OS NOSSOS AMIGOS... PARGOS DAS CANÁRIAS - CAP I

Gostamos deles.
De Dezembro a Maio acabamos por nos encontrar por essas águas de Cristo e por isso, mesmo sem querer, eles acabam por fazer parte da nossa vida de pescadores.
Penso que eles passariam bem melhor sem nós, sem a nossa companhia, mas não é isso que está em causa neste momento.
Não será um caso de “não nos podem nem ver…”, todavia os benefícios desta “amizade”, para o lado dos pargos, não será de todo muito evidente.
Já pelo nosso lado, sempre que conseguimos enganar algum e esse companheiro faz a viagem de regresso a terra connosco, é uma alegria na cozinha. São do bom que o nosso mar nos pode dar.

(*) Tem uma força descomunal! Pode fazer de tudo, desde partir linhas, canas, carretos e até dobrar anzóis. O outro é um pargo. 

Conhecidos por Dentex canariensis, ou Pagrus canariensis, ou “Dentão-das-Canárias”, ou “velha” no nosso Algarve, ou “pargo de pluma”, ou “garapello” pelos espanhóis, este lindíssimo pargo preenche os requisitos de muitos pescadores nacionais: são fortes, agressivos, podem avizinhar os 6 kgs e isso basta para os considerarmos um oponente válido e interessante.
Batem nos jigs com a força que podem, e se muitas vezes acabam por se soltar e ir à sua vida, já as marcas dos seus dentes ficam para sempre nas nossas peças de chumbo. Tenho diversos jigs com buracos profundos provocados pelos seus caninos afiados e potentes.
O peixe que veem na foto acima foi pescado em maio pelo meu amigo António Gaspar, na estreia do seu set-up novo, cana, carreto, linhas e jig. Nada mais entusiasmante que poder ficar com uma boa recordação do dia em que o conjunto de pesca é utilizado pela primeira vez. Mesmo se o dia estava muito pouco promissor e as condições não apontavam a grandes resultados.
Por vezes é preciso ter um pouco de sorte, e desta vez ela esteve presente não obstante estar aparentemente tudo contra nós: depois de uma saída tardia do Clube Naval Setubalense, (para quando um eficaz e fluído sistema de colocação das embarcações na água?), e atendendo à hora da maré e aos atrasos naturais provocados por uma arreliadora ondulação de sudoeste que nos atrasou imenso, chegámos ao local de pesca já com algumas horas de vazante.
Detesto essas condições para início de pesca porque isso quer dizer que vamos ter o peixe de mais a menos, sempre a diminuir a quantidade e qualidade dos seus ataques.
Mas faz-se “das tripas coração”, trabalha-se e vai-se em frente, mesmo sem grande fé, porque a pesca tem ... horas felizes.

Temo-los por cá enquanto as águas se mantêm frias, porque logo que aquecem demasiado eles saem. São “encalorados”. Aqui, um jig da Little Jack, em versão 40 gramas, com uma montagem clássica para jigs curtos: assiste duplo à cabeça e triplo à cauda.

Posso dizer-vos qual a sequência de procedimentos que adopto quando vou por estes pargos. Não é uma “cartilha” rígida, é sim um conjunto de procedimentos que visa maximizar os resultados e resulta de muitos anos a pescar esta espécie.
Confesso que prefiro começar a pescar estes peixes ao raiar do dia, logo que a visibilidade diurna assim o permite. Quando tenho a sorte de conseguir chegar cêdo, a primeira medida é analisar a ondulação, a qualidade da água, (a sua maior ou menor visibilidade), sinto o vento e, com o barco parado, tento perceber qual a corrente naquele instante e a deriva que a embarcação faz relativamente ao fundo.
A seguir, reparo se há comedia, a meia água ou junto ao fundo, e se está em bola compacta ou pelo contrário, se os pequenos peixes me aparecem na sonda algo espalhados, soltos entre si.
Interessa-me também saber se existe caranguejo pilado, (são loucos por isso…), e por fim confirmo se tenho céu nublado ou limpo. Saber a temperatura da água também me é importante.
Faço um registo de memória da posição dominante do vento nos dias anteriores. Pode parecer-vos insignificante mas todavia é isso que irá determinar a presença de comida e a visibilidade das águas. Quem vive numa zona sujeita à influência de dois rios, Tejo e Sado, sabe a que me refiro.
Todos estes dados me irão ajudar a preparar a pesca que vai seguir-se.

