer que a água esteja muito limpa, transparente, à superfície, e em baixo esteja aquilo que as pessoas que mergulham, o meu caso, designamos de “ caldo verde”.
Também pode acontecer o oposto. Quantas vezes pensamos ter o dia de pesca perdido, e afinal junto ao fundo há uma faixa de água limpa que deixa ver na perfeição o nosso jig.
A reflexão deve ser feita tendo em conta o histórico dos dias anteriores, a época do ano, as temperaturas ambiente e da água, a queda de chuvadas anteriores, a distância ao rio mais próximo, a possibilidade de ter havido descargas de barragens, etc, etc.
E para que serve essa análise, perguntam?
Serve-nos para definir a cor do jig a utilizar, o seu peso, e o tipo de acção de pesca que podemos ter.
Vamos por partes:
1- A quantidade de luz que desce ao fundo irá influenciar decisivamente a visibilidade do nosso jig. Se queremos que seja visto, e queremos mesmo, é bom pensar que deve fazer tanto mais contraste quanto a visibilidade no fundo for mais e mais reduzida.
2- Em águas muito turvas não é impossível pescar. Nunca esqueçam que eles, os peixes, não têm apenas os olhos para ver. Por estranho que vos pareça, eles conseguem “ver” em situações de absoluta penumbra, e mesmo em águas sem qualquer pisco de visibilidade, por exemplo águas barrentas. A sua linha lateral permite-lhes saber tudo sobre o que está à sua frente.
3- Numa situação de águas lusas, azuis, isentas de sedimentos, não é difícil que um peixe se aperceba da presença de um jig/ amostra, e que possa estabelecer contacto visual com ele a alguma distância. E se o vê, pode planear o seu ataque com muita precisão, muita certeza.
4- Porém, essas são condições óptimas e nem sempre se conseguem. Assim, mais vale estarmos prevenidos para situações menos favoráveis. O que é normal na nossa costa é que existam uns dois a três metros de boa visibilidade no fundo.
Para quem pesca junto a estuários de rios, isso pode ser um pouco mais reduzido, para quem pesca longe é corrente que tenha mais. Ainda assim, temos a levar em linha de conta o facto de podermos começar a pescar antes de o sol estar alto, o que quer dizer pesca feita ao raiar do dia, ou ao fim do dia. E essas são sempre condições de visibilidade reduzida, indiscutivelmente.
5- Quando estamos na presença de águas mais tapadas, ao lançarmos o nosso jig ao fundo e fazermos a recolha a uma velocidade dita “normal”, de acordo com o figurino que aparece nos filmes, estamos a exigir ao peixe que seja capaz de fazer muita coisa ao mesmo tempo.
E concretamente o quê? Que seja suficientemente rápido a perceber o jig, onde está, o seu tamanho, a sua vibração, a direcção do seu deslocamento, a sua velocidade, a sua cor, a sua “atitude” enquanto possível presa ou quiçá ameaça, o seu interesse enquanto alimento, etc, etc.
Se as águas estão sujas, o tempo que esse predador tem para definir todos estes parâmetros, e mais alguns não referidos, é pouco.
6- A passagem de uma potencial presa pode ocorrer perto ou nem por isso. Se as águas estão limpas, a corrida a esse potencial alimento pode ocorrer a distâncias significativas, leia-se mais de 20 metros. Mas em caso contrário, se as águas estão tapadas, a acção de captura tem de ser despoletada numa breve fracção de segundo. Ou sim ou não, sob pena de a presa”, leia-se o nosso jig, desaparecer de vista e fora do raio de acção desse predador.
7- Nestes casos, conseguir o “click” que faz passar o predador de uma atitude de repouso, expectante, a uma situação real de caça, pode ser algo complexo. Porque tudo é vertiginoso, tudo tem de ser feito num espaço de tempo muito curto. Tudo ou nada!
8- Assim sendo, o facto de darmos ao predador um ponto de referência visual acrescido, (a utilização de uma lula de vinil com uma cor que se destaque no fundo), pode ajudar a que esse peixe consiga referenciar aquilo que queremos que ele persiga e…MORDA!
9- No fundo, aquilo que estamos a fazer é nem mais nem menos que a prolongar o espaço, a distância, de acuidade visual que o nosso jig pode ter. No escuro, a luminescência da nossa lula brilha e dá um ponto de referência. Digamos que acrescenta, soma, ao que teríamos sem essa borrachinha no anzol.
