SENTIDOS DOS PEIXES - O OLFACTO - PARTE II

Vale a pena ler o número anterior do blog, ou não vão entender este.
Tratamos de dissertar sobre a forma como as alterações climáticas podem prejudicar a nossa pesca, por perda de capacidades olfactivas dos robalos, ou das douradas, por exemplo.

Cosima Porteus detectou que os peixes em águas mais ácidas nadavam menos, moviam-se menos no tanque de experiência que os peixes em águas salgadas “normais”, com níveis de CO2 estabilizados em valores padrão.
A um aumento da acidez das águas correspondia uma maior propensão destes a parar de nadar e permanecer imóveis, expectantes – um sinal claro de ansiedade.
A sua equipa de investigadores mediu então as mudanças de sinalização nos neurônios olfativos dos peixes, os nervos responsáveis pelas respostas ao cheiro.
Prepararam uma experiência, (em água oceânica comum, normal, e também num preparado de águas sobremaneira mais ácidas), e expuseram os peixes a dez odores diferentes.
Estes odores incluíram aminoácidos, os quais sinalizavam diferentes fontes de alimento comuns, mas também de ácidos biliares que indicariam aos peixes sujeitos à experiência que um tubarão ou outra espécie predadora de grande porte estaria presente, por perto.
A ideia era perceber de que forma os peixes reagiam a estes estímulos diferentes, e de facto houve diferenças substanciais.
Os genes limitativos da aprendizagem, aquilo que trava o normal desenvolvimento cognitivo do peixe ao longo da sua vida, eram muito mais activos, ou seja, os peixes participantes desta experiência não reagiam a novas propostas, ficavam amorfos, estáticos.
Isto pode ser uma má notícia para a evolução dos peixes no sentido de lidarem com as mudanças climáticas, embora os impactos evolutivos sejam difíceis de prever a partir apenas deste estudo, diz Porteus.
O tema é interessante e é algo que ela espera vir a aprofundar no futuro.
Apesar de algumas limitações aquando das suas experiências, Porteus ficou surpreendida com a natureza dos resultados da sua equipa: “não esperávamos que uma diminuição relativamente pequena no pH da água do mar, ou seja um ligeiro aumento do seu grau de acidez, tivesse um efeito tão drástico na baixa de sensibilidade do olfato nos peixes”, diz Porteus.

As douradas são peixes que dependem bastante do seu olfacto para encontrarem o seu alimento.

O assunto explica-se desta forma: quanto menor for o nível de pH na água, (que se mede em uma escala de 0 a 14), mais ácida esta será. A superfície dos oceanos, no seu conjunto, tem um pH que varia entre 8,0 e 8,3.
Os organismos marinhos desenvolveram-se e evoluíram num ambiente com estes valores de pH, estando assim geneticamente adaptados a esse ecossistema. Quando a água altera para um nível de acidez superior, ficam perturbados e mudam o seu comportamento.
E o robalo não é o único peixe afetado, explica ela. “Acreditamos que a capacidade de cheirar odores é semelhante na maioria, senão em quase todas as espécies de peixes, por isso o que descobrimos para o robalo quase certamente se aplicará a muitas outras espécies que os pescadores procuram, as douradas, sargos, etc.”
De que forma isso afecta a nossa pesca?
Da seguinte forma: em águas limpas, o peixe que caça à vista lança-se sobre uma amostra ou um jig e tem muitas probabilidades de atingir o alvo. Está a ver a peça, julga-a uma presa, ajusta a velocidade do seu ataque e posiciona-se correctamente para a atingir.
Mas vimos aqui anteriormente que nem sempre temos essas condições, que na maior parte dos casos as nossas águas estão tapadas, turvas. Então, por razões de falta de visibilidade e também porque a acidez crescente provoca uma maior letargia, teremos porventura menos toques bem sucedidos que o habitual.
Pescamos menos.
Também para quem pesca ao fundo com iscos não são boas notícias, a acidez crescente das águas irá levar a uma diminuição da capacidade olfactiva do predador. O que significa por exemplo que um robalo, uma dourada, podem passar por um isco depositado no fundo sem o conseguir detectar. No limite, podem até fazê-lo, perceber onde está e morder o isco, mas a distância de passagem a que conseguem detectar esse isco irá ser menor. Vão mordê-lo se o descobrirem, mas só se passarem mesmo colados a ele.
Pescamos menos.
Há perda de capacidades físicas do peixe e há perda de possibilidades de sucesso para nós, na pesca.


