Não deixa de ser curioso que, ao perguntarmos a uma dúzia de pescadores qual a sua cor favorita de amostra ou jig, em princípio iremos obter doze respostas diferentes. De facto, cada pessoa tem a sua própria percepção de cor e da sua eficácia.
Este fenómeno da perda de luz e cor debaixo de água é uma forma objectiva de analisar a questão e de dar alguma racionalidade ao fenómeno.
Se pescamos em águas rasas e ultra claras, não há grandes dúvidas: tudo funciona.
Mas ao afundarmos a amostra, começamos a ter dificuldades. Os peixes não mordem.
E só não o fazem porque nós não lhes damos a possibilidade disso. Muito mais do que a cor, aquilo que importa é mesmo a nossa capacidade de entender de que forma o peixe pode morder, que condições têm para o fazer.
A visibilidade da água é um tema apaixonante, porque mistura a crença do pescador com os dados objectivos, cientÍficos, que influenciam essa crença.
Talvez seja a hora de passar a cor da amostra para segundo plano, para o fim da lista de critérios absolutos, e passar a dar mais atenção ao perfil, a forma, a velocidade de recuperação, etc.
Ou seja, aquilo que pode influenciar a capacidade do nosso robalo conseguir, ou não conseguir, chegar a tempo de ver, preparar o ataque e morder a nossa amostra.
A detecção de presas não é feita sempre da mesma forma, e com a mesma facilidade.
Com níveis de luz médios, ou altos, e água com suficiente visibilidade, aquilo que comanda as atitudes predatórias do peixe é a sua visão, mais que qualquer outro sentido.
Mas em níveis de luminosidade baixa, ou águas mais turvas, são outros os sentidos que actuam. Os olhos passam a segundo plano, entra em acção o sentido da audição, a linha lateral e o olfacto.
Não necessariamente por esta ordem.
O contraste que a amostra possa fazer, o seu recorte relativamente ao fundo de água, deixa de ser o mais importante. Tudo piora em dias de céu muito nublado, os tais dias em que a quantidade de luz ambiente reduz significativamente.
Nestes dias, o robalo irá estar em zonas de mar onde a sombra o protege das vistas de eventuais presas, discreto, emboscado. Os remansos de água ao lado das correntes fortes interessam-lhe, a invisibilidade que as sombras lhe proporcionam faz com que possam aparecer de rompante a um cardume de pequenos peixes e ter sucesso na captura.
Também zonas de rocha forte com buracos, pedra partida, são normalmente locais onde os robalos se escondem e aguardam a passagem de eventuais presas.
Seria bom conseguirmos estabelecer um padrão de pesca diferenciado, pois podemos encontrar situações de mar tão distintas quanto o dia e a noite, maré cheia ou vazante, águas claras ou completamente tapadas. Estar preparado para todas as eventualidades ajuda-nos a reagir, a poder optar.
Em dias escuros, ou águas muito tapadas, logo condições mais difíceis, somos forçados a dar ao peixe algo mais em termos de visibilidade.
Nestes casos, pesca-se com uma amostra rígida de alto contraste, eventualmente na côr branca, ou prateada, que afunde bem, ou ainda melhor com um vinil branco ou preto equipado com um cabeçote de chumbo que faremos passar da zona de águas revoltas para o remanso onde é pressuposto estar o robalo.
Na circunstância, o vinil deve ter uma cauda shad, com uma pala algo larga, pronunciada, para dar dessa forma ao peixe um alvo, um ponto de referência. A recuperação desse vinil, mesmo que feita de forma linear, constante, irá provocar turbulência na água suficiente para chamar a atenção do predador.
Parece-me importante referir o seguinte: todos os que pescamos robalos sabemos que há dois períodos do ano em que as capturas aumentam drasticamente.
São elas o Outono, em que o peixe prepara a reprodução e por isso está mais receptivo a atacar as nossas amostras, e no início da primavera, altura em que sobe dos fundões onde se abrigou durante o inverno, para fugir à inclemência do tempo e das águas frias.
Particularmente na primavera, acontecem fenómenos climatéricos extremos, com muita chuva, abril águas mil, ventos fortes, e as famosas “marés de primavera”, as grandes marés que tudo levam atrás.
Quando as águas sobem muito, também descem muito. E isso provoca grandes movimentações de água, as correntes aumentam de intensidade e força e isso faz com que os fundos sejam arrastados. Estes fundos, para além das areias finas inertes, estão ainda plenos de matéria orgânica em diferentes estados de decomposição. Quando as águas correm mais que o habitual, as ditas “marés vivas”, os sedimentos depositados ficam em suspensão, vão atrás da água e acabam por a turvar.
Esta ultra volumétrica saída de água tem pois consequências na boa visibilidade do mar e isso afecta-nos a todos os que pescamos com amostras.
Sabemos que as horas de corrente mais forte acontecem entre a segunda e a quarta hora de maré, pois é nesse período que mais de 50% da água de um estuário sai para fora. Podemos facilmente acompanhar este fenómeno, não só pela força da corrente que leva a nossa amostra para longe, como ainda pela turbidez da água à nossa frente.
Frequentemente, iremos fazer capturas de robalos em veios de água ou bolsas de água mais limpa. Os predadores estarão encostados a zonas mais fundas, com água mais escura, e saem para atacar o que passa na saída de água mais limpa.
Faz sentido, do ponto de vista de quem precisa de se esconder para garantir que o seu ataque é eficaz. O que não faria sentido era o contrário, uma perseguição aberta, declarada, em que o robalo seguiria o pequeno peixe por tempo infinito, esgotando as suas energias.
Mesmo em águas terrivelmente tapadas é possível conseguir ferrar alguns robalos... |
Se quisermos escolher uma altura ideal para pescar robalos num estuário, não podemos variar muito: as últimas horas de enchente e a primeira hora de vazante são aquelas que permitem águas mais limpas. A partir daí, as condições de visibilidade deterioram-se e não voltará a ser igual até que novamente tenhamos a enchente.
Pescar em estuário é algo que favorece a pesca com vinis e cabeçotes de chumbo, mais pesados quanto maior a profundidade e a força da corrente, pois os ditos vinis congregam em si tudo aquilo que um robalo procura.
Se tivermos uma cauda shad podemos mesmo fazer uma recuperação lenta, pausada, a deixar rocegar junto ao fundo, e vamos ter toques.
Em termos de comportamento, o robalo é um peixe muito estudado, bem conhecido, e por isso não espanta que cada vez estejamos melhor equipados para o conseguir.
Assim se libertassem os robalos juvenis, e teríamos sempre muito peixe para pescar.
Vítor Ganchinho
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