Um peixe nobre, lutador, um adversário que devemos saber respeitar.

No próximo número irei apresentar-vos com algum detalhe, e baseado nestes enunciados, algumas das acções de pesca a que costumo atender antes de começar a pescar.
Isso será comum a todos nós, haverá certamente por parte de todos aqueles que pescam um momento de reflexão, um momento em que decidimos por uma ou outra estratégia.
É verdade que muito desse trabalho é feito em casa, muito antes de chegarmos ao local, mas sem dúvida forçosamente teremos de ser capazes de repensar a melhor forma de actuar se as premissas se alteraram em relação ao previsto. Ser flexível é importante porque as condições de mar mudam da noite para o dia.
Vou falar-vos sobre isso, vou separar cada um dos detalhes e dissertar sobre cada um deles. No fundo, vão ser meus companheiros de pesca ao pargo, observar os meus métodos de pesca a estes peixes, aquilo em que eu penso antes de lançar um jig, antes mesmo de o escolher em função das condicionantes que tenho à minha frente.
Vou fazê-lo com o entusiasmo que todos nós temos quando chegamos ao spot cheios de vontade de pescar, mas ao mesmo tempo com a racionalidade que deve imperar a quem tem de tomar decisões. Decidir à pressa, “para safar”, pode ser decidir mal.
E se isso acontecer, se cometermos erros, tal irá comprometer em definitivo os resultados desse dia. Quantas vezes temos apenas duas a três horas de actividade séria antes de o peixe resolver fechar a boca?
Mais que isso, uma má decisão pode deixar marcas profundas na nossa crença em tudo, nos jigs, na técnica, em nós próprios. Se não estamos muito convictos da técnica jigging, se o estamos a fazer pela primeira vez por exemplo, um nulo pode ser altamente desmotivador.
Por isso nunca esqueçam: com entusiasmo sim, mas também com alguns laivos de racionalidade. Vou dizer-vos como eu faço, no próximo número.
Espero que isso vos venha a ser útil na preparação das vossas saídas de mar.

(*) O meu amigo António Gaspar, (o homem que tem sobre os seus ombros a responsabilidade de representar os motores Honda em Portugal e Espanha), minutos depois de um combate duro com um destes bonitos pargos.


Vítor Ganchinho


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4 Comentários

  1. Olá Vitor
    Como sempre mais um artigo que nos faz ficar com água na boca 😁

    Grande Abraço
    Toze

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    Respostas
    1. Bom dia Tozé! Vou tentar dar uma ideia sobre a forma de raciocinar quando temos de optar por esta ou aquela estratégia.
      Vamos ver como sai.


      Entretanto estou quase a ter pronto o novo barco, mais duas semanas e estará a navegar.


      Abraço
      Vitor

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  2. Bom dia Vítor

    Ao ler os artigos tento perceber essa forma de raciocinar e tudo faz sentido.
    São anos de conhecimento e muita prática que o Vítor tem .
    Agora com o novo barco os pesqueiros ficam a "5 min" 😁

    Grande Abraço
    Toze

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá Tozé! O barco novo aguarda apenas a vistoria para poder começar a pescar.

      Logo que esteja pronto eu escrevo aqui umas linhas sobre as novas funcionalidades que os barcos de pesca podem ter. A meu ver, este traz tudo o que pode trazer, desde electrónica topo de gama a um motor de proa Kraken, da Garmin.

      No fim, ...vai pescar.


      Grande abraço!
      Vitor

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