Há quem não concorde.
A exposição repentina dos peixes a níveis tão elevados de CO2 é uma situação artificial, adverte Gabriele Gerlach, uma outra especialista em bio evolução, da Universidade Carl von Ossietzky de Oldenburg, na Alemanha.
Gabriele Gerlach admira o trabalho feito pela equipa de Cosima Porteus, mas diz que outros estudos mostraram que o stress da reacção à acidez extra diminui para a segunda geração de peixes reproduzidos, quando expostos ao CO2. Ou seja, os descendentes dos primeiros peixes afectados adaptam-se melhor ao meio que encontram e onde se desenvolvem.


A questão das vibrações.
Basicamente um predador para se alimentar necessita de saber onde está a sua presa, o que é, e quais as perspectivas de a poder capturar.
Neste caso, para além de ser importante ver, também é importante reagir muito rapidamente à emissão de vibrações.
Sabemos que as nossas amostras trabalham muito esse factor. Os jigs emitem turbulências ao deslizarem na água, os vinis idem e até mais que isso, (possivelmente emitem ultrassons), e as amostras fazem uma esteira de vibrações absurda, à conta das palas e outros truques que nós lhes colocamos.
Não faltam motivos para um robalo detectar a nossa amostra. E se quisermos, ainda lhes lançamos amostras com esferas, o odioso rattling que os deixa nervosos.
É de supor que um peixe inactivo, parado, não emita vibrações tanto quanto um peixe ferido ou debilitado que procura escapar vivo encontrando um refúgio seguro. O movimento provoca deslocamento das águas e isso pode ser detectado.
Seria impossível não acontecer um cemitério de peixes se os robalos detectassem as presas só pela sua presença.
O ruído, se ínfimo, é abafado pelo som natural da areia que se move, das pedras que rolam, dos peixes que tocam com as barbatanas em algo sólido. Em dias de mar formado, o cascalho não pára de rolar, as ondas batem nas rochas, e na rebentação forma-se espuma, uma mistura de água e ar.
Não é então por aqui, pelo ruído, que o nosso robalo pode alimentar-se.
Admito que uma minhoca que se esgueira pelo fundo não emita grandes ruídos. Neste casos, parece-me consensual que a visão seja o factor preponderante, a peça-chave do processo de captura.
O peixe vai ao movimento, a algo que se move e por isso se destaca de todos os outros objectos parados. Quem faz mergulho como eu sabe o quanto é importante que uma santola se mova para ser detectada. Se não se mexe, é mais um molho de algas no meio das algas.
Algo com o isto:

Estas santolas só podem ser detectadas por vós pelo facto de as suas patas estarem bem visíveis. O resto dos corpos estão perfeitamente camuflados, e não seriam fáceis de distinguir no meio das algas. Quantas conseguem ver?

Uma presa que não se move não emite vibrações e por isso tem grandes probabilidades de passar despercebida.
Se, por exemplo num peixe pequeno, não há reflexos dos seus flancos a brilhar ao sol, se não há qualquer som, o robalo fica sem indicadores de onde procurar com os olhos.
E se a visibilidade é quase nula, certamente eles não o podem ver. Nem podem ver a nossa amostra.
A ser verdade que eles não conseguem ver bem as amostras, a ser assim então a quantidade de robalos pescados seria bastante reduzida. Mas então como é que os pescamos?!
Se num dia bom podemos ferrar muitos, será que isso quer dizer que haverá algo mais que a visão a actuar? E não é que há mesmo?!

Resolvi ser vosso amigo e mostrar-vos uma santola sem disfarce.

Vamos continuar a ver isso no próximo capítulo.


Vítor Ganchinho


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