Então é de utilizar sempre este estratagema? Nem pensar!
Nunca esqueçam isto: tudo aquilo que que adicionamos ao nosso jig irá prejudicar o seu funcionamento normal.
Os fabricantes matam a cabeça a estudar o comportamento dos jigs, definem o seu balanço, a sua construção, os seus ângulos de suporte de água são objecto de inúmeros e morosos ensaios.
São calculadas as vibrações emitidas, o deslizamento lateral nos diversos patamares de água, a velocidade de queda ao fundo, o efeito das cordas e anzóis, etc, e a seguir nós estragamos tudo adicionando uma lula de vinil que não estava no programa. E então?!
Bom, se não sabemos não devemos tocar na parametrização de fábrica. Mas se queremos entender o fenómeno, nada nos impede de tentar ser “fabricantes” de vez em quando.
Eu utilizo uma estratégia que vos posso contar: se sinto que posso necessitar de um atrelado, por ter condições de água menos boas, e olhando à corrente, às linhas de água que possam existir, ao vento, à profundidade, aquilo que determino é o seguinte:
Poderia pescar aqui com 30 gramas, mas tenho o fundo muito escuro e quero que os pargos vejam o meu jig. Então passo para o peso acima, 40 gramas, e compenso o retardo que a lula de vinil iria fazer ao jig, com mais estes 10 gramas.
E resulta. E podemos fazer isso sempre que sentirmos que nos falta algo, por deficiência das condições que temos de enfrentar nesse dia.
Mas não acaba aqui...
Vejam a pequena lula luminescente junto à boca do pargo. |
Se há situações que levam o predador à loucura são precisamente aquelas em que ele pode tirar partido das desatenções das suas potenciais vítimas.
Explico: um pargo que está parado no fundo, em acção de caça, espera a melhor oportunidade para desferir um ataque fulminante. Eles fazem-no todos os dias e sabem quais são aqueles que resultam melhor e os que podem ser apenas mais uma infrutífera tentativa de conseguir alimento.
Se deparam com um pequeno peixe a perseguir uma pequena lula, leia-se “entretido e descuidado” com algo que lhe interessa, ….essa é uma situação limite de oportunidade!
Para o predador, ter uma oportunidade dessas pode ser a possibilidade do dia de conseguir comida. O pequeno peixe, na sua óptica, está tão concentrado naquilo que está a fazer, caçar a pequena lula, que não pode ao mesmo tempo prestar atenção a quem se aproxima por trás. E ataca!
O mundo submarino é cruel, e as coisas …acontecem. Um ataque, sucesso na corrida, dentada firme e segura, e…peixinho capturado. Só que é o nosso jig…
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E se pensam que isto se passa apenas a nível dos nossos grandes predadores, estão enganados.
É todo um mundo de oportunidades que não se podem perder, e sempre que um individuo se empenha na perseguição a algo, está a dar o flanco, a prestar menos atenção à sua retaguarda.
Todos os seres marinhos aproveitam as oportunidades, nem que sejam as agressivas…lulas. Lula come lula e se puderem tramar o peixinho que persegue a lula, …aproveitam os dois.
Espero que tenham gostado deste trabalho.
Vítor Ganchinho
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sempre temas de grande interesse, é das poucas opiniões que leio na íntegra, e pelo qual me interesso seriamente, primeiramente por falar daquilo que já experenciou, depois por falar de predadores que me encantam enquanto presas na pesca, e depois porque todo o conteudo tem sempre uma componente tecnica e cientifica muito interessante e bem explicada, muitos parabens, continue a partilhar toda essa sua sabedoria.
ResponderEliminarBom dia Pedro Freitas Muito obrigado pelo seu comentário.
EliminarA ideia é passar informação a quem tem menos tempo de a obter nas suas saídas de mar.
Vamos ter mais algumas coisas sobre robalos, mas, porque estamos a chegar a um tempo em que as lulas vão aparecer em força, também vamos passar por elas.
O mar é grande e aquilo que se vê é apenas parte do que realmente acontece.
Mas vamos tentar desvendar mais alguns segredos.
Boas pescas para si!
Vitor
Muito obrigado por mais esta excelente explicação e um gosto ler estas explicaçãos muito obrigado e bom dia
ResponderEliminarNós é que agradecemos o favor de nos contactar. Fique desse lado e continue a pescar, qualquer que seja a sua especialidade.
EliminarVamos passar para os robalos, já a seguir.
Abraço
Vitor