Mais ou menos definidos, com maior ou menor rigor por diferenças de condições de habitat ao longo de toda a nossa costa, sabemos que os nossos peixes têm ciclos de alimentação.
Não seria entendível que assim não fosse dado que nenhum peixe se pode alimentar ininterruptamente, em regime non-stop, durante as 24 horas de um dia, sete dias por semana.
Há momentos em que se alimentam avidamente e outros em que parecem prescindir de todo e qualquer tipo de comida, e assumem uma postura passiva, a deixar o tempo passar.
Estes ciclos de alimentação serão, do meu ponto de vista e pela experiência pessoal que tenho, definidos pelas marés. Há uma marcada influência destas na movimentação e atitude do peixe perante o alimento que pode conseguir. São as marés, lunares e solares, e as correntes por estas provocadas, o grande motor da mudança de atitude dos nossos peixes perante o alimento.
Comem, a seguir deixam de comer e repousam, e voltam a comer horas depois.
Nós, bicho homem, fazemos o mesmo.
Este pargo estava cheio de carapau, e no entanto lançou-se violentamente sobre o meu jig. |
Há um padrão aplicável a um conjunto de seres que comungam de uma necessidade elementar: a alimentação. Poderíamos extrapolar para outras áreas, nomeadamente a reprodução, a procura de conforto térmico, etc, mas foquemo-nos no essencial deste artigo, a alimentação.
Vejam abaixo um pargo que estava completamente atestado de comida e porque estava em período de frenesim alimentar, ainda tentou algo mais. O meu jig.
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É bom que se entenda este fenómeno como algo genérico, global, para toda uma espécie, e que não visa explicar a atitude de um só peixe.
Pode sempre haver um predador que teve menos sorte na maré anterior e precisa de comer. Mas são casos excepcionais, não devemos tomar a nuvem por Juno e pensar que não há uma regra, um padrão, porque na verdade há.
Nas condições certas de mar, uma determinada espécie, ou várias ao mesmo tempo, entram em actividade alimentar. É algo que decorre de estarem criadas condições para que isso aconteça, e a corrente é quase sempre o factor decisivo.
Não acontece ao minuto, ao cronómetro, mas é algo que funciona como que um “click”, de acordo com a movimentação de águas. A qual pode até ser relativamente rápida.
Quantos de nós, e sobretudo aqueles que estão mais vocacionados para a pesca vertical, notam que, entre dois lançamentos, por vezes no espaço de minutos, a água deixou de correr para um lado, parou, e começou a mover-se para o outro? O timing de mudança de comportamento é esse. Num momento o peixe está sossegado, não come. A seguir o vento aumenta de intensidade, a maré muda, a água começa a correr no sentido inverso e ele desata a atacar as iscas.
Vejam como a barriga deste robalo se encontra dilatada. Não eram ovas….pesquei este peixe em Julho. |
As coisas são o que são e não vale a pena complicar aquilo que é simples.
Há momentos do dia em que nos aparecem loucos de fome, atacando qualquer tipo de isco, ou até um anzol limpo, e outros em que nada parece resultar.
É muito evidente a diferença entre pescar quando o peixe está receptivo, predisposto a comer, à procura de comida, e quando ele está mais virado para descansar, para assimilar o alimento anteriormente conseguido, recusando todos os nossos melhores argumentos.
Desesperamos quando a nossa saída de pesca coincide com um desses períodos, porque a indiferença olímpica a que votam as nossas iscas ou amostras leva-nos a questionar a nossa própria competência de pescadores.
Não é caso para tanto.
Apenas temos de saber fazer a gestão destes momentos de acordo com as regras de quem efectivamente manda nesta coisa da pesca à linha: os peixes!
São sempre eles que mandam.
Robalo conseguido com um vinil Fish Arrow. Os vinis são equipados com um anzol simples mas perante tanta sofreguidão, para quê mais?... |
Quando chegamos ao local de pesca devemos ter sempre a preocupação de observar aquilo que temos diante dos nossos olhos.
Tudo conta. O comportamento dos cardumes, das aves, eventualmente até dos mamíferos marinhos, normalmente os nossos prezados golfinhos. A direcção do vento, a hora da maré, a visibilidade da água, etc.
Repito: tudo conta.
A informação nunca é em excesso, tudo nos serve, tudo nos ajuda a perceber o enquadramento daquilo que se está a passar naquele local, naquele momento.
A sonda presta-nos uma inestimável ajuda, se a soubermos ler e se estiver convenientemente parametrizada.
A regulação de sensibilidade desta deve ser um bom compromisso entre a sua capacidade técnica de detecção, ou seja, a definição de imagem que pode ser mais aguçada, ir até um simples grão de areia, ou estar medianamente focada e dispensar aquilo que não interfere no julgamento que queremos e podemos fazer dos fundos.
Tenham a noção de que uma sonda deve ser sensível, mas também a convicção de que sensibilidade a mais não só não nos ajuda muito como pode até prejudicar-nos.
De que adianta regular o aparelho para detectar qualquer ínfimo pormenor que exista entre nós e o fundo, um grão de poeira, se a seguir vamos pescar em águas tapadas, carregadas de fito e zooplâncton?
Vamos nesse caso ter um ecrã carregado de pontos, uma mancha compacta, baça, imperceptível, a toda a largura e altura da sonda, e não vamos conseguir ler nada.
Nem muito ao mar nem muito à terra.
É certo que toda a cadeia alimentar se inicia em quantidades minúsculas de matéria orgânica, animal ou vegetal, e que é a partir daí que o tamanho de quem come aumenta a cada elo da cadeia.
Se quiserem, um alevim come um microscópico representante da família do zooplâncton, ou uma alga, e a seguir vem um peixinho de 10 cm e come esse alevim. E atrás desse peixinho vem um robalo e aspira-o. E por aí fora, até chegarmos, por exemplo, aos nossos tubarões ou às orcas.
Mas aquilo que procuramos na sonda não entra na esfera das nanopartículas, antes diz respeito a seres visíveis, e aproveitáveis por todos aqueles que podem morder na nossa amostra.
Perceber o enquadramento do dia de pesca que temos pela frente ajuda-nos a tomar as melhores decisões.
Vamos ver no próximo número um curioso caso de um robalo que resolveu testar os limites elásticos do seu estômago...
Vítor Ganchinho
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